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Processo nº 494/2014 Data: 20.11.2014
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime(s) de “homicídio” e “ofensas graves à integridade física” (agravada pelo resultado).
Prazo para recorrer.
Legitimidade e interesse em agir do Ministério Público (para recorrer).
Falta de fundamentação.
Nulidade.



SUMÁRIO

1. Com a entrada em vigor da Lei n.° 9/2013, e, assim, com a alteração da redacção do art. 401° do C.P.P.M., o prazo para recurso (em processo penal) passou (de 10) para 20 dias, (mesmo nos processos pendentes); (cfr., art. 6°, n.° 1 e 3 da referida Lei n.° 9/2013).

2. Se é certo que pode haver recurso (do Ministério Público ou assistente) de uma “decisão absolutória” de um arguido “julgado à revelia”, o mesmo já não sucede quando a decisão é “condenatória”.
Com efeito, neste caso, o arguido julgado à revelia, (e condenado), ainda pode recorrer, (o que não sucede com o arguido absolvido, já que ao mesmo não assiste “interesse em agir”), devendo-se, assim, aguardar que seja devidamente notificado para, (só) depois de tal notificação, apreciar-se o recurso contra ele interposto, (independentemente de ter interposto recurso).

3. É inadmissível a “agravação da condenação” do arguido em novo julgamento ocorrido em consequência de recurso por este (ou no seu exclusivo interesse) interposto.

4. O Ministério Público não tem interesse em agir para recorrer de decisões concordantes com a sua posição anteriormente assumida no processo.

5. Há “falta de fundamentação” geradora de nulidade – art. 355°, n.° 2, e art. 360°, al. a) do C.P.P.M. – se na decisão proferida se condena o arguido por um crime diverso do que lhe era imputado, (ou que, ainda que erradamente, se considerava estar acusado), sem nada se expor sobre os motivos desta “divergência”.

O relator,

______________________
José Maira Dias Azedo


Processo nº 494/2014
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. O Digno Magistrado do Ministério Público deduziu acusação contra:
(1°) A,
(2°) B,
(3°) C,
(4°) D,
(5°) E,
(6°) F,
(7°) G,
(8°) H,
(9°) I,
(10°) J,
(11°) K,
(12°) L,
(13°) M,
(14°) N,
(15°) O,
(16°) P,
(17°) Q,
(18°) R,
(19°) S,
(20°) T,
(21°) U , e
(22°) V, arguidos devidamente identificados nos autos, imputando-lhes a prática, em co-autoria material, na forma consumada e em concurso real de:
- 2 crimes de “homicídio”, p. e p. pelo art. 128° do C.P.M.; e,
- 1 crime de “ofensa grave à integridade física”, p. e p. pelo art. 138°, al. d) do mesmo C.P.M.; (cfr., fls. 757 a 762 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

*

Oportunamente requerida que foi a instrução, e efectuado, a final, o debate instrutório, proferiu o Mmo J.I.C. despacho de pronúncia imputando aos identificados arguidos os crimes pelos quais tinham sido acusados; (cfr., fls. 1306 a 1316-v).

*

Remetidos os autos ao T.J.B., e realizada a audiência de julgamento, em 04.06.2010, proferiu o Colectivo Acórdão condenando os atrás mencionados (1° a 6°, 9° a 14°, e 16° a 20°) arguidos:
(1°) A,
(2°) B,
(3°) C,
(4°) D,
(5°) E,
(6°) F,
(9°) I,
(10°) J,
(11°) K,
(12°) L
(13°) M,
(14°) N,
(16°)P,
(17°) Q,
(18°) R,
(19°) S, e
(20°) T, como co-autores materiais da prática, na forma consumada e em concurso real de, 2 crimes de “ofensa grave à integridade física (agravada pelo resultado)”, p. e p. pelos art°s 138°, al. d) e 139°, al. b), (por convolação dos 2 crimes de “homicídio”), e 1 outro de “ofensa grave à integridade física”, p. e p. pelo art. 138°, al. d), todos do C.P.M., e absolvendo, por sua vez, os (7°, 8°, 15°, 21° e 22°) arguidos (7°) G, (8°) H, (15°) O, (21°) U e (22°) V, dos crimes que lhes eram imputados; (cfr., fls. 3198 a 3208-v).

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Do assim decidido, (e de entre os condenados), recorreram os (9° a 14°, 16°, 17° e 19°) arguidos, (9°) I, (10°) J, (11°) K, (12°) L, (13°) M, (14°) N, (16°) P, (17°) Q e (19°) S ; (cfr., fls. 3306 e segs.).

*

Apreciando os ditos recursos proferiu este T.S.I. Acórdão (de 16.05.2013, Proc. n.° 623/2010), determinando o reenvio do processo para novo julgamento (em consequência da verificação do imputado vício de “erro notório na apreciação da prova”); (cfr., fls. 4398 a 4425).

*

Na sequência do assim determinado, teve lugar nova audiência de julgamento no T.J.B. – em que responderam os 17 arguidos que tinham sido condenados no (anterior) Acórdão de 04.06.2010 e – que culminou com a prolação do Acórdão datado de 09.05.2014, (objecto do presente recurso e), com o qual se decidiu:
–– absolver os arguidos (9°) I, (10°) J, (11°) K, (13°) M, (14°) N, (16°) P, (17°) Q, (18°) R e (19°) S, dos crimes que lhes eram imputados;

–– condenar o (1°) arguido A, pela prática, em co-autoria material, na forma consumada e em concurso real, de:
- 2 crimes de “ofensa grave à integridade física (agravada resultado)”, p. e p. pelo art. 138°, al. d) e art. 139°, n.° 1, al. b) do C.P.M., na pena de 7 anos e 9 meses de prisão cada;
- 1 crime de “ofensa grave à integridade física” p. e p. pelo art. 138.º al. d) do mesmo C.P.M., na pena de 4 anos e 9 meses de prisão; e,
- em cúmulo jurídico, na pena única de 10 anos e 6 meses de prisão; e,

–– condenar os arguidos (2°) B, (3°) C, (4°) D, (5°) E, (6°) F, (12°) L) e (20°) T, pela prática, em co-autoria material, na forma consumada e em concurso real de:
- 2 crimes de “ofensa grave à integridade física”, p. e p. pelo art. 138°, al. d) e art. 139°, n.° 1, al. b) do C.P.M., na pena (individual) de 7 anos e 6 meses de prisão para cada crime;
- 1 crime de “ofensa grave à integridade física”, p. e p. pelo art. 138°, al. d) do Código Penal, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão; e,
- em cúmulo jurídico, na pena única (e individual) de 10 anos de prisão; (cfr., fls. 5170 a 5180).

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Inconformado com o assim decidido, o MINISTÉRIO PÚBLICO recorreu, (sendo este o recurso que agora se aprecia).
Motivou, produzindo, a final, as seguintes conclusões:

“1. O acórdão recorrido enferma dos vícios de contradição insanável da fundamentação previsto no art.º 400.º n.º 2 al. b) do Código de Processo Penal, de violação de lei por falta dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, nos termos do art.º 400.º n.º 1 do Código de Processo Penal, conjugado com o art.º 355.º do mesmo Código, de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos do art.º 400.º n.º 2 al. a) do Código de Processo Penal e do vício de erro notório na apreciação da prova, nos termos do art.º 400.º n.º 2 al. c) do Código de Processo Penal.
2. In casu, conforme os factos provados no acórdão a quo, verifica-se expressamente que os actos dos arguidos bastam constituir dois crimes de homicídio p.p. pelo art.º 128.º do Código Penal e um crime de ofensa grave à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal, tendo em conta o motivo do crime (os ofendidos recusaram ficar em subordinados de A)), as armas brancas afiadas utilizadas (canos de ferro tirados da janela e da cama das salas prisionais), o processo de prática de crime (continuaram a agredir quando os ofendidos caíram no chão por ferimentos), o relatório da autópsia (o ofendido W ficou ferido por arma branca, em consequência, morto por hemorragia resultante da grave laceração pulmonar de dois lados, enquanto o ofendido X também ficou ferido por arma branca, em consequência, morto por hemorragia resultante da laceração grave dos pulmões e das traqueias), o relatório da medicina legal (o ofendido Y sofreu ferimentos no rosto direito (duas lesões), na parte dianteira e superior da parede torácica e no ombro direito (cinco lesões, com comprimento e profundidade compreendidos entre 2cm e 5cm), nas pernas (três lesões na perna direita e uma na esquerda, com profundidade compreendida entre 2cm e 4cm), e na parede abdominal (com comprimento de 3cm), e a lesão na parede abdominal causa a picada do estômago, do jejuno e do mesocolon, bem como o grande hematoma retroperitoneal).
3. Aliás, julgou o Tribunal a quo, na fundamentação da decisão, que os actos ilícitos dos oito arguidos supracitados constituem dois crimes de ofensa grave à integridade física ou à saúde que vier a produzir morte a outrem p.p. pelo art.º 139.º n.º 1 al. b), conjugando com o art.º 138.º al. d) do Código Penal e um crime de ofensa grave à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal.
4. O que conduz à incompatibilidade entre os factos provados e provas e a fundamentação da sentença. O acórdão a quo enferma do vício de contradição insanável da fundamentação p.p. pelo art.º 400.º n.º 2 al. b) do Código de Processo Penal e consequentemente, conduzirá à nulidade do acórdão proferido.
5. No acórdão, o Tribunal a quo não especificou sumariamente que se absolvesse ou não os oito arguidos supracitados de dois crimes acusados de homicídio p.p. pelo art.º 128.º do Código Penal, nem as razões de condenação de dois crimes de ofensa grave à integridade física ou à saúde que vier a produzir morte a outrem p.p. pelo art.º 139.º n.º 1 al. b), conjugando com o art.º 138.º al. d) do Código Penal e de um crime de ofensa grave à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal.
6. Evidentemente, o acórdão a quo viola a lei por falta dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão nos termos do art.º 400.º n.º 1 do Código de Processo Penal, conjugado com o art.º 355.º do mesmo Código.
7. Ao mesmo tempo, notamos que o Tribunal a quo condenou os oitos arguidos A, B, C, D, E, F, L e T, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de dois crimes de ofensa grave à integridade física ou à saúde que vier a produzir morte a outrem p.p. pelo art.º 139.º n.º 1 al. b), conjugando com o art.º 138.º al. d) do Código Penal e de um crime de ofensa grave à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal.
8. Segundo a definição, a agravação pelo resultado compreende duas partes: crime de base e resultado agravado. E o crime de base refere-se a que o acto do agente já constitui crime previsto no Código Penal. In casu, trata-se crime de ofensa grave ao corpo e à saúde de outrem conforme o acórdão a quo. E a agravação pelo resultado refere-se a que o acto do agente, para além de preencher os requisitos constitutivos de crime de base, provoca ainda uma consequência de prejuízo previsto na lei digna de uma pena agravado. In casu, o Tribunal a quo entende que há morte como resultado agravado, constituindo o crime de agravação pelo resultado, e a lei exige a negligência subjectivamente do agente perante o resultado agravado, e nos termos do art.17.º do Código Penal, quando a pena aplicável a um facto for agravada em função da produção de um resultado, a agravação depende sempre da possibilidade de imputação desse resultado ao agente pelo menos a título de negligência. É de salientar que a atitude interna de negligência do agente face ao resultado agravado constitui requisito necessário de agravação da pena pelo resultado, caracterizando-se por exclusividade, isto é, a agravação da pena pelo resultado pressupõe a negligência e não dolo, o agente quem tem atitude interna de dolo deve responsabilizar-se por crime doloso face ao resultado agravado.
9. No presente processo, de acordo com os factos provados, o Tribunal a quo não apurou o elemento subjectivo dos oito arguidos relativamente ao crime de ofensa grave ao corpo e à saúde de outrem e a atitude interna de negligência destes face ao resultado agravado de morte.
10. O acórdão a quo padece do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos do art.º 400.º n.º 2 al. a) do Código de Processo Penal, ou seja, quando do texto da decisão não constam todos os factos pertinentes à subsunção no preceiro legal incriminador por falta de apuramento de matéria.
11. Por outro lado, o recorrente entende que o acórdão a quo padece do vício de erro notório na apreciação da prova p.p. pelo art.º 400.º n.º 2 al. c) do Código de Processo Penal.
12. Na audiência de julgamento, como as testemunhas Y, Z, Z1 não conseguiram recordar certos factos, o Tribunal a quo leu, nos termos do art.º 337.º n.º 3 al. a) do Código de Processo Penal, as declarações anteriormente prestadas perante o Ministério Público, incluindo as declarações de Y (fls. 736 a 737 dos autos), Z (fls. 738, 82, 83, 342 e 343 dos autos), e de Z1 (fls. 740 dos autos).
13. Devido à morte das testemunhas de acusação Z2 e Z4, o Tribunal a quo também leu as declarações prestadas perante o Ministério Público nos termos do art.º 337.º n.º 4 do Código de Processo Penal.
14. Indicou a testemunha Z4), na declaração anteriormente prestada perante o Ministério Público (fls. 693 e 694), que M e N, com fotografias n.ºs 8208 e 3270 (deve ser 13270 por erro de escrita, uma vez que não se consta a fotografia n.º 3270 na fls. 235), fls. 235, P, com fotografia n.º 18112, fls. 237, Q, fls. 183, todos os arguidos supracitados participaram neste ataque, causando directamente a morte dos dois reclusos e os ferimentos de outros reclusos.
15. Na audiência de julgamento, indicou o arguido M que os arguidos D, E, F, N e T, tinham agredido, com arma branca, os ofendidos Z e X.
16. Na audiência de julgamento, a testemunha Z confirmou a declaração anteriormente prestada perante o Ministério Público (fls. 738, fls. 342, fls. 343, fls. 82 e fls. 83 dos autos), segunda a qual, a testemunha afirmou que na ocorrência do caso, viu que saíram da sala prisional n.º 4 mais de vinte reclusos, com armas brancas de ferro nas mãos da maioria, arremessaram-se contra os ofendidos Y e W, esta testemunha ainda indicou que C (fotografia n.º 10942), D (fotografia n.º 17896), F (fotografia n.º 17897) e B (fotografia n.º 158/98) agrediram o ofendido Y; E(fotografia n.º 17963), I (fotografia n.º 18207), J (fotografia n.º 18208) e K (fotografia n.º 18209) proseguiram e tentaram golpear o ofendido W; e L (fotografia n.º 10417), M (fotografia n.º 8208), N (fotografia n.º 13270), R (fotografia n.º 18114), S (fotografia n.º 18203), T (fotografia n.º 220/98) entraram na sala prisional para agredir o ofendido X.
17. Daí que possamos provar, conforme as provas produzida na audiência, que os nove arguidos absolvidos, I, J, K, M, N, P, Q, R e S cometeram, de forma comparticipação, dois crimes de homicídio p.p. pelo art.º 128.º do Código Penal e um crime de ofensa grave à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal.
18. O Tribunal a quo incorre no erro notório na apreciação da prova, violando o disposto no art.º 400.º n.º 2 al. c) do Código de Processo Penal.
19. Face ao exposto, deve o Tribunal condenar os dezassete arguidos pela prática de dois crimes de homicídio p.p. pelo art.º 128.º do Código Penal e um crime de grave ofensa à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal, concretamente, condenar o arguido A pela prática de dois crimes de homicídio, na pena de 13 anos de prisão por cada, e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 9 meses de prisão, em cúmulo jurídico, na pena única de 15 anos e 6 meses de prisão; e condenar os outros dezasseis arguidos pela prática de dois crimes de homicídio, na pena de 12 anos de prisão por cada, e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, em cúmulo jurídico, na pena única de 13 anos de prisão”.

