Processo nº 262/2014
(Recurso Jurisdicional Administrativo)
Relator: João Gil de Oliveira
Data: 27/Novembro/2014
Assuntos:
- Alojamento ilegal
SUMÁRIO:
Pratica a infracção prevista no n.º1 do artigo 10º da Lei n.º 3/2010 a pessoa que recebe uma comissão para arrendar uma fracção, onde terceiro aloja várias pessoas, sem que para tal esteja autorizado ou se verifiquem os condicionalismos do artigo 2º, bem sabendo que ali se desenvolve aquela actividade, tendo, na qualidade de arrendatário, disponibilidade jurídica e de facto para não autorizar e pôr cobro a essa actividade ilegal.
O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira
Processo n.º 262/2014
(Recurso de Decisões Jurisdicionais)
Data : 27 de Novembro de 2014
Recorrente: A
Entidade Recorrida: Directora dos Serviços de Turismo
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
1. O recorrente A não se conformando com a sentença proferida no Tribunal Administrativo e que julgou improcedente o recurso contencioso por si interposto do acto do Exmo Senhor Director de Turismo que lhe aplicou a multa de MOP$200.000,00 por alojamento ilegal, vem dela recorrer, alegando, em sede de conclusões: Impugnação no reconhecimento dos factos
1. Nas fls. 2 a 6 do acórdão recorrido indicam os factos reconhecidos como importantes pelo Tribunal A quo para o julgamento da acção.
2. Face ao supracitado reconhecimento, o recorrente tem ponto de vista diferente.
3. No acórdão recorrido, para além dos factos reconhecidos pelo Tribunal A quo, entende o recorrente que devia também reconhecer o facto constante no ponto 8 do recurso contencioso.
4. Entende-se desta forma, razão porque nas fls. 30 do processo provou-se o facto constante no ponto 8 do recurso (B chegou a celebrar contrato de arrendamento da fracção envolvida no processo, sita na Rua de Shanghai 75-D, Jardim I Keng, edf. I Pou Kok, XXº andar XX, com a Agência de Imobiliário XX Lda., no período compreendido entre 06/07/2009 a 05/07/2010. (vide fls. 30 recibo nº 000274)), este facto prova que B antes do recorrente arrendar a fracção em causa, já tinha controlo efectivo da aludida fracção, quanto ao contrato de arrendamento celebrado com o recorrente foi apenas uma continuação do arrendamento com B, aquando do período de arrendamento celebrado com B, já ela exercia a actividade de prestação ilegal de alojamento, por outras palavras, seja qual for o período de arrendamento, a fracção era controlada efectivamente por B, isto prova que o facto constante no ponto 8 do recurso contencioso tem importância para a decisão e que deve reconhecer como facto importante.
5. Nas fls. 2 do acórdão recorrido indica que o Tribunal A quo reconheceu como factos importantes para a decisão da causa, parte diz: “No dia 30/05/2011, numa operação policial efectuada pela PSP, foi descoberto que a fracção, sita na Rua de Shanghai 75-D, Jardim I Keng, edf. I Pou Kok, XXº andar XX, havia suspeitas de prestação ilegal de alojamento, face à situação, a PSP notificou o caso à DST, o pessoal da DST acompanhado do pessoal da PSP procedeu a inspecção à referida fracção e encontrou na fracção 4 ocupantes não residentes de Macau, munidos de documento de viagem respectivamente: C, D, E e F. Os supracitados indivíduos não conseguiram exibir contrato de arrendamento da fracção, o pessoal da DST ouviu os 4 ocupantes em declarações, um dos quais D declarou que foi “XXX” (após confirmação foi apurado que se tratava B) quem organizou o seu alojamento na referida fracção e lhe entregou as chaves da casa, conheceu-a há cerca de 4 meses, não precisava de pagar renda, ao mesmo tempo, disse que não conhecia os outros ocupantes da fracção em causa; E e F declaram que houve uma senhora chamada “Ah Fan” (após confirmação foi apurado que se tratava B) que forneceu a fracção em causa e as chaves da casa, começou a residir na referida fracção a partir de 23 de Maio, tinha de pagar a renda diária de HK$300.00 e já pagou 7 dias de renda, era B quem recebia a renda; B recusou de responder às perguntas do pessoal da DST. Posteriormente, o pessoal da DST ouviu o recorrente, o qual declarou que em 06/07/2010, ajudou uma senhora chamada “Ah Leng” para assinar o contrato de arrendamento com o proprietário da fracção em causa, recebendo a título de compensação a quantia de HK$1,000.00; mais declarou que de vez em quando via “Ah Leng” (após confirmação foi apurado que se tratava B) levar pessoas que falavam mandarim à aludida fracção e chegou perguntar “Ah Leng” que relação tinha com tais pessoas; o recorrente referiu que a renda basicamente era “Ah Leng” que pagava, o recorrente apenas pagou uma ou duas vezes a renda, ele raramente desloca à fracção, só quando trabalha nos turnos da noite é que pernoitava na fracção.……No dia 17/11/2011, o pessoal da DST ouviu a empregada da Agência de Imobiliário XX Lda. I, a qual declarou que no dia da celebração do contrato, o recorrente veio à agência acompanhado de uma senhora, na altura o recorrente disse que trabalhava aí perto, pretendia arrendar uma casa para viver com a sua família, mas a renda, maior parte das vezes era paga pela aludida senhora à Agência de Imobiliário XX Lda., que posteriormente o senhorio da fracção ia à agência recolher a renda, ao mesmo tempo, entregou a cópia do contrato de arrendamento da fracção e demais documentos (vide fls. 111 a 120 dos autos, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido). Em 20 /09/2012, o pessoal da DST ouviu novamente G, a qual declarou que na data da celebração do contrato de arrendamento, o recorrente veio com uma senhora chinesa, após reconhecimento apurou que se tratava da B, o recorrente, na altura, disse que B era seu parente (vide fls. 196, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido)……No dia 26 de Fevereiro de 2013, o recorrente apresentou a sua defesa por escrito, indicou que por ser guarda porteiro do referido prédio conheceu deste modo a B, posteriormente, por a Agência de Imobiliário XX Lda. ter dito que a fracção em causa só é dada de arrendamento a residentes de Macau, por isso, com vista a receber da B a compensação de HK$1,000.00, ajudou-a assinar o contrato de arrendamento da fracção em causa, mas na realidade a fracção foi arrendada pela B, toda a caução e a renda da fracção foi paga por ela; ao mesmo tempo disse que viu B levar 1 ou 2 pessoas estranhas ao prédio, o recorrente chegou perguntar sobre isso à B, mas ela referiu que tais pessoas eram seus parentes e amigos (vide fls. 235 a 236)……”(a parte carregada e sublinhada foi acrescentada pelo recorrente)
6. Conforme os factos importantes reconhecidos pelo Tribunal A quo, sabemos que, quem angariava pessoas, prestava ilegalmente alojamento e recebia a renda dos ocupantes da fracção era B, ao mesmo tempo, houve testemunhas a declarar que B acompanhou o recorrente para assinar o contrato de arrendamento, bem como, a respectiva renda era paga por B.
