ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
I – Relatório
1. A intentou acção declarativa com processo ordinário (impugnação pauliana) contra B e C, pedindo a sua condenação à restituição do vendido (seis fracções autónomas de um prédio, vendidas pela segunda ré à primeira ré), na medida do interesse da autora, para satisfação dos seus créditos (HK$211,208.00 e juros) sobre a segunda ré.
Posteriormente, D veio deduzir intervenção principal espontânea, como autora, fazendo contra as mencionadas duas rés, o mesmo pedido feito pela autora, restituição do vendido (seis fracções autónomas de um prédio, vendidas pela segunda ré à primeira ré), mas para satisfação dos seus créditos (MOP$13.782.899,89) sobre a segunda ré.
A primeira ré (e não a devedora, a segunda ré) invocou a prescrição do crédito da interveniente D.
O Exm.º Juiz-Presidente do Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base, julgou a acção procedente, condenando a segunda ré a restituir o vendido1 (seis fracções autónomas de um prédio, vendidas pela segunda ré à primeira ré), na medida do interesse da autora, para satisfação dos seus créditos (HK$211,208.00 e juros) sobre a segunda ré.
Por lapso, assumido pelo próprio, o mesmo Juiz-Presidente do Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base não se pronunciou sobre o pedido deduzido pela interveniente D, nem, consequentemente, sobre a excepção de prescrição do seu crédito.
Em recurso interposto, o Tribunal de Segunda Instância (TSI), decidiu :
a) Estar a sentença do Juiz de 1.ª Instância ferida de nulidade, por omissão de pronúncia, por não se ter pronunciado sobre o pedido deduzido pela interveniente D;
b) Não poder dar cumprimento ao disposto no art. 630.º do Código de Processo Civil (suprimento da nulidade e conhecimento do objecto do recurso) por não terem os autos elementos para conhecer da prescrição oposta ao pedido da D, já que, tendo sido suscitada a interrupção da prescrição pela notificação da 2.ª ré, levada a cabo pelo High Court de Birmingham, não foi objecto de pronúncia pelo Juiz de 1.ª Instância, sendo que os documentos juntos para prova de tal notificação são meras fotocópias;
c) Em consequência, com fundamento no n.º 4 do art. 629.º do Código de Processo Civil, determinou a devolução dos autos ao Tribunal de 1.ª Instância para, após apurar se ocorreu notificação da 2.ª ré pelo High Court de Birmingham, proferir nova decisão sobre o pedido da interveniente D e da autora (e não apreciou os recursos interpostos pelas rés da sentença que apreciou o pedido da autora).
Inconformada, recorre a interveniente D, para este Tribunal de Última Instância, pedindo a revogação do Acórdão recorrido e que se mande baixar o processo ao TSI para reformar a decisão.
Para tal, formulou as seguintes conclusões úteis:
- O Tribunal ad quem tinha o dever de decidir, já que dispõe de todos os elementos suficientes para o efeito, sendo que o mesmo se dirá em relação à postura do Senhor Juiz Presidente do Colectivo do Tribunal Judicial de Base.
- A Recorrente nas suas alegações de recurso, para o Tribunal da Segunda Instância apresentadas nos termos do n° 2 do artigo 613º do CPCM, sustentou que a sentença recorrida padecia do vício de nulidade, mormente pela omissão de pronúncia verificada, o que foi expressamente reconhecido pelo Ex.mo Senhor Juiz a quo.
- Todavia, pese essa alegação, a mesma defendeu que o suprimento de tal omissão não constituía nenhuma modificação da decisão, constituindo tão só um suprimento de um lapso, entendimento que continua a sufragar e que foi reconhecido pelo Senhor Juiz a quo que teve a preocupação de o dizer no seu despacho lavrado a fls. 1206 dos autos, onde igualmente vincou a ideia de que o Tribunal tinha na sua posse todos os elementos de facto para a tomada de posição relativamente a questão pela qual acabou por não pronunciar,
- Posição com a qual não se concorda, salvo o devido respeito, em face do teor do n° 2 do artigo 569º do CPCM que diz o seguinte: "O juiz pode rectificar erros materiais, suprir nulidades, esclarecer dúvidas provocadas pela sentença e reformá-la quanto a custas e multa".
