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    Processo n.º 347/2014
    (Recurso Cível)
    
    Relator: João Gil de Oliveira
    Data : 15/Janeiro/2015


ASSUNTOS:
    - Caducidade do registo de marca por não uso sério; conhecimento sujeito à iniciativa das partes

    
    SUMÁRIO :
     O conhecimento da caducidade do registo de marca por não uso sério por um período de três anos não é de conhecimento oficioso.
              O Relator,
              João A. G. Gil de Oliveira

Processo n.º 347/2014
(Recurso Civil)
Data : 15/Janeiro/2015

Recorrente : A

Recorrida : B Limitada

    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
    A, ora recorrente, notificado da douta sentença que revogou a decisão da DSE que se pronunciara no sentido da caducidade por não uso sério da determinada marca, em relação a todos os serviços de dada classe, tendo interposto recurso da mesma, vem nos termos do artigo 613.° n.º 2 do Código de Processo Civil (C.P.C.), apresentar as suas alegações de recurso, concluindo da seguinte forma:
    A. Sendo a DSE uma entidade administrativa que zela pelo interesse público no registo de Propriedade Intelectual, nomeadamente pelos valores da concorrência leal e da protecção da propriedade intelectual discorda-se que a DSE possa ter agido em excesso de pronúncia.
    B. A Administração Pública rege-se segundo o Código do Procedimento Administrativo o qual no seu art. 59.° dispõe que a Administração não só pode debruçar-se sobre "matérias não mencionadas nos requerimentos", como ainda "decidir coisa diferente ou mais ampla do que a pedida".
    C. A caducidade neste caso é de conhecimento oficioso, como resulta do art. 315.° do Código Civil ("A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes").
    D. A Recorrida, sob a qual pendia o ónus de prova nos termos do art. 232.° n.º 5 do RJPI veio confirmar e informar a DSE, no processo administrativo de que não tinha usado a marca para qualquer dos servicos na especificação.
    E. A declaração de intenção de uso prevista no Código da Propriedade Industrial de Portugal é um mecanismo que obriga os interessados a, para evitarem a caducidade, apresentar esta declaração, que institui uma mera presunção de uso, que pode ser ilidida por qualquer interessado que prove a caducidade por não uso da marca.
    F. A douta decisão a quo estabelece uma ponte entre o regime de Portugal e o de Macau, retirando do facto de não se ter transposto o mecanismo de declaração de intenção de uso (também referida apenas por DIU) para o RJPI, a conclusão de que nesta matéria não existe em Macau conhecimento oficioso.
    G. Contudo, o regime existente em Portugal é bastante diferente do de Macau, na medida em que i) concede maior importância à intervenção dos particulares (pelo mecanismo do DIU) e porque ii) inverte o ónus da prova.
    H. No primeiro ponto, o mecanismo legal do DIU permite criar uma presunção (de fonte legal) de que a marca está a ser usada, obrigando os contra-interessados a ilidir essa presunção. No segundo, o ónus da prova é invertido e incumbe aos interessados no cancelamento provar que a marca não está a ser usada (ao passo que no regime de Macau incumbe ao titular da marca provar que usa a mesma) - de todo o modo, o regime vigente em Portugal não limita ou cerceia os poderes da Administração em declarar oficiosamente a caducidade.
    I. Não tem assim qualquer sentido afirmar que, tendo os particulares um menor âmbito de intervenção no regime em vigor em Macau, também a Administração esteja mais limitada ou condicionada. Pelo contrário, tendo os particulares menos intervenção no controle do uso das marcas, aumenta a responsabilidade e o âmbito de intervenção da Administração nesta matéria.
    J. A caducidade por não uso respeita claramente a um interesse público em controlar o número de marcas e em expurgar o registo das marcas registadas que não correspondem a qualquer interesse sério ou a qualquer intenção comercial ou industrial no seu uso.
    K. O regime da caducidade por não uso prossegue eminentemente um interesse público, que não está sujeito à disponibilidade das partes. Tratando-se de matéria indisponível, decorre imediata e necessariamente que a mesma é de conhecimento oficioso (como o confirma o artigo 315.° do Código Civil).
    L. Na sentença recorrida não terá sido feita a correcta interpretação dos normativos legais aplicáveis. No entendimento da sentença recorrida, sempre que uma causa de caducidade não opera automaticamente a mesma não é de conhecimento oficioso e está sujeita a requerimento ou a intervenção dos particulares. Por outras palavras, na sentença recorrida "conhecimento oficioso" e caducidade que opera "automaticamente" são conceitos sinónimos ...