7. Além disso, segundo o cartão de visita constante nas fls. 8 do processo, indica o nome “Ah Leng”, tel. contacto: XXX, , na factura das despesas de telefone constantes nas fls. 9, indica o utente do telefone nº XXX como sendo “XXX”, em termos de lógica, sabemos que a supracitada “Ah Leng” e “XXX” se tratavam da mesma pessoa, o respectivo cartão de visita foi encomendado por B para ser distribuído às pessoas, a fim de angariar clientes para o exercício da actividade de prestação ilegal de alojamento.
8. A entidade recorrida emitiu notificação nº 185/AI/2013, informando ao recorrente sobre o relatório nº 222/DI/2013, no ponto 36: “A entregou a fracção à B para prestação ilegal de alojamento.”
9. Pelo exposto, tendo ou não o recorrente participado na exploração da actividade de prestação ilegal de alojamento, não podemos negar que a fracção em causa foi utilizada para a prestação ilegal de alojamento, incluindo angariação de clientes, combinação do preço do alojamento e respectivo recebimento, bem como a renda era paga pela B.
10. Ao mesmo tempo, não houve provas, a indicar que B recebeu ordens do recorrente ou era seu subordinado para o exercício da actividade de prestação ilegal de alojamento, do entendimento mais lógico e da regra de experiência, o recorrente na presente acção foi aproveitado por B como “instrumento” para assinar o contrato de arrendamento da fracção em causa, a fim de explorar a actividade de prestação ilegal de alojamento.
11. Mesmo que existisse os factos supracitados, na notificação nº 185/AI/2013 mas apenas aplicou a multa ao recorrente na quantia de MOP$200,000.00.
I. Face ao erro na aplicação da lei
12. Nas fls. 9 do acórdão recorrido: “O legislador estipulou ainda que, quem controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento, é sancionado de igual modo como quem exerce a actividade de prestação ilegal de alojamento, no pagamento da multa entre duzentas mil a oitocentas mil patacas, daí sabemos que o legislador considera a ilicitude e gravidade desta conduta idêntica à da actividade de prestação ilegal de alojamento, que é de alta censurabilidade. Como definir o infractor de “controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento”, previsto na referida lei, entende o Tribunal que o legislador não pretende, face a isto, tornar a regulamentar sobre a participação directa do agente na actividade de prestação ilegal de alojamento (porque no artº 10º, nº1 estipula claramente a sanção contra o agente que exerce prestação ilegal de alojamento), tendo em conta que o exercício da actividade de prestação ilegal de alojamento depende necessariamente o controlo substancial do prédio ou fracção autónoma (incluindo o direito do gozo do prédio ou da fracção autónoma, tal como o direito de propriedade, direito de utilização ou direito de usufruto), por isso, com vista a atingir o objectivo de reforçar o combate à actividade de prestação ilegal de alojamento previsto na Lei de “proibição de prestação ilegal de alojamento”, quando, de facto, a pessoa que tem o direito de controlo do prédio ou fracção autónoma autorizar que o prédio ou fracção fosse utilizado para a prestação ilegal de alojamento (seja autorização expressa ou tácita, este último é por acto (acção ou omissão), é razoável presumir-se que a pessoa tolera que o prédio ou fracção autónoma fosse utilizado para o exercício da actividade de prestação ilegal de alojamento), ao abrigo do artº 10º, nº 1 da Lei nº 3/2010, a sua conduta corresponde a expressão “controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento”, mesmo que a participação na actividade de prestação ilegal de alojamento não fosse directa.
Devido ao facto, é que na legislação abrange também no âmbito do regulamento, a pessoa que tem o direito de controlar prédio ou fracção autónoma, mesmo que a sua participação na actividade de prestação ilegal de alojamento não fosse directa, com vista a exterminar pessoas que prestam ilegalmente alojamento, aproveitando o direito de controlo do prédio ou fracção autónoma dos outros, para exercer actividades ilícitas, dolosamente criar dificuldades na investigação e recolha de provas, a fim de atingir o objectivo de defraudar a lei.
13. Finalmente entendeu o Tribunal que não conseguiu provar que a entidade competente na apreciação das provas violou as regras de experiência e os critérios objectivos, portanto, a conduta praticada pelo recorrente corresponde 1 infracção administrativa de controlo da fracção autónoma utilizada para a prestação ilegal de alojamento previsto no artº 10º, nº 1 da Lei nº 3/2010, pelo que deve ser sancionado, assim sendo, o fundamento apresentado pelo recorrente na acção, alegando que o acto recorrido enferma de erro nos pressupostos da lei, deve julgar improcedente.
14. Ao abrigo do artº 10º, nº 1 da Lei nº 3/2010: “1. Quem prestar ilegalmente alojamento ou controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento é punido com multa de 200 000 a 800 000 patacas.”
15. Entendo que, face ao conceito de controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento, deve ter uma interpretação com mais rigor em termos de direito, a fim de saber o significado correcto do conceito.