- A omissão de pronúncia verificada poderá ser suprida nos termos do n° 2 do artigo 569º do CPCM, e considerando que nos autos existe todos os elementos de facto necessário para a tomada de posição, entende-se que o Tribunal de recurso, conhecendo da nulidade da sentença recorrida, por omissão de pronúncia, pode proferir decisão dando provimento ao pedido da Interveniente.
- Os documentos constantes dos autos a fls. 628 a 651 fazem prova plena uma vez que se juntou cópia certificada por Advogado, nos termos do art. 6.º do Decreto Preambular que aprova o Código de Notariado a fls. 812 a 860.
- Por outro lado, trata-se, de facto, de documentos extraídos no estrangeiro, no caso concreto no Reino Unido e de acordo com as regras em vigor nesse país e nos termos do nº 1 do art. 358.° do CCM"... fazem prova como o fariam os documentos da mesma natureza exarados em Macau.". Pelo que, salvo o devido respeito, não poderia ter deixado de se valorar os documentos em questão, pois esses documentos fazem prova plena dos factos com eles relacionados.
- Ora, "Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa...", pode a decisão de primeira instância sobre a matéria de facto ser alterada pelo Tribunal de Segunda Instância, nos termos da alínea a) do n.º1 do art. 629.° do CPCM.
- Para mais, tratando-se da excepção peremptória de conhecimento oficioso, nos termos do art. 415.° do CPCM e constando dos autos todos os elementos necessários e suficientes, deveria o Tribunal a quo ter decido a questão pois tinha todos os elementos para decidir a questão da excepção peremptória em questão.
- Consideram-se violadas as seguintes normas: n.° 2 do art. 569.° do CPCM; art. 570.° do CPCM; art. 630.° do CPCM; n.º 1 e n.º 2 do art. 358.° do CCM; art. 6.° do Decreto-Lei n.° 62/99/M de 25 de Outubro (Decreto preambular que aprova o Código do Notariado) e al a) do n.º 1 do art. 629.° e art. 630.°, ambos do CPCM.
As rés defenderam a improcedência do recurso.
II – Os factos
Uma vez que a decisão de facto fixada no Acórdão recorrido do TSI (Processo n.º 368/2006) não foi impugnada nem há lugar a qualquer alteração da mesma, sendo que, aliás, tal matéria, respeitante ao fundo da causa, não tem qualquer interesse para a questão puramente processual que agora está em causa, remete-se quanto aos factos relevantes, para aquela decisão, nos termos dos arts. 652.º e 631.º, n.º 6 do Código de Processo Civil.
III – O Direito
1. A questão a resolver
A questão a resolver é a de saber se o TSI devia ter conhecido do pedido deduzido pela interveniente D - suprindo a nulidade por omissão de pronúncia do Ex.mo Juiz de Primeira Instância - e também da questão da prescrição do crédito da interveniente, suscitada pela primeira ré, aqui se incluindo a subquestão da interrupção da prescrição, levantada pela interveniente, ao invés de ter determinado que fosse aquele Juiz de Primeira Instância a conhecer dessas questões.
2. Nulidade de sentença. Regra da substituição ao tribunal recorrido.
É pacífico, isto é, não é controvertido que o Ex.mo Juiz de Primeira Instância não conheceu do pedido deduzido interveniente D e da excepção peremptória da prescrição do crédito da interveniente, suscitada pela primeira ré, aqui se incluindo a subquestão da interrupção da prescrição, levantada pela interveniente.
Todos os intervenientes (partes, juiz a quo e Tribunal ad quem) estão de acordo que o Juiz de Primeira Instância praticou a nulidade a que se refere a primeira parte da alínea d) do n.º 1 do art. 571.º do Código de Processo Civil2, por ter deixado de pronunciar-se sobre questão que estava obrigado a apreciar, assim violando o dever imposto pelo n.º 2 do art. 563.º do mesmo diploma legal. Praticou aquilo que em direito processual se designa por omissão de pronúncia.
