Processo nº 186/2014
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 15 de Janeiro de 2015
ASSUNTO:
- Objecto do recurso
SUMÁRIO:
- Não pode a Recorrente voltar a por em causa a validade das decisões judiciais já transitadas em julgado num recurso com objecto específico que se difere daquelas.
O Relator
Processo nº 186/2014
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 15 de Janeiro de 2015
Recorrente: A (Executada)
Objecto do Recurso: Despacho que admitiu os incidentes de intervenção principal espontânea
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – Relatório
Por despacho de 01/07/2013, foi deferido o requerimento de intervenção principal espontânea dos 2 filhos da ora Recorrente (Executada), B e C.
Dessa decisão vem recorrer a Recorrente, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
1. A recorrente, nos termos acima melhor explanados, entende que tendo sido proferido em 6 JAN 2010 um despacho mandando aguardar o prazo para efeitos de interrupção da instância, é manifesto que o subsequente despacho a reconhecer a interrupção sempre deveria ter sido prolatado o mais tardar até 6 JAN 2011, ou seja, no máximo até um ano após o início desse "período de espera".
2. Ou, quando muito, um tal despacho, ainda que posterior ao decurso do ano legalmente exigível, sempre teria, a fim de se conformar com o dito requisito temporal, expressamente fazer retroagir os seus efeitos à data do completamento do ano (365 dias) exigido pela lei, o que não sucedeu in casu.
3. Face ao que entende a recorrente que sempre terá de ser desconsiderado que a interrupção da instância executiva apenas ocorreu em 30 NOV 2011 e que, muito pelo contrário, a dita interrupção ocorreu anteriormente, logo em 6 JAN 2011.
4. Pelo que é desde 6 JAN 2011 que se teriam de contar os 2 anos a que alude o art. 233.° para efeitos de deserção da instância, prazo esse, pois, que terminou em 6 JAN 2013 e, portanto, muito antes de 30 ABR 2013, data em que foi apresentado o incidente de intervenção principal espontânea.
5. Ao não ter assim decidido, fez o Tribunal a quo errada interpretação e aplicação da al. c) do art. 229.°, do art. 233.°, n.º 1, e da al. c) do art. 229.°, todos do C.P.C., o que se invoca para os efeitos do n.º 2 do art. 598.° do C.P.C.
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Os Recorridos, B e C, responderam à motivação do recurso da Rcorrente nos termos constantes a fls. 262 a 267 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
- Em 01/07/2013, o Juíz a quo proferiu o seguinte despacho (fls. 223 dos autos):
“...Fls. 205 e 207: Os filhos do exequente D, B e C, vieram requerer a intervenção principal espontânea nos presentes autos de execução dos alimentos, invocando que a dívida exequenda, vencida e vincenda, não foi paga até ao momento.
A executada respondeu no sentido de se verificar na instância a deserção, dado que foi decretada a interrupção da instância no dia 06/01/2010.
Verificou-se que foi decidido aguardar o prazo para efeitos da interrupção da instância em 06/01/2010 e declarada a interrupção da instância em 30/11/2011 (fls. 196 e 198 dos autos).
Pelo que, não se esgota ainda o prazo de dois(2) anos para efeitos de deserção, ao abrigo do art.° 233.°, n.º 1, do C.P.C.
Em relação ao requerimento dos filhos, o exequente já perdeu a sua legitimidade para representar o filho B a partir de 23 de Julho de 2010 e a filha C a partir de 2 de Maio de 2012, respectivamente, quando o filho e a filha atingiram a maioridade.
Com efeito, os filhos têm interesses próprios e são partes legítimas nos presentes autos e deve deferir-se o respectivo requerimento, nos termos dos art.º 43.º e 55.º do C.P.C. ...”.