16. Ao abrigo do Artº 8º do CC: 1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada. 2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
17. Através do artigo acima referido, explica e diz que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico (elementos sistemáticos) em conjugação com outros elementos, como por exemplo, elementos históricos, elementos objectivos.
18. Face ao exposto necessita de citar sobre a primeira parte do teor de fls. 5 e 6 do Parecer nº 1/IV/2010 da 1ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa da RAEM: “19. Deve-se indicar que, face às alterações do nome e definição, especialmente sobre a questão da mudança do paradigma, o novo texto é muito mais adequado e perfeito em diversos níveis. Primeiro, foi correcto em escolher que as questões apontem para as actividades ilícitas e não no próprio objecto, isto é, o acto que está envolvido nas actividades ilícitas e não o objecto que é evidente ser uma coisa que não tem a sua própria vontade. Simplificando, o combate é contra um tipo de actividade – a prestação ilegal de alojamento – e não em determinado objecto -- pensão ilegal --, “em termos de definição legal, não deve focar no imóvel, mas sim nas actividades de alojamento ilegal, razão porque estas não se podem transformar em objecto”. O mesmo que arrendamento ilegal, quer seja o prédio tenha uso diferente, quer seja por outros motivos, a lei pretende focar na proibição de prestação de certos arrendamentos e não a fracção ou prédio que foi dado de arrendamento.”
19. Deve ainda citar o artº 1º da Lei nº 3/2010: “artº 1º (objecto) A presente lei tem por objecto a estatuição de medidas de fiscalização e regime sancionatório relativos à prestação ilegal de alojamento, com vista a reforçar o combate a esta actividade.”
20. Após apreciação do teor pela 1ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa da RAEM, a AL estipulou a Lei nº 3/2010 que é o combate à actividade de “prestação ilegal de alojamento” e não o combate ao objecto a “pensão ilegal”, isto está explícito no artº 1º da Lei nº 3/2010 sobre objecto.
21. Por isso, na interpretação e aplicação do artº 10º, nº1 da Lei nº 3/2010, não pode ignorar o estipulado no artº 1º da mesma lei sobre objecto.
22. Assim sendo, temos toda a razão de acreditar que foi assim estipulado porque o combate é contra o infractor que praticou “a prestação ilegal de alojamento” e não foi referido como deve sancionar a pessoa que não prestou “serviços” de alojamento ilegal.
23. Nestes termos, conforme a intenção do legislador, em conjugação com a interpretação acima referida, face ao sentido de controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento deve explicar no sentido quando alguém fornecer o “objecto” (fracção autónoma) e participar na prestação do “serviço” (prestação ilegal de alojamento), é que pode aplicar-lhe a multa; apenas fornecer o “objecto” (fracção autónoma), sem ter participado na prestação do “serviço”, não deve aplicar a multa, entende o recorrente que apenas esta interpretação corresponde realmente com a intenção do legislador.
24. Nas fls. 11 do acórdão recorrido: “Desde a investigação até chegar à presente acção, o recorrente não só, não conseguiu provar como foi instigado para ser arrendatário da fracção e instigado para prestar as supracitadas “falsas” declarações, mas também referiu que no exercício das funções como guarda porteiro do prédio, viu B levar pessoas que falavam mandarim, vemos que, embora levantou suspeitas de tais pessoas, mas não tomou quaisquer medidas para evitar que a fracção arrendada por si, fosse organizada pela B para alojamento de pessoas estranhas, isto não apoia na sua versão que ignorava que a referida fracção fosse utilizada para a exploração da actividade de prestação ilegal de alojamento. Além disso, o recorrente aquando da assinatura do contrato assinou também uma declaração, na qual dizia claramente que o arrendatário tinha de prometer não subarrendar a fracção a terceiros para fins de exploração da actividade hoteleira, recebendo a renda diária, não colocar camas na sala, fazer obras de divisão, alterar a estrutura da casa e alojar pessoas estranhas ou em situação de permanência ilegal etc., tal como disse o recorrente que quando tomou de arrendamento a fracção era para residir com a sua família, sendo B seu parente, podemos deduzir razoavelmente que o recorrente através do controlo efectivo do prédio ou fracção, tolerava ou admitia que B utilizasse a fracção arrendada para prestação ilegal de alojamento. (a parte carregada e sublinhada foi acrescentada pelo recorrente) daí sabemos que o Tribunal A quo, para além de reconhecer que o recorrente forneceu a fracção em causa à B, reconheceu também que B era a única pessoa que se dedicava à actividade de prestação ilegal de alojamento.
25. No presente processo, o recorrente não tinha conhecimento de que B explorava a actividade de prestação ilegal de alojamento, apenas lhe forneceu o “objecto”, ou seja a fracção em causa, nunca participou qualquer “serviço” de prestação ilegal de alojamento, nem houve provas disso.
26. Por isso, a entidade recorrida e o Tribunal A quo na interpretação e aplicação do artº 10º, nº 1 da Lei nº 3/2010, devem corresponder com a intenção do legislador de multar a pessoa que prestou “serviço” de alojamento ilegal, ou seja, B e não o recorrente.
27. Mas a entidade competente e o Tribunal A quo fizeram a sua interpretação extensiva com base à letra da lei, reconheceram que foi o recorrente quem violou a lei, pois a decisão tomada pela entidade competente e constante no acórdão recorrido padece de vício de erro na aplicação da lei.
28. Caso V. Exª não concorde com o ponto de vista acima referido, o recorrente apresenta os seguintes fundamentos:
29. Nos termos do artº 21º da Lei nº 3/2010, em tudo o que não se ache especialmente regulado na presente lei, aplicam-se, subsidiariamente, as disposições do Decreto-Lei n.º 52/99/M, de 4 de Outubro, o Código do Procedimento Administrativo, o Código Penal e o Código de Processo Penal, assim sendo, deve também aplicar o princípio da competência abrangido no referido código e o princípio da legalidade (activismo), a entidade pública depois de proceder o acto de investigação, se tivesse reconhecido a existência do acto de infracção e a entidade do agente da infracção, deveria acusar oficiosamente o infractor.