Não suscitou dúvidas ao TSI nem parece – às partes – que o n.º 1 do art. 630.º impõe ao tribunal de recurso, isto é, ao TSI, que conheça do objecto do recurso, mesmo que a sentença proferida na primeira instância seja declarada nula.
Vale a pena conhecer melhor o regime fixado por esta norma.
É sabido que o tribunal de recurso pode julgar segundo o modelo da substituição ou segundo o da cassação. No primeiro, a decisão do tribunal superior, quando o recurso seja procedente, revoga a decisão recorrida e substitui-a por outra. No sistema de cassação a decisão do tribunal superior rescinde ou anula a decisão de primeira instância, mas não a substitui. Os autos voltam ao tribunal de primeira instância que deve reformar a sua decisão, de acordo com a decisão do tribunal superior, cassatória ou anulatória.
No sistema jurídico de Macau, o sistema mais utilizado é o de substituição. Só em muito poucas situações o tribunal de recurso age como tribunal de cassação Por exemplo, no caso do n.º 2 do art. 651.º.
A norma do n.º 1 do art. 630.º tem uma longa tradição no sistema jurídico de Macau. Já o segundo período do art. 715.º do Código de 1939 dispunha:
“Embora o tribunal de recurso declare nula a sentença proferida na 1.ª instância, não deixará de conhecer do objecto da apelação”.
Sobre este inciso pronunciou-se o autor do Código, ALBERTO DOS REIS3, no seguinte sentido:
“Poderá parecer que a solução lógica, no caso figurado (o autor refere-se ao recurso por nulidade de sentença de primeira instância), seria a de se anular a sentença e fazer baixar o processo à 1.ª instância para que o juiz corrigisse a nulidade declarada.
Com o 2.º período do art. 715.º pretendeu-se, precisamente, afastar esta solução; e afastou-se, em obediência ao princípio da economia do juízo. A razão que ditou o art. 715.º foi a mesma que ditou o preceito contido na 1.ª alínea do art. 753.º Em vez de o processo baixar à 1.ª instância para o respectivo juiz suprir o vício, o que importaria desperdício de tempo e de actividade, pois que, corrigida a nulidade, os autos teriam de subir novamente à Relação, ordena-se que o tribunal de 2.ª instância, declarada a nulidade, aprecie, a seguir, o objecto da apelação.
É que nenhuma das nulidades previstas no art. 668.º constitui obstáculo sério a que a Relação se pronuncie sobre o mérito da apelação. A omissão dos nomes das partes e da assinatura do juiz (n.º 1.º do art. 668.º) não representa embaraço algum. Se a sentença deixou de pronunciar-se sobre questão que devesse apreciar (1.ª parte do n.º 4.º), a Relação conhecerá dessa questão e resolvê-la-á como entender; o que sucede, nesta hipótese, é que os dois graus normais de jurisdição ficam reduzidos a um”.
A norma comentada passou, sem qualquer alteração, a constituir o art. 715.º do Código de Processo Civil de 1961, e passou para o n.º 1 do art. 630.º do Código de Macau:
“1. O Tribunal de Segunda Instância conhece do objecto do recurso, mesmo que sentença proferida na primeira instância seja declarada nula ou contrária a jurisprudência obrigatória”.
E o regime da substituição ao tribunal recorrido foi mesmo ampliado no n.º 2, com uma hipótese algo diversa, e que é a seguinte:
“2. Se o tribunal recorrido não tiver conhecido de certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, o Tribunal de Segunda Instância, se entender que o recurso procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhece no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha dos elementos necessários”.
Estes n. os 1 e 2 do art. 630.º são semelhantes aos n. os 1 e 2 do art. 715.º do Código português, resultante das Reformas de 1995/96, sobre os quais o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, que aprovou a alteração ao Código, se pronuncia no seguinte sentido:
“consagra-se expressamente a vigência da regra da substituição da Relação ao tribunal recorrido, ampliando e clarificando o regime que a doutrina tem vindo a inferir da lacónica previsão do artigo 715.º do Código de Processo Civil, por se afigurar que os inconvenientes resultantes da possível supressão de um grau de jurisdição são largamente compensados pelos ganhos em termos de celeridade na apreciação das questões controvertidas pelo tribunal ad quem”.