A final, pede, “que se julguem procedentes as motivações do presente recurso, anulem o acórdão a quo e condenem o arguido A pela prática de dois crimes de homicídio, na pena de 13 anos de prisão por cada, e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 9 meses de prisão, em cúmulo jurídico, na pena única de 15 anos e 6 meses de prisão; e condenem os outros dezasseis arguidos pela prática de dois crimes de homicídio, na pena de 12 anos de prisão por cada, e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, em cúmulo jurídico, na pena única de 13 anos de prisão, ou determinem o reenvio do processo para novo julgamento, sempre que não for possível decidir da causa nos termos do art.º 418.º do Código de Processo Penal (…)”; (cfr., fls. 5230 a 5237).

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Responderam os arguidos (14°) N e (19°) S (cfr., fls. 5265 e segs.), (1°) J (cfr., fls. 5286 e segs.), (9°) I (cfr., fls. 5296 e segs. e fls. 5379 e segs.), (11°) K e (13°) M (cfr., fls. 5322 e segs.), (12°) L (cfr., fls. 5327 a segs.), e (16°) P e (17°) Q (cfr., fls. 5333 e segs.).

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Admitido o recurso com efeito e modo de subida adequadamente fixados, vieram os autos a este T.S.I..

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Oportunamente, em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer pugnando pela procedência do recurso.

Tem o mesmo o teor seguinte:

“Ao douto Acórdão recorrido na parte de condenar os 8 arguidos aí identificados em dois crimes p.p. pela disposição na alínea b) do n.° 1 do art. 139° ex vi d) do art. 138° do Código Penal (vide fls. 5170 a 5181 v.), a ilustre Colega assacou os vícios previstos respectivamente na alínea b) do n.° 2 do art. 400°, no n.° 1 do art. 400° em conjugação com art. 355° e na alínea a) do n.° 2 do art. 400°, sendo todos do CPPM.
1. Note-se que a condenação dos apontados dois crimes implica a convolação dos dois crimes de homicídio indicados na Acusação. Para tal efeito, o Tribunal a quo explicou apenas (pags. 17 a 18 do Acórdão): 此外,嫌犯 A、B、C、D、E、F、L及T的行為是在有意識、自由及故意的情況下以直接共犯及既遂形式構成兩項〈刑法典〉第139條第1款b項結合第138條d項所規定及處罰之嚴重傷害他人身體或健康、因而引致其死亡罪(及......)並完全符合由上述法規規定的罪狀中所有主觀及客觀上均可予以歸責之要件。 Não se descortina fundamentação mais nada.
Em consonância com as boas jurisprudência adquiridas, divisamos que sendo embora abstracta, fraca, insuficiente e pouco congruente, tal fundamentação não padece da contradição insanável invocada pela ilustre Colega nas 2 a 4 conclusões da Motivação de fls. 5231 a 5237 dos autos.
2. O facto dado por provado no n.° 21 diz (vide. p.12 do Acórdão em questão):  嫌犯A、B、C、D、E、F、L及T等人在自由、自願及有意識的情況下,共同決意,分工合作,故意對被害人Y、W、X使用暴力襲擊,並因此直接導致被害人W及X死亡,同時亦直接對……造成嚴重傷害。
Comparado este facto provado com o facto descrito no art.21 ° da Acusação, toma-se patente que o Tribunal a quo aceitou o essencial do facto alegado pelo M.° P.° para delinear a culpa dos arguidos, consistindo a única distinção no número dos arguidos.
Com efeito, o Tribunal a quo não indicou nenhum facto provado para justificar a dita convolação dos 2 crimes de homicídio indicados na Acusação, nem especificou, de todo em todo lado, nenhuma matéria de facto provada para sustentar a decisão de condenar aqueles 8 arguidos em dois crimes p.p. pela disposição na alínea b) do n.°1 do art.139° ex vi alínea d) do art.13 8° do Código Penal.
Nesta medida, opinamos modestamente que se verifica in casu a «insuficiência para a decisão da matéria de facto provada» consignada na a) do n.°2 do art.400° do CPP e invocada pela ilustre Colega nas 13 e 17 conclusões da referida Motivação.
3. Os factos provados nos n.°s 3 a 5 do Acórdão recorrido mostram seguramente a premeditação dos arguidos condenados para atacar os 4 ofendidos, e também o medo (preocupação) e odeio comuns (dos arguidos) no sentido de serem "vendidos" por tais ofendidos.
Os factos provados nos n.°s 6 a 10 desse aresto revelam, sem dúvida, a perseguição insistente pelos arguidos para atacarem os ofendidos Y e W. Por sua vez, os provados nos n.°s 12 a 14 demonstram a forte vontade dos arguidos. Os ferimentos descritos nos factos provados n.°s 19 e 20 constatam a intenção cruel e desumana.
O facto provado no n. °21 afirma expressamente que os arguidos cometeram dolosamente a agressão violenta que causou directamente o falecimento dos ofendidos W e X, e simultaneamente provocou a grave lesão à integridade física e saúde do ofendido Y.
Ponderados em harmonia com a regra de razoabilidade comum, os factos provados imbuem-nos da perspectiva de que durante a sanguinária agressão, todos os arguidos podiam e deviam prever, como consequência directa e seriamente possível, o falecimento de quaisquer dos ofendidos, e conformavam conscientemente com a verificação do falecimento provocado pela dita agressão.
Quer dizer que todos os arguidos não se importam e conformavam com a qualquer consequência possível da cruenta agressão, sendo absolutamente indiferente para eles o falecimento ou a grave lesão dos ofendidos, tais como a perda do sentido humano ou. a mutilação.
À luz do preceito no n.°3 do art.13° do Código Penal, parece-nos não duvidoso que os factos dados por provados pelo Tribunal a quo no Acórdão recorrido constatam, pelo menos, o dolo eventual dos arguidos para com o falecimento dos ofendidos W e X.
Nesta linha de vista, inclinamos a entender que a convolação operada no Acórdão recorrido enferma, além da «insuficiência para a decisão da matéria de facto provada», ainda do erro de direito por não imputar aos arguidos o dolo eventual em relação ao falecimento dos ofendidos W e X, erro que se encontra invocado, de forma pouca exacta, na 13 conclusão da mencionada Motivação.
*
Sem prejuízo do respeito pela opinião diversa, sufragamos o «erro notório na apreciação de prova» imputado pela ilustre Colega ao douto Acórdão recorrido na parte de o Tribunal a quo absolver da Acusação os 9 arguidos aí melhor identificados.
Ora bem, os factos provados tomam concludente e inquestionável que ao fugir e esquivar de perseguições e agressões, os 4 ofendidos atacados obtiveram ajuda de 4 reclusos (Z2,Z3,Z4,Z5, vide. os factos provados n.°8 e n.°12 do Acórdão em questão).
De outro lado, para impedir a continuação da violenta agressão, o guarda prisional de serviço Z6 tinha de avisar o guarda de turno substituto Z7, advertindo este a solicitar imediatamente ao Chefe de serviço para mandar mais pessoal para apoio.
Analisando tais factos em harmonia com as regras de experiência comum, parece-nos objectivamente impossível haver só 8 indivíduos que praticaram as perseguições e agressões, provocando falecimento de dois ofendidos e grave ferimento de um deles.
Também nos apresenta objectivamente improvável o facto provado n°13 – sendo manifestamente e anormal e desrazoável que os 2 arguidos L e T conseguiram, contra a resistência com toda a força de 3 homens para salvaguardar a vida própria ou alheia, abrir a porta fechada e entrar na sala prisional n. °2 do EP.
Nestes termos e tendo em devida consideração todos os meios de prova alegados, e bem, pela ilustre Colega nos arts.23° a 25° da Motivação, somos impulsados, por cautela, a entender que enferma do invocado erro notório na apreciação de prova a Absolvição decretada pelo Tribunal a quo no Acórdão recorrido.
Por todo o expendido acima, propendemos pela procedência do recurso em apreço”; (cfr., fls. 5520 a 5522).