- Em 19/07/2013, a Recorrente apresentou o requerimento da interposição do recurso do despacho supra nos seguintes termos (fls. 226 dos autos):
“A, Executada nos autos do processo supra cotado, inconformada com a decisão vertida no douto despacho de fls. 223, que admitiu os incidentes de intervenção principal espontânea deduzidos pelos seus filhos, e estando, em consequência da sua admissão findos, vem dele interpor RECURSO ORDINÁRIO, com subida imediata nos próprios autos, cujo efeito é suspensivo, tudo nos termos conjugados dos artigos 601.° n.º 1 al. a), 606.° n.º 2 alínea b) e 607.° n.º 1 do CPC.
Por estar em tempo e ter legitimidade para tal, requer-se a admissão do presente recurso...”.
- Em 25/09/2013, a Recorrente requereu de novo que fosse declarada a deserção da instância nos termos e fundamentos constantes a fls. 230 a 235 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
- Em 15/10/2013, a Recorrente apresentou a motivação do recurso, identificando de forma expressa que o objecto do recurso era “o despacho proferido em 1 JUL 2013 por via do qual foi admitida a intervenção principal espontânea dos 2 filhos da Executada, B E C”. (fls. 238 dos autos).
- Em 06/01/2014, em consequência do requerimento da declaração da deserção da instância apresentado pela Recorrente e da apresentação da motivação do recurso pela mesma, o Juíz a quo proferiu o seguinte despacho (fls. 268 a 269v dos autos):
“...A fls. 223, a Mm. Juiz decidiu duas partes de matérias, por um lado, admitiu os incidentes de intervenção principal espontânea deduzidos pelos seus filhos. Por outro lado, entendeu que os autos não estão esgotados o prazo de dois anos para efeito de deserção nos termos do art.º233, n.º1 do CPCM.
A fls. 226, a Executada apresentou o requerimento de interposição do recurso contra a decisão vertida no despacho a fls. 223 que admitiu os incidentes de intervenção principal espontânea deduzidos pelos seus filhos.
A fls. 227, a Mm. Juiz admitiu o recurso interposto acima exposto.
A fls. 238 a 246, a Executada apresentou as suas alegações. O objecto de recurso aí indicado é o despacho proferido em 01/07/2013 (fls.223), por via do qual foi admitida a intervenção principal espontânea dos 2 filhos da Executada. Só que, na fundamentação deste recurso, alegou-se sobre a matéria que o Tribunal "A Quo" interpretou e aplicou erradamente as normas jurídicas que regulam a matéria de interrupção e deserção da instância executiva, e sem ter grande desenvolvimento sobre a matéria de admissão os incidentes de intervenção principal espontânea deduzidos pelos seus filhos.
A fls. 260 a 267, o Exequente ofereceu as suas contra alegações, no sentido de defender igualmente a sua posição sobre a interpretação e deserção da instância executiva.
Cumpre decidir:
No nosso modesto entendimento, o objecto de recurso da Executada é desviado com a fundamentação do recurso. No entanto, tendo a competência de apreciar o recurso cabe ao Venerando Tribunal de Segunda Instância, portanto, não nos cabe a apreciar o desviado acima exposto.
Oportunamente, subam os presentes autos ao Venerando Tribunal de Segunda Instância, para fazer a habitual justiça.
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Fls. 230 a 235, 249 a 253: Visto.
A fls. 230 a 235, além de apresentação do recurso, a Executada vem ainda requerer, por um lado, reafirma a sua posição sobre o objecto de recurso a fls. 226, por outro lado, vem expressamente alegar que, uma vez o recurso foi interposto unicamente em sede e visando a decisão sobre o incidente de intervenção espontânea, não incidindo ou extendendo de modo autónomo aos autos principais da presente lide executiva. Pelo que, embora o aludido incidente de intervenção principal espontânea esteja colocado em crise por força do mencionado recurso, certo é que, de todo o modo os presentes autos de execução correm neste momento os seus termos e neles figuram agora como autores/exequentes unicamente os filhos da executada e como ré/executada a mãe dos mesmos. Com este pretexto, vem a Executada novamente coloca o pedido de extinção de lide executiva por fundamento de verificação de causa de deserção da instância executiva nos termos do art.º223, n.º1, e art.º229, alínea c) do CPCM.