30. No presente processo, conforme o entendimento da entidade recorrida, do recorrente e do Tribunal A quo, em conjugação com os elementos constantes nos autos, sem dúvida foi reconhecido como evidente que existe o facto de B ter exercido a actividade de exploração da prestação ilegal de alojamento, portanto quer seja ter reconhecido que o recorrente foi aproveitado como instrumento para assinatura do contrato, ou ambos em co-autoria praticaram a infracção supracitada, quer seja o recorrente ter tolerado B na exploração da prestação ilegal de alojamento, a entidade recorrida devia acusar também a B, mas não, a entidade recorrida não aplicou nenhuma sanção à B, apenas aplicou a multa ao recorrente, por isso, a decisão tomada pela entidade competente padece de vício de erro na aplicação da lei, nos termos do artº 124º do CPA, deve o Tribunal declarar a anulação do acto.
31. No recurso contencioso interposto pelo recorrente sobre a parte da conclusão constante no ponto 34 referiu que: “Pelo contrário, a DST reconheceu que a pessoa que explorava a actividade de prestação ilegal de alojamento foi B, ela através do recorrente, depois de ter tomado de arrendamento a fracção, forneceu alojamento ilegal aos turistas, a fim de obter lucros.”
32. Conforme os factos apresentados pelo recorrente, assim como o Tribunal A quo também nas fls. 11 do acórdão reconheceu que “…B utilizou a fracção arrendada para prestação ilegal de alojamento.”, por isso, o Tribunal A quo devia reconhecer que o acto recorrido padece do vício acima supracitado, declarando a anulação do acto, mas no acórdão recorrido assim não fez.
Pedido
Nos termos expostos, deve-se julgar procedente o fundamento do recurso, em consequência:
Ser declarada a revogação do acórdão recorrido e a anulação da decisão tomada pela entidade recorrida sobre a aplicação da multa ao recorrente.
2. A Exma Senhora Directora dos Serviços de Turismo (DST), entidade recorrida nos autos à margem identificados, veio contra-alegar, dizendo, em síntese:
I. A DST não vislumbra na sentença do TAM qualquer dos vícios invocados pelo Recorrente;
II. Na verdade, o juiz tem o dever de seleccionar, de entre os factos dados como provados, apenas aqueles que interessam para a decisão da causa e foi o que aconteceu no presente caso;
III. Dos factos apurados e dados como provados resulta que o recorrente era o arrendatário da fracção desde a assinatura do contrato de arrendamento a 6 de Julho de 2010, qualidade essa que ainda mantinha à data da Inspecção Conjunta a 30 de Maio de 2011 e que, na qualidade de porteiro do prédio, tinha certamente conhecimento de que na mesma se prestava alojamento ilegal;
IV. Em sede do presente recurso o Recorrente não salienta nenhuns factos apurados que ponham por em causa a sua culpa e, por outro lado, os factos que alega e que apontam para uma eventual participação de outras pessoas na angariação ou até na exploração da actividade ilegal não afastam a sua responsabilidade;
V. O Recorrente foi punido ao abrigo do n.º 1 do artigo 10.° da Lei n.º 3/2010 e tal condiz com os factos apurados e que foram dados como os necessários e relevantes para o julgamento da causa e para a determinação da sua Recorrente pela prática da infracção;
VI. Quanto ao alegado erro na aplicação da lei, a entidade Recorrida não concorda com a interpretação ao n.º 1 do artigo 10.° apresentada pelo Recorrente dado que a mesma não tem correspondência com a letra da lei;
VII. Aquele dispositivo estabelece "quem prestar ilegalmente alojamento ou controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma (...)" e a utilização da conjunção coordenativa "ou" pressupõe a existência de uma alternativa entre os dois termos;
VIII. Caso o legislador tivesse querido fazer depender a punição da posse e do exercício efectivo da actividade de prestação de alojamento ilegal teria utilizado a conjunção "e" e não "ou";
IX. Para além disso, o legislador atribuiu o mesmo grau de censura a quem controla por qualquer forma o prédio ou fracção autónoma e a quem presta o alojamento, punindo ambas as situações com uma multa de MOP 200 000,00;
X. Para além disso, a posse da fracção dá ao arrendatário o controle da mesma e, nesse sentido, quem controla uma fracção onde se presta alojamento ilegal pode ser punido pelo n.º 1 do artigo 10.° da Lei n.º 3/2010;
XI. Este entendimento decorre de forma clara da lei e foi, por várias vezes, reiterado pelo TAM em processos onde se analisaram questões semelhantes às levantadas no presente recurso;
XII. Em suma, o tribunal "a quo" subsumiu correctamente os factos provados à norma constante no n.º 1 do artigo 10° da Lei n.º 3/2010;
XIII. E assim conclui que não existiu erro no conhecimento dos factos nem violação de lei, pelo que bem esteve o acto da DST em punir o Recorrente pela violação do n.º 1 do artigo 10.º da Lei 3/2010 e, igualmente, bem esteve a sentença do TAM de 14 de Janeiro que não deu provimento ao recurso apresentado pelo Recorrente.
Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, , deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se a douta sentença recorrida.
3. O Exmo Senhor Procurador-Adjunto emite o seguinte douto parecer:
Se bem apreendemos o conteúdo do argumentado pelo recorrente, assaca o mesmo à douta sentença sob análise praticamente o mesmo tipo de vícios que sustentara em sede do recurso contencioso, isto é, o que o próprio denomina como "erro no reconhecimento de facto", pretendendo, cremos, com isso sustentar que o tribunal "a quo" não terá ponderado devidamente em matéria factual comprovada e relevante, atinente à circunstância de B ter celebrado contrato de arrendamento da fracção em questão em período anterior ao recorrente, sendo que, já nessa altura, aquela exercia a actividade de prestação ilegal de alojamento, a qual manteve após o arrendamento pelo recorrente sendo, pois, tal senhora quem a controlava efectivamente, ignorando o visado que a mesma explorava aquela actividade ilícita, razões por que topa também "erro na aplicação da lei", na interpretação "sui generis" que o mesmo empreende, no sentido de ver como aplicável o n° 1 do art. 10° da Lei 3/2010 apenas aos casos em que se comprova terem-se efectivamente prestado "serviços" de alojamento ilegal, não se bastando a norma com o fornecimento do que denomina de "objecto", ou seja, a titularidade como arrendatário, da fracção em apreço.