Em conclusão, quando o juiz de 1.ª instância não conheça de questão que devia conhecer, no recurso, o TSI deve dela conhecer.
3. Modificabilidade e ampliação da decisão de facto
O Acórdão recorrido, no entanto, considerou que não podia conhecer da questão, por não dispor de todos os elementos necessários.
Ora, o princípio está correcto: a regra do n.º 1 do art. 630.º só se aplica se o tribunal de recurso tiver todos os elementos de facto necessários para decidir. Se não os tiver, deve anular a decisão e determinar ampliação da matéria de facto, nos termos do n.º 4 do art. 629.º, desde que se trate de factos alegados pelas partes, para permitir a decisão de direito, que neste caso caberá ao tribunal de 1.ª instância.
Só que, no caso dos autos, o acórdão recorrido fez má aplicação do regime do art. 629.º.
A justificação que o TSI dá para não se substituir ao juiz de 1.ª instância é a seguinte:
“... a matéria referente à notificação da 2.ª R. pelo Supremo Tribunal de Justiça de Birmingham não foi objecto de pronúncia pelo Tribunal a quo, (não figurando nem nos factos assentes ou base instrutória do despacho saneador), certo sendo ainda que os documentos pela interveniente juntos para prova de tal notificação são meras fotocópias, inviável sendo a esta Instância julgar tal matéria apenas com base nos mesmos”.
Ora, que a questão não foi objecto de pronúncia pelo tribunal a quo não constituía nenhuma novidade. A omissão de pronúncia era, no caso, o pressuposto da nulidade da sentença e, portanto, da aplicação da regra do n.º 1 do n.º do art. 630.º pelo TSI.
E a matéria não podia constar dos factos assentes porque, ao tempo, os documentos escritos em língua inglesa não estavam traduzidos. Por isso, o Ex.mo Juiz, quando elaborou o despacho saneador, fez constar e, bem, o seguinte: “A interveniente deverá juntar, querendo, no prazo de 20 dias, tradução certificada dos documentos de fls. 628 a 651 que se encontram em língua inglesa”. Ora estes documentos eram precisamente os relativos à notificação da 2.ª ré, supostamente levada a cabo pelo High Court of Justice de Birmingham, Queen's Bench Division. E a interveniente veio a juntar tradução para português destes documentos (fls. 811 e seg.).
E tal matéria não tinha que constar da base instrutória, porque tratando-se de matéria que só pode ser provada por documentos, sobre ela não podia o tribunal colectivo de primeira instância, que julga a matéria de facto, pronunciar-se, atento o disposto no n.º 4 do art. 549.º:
“4. Têm-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documentos, confissão ou falta de impugnação”.
Não obstante, o Juiz que proferiu a sentença em 1.ª instância devia conhecer do facto, se o tivesse como relevante, para o considerar provado ou não provado, em obediência ao comando do n.º 2 do art. 562.º.
Pois bem, estando em causa matéria de facto alegada por uma parte, que só pode ser provada por documentos, não pode o TSI devolver o processo ao Tribunal de Primeira Instância, já que o TSI tem poder de cognição em matéria de facto (art. 39.º da Lei de Bases da Organização Judiciária) e não há necessidade de ser produzida prova oral, como testemunhal ou por depoimento de partes.
Quando está em causa matéria de facto que só pode ser provada por documento ou que foi objecto de prova por documento ou, por exemplo, apenas por prova pericial escrita, não pode o tribunal de recurso devolver o processo para o Juiz de 1.ª Instância. Deve ele mesmo julgar a questão. Se não se juntaram os documentos pertinentes, ou se se juntaram meras fotocópias, deve ser o TSI a providenciar pela junção – para tanto notificando as partes – e julgar a questão, sejam ou não juntos os documentos, de acordo com as regras do ónus da prova.
É isso que resulta indiscutivelmente do art. 629.º, n.º 1: a decisão de facto de primeira instância pode ser alterada pelo TSI quando constarem do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão.