*

Lavrado despacho em sede de exame preliminar, colhidos os vistos dos Mmos Juízes-Adjuntos e realizada que foi a audiência de julgamento do recurso, (dado haver arguidos/recorridos que no T.J.B. foram julgados à sua revelia), passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Pelo Colectivo do T.J.B. foram dados como provados os factos seguintes:

“1.
  Em Setembro de 1998, os arguidos A, B, C, D, E, F, I, J, K, L, M, N, P, Q, R, S e T, e os ofendidos Y, W, X e Z, todos encontravam-se presos no 2º andar, Estabelecimento Prisional de Macau, Bloco V.
2.
  Os arguidos B, C, D, E, F, L e T são subordinados do arguido A.
3.
  O arguido A, a fim de fortalecer a força no estabelecimento prisional, convidou os ofendidos Y, W, X e Z para participar no seu grupo, porém, recusaram os quatro ofendidos.
4.
  No dia 19 de Setembro de 1998, de manhã, o arguido A convocou os arguidos B, C, D, E, F, L e T, entre outros, na sala prisional n.º 4, sito no 2º andar, Bloco V, e distribuiu a cada um os canos de ferro tirados da janela e da cama (a parte destas armas encontram-se apreendidas, vide foto constante da fls. 362 dos autos), para agredir os ofendidos Y, W, X e Z.
5.
  Por volta das 12h00 no mesmo dia, o arguido A e os outros arguidos supracitados, sob a ordem do arguido A, arremeteram da sala prisional n.º 4 contra os ofendidos Y e W que estavam a conversar na altura nas proximidades da porta da sala prisional n.º 6.
6.
  Na altura, o arguido A deu um golpe, com arma branca, no abdómen do ofendido Y, e os outros arguidos, incluindo os sete supracitados, também agrediram com arma os ofendidos Y e W.
7.
  Os ofendidos Y e W fugiram respectivamente com ferimentos depois da agressão.
8.
  O ofendido Y fugiu até à porta da sala prisional n.º 3 e caiu no chão devido aos ferimentos, perante essa situação, o recluso Z2 que se encontrava na sala prisional n.º 3 na altura arrastou o ofendido imediatamente para a sala prisional, e fechou a porta de ferro da sala prisional com os outros reclusos Z1 e Z4 com toda a força, para impedirem a entrada dos arguidos A, B e C, entre outros.
10.
  Por outro lado, o ofendido W fugiu ao longo dos corredores da sala prisional até às proximidades de balneário ao lado da sala prisional n.º 1, mas foi apanhado e agredido pelos arguidos, incluindo D e outros, caindo no chão devido a várias agressões corporais.
11.
  A seguir, vários arguidos incluindo nomeadamente L e T e outros dirigiram-se à sala prisional n.º 2 onde Z e o ofendido X se encontravam para efectuar agressões.
12.
  Perante a situação, Z, o arguido X e o recluso Z5 fecharam com toda a força a porta da sala prisional n.º 2, para impedirem a entrada dos arguidos, incluindo L, T e entre outros.
13.
  Durante o processo, os ofendidos X e Z ficaram feridos nas mãos e braços por armas dos arguidos por fenda da porta. A seguir, entraram na sala prisional n.º 2 os arguidos e agrediram os dois ofendidos supracitados.
14.
  Na altura, os arguidos, incluindo B e outros, também participaram a agredir os ofendidos X e Z.
15.
  Durante o processo, Z caiu no chão devido aos ferimentos, enquanto o ofendido X fugiu da sala prisional n.º 2, mas finalmente foi apanhado e caiu no chão nos corredores devidos às agressões.
17.
  O guarda prisional Z6 notificou imediatamente a outro guarda prisional em serviço substituto, Z7, e este último notificou seguidamente ao chefe em serviço para mandar o pessoal para socorro.
18.
  A seguir, os ofendidos Y, W e X foram transportados para o Centro Hospitalar Conde de S. Januário, mas os ofendidos W e X vieram a falecer pelas 12h54 e 14h45 no mesmo respectivamente após lhes terem prestados socorros e tratamentos mas sem eficácia, e o ofendido Y ficou hospitalizado a ser tratado até a 24 de Setembro do mesmo ano.
19.
  Segundo o relatório da autópsia do cadáver, o ofendido W ficou ferido por arma branca, em consequência, morto por hemorragia resultante da grave laceração pulmonar de dois lados; enquanto o ofendido X também ficou ferido por arma branca, em consequência, morto por hemorragia resultante da laceração grave dos pulmões e das traqueias (vide relatório da autópsia do cadáver, fls. 331 a 337 dos autos, aqui se dá por integralmente reproduzido).
20.
  Os actos supracitados dos arguidos A, B, C, D, E, F, L e T, causam directamente a morte dos ofendidos W e X; ao mesmo tempo, causaram directamente ao ofendido Y os ferimentos de corte no rosto direito (duas lesões), na parte dianteira e superior da parede torácica e no ombro direito (cinco lesões, com comprimento e profundidade compreendidos entre 2cm e 5cm), nas pernas (três lesões na perna direita e uma na esquerda, com profundidade compreendida entre 2cm e 4cm), na parede abdominal (com comprimento de 3cm), e a lesão na parede abdominal causa a picada do estômago, do jejuno e do mesocolon, bem como o grande hematoma retroperitoneal, colocando em perigo a vida deste, logo, o ofendido precisa de 20 dias para a recuperação e perde a capacidade de trabalho neste período de recuperação (vide relatório do exame legal, fls. 744 dos autos, aqui se dá por integralmente reproduzido).
21.
  Os arguidos A, B, C, D, E, F, L e T, actuaram de comum acordo e dividiram as tarefas entre si, agrediram dolosa e violentamente os ofendidos Y, W e X, causando directamente por isso a morte dos ofendidos W e X e ofensa grave à integridade física e à saúde do ofendido Y.
22.
  Os arguidos bem sabiam que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
-
(Provou-se ainda que:)
  O arguido I alegou que é comerciante, auferindo mensalmente o rendimento no valor cerca de MOP$18.000,00. Tem como a sua habilitação literária o ensino secundário complementar, tendo o pai, a mulher grávida e um filho a seu cargo.
  O arguido J alegou que é motorista, auferindo mensalmente o rendimento no valor cerca de MOP$13.000,00. Tem como a sua habilitação literário o ensino primário, tendo três filhos, a mulher e os pais a seu cargo.
  O arguido K alegou que é cozinheiro, auferindo mensalmente o rendimento no valor cerca de MOP$15.000,00. Tem como a sua habilitação literária o ensino primário, tendo um filho a seu cargo.
  O arguido L alegou que é motorista, auferindo mensalmente o rendimento no valor cerca de MOP$10.000,00. Tem como a sua habilitação literária o 2º ano do ensino primário, tendo ninguém a seu cargo.
  O arguido M alegou que é comerciante, auferindo mensalmente o rendimento no valor cerca de MOP$6.000,00. Tem como a sua habilitação literária o ensino primário, tendo a mulher e um filho a seu cargo.
  O arguido N alegou que é gerente da Agência de Automóveis Usados, auferindo mensalmente o rendimento no valor cerca de MOP$16.000,00. Tem como a sua habilitação literária o ensino primário, tendo três filhos, a mulher, os sogros a seu cargo.
  O arguido P alegou que é cozinheiro e tem como a sua habilitação literária o ensino primário, tendo os pais a seu cargo.
  O arguido Q alegou que é operador, auferindo mensalmente o rendimento no valor cerca de MOP$10.000,00. Tem como a sua habilitação literária o 3º ano do ensino secundário, tendo a mãe a seu cargo.
  O arguido S alegou que é trabalhador de construção, auferindo mensalmente o rendimento no valor cerca de MOP$15.000,00. Tem como a sua habilitação literária o ensino primário, tendo o pai, a mulher e um filho a seu cargo.
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  Os arguidos C, I, J, K, N, S e T, todos são delinquentes primários.
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  Do Processo Comum Colectivo n.º 245/98 resulta que o arguido A foi condenado pela prática de um crime de usura para jogo e um crime de exigência ou aceitação de documentos, um crime de sequestro e de um crime de extorsão, na pena única de 5 anos e 3 meses de prisão em 10 de Novembro de 1998, com pena acessória de proibição de entrada em locais de jogo com período de 3 anos. O arguido cumpriu a pena em 23 de Maio de 2003.
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  Do Processo Comum Colectivo n.º 353/98 resulta que o arguido B foi condenado, em 16 de Março de 1999, pela prática de um crime de tráfico de estupefaciente, na pena de 11 anos de prisão e na multa no valor de MOP$10.000,00, convertível em 100 dias de prisão caso não for paga. O arguido cumpriu a pena em 23 de Abril de 2009.
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  Do Processo Comum Colectivo n.º 207/99 resulta que o arguido D foi condenado pela prática de um crime de resistência e coacção, um crime de roubo, um crime de rapto, um crime sequestro, um crime de detenção de armas proibidas (art.º 262.º n.º 1 do Código Penal), um crime de detenção de armas proibidas (art.º 262.º n.º 3 do Código Penal) e de um crime de tráfico de estupefacientes de quantidades diminutas, na pena de 9 anos de prisão em 8 de Julho de 1999. O arguido cumpriu a pena em 22 de Junho de 2007.
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  Do Processo Comum Colectivo n.º 88/99 resulta que o arguido E foi condenado pela prática de um crime de rapto, um crime de violação de domicílio e de um crime de furto qualificado, na pena de 9 anos e 3 meses de prisão em 29 de Novembro de 1999. O arguido cumpriu a pena em 14 de Outubro de 2007.
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  Do Processo Comum Colectivo n.º 207/99 resulta que o arguido F foi condenado pela prática de um crime de resistência e coacção, um crime de roubo, um crime de rapto, um crime de sequestro, um crime de detenção de armas proibidas (art.º 262.º n.º 1 do Código Penal), um crime de detenção de armas proibidas (art.º 262.º n.º 3 do Código Penal) e de um crime de tráfico de estupefacientes de quantidades diminutas, na pena de 9 anos de prisão em 8 de Julho de 1999. O arguido cumpriu a pena em 22 de Junho de 2007.
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  Do Processo Sumário n.º CR3-07-0008-PSM resulta que o arguido L foi condenado pela prática de um crime de apropriação ilegítima em caso de coisa achada, na pena de 2 meses de prisão em 17 de Janeiro de 2007, com suspensão da execução da pena pelo período de 1 ano.
  Do Processo Comum Colectivo n.º CR1-06-0138-PCC resulta que o arguido L) foi condenado, em 22 de Novembro de 2007, pela prática de um crime de tráfico e consumo de estupefacientes e um crime de detenção de instrumentos para consumo de estupefacientes, na pena de 7 meses de prisão e na multa no valor de MOP$4.000,00, convertível em 26 dias de prisão caso não for paga, e na pena de 4 meses de prisão respectivamente. Em cúmulo jurídico com o Processo n.º CR3-07-0008-PSM, foi totalmente condenado na pena única de 10 meses de prisão e na multa no valor de MOP$4.000,00, convertível em 26 dias de prisão caso não for paga, com suspensão da execução da pena pelo período de 2 anos. O arguido cumpriu a pena em 1 de Março de 2009.
  Do Processo Sumário n.º CR1-08-0044-PSM resulta que o arguido L foi condenado pela prática de um crime de detenção de estupefaciente para consumo pessoal, na pena de 45 dias de prisão efectiva em 27 de Fevereiro de 2008. O arguido cumpriu a pena em 9 de Abril de 2008.
  Do Processo Comum Singular n.º CR4-08-0285-PCS resulta que o arguido L foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefaciente de quantidades diminutas, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão efectiva e na multa no valor de MOP5.000,00 em 11 de Fevereiro de 2010, convertível em 33 dias de prisão caso não for paga nem substituída por trabalho.
  Do Processo Comum Colectivo n.º CR2-09-0259-PCC resulta que o arguido L foi condenado pela prática de um crime de roubo, na pena de 4 anos de prisão em 16 de Abril de 2010.
  Do Processo Contravencional n.º CR3-08-1274-PCT resulta que o arguido L foi condenado, em 16 de Abril de 2010, pela prática de uma contravenção, na multa no valor de MOP$3.000,00, convertível em 20 dias de prisão caso não for paga nem substituída por trabalho.
  Em cúmulo jurídico do Processo n.º CR2-09-0259-PCC e do Processo n.º CR4-08-0285-PCS, foi condenado, em 20 de Maio de 2010, o arguido L na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão e na multa de MOP$5.000,00, convertível em 33 dias de prisão cão não for paga nem substituída por trabalho.
  Do Processo Comum Colectivo n.º CR4-10-0072-PCC resulta que o arguido L foi condenado, em 28 de Janeiro de 2011, pela prática de um crime de furto qualificado, na pena de 1 ano de prisão efectiva.
  Do Processo Comum Singular n.º CR1-10-0282-PCS resulta que o arguido L foi condenado, em 26 de Maio de 2011, pela prática de um crime de furto, na pena de 7 meses de prisão efectiva.
  Em cúmulo jurídico do Processo n.º CR4-10-0072-PCC, Processo n.º CR2-09-0259-PCC, Processo n.º CR1-10-0282-PCS e do Processo n.º CR4-08-0285-PCS, foi condenado totalmente, em 1 de Junho de 2012, o arguido L na pena única de 5 anos e 3 meses de prisão efectiva e na multa no valor MOP$5.000,00, convertível em 33 dias de prisão caso não for paga nem substituída por trabalho.
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  Do Processo Comum Singular n.º CR1-10-0226-PCS resulta que o arguido M foi condenado pela prática de um crime de ofensa simples à integridade física, na pena de 4 meses de prisão efectiva em 9 de Junho de 2011.
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  Do Processo Comum Colectivo n.º 455/98 resulta que o arguido P foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 3 anos de prisão em 7 de Maio de 1999 e o arguido já cumpriu a pena em 6 de Agosto de 2001.
  Do Processo Comum Colectivo n.º PCC-081-04-5 resulta que o arguido P foi condenado, em 2 de Dezembro de 2004, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena única de 10 anos e 9 meses de prisão efectiva e na multa no valor de MOP$12.000,00, convertível em 60 dias de prisão caso não for paga nem substituída por trabalho.
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  Do Processo Comum Colectivo n.º 455/98 resulta que o arguido Q foi condenado, em 7 de Maio de 1999, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes e um crime de detenção de armas proibidas, na pena de 9 anos e 6 meses de prisão e na multa no valor de MOP$6.000,00, convertível em 120 dias de prisão caso não for paga nem substituída por trabalho. O arguido já cumpriu a pena em 17 de Outubro de 2011.
  Do Processo n.º CR1-03-0074-PCC resulta que o arguido Q foi condenado, em 10 de Outubro de 2003, pela prática de três crimes de extorsão qualificada, na pena de 10 anos e 6 meses de prisão.
Do Processo Comum Colectivo n.º 455/98 resulta que o arguido R foi condenado, em 7 de Maio de 1999, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 8 anos e 6 meses de prisão e na multa no valor de MOP$6.000,00, convertível em 120 dias de prisão caso não for paga nem substituída por trabalho. O arguido já cumpriu a pena em 6 de Fevereiro de 2007”.