Por partes:
Como bem acentua a recorrida, o julgador tem o dever de seleccionar de entre os factos dados como provados, aqueles que interessam para boa decisão da causa.
O arrendamento anterior, a que o recorrente se reporta, a deter algum interesse, só teria a virtualidade de prejudicar a sua posição, já que é o próprio a reconhecer que sabia que, quer no domínio de tal contrato, quer aquando do seu próprio arrendamento, era exercida a prática ilegal em causa na fracção em questão.
De resto, bem vistas as coisas, a este nível, o argumentado pelo visado é um perfeito repositório de contradições, já que, admitindo a existência daquela prática mesmo no domínio do seu arrendamento, por parte de B, acaba por, caricatamente (cfr. ponto 25 das conclusões das respectivas alegações) afirmar que "não tinha conhecimento de que B explorava a actividade de prestação ilegal de alojamento ... " !
Bom, mas tentando sair do confuso e contraditório emaranhado do alegado pelo visado, importará acentuar que, da factualidade apurada no procedimento e vertida no douto aresto sob escrutínio se retira claramente que o recorrente assinou, a 617/10 contrato de arrendamento da fracção em questão, qualidade que detinha aquando da visita inspectiva que determinou o procedimento, não se tendo demonstrado que para a celebração de tal contrato tivesse sido coagido ou instigado, com atropelo da sua vontade, ou que se tenha tratado de mera simulação em favor de outrem, sendo que, enquanto porteiro do prédio onde a fracção se inseria, aquele não desconhecia, aliás o admitindo expressamente, o exercício, nessa fracção da actividade de prestação ilegal de alojamento, situação que, no mínimo, tolerou e com que pactuou.
Nestes parâmetros, independentemente da eventual prestação dos tais "serviços" de alojamento a que alude, a verdade é que se mostra evidente que o visado conhecia e controlava a situação (a sua própria argumentação é disso exemplo claríssimo) da fracção de que era arrendatário e onde era manifestamente exercida a actividade ilegal em causa, pelo que mal se entende a esgrima com a necessidade da verificação concomitante dos "serviços" com o "objecto" para a integração operada, nos termos do n° 1 do art. 10° da Lei 3/2010, disposição de cuja análise facilmente decorre bastar-se a mesma com o controle da fracção.
Apenas uma palavra final, em matéria em que, face ao constante do procedimento, se nos afigura poder, porventura, assistir alguma razão ao recorrente : estamos a reportar-nos à estranheza da falta de sanção relativamente à já citada Wong, dado o "manancial" probatório também quanto à mesma apurado.
Trata-se, contudo, de "contas de outro rosário", em que o tribunal não tem que se imiscuir e que, de todo o modo, não detém qualquer virtualidade quanto à validade do acto de que ora cumpre conhecer.
Donde, sem necessidade de maiores considerações ou desenvolvimentos, sermos a entender não merecer provimento o presente recurso.
4. Foram colhidos os vistos legais.
II - FACTOS
Vêm provados os factos seguintes:
No dia 30/05/2011, numa operação policial efectuada pela PSP, foi descoberto que a fracção, sita na Rua de Shanghai 75-D, Jardim I Keng, edf. I Pou Kok, XXº andar XX, havia suspeitas de prestação ilegal de alojamento, face à situação, a PSP notificou o caso à DST sobre a situação encontrada, o pessoal da DST acompanhado do pessoal da PSP, procedeu a inspecção à referida fracção e encontrou na fracção 4 ocupantes não residentes de Macau, munidos de documento de viagem, respectivamente: C, D, E e F. Os supracitados indivíduos não conseguiram exibir contrato de arrendamento da fracção, o pessoal da DST ouviu os 4 ocupantes em declarações, um dos quais D declarou que foi “XXX” (após reconhecimento foi apurado que se tratava da B) quem organizou o seu alojamento na referida fracção e entregou-lhe as chaves da casa, conheceu-a há cerca de 4 meses, não precisava de pagar renda, ao mesmo tempo, disse que não conhecia os outros ocupantes da fracção em causa; E e F declaram que houve uma senhora chamada “Ah Fan” (após reconhecimento foi apurado que se tratava da B) que forneceu a fracção em causa e as chaves da casa, começou a residir na referida fracção a partir de 23 de Maio, tinha de pagar a renda diária na quantia de HK$300.00 e já pagou 7 dias de renda, era B quem recebia a renda; B (portadora de passaporte com prazo expirado) recusou de responder às perguntas do pessoal da DST. Posteriormente, o pessoal da DST ouviu o recorrente, o qual declarou que, em 06/07/2010, ajudou uma senhora chamada “Ah Leng” tomar de arrendamento a fracção em causa, recebendo a título de compensação a quantia de HK$1,000.00; mais declarou que de vez em quando via “Ah Leng” (após reconhecimento foi apurado que se tratava da B) levar pessoas que falavam mandarim à aludida fracção e chegou perguntar “Ah Leng” que relação tinha com tais pessoas; o recorrente referiu que a renda basicamente era “Ah Leng” que pagava, o recorrente apenas pagou uma ou duas vezes a renda, ele raramente desloca à fracção, só quando trabalha nos turnos da noite é que pernoitava na fracção.
No mesmo dia, o pessoal da DST elaborou o auto de notícia nº 39/DI-AI/2011, tirou fotografias e desenhou o esboço da fracção, no qual demonstra que a tal fracção havia indícios de prestação ilegal de alojamento e que violou o disposto no artº 2º da Lei nº 3/2010 (vide fls. 4 a 45 e verso, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
H é proprietário da fracção em causa (vide fls. 85 a 88).
