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Processo n.º 671/2014
(Recurso Laboral)

Relator: João Gil de Oliveira
Data : 11/Dezembro/2014


ASSUNTOS:
    - Compensação pelo descanso semanal não gozado


SUMÁRIO :
O trabalhador tem direito de receber, por cada dia de descanso semanal não gozado, o dobro da retribuição normal, para além do singelo já recebido
              O Relator,

João A. G. Gil de Oliveira






Processo n.º 671/2014
(Recurso Civil)
Data : 11/Dezembro/2014

Recorrente : B

Recorrida : C (Macau) – Serviços e Sistemas de Segurança, Lda.

    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO

    1. B, mais bem identificado nos autos, inconformado com parte da sentença proferida em acção laboral que moveu contra C (Macau) – Serviços e Sistemas de Segurança, Lda., dela vem recorrer, alegando, em síntese:
    1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao Recorrente a atribuição de uma compensação devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal na medida de um dia de salário em dobro.
    2. Porém, ao condenar a Recorrida a pagar ao Recorrente apenas o equivalente a um dia de trabalho (em singelo) pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, o Tribunal a quo procedeu a uma não correcta aplicação do disposto na al. a) do n.º 6 do artigo 17.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
    3. Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal, por cada dia de descanso semanal prestado;
    4. Do mesmo modo, ao condenar a Recorrida a pagar ao Recorrente apenas e tão-só um dia de salário em singelo, o Tribunal a quo desviou-se da interpretação que tem vindo a ser seguida pelo Tribunal de Segunda Instância sobre a mesma questão de direito, no sentido de entender que a compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser feita em respeito à seguinte fórmula: (salário diário X n.º de dias de descanso não gozados X 2);
    5. De onde, resultando que o Recorrente prestou trabalho durante todos os dias de descanso semanal durante toda a relação de trabalho, deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MüP$143,068.00 a título do dobro do salário - e não só de apenas MOP$71,534.00, correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento.
    Nestes termos, deve a sentença na parte em que condena a recorrida a pagar ao recorrente apenas o equivalente a um dia de retribuição em singelo, ser julgada nula e substituída por outra que atenda ao pedido tal qual supra formulado.

    2. C (Macau) Serviços e Sistemas de Segurança Limitada contra-alega, pugnando doutamente pela manutenção do decidido.
    3. Foram colhidos os vistos legais
    
    II - FACTOS

Vêm provados os factos seguintes:
    1) Entre 22 de Abril de 1994 a 31 de Maio de 2008, o Autor prestou para a Ré funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (A)
    2) A Ré sempre fixou o local (posto de trabalho), o período e o horário de trabalho do Autor de acordo com as necessidades. (B)
    3) O Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré, e sempre prestou trabalho nos locais (postos de trabalho) indicados pela Ré. (C)
    4) Ao longo de toda a relação laboral a Ré pagou ao Autor uma quantia fixa mensal, acrescida de uma quantia determinada em função do número de horas de trabalho extraordinário efectivamente prestadas pelo Autor. (D)
    5) Durante a relação de trabalho o Autor auferiu da Ré, a título de salário anual e de salário normal diário, as quantias que abaixo se discrimina (Cfr. doc. 1, Certidão de Rendimentos – Imposto Profissional): (E)

Ano
Salário annual
Salário normal diário
1996
45292
189
1997
48417
134
1998
47753
133
1999
51419
143
2000
54666
152
2001
43251
120
2002
47590
132
2003
50079
139
2004
55533
154
2005
41199
114
2006
52407
146
2007
86037
239
    6) Entre 22 de Abril de 1994 a 31 de Dezembro de 2007 (excepto durante o período compreendido entre 10/01/2000 a 18/01/2002, que não faz parte do presente pedido), a Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal. (F)
    7) Entre 22 de Abril de 1994 a 31 de Dezembro de 2007 (excepto durante o período compreendido entre 10/01/2000 a 18/01/2002, que não faz parte do presente pedido), a Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (1.º)
    8) A Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório, em virtude do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (2.º)
  