A fls. 249 a 253: o Exequente ofereceu as suas respostas, no sentido de defender igualmente a sua posição sobre a interpretação e deserção da instância executiva.
Cumpre decidir:
Salvo os devidos respeitos e demais opiniões melhores e diversas, o Tribunal entende que a Executada continuar não ter razão sobre o requerimento a fls. 230 a 235.
Por um lado, conforme os factos acima expostos, o recurso interposto pela Executada, cujo objecto é de atacar a decisão judicial sobre a admissão dos incidentes de intervenção principal espontânea deduzidos pelos seus filhos, no entanto, com a alegação de motivação apresentada, a fundamentação de recurso está atacar a interpretação do Tribunal "A Quo" sobre as normas jurídicas que regulam a matéria de interrupção e deserção da instância executiva. Portanto, do início ao fim, a executada quer colocar o Venerando TSI a apreciar a questão se existe ou não a causa para desertar a instância executiva.
Por outro lado, a Executada volta a colocar novamente a mesma questão ao Tribunal "A Quo", com pretexto de que agora mudaram as partes activas, em vez do pai (ser representante dos filhos menores) passam agora a ser os próprios filhos maiores, são os próprios filhos agem como Autores/Exequentes. Com esta substituição das partes activas, a Executada volta novamente a colocar a mesma questão de extinção de lide executiva, com idêntico fundamento que já exposto na motivação de recurso acima referido.
Bom, ao nosso modesto entendimento, é quase incompreensível sobre o pedido da Executada acima referido. Pois, por um lado, conforme o art.º264, n.º2 do CPCM, o interveniente (neste caso, os intervenientes principais espontâneas são os filhos) aceita a causa no estado em que se encontrar, sendo considerado revel quanto aos actos e termos anteriores; mas goza de todos os direitos de parte principal a partir do momento da sua intervenção. Portanto, in casu, não há duas instâncias executivas, mas sim uma e única, o que aconteceu é os exequentes mudaram/substituíram, nada mais. E os substituintes aceitam a causa no estado em que se encontrar. Pelo que, não deve entender que há nova instância executiva entre os novos exequentes e a antiga executada que vale para extinguir mais uma vez.
Por outro lado, mesmo seguindo o raciocínio da executada, uma vez que a executada está a atacar a decisão de substituição das partes activas no recurso, assim sendo, desde que as substituições das partes não são definitivamente estabelecidas, e não podem por ora decidir a deserção de instância entre os novos exequentes e a antiga executada.
Pelo exposto, indefiro o requerimento de executada a fls.230 a 235.
Custas do incidente pela executada.
Notifique e D.N ..”
- O despacho supra transcrito foi notificado às partes por cartas registadas de 10/01/2014 (fls. 270 a 271v dos autos).
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III – Fundamentação:
O objecto do presente recurso, conforme identificado pela Recorrente tanto no requerimento da interposição do recurso como na motivação do recurso apresentada, é a decisão que admitiu a intervenção espontânea dos seus dois filhos.
No entanto, como bem notou o juíz a quo, toda a fundamentação do recurso consiste em atacar a decisão da não declaração da deserção da instância.
Verifica-se aqui uma manifesta desconformidade entre o objecto do recurso e a sua fundamentação, ou seja, os fundamentos do recurso não são destinados para o objecto do recurso.
A pretensão da Executada, ora Recorrente relativa à declaração da deserção da instância, já foi indeferida por duas vezes pelo Tribunal a quo, decisões essas que lhe foram oportunamente notificadas e como não foram objecto de qualquer recurso, já transitaram em julgado, formando-se assim caso julgado.
Nesta conformidade, nunca pode a Recorrente no âmbito do presente recurso voltar a por em causa a validade das mesmas decisões.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao presente recurso.
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Custas do recurso pela Recorrente.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 15 de Janeiro de 2015.
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Ho Wai Neng
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José Cândido de Pinho
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Tong Hio Fong
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