A DST nunca emitiu licença de exploração de estabelecimentos hoteleiros à fracção sita na Rua de Shanghai 75-D, Jardim I Keng, edf. I Pou Kok, XXº andar XX.
No dia 03/06/2011, H foi ouvido pelo pessoal da DST, o qual declarou que incumbiu a sua tia G para lhe tratar do arrendamento da fracção, embora não passou procuração, mas sabia que a sua tia, através da Agência de Imobiliário XX Lda. deu de arrendamento a fracção e assinou o contrato em representação do senhorio, ao mesmo tempo, disse que não conhecia o arrendatário e outros ocupantes da fracção em causa, nem sabia o preço da renda (vide fls. 64 dos autos, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
No 07/06/2011, o pessoal da DST, ouviu G em declarações, a qual declarou que a fracção foi dada de arrendamento através da Agência de Imobiliário XX Lda., o arrendatário estava presente aquando da celebração do contrato, sabia que o arrendatário é residente de Macau, mas não sabia quantas pessoas residiam na fracção, mensalmente recebia a renda através da Agência de Imobiliário XX Lda., ao mesmo tempo, entregou a cópia do contrato de arrendamento e demais documentos, no contracto consta claramente que o recorrente era o arrendatário, cujo período de arrendamento era compreendido entre 06/07/2010 a 05/07/2011, a renda mensal era de HK$7,000.00 (vide fls. 70 e verso a 80, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
No dia 17/11/2011, o pessoal da DST ouviu a empregada da Agência de Imobiliário XX Lda. I, a qual declarou que no dia da celebração do contrato, A veio à agência acompanhado de uma senhora, na altura o recorrente disse que trabalhava aí perto, pretendia arrendar uma casa para viver com a sua família, mas a renda, maior parte das vezes era paga pela aludida senhora à Agência de Imobiliário XX Lda., que posteriormente o senhorio da fracção ia à agência recolher a renda, ao mesmo tempo, entregou a cópia do contrato de arrendamento da fracção e demais documentos. (vide fls. 111 a 120 dos autos, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido)
Em 20 /09/2012, o pessoal da DST ouviu novamente G, a qual declarou que na data da celebração do contrato de arrendamento, o recorrente veio com uma senhora chinesa, após reconhecimento apurou-se que se tratava da B, o recorrente, na altura, disse que B era seu parente (vide fls. 196, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
No dia 21/09/2012, o pessoal da DST ouviu de novo o recorrente, o qual reafirmou que, em 06/07/2010, foi a B que o levou à Agência de Imobiliário XX Lda. para assinar o contrato e recebeu a título de compensação HK$1,000.00, ao mesmo tempo disse que foi instigado pela B para declarar no auto de interrogatório que nos turnos da noite pernoitava na aludida fracção, a pessoa que efectivamente tomou de arrendamento a fracção foi B, era ela que pagava as despesas da água e electricidade, bem como pagava a renda da fracção à Agência de Imobiliário XX Lda. (vide fls. 200 e verso, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
No dia 15/02/2013, a entidade recorrida proferiu despacho, concordou com o teor do relatório nº 78/DI/2013, indicando que o recorrente no início confessou que chegou a pagar 1 ou 2 vezes a renda da fracção e chegou a pernoitar lá, mas depois negou tais factos, bem como, alegou que foi instigado por B, contudo esta versão não é credível, razão porque o recorrente sabia perfeitamente que era impossível ao pessoal da DST organizar o debate entre ele e a B, por isso aproveitou esta versão para eximir-se da sua responsabilidade legal, conforme os factos, pôde confirmar que o recorrente controlava a fracção em causa para prestação ilegal de alojamento, tendo violado o disposto no artº 10º, nº 1 da Lei nº 3/2010, pelo que, decidiu deduzir acusação, bem como foi-lhe notificado para no prazo estipulado apresentar contestação (vide fls. 210 a 222, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
No mesmo dia, a entidade recorrida emitiu notificação nº 65/AI/2013, informando o recorrente para, no prazo de 10 dias, contados a partir da data da recepção da notificação, apresentar a sua contestação sobre o facto de prestação ilegal de alojamento na fracção em causa, bem como, foi informado de que expirado o prazo, não será aceite a entrega da contestação e das provas (vide fls. 228, cujo teor se deu por integralmente reproduzido).
No dia 26 de Fevereiro de 2013, o recorrente apresentou a sua defesa por escrito, indicou que por ser guarda porteiro do referido prédio conheceu, deste modo, a B, posteriormente, por a Agência de Imobiliário XX Lda. ter dito que a fracção em causa só é dada de arrendamento a residentes de Macau, por isso, com vista a receber da B a compensação de HK$1,000.00, ajudou-a assinar o contrato de arrendamento da fracção em causa, mas na realidade a fracção foi arrendada pela B, toda a caução e a renda da fracção foi paga por ela; ao mesmo tempo, disse que viu a B levar 1 ou 2 pessoas estranhas ao prédio e chegou a perguntá-la sobre isso, mas ela referiu que tais pessoas eram seus parentes e amigos (vide fls. 235 a 236).
No dia 04/03/2013, o recorrente entregou de novo a contestação, reafirmou que a fracção em causa foi tomada de arrendamento pela B, disse ele que na data do incidente foi instigado pela B e pela empregada da agência de imobiliário, para declarar perante o pessoal da DST que a fracção foi tomada de arrendamento por ele e que tinha pago 1 a 2 vezes a renda, bem como pernoitava na fracção aquando trabalhava nos turnos da noite. Mais disse que como guarda porteiro, o seu horário de trabalho era longo e o rendimento era reduzido, não tinha capacidade de controlar a fracção para exploração da actividade de pensão ilegal, ao mesmo tempo, disse que B, para assinatura do contrato de arrendamento, pagou-lhe a título de compensação a quantia de HK$1,000.00, nunca pagou a renda, nem a caução e não tinha as chaves da fracção (vide fls. 238 a 242 dos autos).