*

Por sua vez, e como “factos não provados”, consignou o mesmo Colectivo que não se provaram “outros factos relevantes” não correspondentes aos factos assentes, designadamente:
“2.
  Todos os arguidos supracitados são membros da seita “XXX” de Macau, entre os quais, I, J, K, M, N, P, Q, R, S são subordinados do arguido A.
9.
  Durante o processo, Z2 ficou ferido por arma do arguido P por fenda da porta.
16.
  Na altura, o guarda prisional Z6 que se encontrava nos serviços no andar em apreço, face à situação, tentou impedir os actos dos arguidos, mas os arguidos não fizeram caso dele e continuaram a agredir os três ofendidos supracitados e Z”.
  *
Seguidamente, e quanto à “convicção do Tribunal” consignou que:
“A convicção do Tribunal Colectivo tem por base a análise e a comparação, de modo activo e pleno, das provas produzidas na audiência de julgamento, nomeadamente as declarações prestadas pelos arguidos J, K, L, M, N, P e Q, os depoimentos prestados pelas testemunhas Y (ofendido), Z6, Z, Z1, Z8 (investigador da PJ), G, Z9, U, V, Z10, Z11, Z12, Z13, Z14 e Z15, as declarações prestadas pelas testemunhas Z2 e Z4 perante o Ministério Público, declarações essas foram lidas na audiência de julgamento nos termos do art.º 337.º n.º 4 do Código de Processo Penal, bem como a apreciação das provas documentais e objectos apreendidos constantes dos autos na audiência. Importa salientar que na audiência os arguidos I e S mantiveram-se em silêncio.
Além disso, A testemunha Y, ora ofendido do presente caso, indicou expressamente na audiência que os arguidos A, B e C são agentes principais que o agrediram e os arguido D, E e L se encontraram na posse de arma. Ademais, analisadas as alegações prestadas na audiência por vários arguidos e testemunhas, nomeadamente os depoimentos das testemunhas Z, Z1, Z15, Z4 e M, podem julgar que a agressão na altura era chefiada pelo primeiro arguido A, enquanto os arguidos B, C, D, E, F, L e T, entre outros, realizaram respectivamente as agressões de grau distinto contra os ofendidos do presente caso”; (cfr., fls. 5174 a 5178).

Do direito

3. Vem o Ministério Público recorrer do Acórdão pelo Colectivo do T.J.B. proferido em 09.05.2014, (na sequência do reenvio determinado pelo veredicto deste T.S.I. de 16.05.2013).

E, antes de entrar na apreciação das questões pelo Exmo. Recorrente colocadas, cabe esclarecer o seguinte.

3.1. Da lei (processual) aplicável aos autos.

Em 01.01.2014 entrou em vigor a Lei n.° 9/2013 que introduziu alterações ao C.P.P.M. aprovado pelo D.L. n.° 48/96/M de 02.09.1996.

Nos termos do art. 6° da dita Lei n.° 9/2013:

“1. As alterações ao Código de Processo Penal introduzidas pela presente lei são aplicáveis aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor.
  2. Exceptuam-se do disposto no número anterior:
 1) Os processos em que tenha já sido designada data para a audiência em primeira instância;
 2) Os processos que se encontram em fase de recurso, se houver já despacho preliminar do relator nos termos do artigo 407.º do Código de Processo Penal.
  3. Independentemente da fase em que se encontre, são aplicáveis a todos os processos pendentes a alteração aos n.os 7 e 8 do artigo 100.º do Código de Processo Penal e as disposições legais que passam a estabelecer prazos mais alargados para a prática de actos processuais”.
  
  Ora, no caso, e mesmo que se tenha em conta a (2ª) audiência ocorrida no T.J.B. após o reenvio dos autos para novo julgamento determinado pelo Ac. deste T.S.I. de 16.05.2013, há que ter presente que a mesma foi designada por despacho de 02.09.2013; (cfr., fls. 4607).
  
  Constata-se assim que aos presentes autos aplica-se o C.P.P.M. na sua versão original, (com excepção dos “prazos” a que se refere a al. 3, n.° 2 do transcrito art. 6° e que, a seguir, se irá fazer referência).
  
Esclarecido este aspecto, continuemos.

3.2. Da (questão prévia) da tempestividade do recurso.

Pelos (14° e 19°) arguidos N e S foi suscitada a supra identificada questão.

Em sede de exame preliminar, pelo ora relato r foi decidido julgar a mesma improcedente, consignando-se que o recurso era tempestivo, “pois que interposto no prazo – (agora) previsto no art. 401°, n.° 1 do C.P.P.M. – de 20 dias, (precisamente, no vigésimo dia), sendo aqui aplicável o n.° 3 do art. 6 da Lei n.° 9/2013 que introduziu alterações ao C.P.P.M.”; (cfr., fls. 5524).

Sendo que os identificados arguidos insistem com a mesma “questão prévia”, pedindo uma nova apreciação da mesma pela conferência, (cfr., fls. 5534 a 5535), cabe apenas dizer, (até porque nada de novo dizem os arguidos em questão), que se confirma, na íntegra, o que sobre a dita questão se decidiu, pois que o prazo para o recurso em causa é – efectivamente – de 20 dias, o Acórdão recorrido foi lido na sessão de 09.05.2014, (cfr., fls. 5181; aí se iniciando a contagem do mencionado prazo de 20 dias), e o recurso do Ministério Público interposto em 29.05.2014, (cfr., fls. 5230), exactamente, no vigésimo dia.

*

–– Não obstante o que se deixou consignado sobre a “questão prévia” pelos (14° e 19°) arguidos N e S suscitada, importa aqui resolver outra questão também relacionada com a “tempestividade do recurso” pelo Ministério Público trazido a este T.S.I..

Vejamos.

Como se deixou relatado, dos 17 arguidos que responderam no (novo) julgamento efectuado pelo T.J.B. e que culminou com a prolação do Acórdão de 09.05.2014, 8 foram condenados, (os 1°, 2°, 3°, 4°, 5°, 6°, 12° e 20° arguidos, A, B, C, D, E, F, L e T), e os restantes nove, absolvidos, (os 9°, 10°, 11°, 13°, 14°, 16°, 17°, 18° e 19° arguidos, I, J, K, M, N, P, Q, R e S).

Verifica-se dos autos que de entre os 8 arguidos condenados, os arguidos (1°) A, (2°) B, (3°) C, (4°) D, (5°) E, (6°) F e (20°) T, foram julgados à sua “revelia”, nos termos do art. 315° do C.P.P.M..

E, (dado que em relação aos mesmos a decisão ora recorrida foi “condenatória”), impõe-se considerar que “prematuro” é o recurso pelo Ministério Público interposto.

De facto, e como já teve este T.S.I. oportunidade de considerar:
“Se é certo que pode haver recurso (do Ministério Público ou assistente) de uma “decisão absolutória” de um arguido “julgado à revelia” – cfr., v.g., o Ac. deste T.S.I. de 10.12.2009, Proc. n.° 274/2009 – o mesmo já não sucede quando a decisão é “condenatória” – cfr., v.g., o Ac. de 19.05.2011, Proc. n.° 199/2011.
Com efeito, neste caso, o arguido julgado à revelia, (e condenado), ainda pode recorrer, (o que não sucede com o arguido absolvido, já que ao mesmo não assiste “interesse em agir”), devendo-se, assim, aguardar que seja devidamente notificado para, (só) depois de tal notificação, apreciar-se o recurso contra ele interposto, (independentemente de ter interposto recurso)”; (cfr., v.g., o Ac. deste T.S.I. de 25.10.2012, Proc. n.° 653/2011, do ora relator).

Dest’arte, e como se deixou dito, constatando-se que os atrás identificados (1°, 2°, 3°, 4°, 5°, 6° e 20°) arguidos foram julgados à “revelia”, que ainda não foram pessoalmente notificados da “decisão condenatória” contra eles proferida, e observado que foi o contraditório sobre a questão, visto está que há que decidir em conformidade, isto é, pelo não conhecimento do presente recurso quanto aos mesmos.

Avancemos.

3.3. Do recurso.

Clarificadas que assim nos parecem ter ficado as questões da “lei processual aplicável”, da “tempestividade do recurso”, (e, desta forma, do seu “âmbito subjectivo”), é tempo de se conhecer do seu mérito.

A tanto se passa.

Vejamos.

É sabido que as “conclusões da motivação de recurso” identificam o “objecto do recurso” e as “questões” a tratar e decidir pelo Tribunal para o qual o mesmo é dirigido; (cfr., v.g., o recente Ac. de 25.10.2012, Proc. n.° 653/2011).

Nesta conformidade, como de uma leitura às conclusões pelo Exmo. Recorrente produzidas a final da sua motivação de recurso se constata, (e como logo na “conclusão 1ª” se afirma), é o mesmo de opinião que “o acórdão recorrido enferma dos vícios de contradição insanável da fundamentação previsto no art.º 400.º n.º 2 al. b) do Código de Processo Penal, de violação de lei por falta dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, nos termos do art.º 400.º n.º 1 do Código de Processo Penal, conjugado com o art.º 355.º do mesmo Código, de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos do art.º 400.º n.º 2 al. a) do Código de Processo Penal e do vício de erro notório na apreciação da prova, nos termos do art.º 400.º n.º 2 al. c) do Código de Processo Penal”; (cfr., fls. 16 do presente aresto).