    III - FUNDAMENTOS
    O objecto do presente recurso passa unicamente pela seguinte questão: qual a fórmula de compensação pelo não gozo dos descansos semanais?
    Na douta sentença o Mmo Juiz, na sua interpretação do artigo 17.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, entendeu ser de sufragar o entendimento seguido pelo Venerando Tribunal de Última Instância e, em consequência, condenar a ré a pagar ao autor apenas o correspondente ao valor de um salário em singelo no que respeita ao trabalho prestado em dia de descanso semanal durante todo o período da relação laboral.
    Não se acompanha esse entendimento.
    Dispõe a al. a) do n.º 6 do art. 17.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril:
    “6. O trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago:
    a) Aos trabalhadores que auferem salário mensal, pelo dobro da retribuição normal;”
    Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal por cada dia de trabalho prestado em dia de descanso semanal.
    Argumenta-se que um salário já foi pago, pelo que só terá direito a receber mais um. Não! O salário que lhe foi pago ao fim do mês é pelos dias em que trabalhou. Tem direito a um salário mensal correspondente a 26/27 dias de trabalho efectivo e a descansar 4/5 dias. Se foi trabalhar nesses dias, não se pode considerar que foi pago por isso. A determinação do salário diário quando o trabalhador ganha ao mês é uma ficção meramente contabilística: x:30=y, tanto assim que haveria que dividir por 30/31/28/29, consoante os meses.
    Como se compreenderia que dois trabalhadores na mesma empresa – um que fosse trabalhar em dia de descanso e outro que optou por descansar nesse dia recebessem o mesmo vencimento a esse título? Isto é, a remuneração extra do que foi trabalhar, na fórmula x1, não compensaria o sacrifício do trabalho em dia de descanso, pois receberia apenas a compensação de um dia de trabalho normal. Não se pode dizer, em relação ao que trabalha em dia de descanso que ele já recebeu um dia, pois trata-se de realidades de natureza diferente. De certa forma, pode dizer-se que ele recebe para não trabalhar nesse dia, pois o descanso é um direito que lhe assiste, para retemperar forças, para poder continuar a trabalhar, pelo que não se pode dizer que já recebeu parte da compensação pelo seu trabalho.
    Igualmente na esteira das posições anteriormente assumidas a fórmula correcta deve ser x2 para o cálculo das compensações pelo não descanso semanal.
    Considerando que se trata de matéria mais do que analisada e decidida na Jurisprudência deste TSI, vamo-nos remeter para a Jurisprudência quase uniforme deste Tribunal, com a redacção que foi dada no acórdão deste TSI, no proc. n.º 780/2007, de 31 de Março de 2011, onde aquela uniformidade sofreu apenas uma ligeira inflexão.
    Veja-se ainda o Ac. do Tribunal de Segunda Instância n.º 678/2013, de 24 de Abril de 2014, nos termos do qual se sublinha que: “a Autora tem direito de receber, por cada dia de descanso semanal não gozado, o dobro da retribuição normal, para além do singelo já recebido”. 1
    Assim, resultando provado que o recorrente, durante todo o período da relação laboral não gozou dos respectivos dias de descanso semanal, deve a recorrida ser condenada a pagar ao autor, seu trabalhador, a quantia de MOP$143,068.00 a título do dobro do salário - e não só de apenas MOP$71,534.00, correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise - acrescida de juros até efectivo e integral pagamento.
    
    IV - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em conceder provimento ao recurso, e, revogando a decisão recorrida, condena-se a ré C – Serviços e Sistemas de Segurança, Limitada, a pagar ao autor B a quantia de MOP$143,068.00 como compensação pelo não gozo dos dias de descanso semanal não gozados, acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, no mais se mantendo o doutamente decidido.
    Custas do recurso pela recorrida.
Macau, 11 de Dezembro de 2014,

Relator João A. G. Gil de Oliveira

Primeiro Juiz-Adjunto Ho Wai Neng

Segundo Juiz-Adjunto José Cândido de Pinho
1 - Ainda, entre muitos outros, do TSI, 396/2014, 338/2014, 426/2013, 596/2010; 805/2010.
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671/2014 1/9