No dia 11/03/2013, o recorrente apresentou mais uma vez a sua defesa por escrito, tornou a afirmar o mesmo teor das duas defesas por escrito acima referidas (vide fls. 244 a 246 dos autos).
No dia 08/05/2013, o pessoal da DST através de contacto telefónico, notificou o recorrente para, no prazo de 10 dias, trazer a empregada da Agência de Imobiliário XX Lda. e a B às instalações da DST, a fim de fazer o debate (vide fls. 247, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
No dia 21/06/2013, a entidade recorrida proferiu despacho, concordou com o relatório nº 222/DI/2013, indicando que a contestação apresentada pelo recorrente, parte do teor era repetição das declarações prestadas perante o pessoal da DST na fase de investigação, o respectivo fundamento não é credível, essa versão era somente para eximir-se da sua responsabilidade, além disso, o recorrente deu como pretexto que foi instigado pela B, isto também não tem qualquer base de fundamento, quanto ao declarado pelo recorrente de que o seu rendimento era limitado e o horário de trabalho era longo, não tinha capacidade de controlar a fracção em causa, esta versão não é convincente, pois conforme os factos, foi confirmado que o recorrente controlava a fracção em causa utilizada para a prestação ilegal de alojamento, pelo que decidiu ao abrigo do artº 10º, nº 1 da Lei nº 3/2010, aplicar-lhe a multa de MOP$200,000.00 (vide fls. 248 a 253 dos autos, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
No mesmo dia, a entidade recorrida emitiu notificação nº 185/AI/2013, informando ao recorrente sobre a supracitada decisão e ao mesmo tempo, foi ordenado a cessação imediata da prestação ilegal de alojamento no aludido prédio ou fracção autónoma, além disso, para efectuar o pagamento da multa na DST, no prazo de 10 dias, contados a partir da data de recepção da notificação; foi indicado ainda que face à presente decisão, nos termos do DL nº 110/99/M de 13 de Dezembro com aprovação do artº 25º, nº 2, al. a) do CPCA e artº 20º da Lei nº 3/2010, o recorrente pode interpor recurso contencioso, dentro do prazo legal, ao TA (vide fls. 254, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
No dia 26/03/2013, a DST enviou por correio a referida notificação (vide fls. 261 a 262 e verso, cujo teor se deu aqui por integralmente reproduzido).
IV - FUNDAMENTOS
1. Tanto quanto conseguimos destrinçar na alegação do recorrente, identificamos as seguintes questões nucleares, para além de outras questões adjacentes, como fundamento do recurso interposto:
- Desconsideração de factos relevantes que poderiam ajudar a compreender a intervenção do recorrente e a desvinculá-lo da actuação de prestação de alojamento ilegal;
- Erro na interpretação da lei, por os factos apurados relativos à intervenção do recorrente não serem de molde a integrar a previsão típica da contravenção por que foi condenado.
2. De entre os factos a que o Tribunal Administrativo não terá atendido e que seriam relevantes para decidir o recurso, estaria o facto constante no ponto 8 do recurso (B chegou celebrar contrato de arrendamento da fracção envolvida no processo, sita na Rua de Shanghai 75-D, Jardim I Keng, edf. I Pou Kok, XXº andar XX, com a Agência de Imobiliário XX Lda., no período compreendido entre 06/07/2009 a 05/07/201).
Tal facto seria suportado pelo doc. de fls. 30 - recibo nº 000274 - que prova que B antes de o recorrente tomar de arrendamento a fracção em causa, já tinha controlo efectivo da aludida fracção, pois o contrato de arrendamento celebrado com o recorrente foi apenas uma continuação do arrendamento por aquela celebrado, já ela ali exercendo anteriormente a actividade de prestação ilegal de alojamento.
Nesta conformidade, fosse qual fosse o período de arrendamento, a fracção seria controlada efectivamente por B.
3.Contrariamente ao pretendido este facto não se mostra relevante.
Podemos até dá-lo como assente, mas isso, contrariamente ao alegado, não afasta todo o envolvimento que o recorrente teve no período subsequente àquele arrendamento pela B.
Pretende o recorrente convencer que era um simples porteiro, que ajudou apenas aquela senhora a arrendar a fracção, na medida em que ela não o podia fazer por ser não residente (por explicar fica a razão porque conseguiu arrendar anteriormente a fracção), que se limitou a ganhar uma pequena comissão por esse serviço prestado e que era estranho a tudo o que ali se passava, fracção apenas formalmente por si arrendada.
4. Não há dúvida que dos factos apurados resulta que o recorrente era o arrendatário da fracção uma vez que celebrou, a 6 de Julho de 2010, um contrato de arrendamento, na agência imobiliária "XX X", documento esse que se encontra nos autos. De referir, ainda de acordo com esse contrato, que o recorrente se comprometeu a não dar a fracção de subarrendamento a terceiros nem a permitir que na mesma fosse prestado alojamento ilegal.
Não se acompanha o afirmado pelo recorrente, no sentido de que não tinha o controle da fracção, pois da sua posição jurídica não deixava de resultar o poder de pôr cobro ou denunciar uma actividade ilegal. Aí, ainda que por inércia ou omissão, não deixou de pactuar com a situação de alojamento ilegal.
5. Constata-se que é o próprio A que admite ter pernoitado algumas vezes na fracção e, porque era o porteiro do prédio, sabia que havia pessoas estranhas que entravam e saíam acompanhados da senhora XXX e eram levados por ela a instalar-se na fracção, nada fazendo para impedir essa situação.
Aliás, mesmo em sede das presentes alegações, não enjeita esse conhecimento, ao dizer:
Pelo exposto, tendo ou não o recorrente participado na exploração da actividade de prestação ilegal de alojamento, não podemos negar que a fracção em causa foi utilizada para a prestação ilegal de alojamento, incluindo angariação de clientes, combinação do preço do alojamento e respectivo recebimento, bem como a renda era paga pela B.
6. Não é por não haver provas a indicar que B recebeu ordens do recorrente ou era seu subordinado para o exercício da actividade de prestação ilegal de alojamento, que se pode retirar que o recorrente tenha sido mero “instrumento” daquela para assinar o contrato de arrendamento da fracção em causa, a fim de explorar a actividade de prestação ilegal de alojamento.