Sendo que o assim afirmado corresponde com o alegado na motivação de recurso e restantes conclusões, adequado é considerar-se que vem – efectivamente – colocadas as questões seguintes:

- “contradição insanável da fundamentação”; (por “incompatibilidade entre os factos provados e provas e fundamentação do Acórdão”, e, tanto quanto conseguimos entender, dado que se considera que os factos dados como provados deveriam dar lugar à condenação de todos os – 17 – arguidos como co-autores de 2 crimes de “homicídio” e 1 outro de “ofensa grave à integridade física”, p. e p. pelos art°s 128° e 138°, n.° 1, al. d) do C.P.M.; cfr., pontos II, 1 a 10 da motivação de recurso e concl. 2ª a 4ª),

- “falta de fundamentação”; (por “falta dos motivos de facto e de direito para a decisão de absolvição e não condenação pelos crimes pelos quais estavam todos os arguidos acusados”; cfr., pontos 11 a 13 da motivação de recurso e concl. 5ª a 6ª),

- “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”; (por se considerar que “o Tribunal a quo não apurou o elemento subjectivo dos 8 arguidos relativamente ao crime de ofensa grave à integridade física e a negligência destes face ao resultado agravado da norma”; (cfr., pontos 14 a 17 da motivação de recurso e concl. 7ª a 10ª), e,

- “erro notório na apreciação da prova”, (no que toca à “decisão de absolvição” dos 9°, 10°, 11°, 13°, 14°, 16°, 17°, 18° e 19°, arguidos, cfr., pontos 18 a 27 da motivação de recurso e concl. 11ª a 18ª), constatando-se, igualmente, que a final do recurso se acaba por peticionar:

“A condenação dos dezassete arguidos pela prática de dois crimes de homicídio p.p. pelo art.º 128.º do Código Penal e um crime de grave ofensa à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal, concretamente, condenar o arguido A pela prática de dois crimes de homicídio, na pena de 13 anos de prisão por cada, e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 9 meses de prisão, em cúmulo jurídico, na pena única de 15 anos e 6 meses de prisão; e condenar os outros dezasseis arguidos pela prática de dois crimes de homicídio, na pena de 12 anos de prisão por cada, e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, em cúmulo jurídico, na pena única de 13 anos de prisão”; (cfr., concl. 19ª).

Identificadas que assim ficam as “questões a tratar”, seria então de se passar a proceder à sua apreciação.

Porém, cabe aqui fazer uma (outra) observação (prévia).

É a seguinte:

Em sede de exame preliminar, e atento o atrás transcrito “pedido” pelo Exmo. Recorrente deduzido, proferiu o ora relator despacho com o seguinte teor:

“No seu recurso, e entre o demais, pede o Ministério Público que se profira decisão condenatória de todos os arguidos como co-autores da prática de 2 crimes de “homicídio” p. e p. pelo art. 128° do C.P.M., (nas penas de …); (cfr., fls. 5230 a 5237).
E ainda que tenha sido este o sentido da acusação pública deduzida assim como do despacho de pronúncia então prolatado, constata-se que o anterior (1°) Acórdão do T.J.B., datado de 04.06.2010, adoptou solução diversa, condenando os arguidos não como co-autores de 2 crimes de “homicídio”, mas sim, de 2 crimes de “ofensas graves”, p. e p. pelo art. 138°, al. d) e 139°, al. b) do C.P.M.; (cfr., fls. 3198 a 3208-v).
Dest’arte, certo sendo que deste (1°) Acórdão (de 04.06.2010) não recorreu o Ministério Público, admitindo-se que, (por isso), se possa vir a entender que inviável é (agora) a mencionada pretensão de condenação dos arguidos como co-autores de 2 crimes de “homicídio”, e no intuito de se assegurar um contraditório pleno sobre a “questão”, proceda-se à notificação de todos os intervenientes processuais para, querendo, sobre a mesma dizerem o que entenderem conveniente no prazo de 10 dias”; (cfr., fls. 5524 a 5524-v).

Observado que assim (também) foi o princípio do contraditório sobre a identificada “questão”, (notando-se que o Exmo. Representante do Ministério Público neste T.S.I. pugnou pelo conhecimento das questões colocadas no recurso interposto, defendendo a sua total procedência; cfr., fls. 5532), afigura-se-nos adequado começar por da mesma decidir.

Vejamos.

Pois bem, tanto quanto julgamos saber, sobre a referida “questão” incidem duas posições, (crendo nós que a matéria ainda não foi tratada pelos Tribunais locais).

Uma – também sugerida pelo Ilustre Procurador Adjunto –no sentido de considerar que “uma decisão anulada é como uma decisão que não existe ou que nunca existiu”.

Aliás, sobre o “ponto em questão”, considera-se mesmo que “havendo anulação, nada subsiste do anulado que se possa projectar no futuro, limitando ou condicionando”; (neste sentido, cfr., v.g., o Ac. do S.T.J. de 09.04.2003, P. 02P4628, in www.dgsi.pt, aqui citado como mera referência).

A outra, de sentido – totalmente – oposto, pugnando pela “inadmissibilidade de uma agravação da condenação do arguido em novo julgamento ocorrido em consequência de recurso por este (ou no seu exclusivo interesse) interposto”.

Mostra-se-nos de sufragar a segunda das enunciadas posições; (que, da pesquisa que nos foi possível efectuar, é, de longe, a maioritária: cfr., v.g., para além do voto de vencido no supra citado Ac. do S.T.J. de 09.04.2003, os Acs. deste mesmo Alto Tribunal de 24.04.2003, P. 03P.2616; de 27.11.2003, P. 03P3393; de 17.02.2005, P. 04P4324; de 05.07.2007, in C.J., Acs. do S.T.J., n.° 200, Ano XV, T. II, pág. 239; de 14.09.2011, P. 138/08 e de 24.10.2012, P. 1584/09; do T. Constitucional português de 30.03.2007, Proc. n.° 236/07, assim como, Jorge Dias Duarte, in “Proibição de reformatio in pejus. Consequências processuais”; Mara Lopes in “O princípio da proibição da reformatio in pejus como limite aos poderes cognitivos e decisórios do Tribunal”, Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Figueiredo Dias, Vol. III, pág. 948 e segs.; José M. Damião da Cunha in “O caso julgado parcial…”; P. Albuquerque in “Comentário do Cód. Proc. Penal”, pág. 1076 e L. Henriques in “Anot. e Comentário ao C.P.P.M., Vol. III, pág. 211 e 212).

Com efeito, (e de entre a extensa e variada fundamentação que se pode encontrar nos citados arestos e estudos, e que aqui nos dispensamos de reproduzir), cabe-nos, essencialmente, realçar que estando o processo penal (profundamente) inspirado pelo “princípio do acusatório”, e sendo – nem podendo deixar de ser – um processo que se quer “justo” e “equitativo”, (fair trial), em que vigoram (também) os “princípios da boa fé”, da “lealdade processual”, e da “proibição da reformatio in pejus”, tal não poderá deixar de implicar que, nos casos em que a acusação se conforme com a decisão e o recurso é apenas interposto pelo arguido (ou no seu exclusivo interesse), fiquem limitados os parâmetros da decisão, condicionando, no processo, o poder de decisão à não alteração em seu desfavor.

E, nesta conformidade, razoável parece de considerar que o (referido) “recurso” estabelece assim, (inevitavelmente), um “limite à actividade jurisdicional”, constituído pelos “termos e pela medida da condenação do arguido” (único) recorrente, o que não deixa de suceder, mesmo se no recurso se tenha pedido a anulação do julgamento ou o reenvio para outro tribunal, sendo que solução diversa, (contrária), se traduziria em atribuir, ao tribunal do novo julgamento (ou para o qual se decidiu reenviar o processo para novo julgamento), poderes que não estavam cometidos ao (próprio) tribunal de recurso.

De facto, se em conformidade com o “princípio da proibição da reformatio in pejus”, (cfr., art. 399° do C.P.P.M.), e portanto, em recurso interposto pelo arguido ou no seu interesse, impedido está o Tribunal ad quem de agravar a sua situação, como pretender que o Tribunal do novo julgamento ou do reenvio o venha a fazer?

Dir-se-á, quiçá, (na linha da argumentação em sentido contrário atrás já referida), que tendo-se (até) anulado o (próprio) julgamento efectuado, tudo se passa como se “nada existisse” e se “começasse tudo de novo”.


Ora, é certamente um entendimento (que obviamente se respeita), embora, em nossa (modesta) opinião, não se mostra de subscrever, (até porque, a se entender que nada existisse, e tudo começasse de novo, inexplicável se tornaria a não submissão ao 2° julgamento no T.J.B. dos arguidos que foram absolvidos com o 1° Acórdão de 04.06.2010).

É verdade que o “princípio da proibição da reformatio in pejus” (consagrado no art. 399° do C.P.P.M.) está inserido no Livro (IX) – especialmente dedicado à matéria – dos “Recursos” e que surgiu como “reacção” a um (certo) entendimento que permitia ao Tribunal de recurso agravar a pena do arguido em recurso por este interposto; (sobre a origem e evolução deste instituto, vd. v.g., o Parecer ínsito no B.M.J. n.° 180, 1968, pág. 103 e segs., no qual se discutem as várias posições doutrinárias sobre o seu fundamento jurídico, e o Ac. do S.T.J. de 05.05.1950 que fixando jurisprudência sobre a matéria acabou com a divergência então existente, originando a sua consagração no então C.P.P. de 1929 através da alteração introduzida pela Lei n.° 2139 de 05.03.1969 à redacção do seu art. 667°).

Daí que se mostre de reconhecer como defensável uma sua “aplicação restrita”, no sentido de o mesmo apenas vincular o Tribunal ad quem, (de “recurso”), e já não o Tribunal do novo julgamento (ou de reenvio), que deve estar “livre” para proceder a uma “nova apreciação do processo” (no seu todo) e para, em resultado desta, decidir (apenas) em conformidade com o que lhe ditar a Lei.

Porém, e como já se deixou adiantado, não se nos mostra ser esta a solução mais adequada.

É que o mencionado “princípio do acusatório”, base estrutural de todo processo penal, faz depender as decisões jurisdicionais do impulso do Ministério Público. E, como sabido é, não havendo recurso do Ministério Público da decisão condenatória, mas apenas do arguido (ou do Ministério Público exclusivamente em benefício do arguido), o Tribunal Superior tem como limite aos seus poderes de cognição a própria decisão recorrida, que não pode “agravar”, precisamente, por falta o pressuposto essencial exigido pelo processo acusatório: o “impulso do Ministério Público”.

Fixados assim os limites de cognição do Tribunal Superior, circunscritos ficam, igualmente, e na mesma medida, os poderes do tribunal do novo julgamento ou de reenvio, quando estes forem decretados pelo tribunal de recurso.

Esta, em nossa opinião, a única solução que respeita o “princípio do acusatório”, e, simultaneamente, previne a incongruência de atribuir poderes de cognição mais vastos ao tribunal do novo julgamento ou do reenvio do que ao tribunal de recurso.

Como (expressivamente) considera Damião da Cunha – in ob. cit. – “«o instituto da proibição da reformatio in pejus mais que um princípio geral das impugnações será um princípio do processo» (p. 229), que «vale, não por si mesmo, mas como tradução (ou mera consequência) de uma ideia de “equidade” ou de “justiça” do caso concreto» (p. 436), e, por isso, «um princípio da função jurisdicional, enquanto garantia do direito de defesa, que vale para qualquer Direito e processo sancionatório público» (p. 437)”.