Sempre se entendeu, com base em disposição equivalente ao art. 629.º, n.º 1 do Código de Macau (o art. 712.º, n.º 1 do Código de 1961 e o art. 712.º do Código português) que, quando a decisão de facto do tribunal de primeira instância se baseou apenas em documentos escritos, prova testemunhal escrita ou por depoimento de parte escrita (nos dois casos por carta precatória ou rogatória) ou prova pericial escrita, pode o tribunal de segunda instância alterar a decisão de facto.4
Ora, se o tribunal de primeira instância omitiu pronúncia sobre uma questão e se para decidir tal questão em recurso – com fundamento no art. 630.º - é necessário apurar um facto que só pode ser provado por documento, por identidade ou maioria de razão relativamente ao regime do art. 629.º, n.º 1, deve o TSI providenciar pela junção aos autos do documento em causa e decidir então a questão omitida.
Na verdade, não faz nenhum sentido que o TSI devolva o processo ao tribunal de primeira instância se, por um lado, tem poder de cognição em matéria de facto e, por outro, lhe cumpre suprir as nulidades de sentença praticadas pelo tribunal de primeira instância (n.º 1 do art. 630.º).
É, pois, procedente o recurso.
Dado que o TSI não tomou qualquer decisão sobre o valor dos documentos juntos pela interveniente a fls. 628 a 651, não cabe ao TUI emitir pronúncia sobre a questão neste momento.
Por outro lado, constata-se que o TSI também não conheceu dos recursos das rés – relativamente à decisão que julgou procedente o pedido da autora - não sendo claro porque não o fez, pois, nesta parte, a sentença de primeira instância não estava afectada de nulidade.
Porventura ter-se-á considerado que a nulidade da omissão quanto ao pedido da interveniente principal implicava a anulação da restante parte da sentença. Mas não é assim. A nulidade consistente em omissão de pronúncia não afecta a parte de decisão que conheceu de outras questões. É o que resulta do princípio aflorado na segunda parte do n.º 2 do art. 147.º: a nulidade de uma parte do acto não prejudica as outras partes que dela sejam independentes. Como explica ANSELMO DE CASTRO5, trata-se de uma regra inspirada “no princípio da conservação dos actos jurídicos e que são, além disso, fruto das exigências de economia processual (utile per inutile non vitiatur)”.
De facto, qual o interesse de obrigar o juiz de 1.ª Instância a repetir aquilo que escreveu a propósito do pedido da autora e obrigar as rés a interpor novos recursos se o vício de nulidade da sentença, por falta de apreciação do pedido da interveniente, não afecta aquela parte da sentença?
Por fim, o TSI deve rectificar o lapso da sentença de primeira instância, referido na nota 1, já que quem tem de restituir o vendido, não é a segunda ré – que vendeu os imóveis – mas a compradora, a primeira ré.
IV - Decisão
Face ao expendido, julgam procedente o recurso interposto pela interveniente D, revogam o Acórdão recorrido e determinam que o TSI conheça do pedido deduzido pela mesma interveniente e das questões pertinentes, incluindo, se for caso disso, da excepção de prescrição, com base nos factos provados na sentença de primeira instância e de quaisquer factos alegados que devam ser provados por documentos, procedendo às diligências instrutórias que entender adequadas. Deve, ainda conhecer dos recursos interpostos pelas rés.
Custas pelas recorridas.
Macau, 23 de Maio de 2007.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) - Sam Hou Fai - Chu Kin
1 Há aqui um manifesto lapso, já que quem tem de restituir o vendido, não é a segunda ré – que vendeu os imóveis – mas a compradora, a primeira ré.
2 Será este o diploma legal a que nos referimos, quando se não indicar a proveniência de normas legais.
3 ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra, Coimbra Editora, reimpressão, 1981, Vol. V, p. 489.
4 Cfr. AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2000, p. 154 e LEBRE DE FREITAS e RIBEIRO MENDES, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra, Coimbra Editora, 2003, Vol. 3.º, p. 96.
5 ANSELMO DE CASTRO, Direito Processual Civil Declaratório, Coimbra, Almedina, 1982, Vol. III, p. 111.
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Processo n.º 24/2007