7. Em face da factualidade apurada não é plausível que venha negar que não tivesse conhecimento da verdadeira finalidade que estava a ser dada a essa fracção, conhecimento que não se pode considerar neutral em relação a essa actividade ilegal.
A responsabilidade de outras pessoas, tal como pretende fazer crer, não afasta a sua própria responsabilidade e, embora se fique por perceber ou saber se foram perseguidas, tal não impede a responsabilização do recorrente na parte respeitante ao seu envolvimento
8. Assim sendo, vamos agora apreciar do propalado erro de direito e se se mostra integrada a previsão típica da infracção que lhe foi assacada.
O recorrente foi punido ao abrigo do n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 3/2010 que prevê:
“Quem prestar ilegalmente alojamento ou controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma utilizado para a prestação ilegal de alojamento é punido com multa de 200 000 a 800 000 patacas.”
A previsão típica passa por saber se os factos apurados integram a prestação de alojamento ilegal ou pelo controle por qualquer forma de prédio utilizado para esse fim.
Admite-se que o recorrente não explorasse directamente essa actividade ou prestasse directamente alojamento ilegal, mas já a segunda daquelas previsões típicas se mostra observada, qual seja a do controle do prédio onde se desenvolvia aquela actividade.
Aceita-se que num determinado momento o recorrente, porteiro do prédio, tivesse querido facilitar a vida à B, lhe tivesse querido prestar um favor, em troca de uma comissão de MOP1000,00, mas as coisas passam a ser diferentes a partir do momento em que ele fica ciente ou não pode deixar de saber o que ali se passa, apercebendo-se que há pessoas que se alojam ou são alojadas num apartamento sobre o qual ele, ao ter a disponibilidade jurídica, tem também a disponibilidade de facto, bem podendo pôr cobro à situação, denunciar o caso ou rescindir o arrendamento.
Na verdade, a qualidade de arrendatário, dada como provada, foi expressamente reconhecida pelo próprio recorrente, atribuindo-lhe os poderes de controle sobre o prédio e, por essa via, o domínio sobre uma actividade ilegal, ainda que ela não fosse directamente empreendida por si, tanto bastando para integrar a previsão do n.º 1 do artigo 10.° da Lei n.º 3/2010;
8. Não tem razão o recorrente na interpretação que dá àquela norma, contentando-se a previsão legal apenas com uma das duas actividades "quem prestar ilegalmente alojamento” ou “controlar por qualquer forma prédio ou fracção autónoma (…)" e a utilização da conjunção coordenativa "ou" pressupõe a existência de uma alternativa entre os dois termos;
Aliás, para além da interpretação gramatical do texto, a essa conclusão sempre se chegaria, tanto numa perspectiva histórica, como teleológica da norma. É que esta lei surge numa dada conjuntura, em que o fenómeno da prestação do alojamento ilegal assumia proporções preocupantes, com graves consequências sociais que são do conhecimento geral, nem sempre se revelando fácil provar quem foi o prestador do alojamento, pois, frequentemente, os ocupantes são trazidos para as fracções por angariadores de rua que desconhecem a identidade do explorador. Assim se compreende que o legislador se tenha preocupado em alargar e apertar a rede, para permitir à administração um combate mais eficaz àquela actividade ilegal e, para contornar estas situações, tenha optado por responsabilizar, também, aquele que detém a posse do imóvel onde aquela actividade se desenvolve.
9. No fundo, estende-se a responsabilização a quem, ainda que não preste directamente acolhimento, angarie hóspedes ou receba contrapartidas, também àqueles que, por terem a posse ou detenção do prédio, não deixam de pactuar com essa situação, ao permitirem que ela se desenvolva em espaço sob o seu domínio. Por isso, o legislador atribuiu o mesmo grau de censura a quem controla por qualquer forma o prédio ou fracção autónoma e a quem presta o alojamento, punindo ambas as situações da mesma forma.
Pratica a infracção prevista no n.º1 do artigo 10º da Lei n.º 3/2010 a pessoa que recebe uma comissão para arrendar uma fracção, onde terceiro aloja várias pessoas, sem que para tal esteja autorizado ou se verifiquem os condicionalismos do artigo 2º,
- “Para efeitos da aplicação da presente lei, é prestação ilegal de alojamento, a actividade de prestação de alojamento ao público, sem possuir a licença para exploração de estabelecimentos hoteleiros, em prédio ou fracção autónoma não destinado a fins de actividade hoteleira e similar, cujo ocupante é não residente da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), ao qual não foi concedida autorização especial de permanência ou autorização de permanência de trabalhador não residente, salvo verificando-se uma das seguintes situações: 1) A pessoa que presta alojamento tem uma relação estável de arrendamento com o ocupante e, antes da investigação da actividade referida, entregou a declaração de contribuição predial relativa a esta relação de arrendamento, junto da Direcção dos Serviços de Finanças; 2) A pessoa que presta alojamento e o ocupante já se conheciam bem, antes do alojamento, por terem entre si uma relação familiar, profissional, de estudo ou outra relação pessoal, e por causa dessa relação é prestado ao ocupante alojamento gratuito.”,
bem sabendo que ali se desenvolve aquela actividade, tendo, na qualidade de arrendatário, disponibilidade jurídica e de facto para não autorizar e pôr cobro a essa actividade ilegal.
10. Pelas apontadas razões, entende-se não ter havido erro no conhecimento dos factos nem violação de lei, por errada interpretação da mesma, como não se verifica erro nos pressupostos de facto, sendo a matéria bastante para integrar a infracção prevista no n.º 1 do artigo 10.º da Lei 3/2010.
Nesta conformidade, o recurso não deixará de improceder.
V - DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao presente recurso jurisdicional.
Custas pelo recorrente, com 5 UC de taxa de justiça.
Macau, 27 de Novembro de 2014,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Presente
Vitor Coelho
262/2014 32/32