De facto, como no também atrás já citado Ac. do S.T.J. de 24.10.2012 se consignou, e adequado se mostra de considerar: “a proibição da reformatio in pejus, tem um duplo fundamento: como garantia de defesa; como decorrência do princípio acusatório.
Como garantia de defesa, destina-se a prevenir o risco de o arguido ser surpreendido com o agravamento da condenação pelo tribunal superior em recurso interposto por ele, e só por ele (reformatio direta); ou o risco de ver a sua posição agravada, após anulação do primeiro julgamento, decretada em recurso apenas da sua iniciativa, no novo julgamento (reformatio indireta).
Se não interviesse, em qualquer dos casos, a garantia da proibição da reformatio in pejus, o arguido ficaria limitado no seu direito de impugnação de uma decisão que considerasse injusta, pois, sabendo que correria o risco de ver a sua posição agravada, se requeresse a anulação do julgamento ou suscitasse alguma questão que pudesse determinar essa anulação, ficaria naturalmente receoso de recorrer. Ou seja, a inexistência da garantia da proibição da reformatio in pejus afetaria incontestavelmente o direito de impugnação, o que é insustentável, por violar frontalmente as garantias de defesa”.

Dito isto, e sendo-nos pois de concluir que anulada uma decisão em recurso do arguido, (ou no seu exclusivo interesse), não pode o mesmo ver agravada a sua situação na subsequente decisão a proferir (em novo julgamento), voltemos à situação dos autos.

E, então, cabe (re)ponderar no “pedido” deduzido pelo Exmo. recorrente, no sentido da:

“Condenação dos dezassete arguidos pela prática de dois crimes de homicídio p.p. pelo art.º 128.º do Código Penal e um crime de grave

ofensa à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal, concretamente, condenar o arguido A pela prática de dois crimes de homicídio, na pena de 13 anos de prisão por cada, e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 9 meses de prisão, em cúmulo jurídico, na pena única de 15 anos e 6 meses de prisão; e condenar os outros dezasseis arguidos pela prática de dois crimes de homicídio, na pena de 12 anos de prisão por cada, e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, em cúmulo jurídico, na pena única de 13 anos de prisão”.

Quid iuris?

Ora, começando pelas (peticionadas) “penas”, (e, obviamente, não se incluindo aqui os 1° a 6° e 20° arguidos em resultado do que atrás se decidiu e que, por isso, não cabe emitir pronúncia) evidente se nos mostra que inviável é a pretensão apresentada no que toca às pretendidas penas de “13 e 12 anos de prisão”, reclamadas para os crimes de “homicídio”, assim como para as “penas únicas” resultantes do cúmulo jurídico.

Com efeito, com o (1°) Acórdão do T.J.B. de 04.06.2010 decidiu-se da forma seguinte:


Arguido
Crime (C.P.M.)
Pena (prisão)
Cúmulo jurídico

A


1 crime – art. 138°, al. d) (ofensa grave)
2 crimes – art. 138°, al. d) e 139°, al. b) (ofensa grave – agravada pelo resultado)
- 4 anos e 9 meses
- 7 anos e 9 meses (cada)
10 anos e 6 meses
 2°
B
Idem.
- 4 anos e 9 meses
- 7 anos e 9 meses (cada)
10 anos e 6 meses

C

Idem.
- 4 anos e 6 meses
- 7 anos e 6 meses (cada)
10 anos

D

Idem.
- 4 anos e 9 meses
- 7 anos e 9 meses (cada)
10 anos e 6 meses

E
.Idem.
- 4 anos e 9 meses
- 7 anos e 9 meses (cada)
10 anos e 6 meses

F


Idem.
- 4 anos e 9 meses
- 7 anos e 9 meses (cada)
10 anos e 6 meses

G

Absolvido



H
Absolvido



I

Idem.
- 4 anos e 6 meses
- 7 anos e 6 meses (cada)
10 anos
10°
J


Idem.
- 4 anos e 6 meses
- 7 anos e 6 meses (cada)
10 anos
11°
K

Idem.
- 4 anos e 6 meses
- 7 anos e 6 meses (cada)
10 anos
12°
L

Idem.
- 4 anos e 9 meses
- 7 anos e 9 meses (cada)
13 anos (cumulando-se também a pena de 1 ano e 6 meses + $5,000, ou em 33 dias de prisão subsidiária, aplicada no Proc. n.° CR4-08-0285-PCS, e a de 4 anos, aplicada no Proc. n.° CR2-09-0259-PCC).
13°
M


Idem.
- 4 anos e 6 meses
- 7 anos e 6 meses (cada)
10 anos
14°
N

Idem.
- 4 anos e 6 meses
- 7 anos e 6 meses (cada)
10 anos
15°
O
Absolvido


16°
P

Idem.
- 5 anos
- 8 anos (cada)

18 anos (cumulando-se também a pena de 10 anos e 9 meses + $12,000, ou em 60 dias de prisão subsidiária, aplicada no Proc. n.° CR2-04-0183-PCC).
17°
Q


Idem.
- 5 anos
- 8 anos (cada)
18 anos (cumulando-se também 3 penas de 7 anos e 6 meses cada, aplicada no Proc. n.° CR1-03-0074-PCC).
18°
R

Idem.
- 4 anos e 9 meses
- 7 anos e 9 meses (cada)
10 anos e 6 meses
19°
S

Idem.
- 4 anos e 6 meses
- 7 anos e 6 meses (cada)
10 anos
20°
T


Idem.
- 4 anos e 6 meses
- 7 anos e 6 meses (cada)
10 anos
21°
U
Absolvido


22°
V
Absolvido



Sendo as referidas “penas” pelo Exmo. Recorrente peticionadas “superiores” ao que no dito Acórdão do T.J.B. foram decretadas, e sendo nós de opinião que não se pode “agravar” a situação dos arguidos, visto está que não se pode acolher a pretensão apresentada.

–– Aqui chegados, cabe agora decidir da pretendida (alteração da) “qualificação jurídico-penal” (para a sua condenação pelos crimes de “homicídio”).

Cremos que também aqui não pode o Exmo. Recorrente pretender a requerida “qualificação”.

Vejamos.

Com o Acórdão do T.J.B. de 04.06.2010, (seja-nos permitida a expressão), “caiu” a acusação pela prática de 2 crimes de “homicídio”.

E não tendo o Ministério Público interposto recurso – nem sequer “subordinado” – deste Acórdão de 04.06.2010, tendo até, em Resposta aos recursos pelos arguidos então interpostos pugnado pela sua “improcedência, com a consequente (integral) confirmação do decidido”, (cfr., fls., 3517 a 3537-v, e, no Parecer que então juntou aos autos, sugerido até a “rejeição dos recursos”, cfr., fls. 3759 a 3765), poderá, agora, (após reenvio, novo julgamento e novo Acórdão), voltar a pedir a condenação pelos crimes de “homicídio”, como pedia na sua (inicial) acusação?

Não será que tal “postura processual” colide com o “princípio da boa fé”, constituindo também um “venire contra facto próprio”?

Cremos pois que inviável é a pretendida re-qualificação jurídico-penal.

Com efeito, a partir do momento em que não recorreu do Ac. de 04.06.2010, (formulando tal pedido, tendo, até, como se viu, pugnado pela sua – integral – confirmação), deixou de o poder fazer dado que o “objecto do processo” passou a ser “outro”, delimitado pelo referido Acórdão, não lhe sendo legítimo pretender a sua alteração em sede do recurso que agora trás a este T.S.I..

Como é sabido – já que o direito não é ciência exacta nem matemática – outra opinião (que obviamente se respeita) pode certamente haver.

Porém, (não nos tendo sido adiantada quando para tal foi dada a oportunidade, cfr., despacho preliminar), ocorre-nos, ponderar no preceituado no art. 391° do C.P.P.M., onde no seu n.° 1, al. a) se preceitua que “têm legitimidade para recorrer”: “o Ministério Público, de quaisquer decisões, ainda que no exclusivo interesse do arguido”.

E, da reflexão que sobre o assim consagrado nos foi possível encetar, afigura-se-nos de aqui trazer à colacção outra questão, que consiste em saber se “pode o Ministério Público recorrer de decisão em relação à qual antes “concordou” (e, como no caso sucedeu, pugnou pela sua manutenção)”?

Também aqui se nos mostra de considerar que de sentido negativo terá de ser a resposta.

Dir-se-á – quiçá – que sendo o Ministério Público um “fiscal da legalidade” e “auxiliar da justiça”, outra deveria ser a solução, podendo recorrer sempre em defesa da legalidade, (e daí até poder recorrer no “exclusivo interesse do arguido”).

Com efeito, como pugnar por uma boa aplicação do direito e por uma boa administração da justiça se impedido estiver de agir em conformidade com o que em seu entender lhe ditar o Direito?

Pois bem, eis o que se nos oferece dizer.

Também aqui, (e tanto quanto julgamos saber, dado inexistir referências locais sobre a questão), mostra-se de considerar que adequada é a solução que atrás já se deixou adiantada, socorrendo-nos (essencialmente), dos preciosos ensinamentos do Prof. Figueiredo Dias.

Com efeito, em estudo deste Ilustre Mestre, (“Do princípio da «objectividade» ao princípio da «legalidade» do comportamento do Ministério Público no processo penal”, publicado na R.L.J., Ano 128, n.° 3860, pág. 344 e segs.), e comentando um Ac. (de Uniformização de Jurisprudência) do S.T.J. de 27.10.1994, P. 046444, em que se considerou essencialmente que “… atentas a origem, natureza e estrutura, bem como o enquadramento constitucional e legal do Ministério Público, tem este legitimidade e interesse em recorrer de quaisquer decisões mesmo que lhe sejam favoráveis e assim concordantes com a posição anteriormente assumida no processo”, (in D.R. 289/94 1ª S.A., de 16.12.1994), afirmou, de forma expressa e clara, que em relação à questão de saber se “o Ministério Público tem interesse em agir que lhe permita, modificando a posição jurídica anteriormente assumida, recorrer na parte da decisão judicial concordante” se deve responder com “uma negativa rotunda e terminante”, considerando – (vale a pena aqui recordar, pelo menos, algumas passagens), após referência da exigência do “fair trial”, de “um procedimento leal”, como “o mais alto princípio de todo o processo penal”, e entre o demais, nomeadamente, de o Ministério Público dever ser “un et indivisible” – que a dita “conclusão” decorre linearmente da concorrência de duas ordens de considerações: “relativas, em primeiro lugar, ao estatuto do ministério público como sujeito do processo penal; e, em segundo lugar, ao sentido material-teleológico e ao alcance normativo da figura do interesse em agir no processo penal.
No que ao primeiro dos problemas enunciados respeita, pode hoje considerar-se definitivamente adquirido e pacífico (…) o entendimento segundo o qual o ministério público intervém no processo penal com um órgão de administração de justiça, cuja acção deve subordinar-se a estritos critérios de legalidade e objectividade”.

Sublinhando assim, o posicionamento do Ministério Público no Processo Penal – sobre a matéria pode-se ver também um outro estudo do mesmo Professor, sob o título “O dever de obediência hierárquica e a posição do Ministério Público no Processo Penal”, in R.L.J. n.° 106, Ano de 1973/74, pág. 171 e segs.; assim como Cunha Rodrigues, “A posição institucional e as atribuições do Ministério Público e das polícias de investigação criminal”, in B.M.J. n.° 337, pág. 15 e segs. – e acentuando que o Processo Penal não é um “processo de partes”, considera também, em relação à” legitimidade e interesse em agir para recorrer”, que consensual e pacífico é que “só pode recorrer quem, pressuposta a sua legitimidade, tenha sofrido com a decisão a impugnar uma Beschwer, expressão esta que, com maior ou menor proximidade, poderá traduzir-se por «gravame», «ofensa», «perda», «afronta», «prejuízo», «desvantagem»: ohne Beschwer kein Anfechtungsbedürfnis – eis uma máxima incontestada de toda a doutrina processual atinente a qualquer forma de recurso ou reclamação, em suma, a qualquer forma de tutela judicial. Resumidamente, só pode recorrer ou reclamar aquele para quem a decisão representa um gravame ou uma perda, ao qual inflija uma desvantagem ou mal, frustre objectivamente uma expectativa ou um interesse legítimos”, daí, concluindo depois pela já referida “negação do interesse em agir do ministério público, sempre que uma decisão judicial se revele por inteiro convergente com a posição jurídica por aquele assumida no processo”.

Com efeito, e ainda nas palavras do Ilustre Professor: “se o ministério público assume expressamente, em qualquer momento processual, uma posição de direito donde deriva a inculpabilidade do arguido ou a sua menor culpabilidade, não pode em momento posterior modificar essa sua posição, alegando melhor juízo, em desfavor, ainda que só eventual, da posição do arguido”.

Ora, mostrando-se-nos de subscrever o que se deixou exposto, cabe aqui notar que tal douto entendimento veio posteriormente a ser adoptado em (novo) Ac. do S.T.J. de 16.12.2010, (in D.R. n.° 19, 1ª Série de 17.01.2011), onde se fixou jurisprudência no sentido de que “…o Ministério Público não tem interesse em agir para recorrer de decisões concordantes com a sua posição anteriormente assumida no processo”; (ainda sobre a questão, vd., o Ac. do T. Constitucional português n.° 291/02, de 03.07.2002, Proc. n.° 388/02).

Note-se, ainda, que entendimento diverso poderia constituir uma violação ao “princípio da igualdade”, já que ao assistente ou arguido não seria admitido recorrer de decisões concordantes ou favoráveis às suas posições assumidas ou pretensões apresentadas no processo.

Aqui chegados, e afigurando-se-nos que claras ficaram as razões da solução que se nos mostra de adoptar, que dizer?

Pois bem, tendo em conta o “pedido” (nos seus exactos termos) formulados no presente recurso, (e que atrás se deixou transcrito), e não se podendo acolher o mesmo quanto ao “agravamento das penas” nem tão pouco quanto à “alteração da qualificação jurídico-penal” nos termos pretendidos, o que resta para decidir?

Poder-se-ia aqui encarar uma solução de “inexistência total de pedido”?

Pois bem, também não cremos que seja a situação.

Com efeito, se não pode este Tribunal “agravar” a situação dos arguidos, há que ter em conta que na sua motivação de recurso vem também pelo Exmo. Recorrente colocadas questões quanto à “justeza da condenação” pelos 2 crimes de “ofensa grave à integridade física (agravada pelo resultado)” assim como quanto à “absolvição” dos nove arguidos (9°) I, (10°) J, (11°) K, (13°) M, (14°) N, (16°) P, (17°) Q, (18°) R e (19°) S, nesta parte nos parecendo que se impõe apreciar e decidir.

–– E, assim, vejamos, começando-se pela mencionada “decisão de absolvição”.

Aqui, e se bem ajuizamos, colocam-se 3 questões.

São pois, e na ordem em que vem suscitadas, a da alegada “contradição insanável da fundamentação”, “falta de fundamentação” e “erro notório na apreciação da prova”.

Sabido que é que o Tribunal de recurso não está vinculado a apreciar as questões na mesma ordem em que pelo recorrente vem colocadas, comecemos pois, como parece lógico, pela imputada “falta de fundamentação”, (já que sem se saber das “razões da decisão”, como verificar da existência daqueles vícios?).

Sobre a dita “falta”, (e recordando-se que em causa está a redacção do art. 355° do C.P.P.M. na sua versão original, pois que a alteração ao mesmo introduzida com a Lei n.° 9/2013 – como já se consignou – não é aplicável aos presentes autos), importa ter presente que, como se tem vindo a entender, “em matéria de fundamentação não é de adoptar posições maximalistas”; (cfr., v.g., o Ac. de 23.01.2014, Proc. n.° 15/2014).

Tendo em conta tal entendimento, e percorrendo-se o Acórdão recorrido, cremos que se consegue alcançar os motivos da proferida “decisão de absolvição”.

Na verdade, da “matéria de facto dada como provada”, nada consta em relação aos referidos 9 arguidos, sendo, assim, “inevitável”, a decisão proferida (da sua absolvição).

Claro está que no Acórdão recorrido se podia adiantar de forma mais desenvolvida o “porque” do assim decidido. Porém, se nada se provou em relação aos aludidos 9 arguidos, a única solução possível era pois a da sua correspondente absolvição.

E, nesta conformidade, (cabendo aqui notar que, certamente por desatenção, também o Tribunal a quo tinha em mente que os crimes a apreciar eram os 2 de “homicídio”, e 1 de “ofensa grave à integridade física”; vd., v.g., o 1°§ do Acórdão e a própria transcrição no seu texto do art. 128° do C.P.M., que prevê o crime de “homicídio”), sendo que no aresto recorrido se consignou, expressamente, que “apurados os factos, e uma vez que não se provou o envolvimento dos arguidos, (9°) I, (10°) J, (11°) K, (13°) M, (14°) N, (16°) P, (17°) Q, (18°) R e (19°) S, na prática dos 2 crimes de «homicídio» e 1 de «ofensa grave à integridade física», vão os mesmos absolvidos”, (assim fazendo constar também em sede do seu dispositivo), cremos que se tem de ter por fundamentada a “decisão de absolvição”; (é claro que a referência feita não diz respeito aos 2 crimes de “ofensa grave à integridade física agravada pelo resultado”, porém, se nada se provou, em relação a estes arguidos quanto ao seu “envolvimento nas agressões ocorridas”, na mesma, nenhuma decisão condenatória poderia ser proferida).

Quanto aos vícios de “contradição” e “erro”.

Pois bem, em relação aos mencionados “vícios”, repetidamente tem este T.S.I. considerado que:

“Só ocorre o vício de “contradição insanável” quando “se constata incompatibilidade, não ultrapassável, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação probatória e a decisão”; (cfr., v.g. no Acórdão deste T.S.I. de 24.10.2013, Proc. n° 645/2013, e mais recentemente, de 23.10.2014, Proc. n.° 531/2014).

Por sua vez, “o erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.”
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., Ac. de 12.05.2011, Proc. n° 165/2011, e mais recentemente de 23.10.2014, Proc. n.° 531/2014 do ora relator).

Como também já tivemos oportunidade de afirmar:
“Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova; (cfr., v.g., Ac. de 22.05.2014, Proc. n.° 284/2014 e de 03.07.2014, Proc. n.° 375/2014).

E, voltando à “decisão absolutória” agora em apreciação, cremos que também aqui censura não merece o decidido.

De facto, provado não estando o envolvimento dos 9 arguidos (absolvidos) nos actos (de agressão) que levaram ao trágico resultado explicitado nos autos, (a morte de W e X e as lesões no ofendido Y), e sem se querer repetir o que já se consignou, a única solução possível era a sua correspondente (e total) absolvição.

Não se vislumbra pois nenhuma “contradição”.

No que tange ao “erro notório”, vejamos.

Como fundamento desta maleita, invoca o Exmo. Recorrente uma série de “declarações” prestadas tanto em sede de Inquérito, (“declarações para memória futura”) como em audiência de julgamento; (cfr., concl. 12ª a 16ª).

Porém, motivos não havendo para se alterar o entendimento que temos tido sobre o sentido e alcance do vício de “erro notório na apreciação da prova”, também aqui se terá de negar provimento ao recurso.

Com efeito, sendo que em relação aos elementos probatórios pelo Exmo. Recorrente invocados vigora o “princípio da (sua) livre apreciação” consagrado no art. 114° do C.P.P.M., aos mesmos, (e independentemente do seu teor ou sentido), não estava o Colectivo a quo vinculado (a decidir em conformidade).

Por sua vez, não se pode olvidar que (só) em audiência estiveram um total de 17 arguidos, (vários, é certo, julgados à revelia), e como testemunhas depuseram cerca de 15 declarantes, (sem contar as declarações para memória futura antes prestadas e lidas em audiência), tudo, num total de “24 depoimentos”, não nos parecendo assim razoável alegar-se ter havido “erro notório” com base em “alguns” destes elementos de prova, (independentemente do seu número).

Como se consignou no Acórdão recorrido, o Colectivo formou a sua convicção com “base na análise e comparação, de modo activo e pleno das provas produzidas em audiência… bem como da apreciação das provas documentais e objectos apreendidos…”, e, nesta conformidade, não sendo de se olvidar também que há muito que ultrapassada está a regra do “unus testis, testis nullus”, pois que nada impede que o Tribunal forme a sua convicção com o depoimento de uma única testemunha, (que seja como for, não é o caso), e não nos parecendo igualmente que a “convicção” a que chegou quanto ao não envolvimento dos arguidos em questão na matéria dos autos viole qualquer “regra sobre o valor das provas tarifadas”, “regra de experiência” ou “legis artis”, (que o Exmo. Recorrente também não indica), mais não é preciso dizer sobre a questão.

Aqui chegados, e concluída que nos parece ter ficado a apreciação do recurso em relação ao “segmento decisório com o qual se absolveu os atrás identificados 9 arguidos”, continuemos, passando agora para a “decisão condenatória”.

–– Como atrás se deixou explicitado, dos 8 arguidos condenados com o Acórdão recorrido, 7 foram julgados à sua “revelia”, não se podendo conhecer do recurso em relação aos mesmos.

Nesta conformidade, e sendo que os arguidos (1°) A, (2°) B, (3°) C, (4°) D, (5°) E, (6°) F e (20°) T, foram os que responderam à sua revelia, impõe-se concluir que a nossa apreciação terá apenas como objecto o segmento da decisão condenatória em relação ao (12°) arguido L.

Verificando-se que as questões colocadas são também a da “falta de fundamentação” e dos “vícios da decisão da matéria de facto”, agora, com exclusão do “erro notório na apreciação da prova”, começa-se por aquela.

Pois bem, em relação à alegada “falta de fundamentação” diz (essencialmente) o Exmo. Recorrente que se “omitiram os motivos de facto e de direito para a não condenação pelos crimes da acusação”.

Sabendo-se já que inviável é a pretendida “agravação” da situação processual do(s) arguido(s), poderá ainda assim este T.S.I. aferir do assacado vício em relação à decisão proferida?

Cremos que sim.

Não se nega que a “pretensão” apresentada pelo Exmo. Recorrente tem essencialmente como motivação o seu inconformismo em relação à “não condenação do(s) arguido(s) como (co-)autor(es) de 2 crimes de homicídio”.

Porém, não deixa de ser uma “crítica” direccionada à fundamentação apresentada para a decisão proferida.

De facto, se se diz que a não condenação pelos crimes de “homicídio” não está fundamentada, é porque não se percebe a fundamentação exposta para a decisão proferida.

E, dest’arte, cremos que sobre a questão deve este T.S.I. emitir pronúncia, (até porque também não pode esta Instância dispensar uma apreciação da correcção da qualificação jurídico-penal operada).

Nesta conformidade, para uma melhor compreensão da questão, vale a pena aqui transcrever o segmento em causa da decisão recorrida.

Tem o teor seguinte, (situando-se na parte em que o Tribunal a quo procede ao enquadramento jurídico da factualidade provada, “Parte de Direito”, a seguir à referente à da “Convicção do Tribunal”, e que atrás já se deixou transcrita neste aresto):
“Parte do Direito:
Determina-se as leis aplicáveis tendo em conta os factos.
Nos termos do art.º 128.º do Código Penal: Quem matar outra pessoa é punido com pena de prisão de 10 a 20 anos.
E nos termos do art.º 138.º al. d) do mesmo Código, quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa de forma a provar-lhe perigo para a vida, é punido com pena de prisão de 2 a 10 anos.
E nos termos do art.º 139.º n.º 1 al. b) do Código Penal, quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa e vier a produzir-lhe a morte é punido com pena de prisão de 5 a 15 anos, no caso do artigo anterior.
Apurados os respectivos factos, em primeiro lugar, uma vez que não foi provado que os arguidos I, J, K, M, N, P, Q, R e S tinham praticado dois crime de homicídio p.p. pelo art.º 128.º do Código Penal e um crime de ofensa grave à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal, devendo o Tribunal condenar improcedentes os crimes.
Além disso, os arguidos A, B, C, D, E, F, L e T agiram de forma livre, consciente e dolosa, constituindo, em co-autoria material e na forma consumada, dois crimes de ofensa grave à integridade física ou à saúde que vier a produzir morte a outrem p.p. pelo art.º 139.º n.º 1 al. b), conjugando com o art.º 138.º al. d) do Código Penal e um crime de ofensa grave à integridade física p.p. pelo art.º 138.º al. d) do Código Penal e satisfazendo todos os requisitos imputáveis quer subjectivamente, quer objectivamente, dos tipos de crime determinados nas disposições jurídicas supracitadas.
Nos termos do art.º 65.º do Código Penal, na determinação concreta da medida da pena, devem considerar a culpa do agente e as exigências de prevenção criminal, o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste, a gravidade das suas consequências, o grau de violação dos deveres impostos ao agente, a intensidade do dolo, os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram, os motivos que o determinaram, as condições pessoais do agente e a sua situação económica, a conduta anterior ao facto e a posterior a este, bem como demais circunstâncias concretas apuradas, portanto, este Juízo Colectivo julga que o arguido – crê-se que seja o (1°) arguido A – deve ser condenado, pela prática de dois crimes de ofensa grave à integridade física ou à saúde que vier a produzir morte a outrem, na pena de 7 anos e 9 meses de prisão por cada e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 9 meses de prisão; os arguidos B, C, D, E, F, L e T devem ser condenado, pela prática de dois crimes de ofensa grave à integridade física ou à saúde que vier a produzir morte a outrem, na pena de 7 anos e 6 meses de prisão por cada crime respectivamente, e de um crime de ofensa grave à integridade física, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão respectivamente.
Em cúmulo jurídico, o arguido A deve ser condenado na pena única de 10 anos e 6 meses de prisão, enquanto os arguidos B, C, D, E, F, L e T devem ser condenados na pena única de 10 anos respectivamente. (vide art.º 71.º do Código Penal)
3. Decisão
(…)”.

Ora, perante o que se deixou exposto, cremos que (na parte em questão) padece efectivamente a decisão recorrida de manifesta “falta de fundamentação”.

Com efeito, e como já se referiu, na mente do Colectivo figurava a “acusação original” por 2 crimes de “homicídio” do art. 128° do C.P.M. e um outro de “ofensa grave à integridade física”, p. e p. pelo art. 138°, al. d) do mesmo Código; (vd., § 1° do Acórdão recorrido, os preceitos legais invocados na fundamentação e a decisão relativamente à absolvição dos 9 arguidos atrás tratada).

E, ainda que pelos motivos já expostos, (e em nossa opinião), certo é que não podia o Tribunal a quo condenar os arguidos pelos crimes de “homicídio”, claro parece ser que para além de nenhuma razão ter apresentado para não enquadrar a factualidade provada nos referidos crimes de “homicídio”, o mesmo sucede relativamente aos crimes de “ofensa grave à integridade física, (agravada pelo resultado morte)” do art. 138°, al. d) e 139°, al. b) do C.P.M., (sendo de se notar que a dita factualidade dada como assente, corresponde, na sua essência, e no que releva, ao texto da acusação deduzida).

Como já decidiu o Vdo T.U.I.: “a diferença fundamental entre os elementos constitutivos dos dois tipos criminais, o do artigo 128.º do Código Penal e o dos artigos 138.º, alínea d) e 139.º, n.º 1, alínea b) do Código Penal, reside em que no crime de homicídio o agente tem intenção de provocar a morte de outrem e obtém esse resultado, enquanto que no crime de ofensa grave à integridade física originando a morte, o agente tem intenção de agredir o corpo ou a saúde da vítima, sabendo que coloca em perigo a sua vida, mas não tem intenção de lhe provocar a morte; no entanto, a morte acaba por ocorrer por negligência do agente”; (cfr., Ac. de 06.12.2011, Proc. n.° 58/2011).

Nesta conformidade, face ao assim entendido e à ausência na decisão recorrida de qualquer “motivo” para a sua prolação, mostra-se de considerar que, o que na dita “fundamentação” se expôs, constitui, (sem prejuízo do respeito por outra opinião em sentido diverso), uma mera “afirmação conclusiva”, pois que a mesma não adianta, minimamente, e com relação à factualidade dada como provada, quais e como se deram por verificados os aí alegados “requisitos objectivos e subjectivos”, inviável sendo assim captar o percurso pelo Colectivo a quo efectuado para chegar à solução que chegou, ou seja, à decisão condenatória que proferiu.

Constatando-se assim a dita “falta de fundamentação”, e constituindo esta uma “nulidade” prevista nos art°s 355°, n.° 2 e art. 360°, al. a) do C.P.P.M., há que revogar a decisão recorrida para que, em sua reforma seja a mesma removida, prejudicada ficando a apreciação das restantes questões.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos que se deixaram expendidos, acordam:
- julgar improcedente a questão prévia da (in)tempestividade do recurso pelos (14° e 19°) arguidos N e S suscitada;
- não conhecer do recurso em relação aos (1°, 2°, 3°, 4°, 5°, 6° e 20°) arguidos A, B, C, D, E , F e T;
- não admitir o recurso no que toca ao pedido da condenação dos arguidos como co-autores da prática de 2 crimes de “homicídio”, p. e p. pelo art. 128° do C.P.M. com o consequente agravamento das suas penas por falta de interesse em agir;
- julgar improcedente o recurso quanto ao pedido de condenação dos (9°, 10°, 11°, 13°, 14°, 16°, 17°, 18° e 19°) arguidos I, J , K, M, N, P, Q , R e S, (que tinham sido absolvidos pelo Acórdão recorrido); e,
- julgar procedente o recurso no que toca à invocada “falta de fundamentação” da decisão condenatória proferida.

Custas pelos (14° e 19°) arguidos N e S pela improcedência da questão prévia suscitada com taxa de justiça individual que se fixa em 4 UCs, (nào se tributando o Recorrente dada a sua isenção).

Honorários aos Exmos. Defensores Oficiosos no montante de MOP$2.500,00.

Macau, aos 20 de Novembro de 2014
José Maria Dias Azedo
João A. G. Gil de Oliveira
Chan Kuong Seng (com declaração de voto)


















Declaração de voto ao Acórdão de 20 de Novembro de 2014 do
Tribunal de Segunda Instância no Processo n.º 494/2014
Após examinados os presentes autos n.º 494/2014, entendo que:
– o Ministério Público está efectivamente (como se decide no acórdão de recurso de hoje) em tempo para recorrer da nova decisão final da Primeira Instância, proferida na sequência do reenvio do processo ordenado no anterior acórdão deste Tribunal de Segunda Instância;
– e tem o Ministério Público interesse em agir para recorrer dessa nova decisão final, mesmo que não tenha interposto da anterior decisão final da Primeira Instância (que a propósito dos dois crimes de homicídio inclusivamente pronunciados pelo Juízo de Instrução Criminal e acusados pelo Ministério Público, tinha decidido em convolá-los, materialmente por falta de comprovação cabal da intenção de matar, para dois crimes de ofensa grave à integridade física agravados pelo resultado da morte das vítimas), visto que por força da determinação do reenvio do processo para novo julgamento (aquando da decisão concreta do vício de falta de notificação de defensor para estar presente na diligência de tomada de declarações de testemunha para memória futura como tal alegado no recurso então interposto pelos 14.º e 19.º arguidos) (decisão de reenvio essa que não pôde violar o princípio da proibição da reforma para pior consagrado no art.º 399.º, n.º 1, do CPP, porque essa decisão de recurso não chegou a modificar, nem na sua espécie nem na medida, as sanções aplicadas na anterior decisão final da Primeira Instância, em prejuízo dos arguidos aí condenados), a anterior decisão final (quer fáctica quer jurídica) da Primeira Instância já ficou invalidada, invalidação essa que fez também invalidar necessariamente – atenta a norma do art.º 109.º, n.º 1, do CPP, para mim aplicável analogicamente, por aval do art.º 4.º deste Código, à situação de reenvio do processo para novo julgamento – o acto (então tácito) do Ministério Público de não interposição de recurso ordinário da dita anterior decisão da Primeira Instância (porque essa postura de não interposição de recurso era logicamente dependente do acto processual de emissão da anterior decisão final da Primeira Instância: foi perante o teor concreto dessa anterior decisão judicial é que o Ministério Público tomou a posição de não recorrer da mesma), pelo que no caso concreto dos autos, e para todos os efeitos legais, se deve entender que ainda subsistia, até antes da realização do novo julgamento da causa pela Primeira Instância, o interesse do Ministério Público em ver procedente o seu juízo acusatório mormente em sede de crimes de homicídio (sem prejuízo obviamente dos efeitos do caso julgado já formado nos autos em relação à decisão de absolvição dos arguidos então já absolvidos na anterior decisão final da Primeira Instância), interesse em agir esse que veio subsistir mesmo após a emissão da nova decisão final da Primeira Instância (uma vez que dos elementos dos autos não se vislumbra que o Ministério Público, em sede da audiência do novo julgamento, tenha pedido a absolvição dos crimes de homicídio ou pedido a convolação dos crimes de homicídio para os crimes de ofensa grave à integridade física agravados pelo resultado da morte), daí que o Ministério Público tem agora ainda interesse em agir para recorrer livremente (inclusivamente quer a nível da qualificação jurídico-penal dos factos quer da medida da pena, mesmo em desfavor dos arguidos condenados) da nova decisão final da Primeira Instância (que não só convolou os dois crimes de homícidio para dois crimes de ofensa grave à integridade física agravados pelo resultado da morte das vítimas, como ainda passou a absolver os 9.º, 10.º, 11.º, 13.º, 14.º, 16.º, 17.º, 18.º e 19.º arguidos, então condenados na anterior decisão final da Primeira Instância);
– dos vícios assacados à nova decisão final da Primeira Instância na motivação do recurso do Ministério Público, não pode proceder o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, porque ante o resultado do julgamento da matéria de facto publicado nessa nova decisão final, é de concluir que já foi investigado todo o objecto probando então descrito em desfavor dos arguidos no despacho de punúncia;
– mas já procede, desde já, o vício de falta de fundamentação jurídica (devido à insuficiência dessa fundamentação) da decisão condenatória dos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 12.º e 20.º arguidos nos dois convolados crimes de ofensa grave à integridade física gravados pelo resultado da morte;
– porém, nada obsta a que se decida directamente, por força da regra da substituição ao tribunal recorrido (art.º 630.º, n.º 1, do CPC, ex vi do art.º 4.º do CPP), do restante objecto do recurso, na medida do possível;
– assim, para já, há que julgar procedente a questão da alteração da qualificação jurídico-penal dos factos, posto que a matéria de facto descrita como provada no texto da nova decisão final da Primeira Instância dá para suportar a condenação a nível da co-autoria de dois crimes dolosos de homicídio como pronunciados, desde logo, de todos os arguidos aí condenados como co-autores de dois crimes de ofensa grave à integridade física agravados pelo resultado da morte, o que implica a aplicação de novas penas parcelares e única (consequentemente mais graves, devido sobretudo à gravidade da moldura penal do homicídio) a esses arguidos;
– por outro lado, também há que julgar procedente o vício de erro notório na apreciação da prova invocado pelo Ministério Público no tocante à decisão de absolvição daqueles arguidos inicialmente condenados na anterior decisão final da Primeira Instância, isto porque após examinados de modo crítico e global e à luz das regras da experiência da vida humana em normalidade de situações, todos os elementos probatórios constantes dos autos, é de entender que tem toda a razão o Ministério Público ao invocar as razões ora já sumariadas nos pontos 12 a 18 das conclusões da sua motivação de recurso, daí que deve ser ordenado o reenvio do processo para novo julgamento no Tribunal Judicial de Base na parte respeitante a esses arguidos então condenados na anterior decisão final da Primeira Instância.
É, pelas razões acima expostas, em súmula, que fiquei vencido parcialmente na votação da solução hoje dada ao recurso.
   Macau, 20 de Novembro de 2014.
    O primeiro juiz-adjunto,
Chan Kuong Seng





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