    M. Mas se assim fosse, pela lógica da sentença, quando uma marca se torne susceptível de induzir o público em erro (231.° n.º 1 do RJPI), a DSE não terá poderes para actuar e deverá aguardar pela iniciativa dos particulares. O entendimento de que só existe conhecimento oficioso para as causas de caducidade que operam "automaticamente" está errada e desconforme à lei.
    N. O conceito de "automaticamente" que se encontra plasmado no artigo 51.° n.º 2 do RJPI respeita apenas às causas de caducidade associadas ao mero decurso de um prazo estipulado na lei e decorrido esse prazo sem ter sido efectuado um acto do particular junto da Administração o direito de propriedade intelectual caduca automaticamente, i.e., sem ser necessária a intervenção quer dos particulares, quer da própria Administração.
    O. Por outro lado a norma do 231.° n.º 4 permite aproveitar o processo administrativo quando o que foi pedido foi o cancelamento total. A lei contém uma previsão expressa que permite à Administração, caso tenha sido solicitado o cancelamento total, reduzir a sua apreciação e decisão a um cancelamento parcial. Se a lei confere esta faculdade à Administração será razoável e conforme ao espírito da lei entender que o inverso (converter o cancelamento parcial em cancelamento total), não é admissível?
    P. Sempre que os factos em apreciação pela Administração demonstram que há um não uso total da marca, não resta senão (a uma entidade que zela pelo interesse público) declarar a caducidade total da mesma.
    Q. Estabelece o artigo 325.° do Código Civil que "1. A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes.". Este artigo apenas veda a apreciação oficiosa da caducidade convencional e não da legal.
    R. Estamos perante normas de interesse público, que pretendem promover uma concorrência leal entre os agentes económicos, como é confirmado pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26-10-1999, que decidiu o seguinte: "I - A caducidade é, nos termos do art. 333. ° do CC, de conhecimento oficioso, desde que se reporte a matéria excluída da disponibilidade das partes. (…) "III - Está nesse caso a caducidade do registo de marcas destinadas a exportação, conforme regulado nos artigos 78.° n.º 2 e 124.° n.º 4 da Propriedade Industrial de 1940, a qual se fundamenta no interesse público da lealdade da concorrência e correlativa repressão da concorrência desleal”.
    S. Uma marca obtida de má fé tanto pode ser usada ou não. Mas a sua aquisição de má fé é um forte indício que a Recorrida não pretendeu dar uma utilização séria à marca - a lei não obriga o titular da marca a fazer um uso sério da mesma, mas o legislador também foi claro ao determinar que a manutenção dessa passividade durante um período de 3 anos torna a marca vulnerável a uma declaração de caducidade.
    T. O uso da marca não é obrigatório, mas o legislador pretendeu impedir que o seu registo fosse utilizado para impedir o desenvolvimento da actividade comercial, essencial para a vitalidade da economia.
    U. O Tribunal de Segunda Instância decidiu, no processo no. 204/2004, "Tendo embora o nosso sistema jurídico adoptado o instituto de uso facultativo de marcas, não deixa de impor limitações, tal como as limitações aos outro direitos civis ou económicos: o regime de caducidade", sendo este aplicável sempre que o titular da marca não afaste a presunção que sobre este incide de provar a utilização dessa marca.
    V. Como pretende a Recorrida que se dê como provada por meio de uma mera declaração, a um organismo público, de cessação de actividade (i) que essa actividade foi efectivamente exercida e (ii) que, no âmbito da mesma, foi dado uso à marca registada ?!?!
    W. Tendo todos estes documentos duas características comuns: i) respeitam a actos preparatórios 'ou incidentais a qualquer actividade comercial (mas não à actividade em si); ii) sendo todos posteriores à data do requerimento de A (2 de Março de 2009) e, na sua maior parte, posteriores também à data da própria decisão recorrida!! (10 de Julho de 2012). Pelo que, cumulativamente, não podem, nem devem, ser admitidos como prova nos presentes autos, por serem posteriores ao próprio acto recorrido e por não demonstrarem qualquer uso da marca.
    X. Pelo que se repete aqui o mesmo padrão: é a própria Recorrida a demonstrar, a contrario, que a respectiva marca nunca foi utilizada, nem à data do requerimento (02-03-2009) nem tão pouco à data da decisão que declarou a caducidade por não uso (10-07-2012).
    Y. Pelo que bem andou a sentença nesta parte, ao considerar precisamente que nenhum destes documentos, enquanto prova, permitia à Recorrida preencher o requisito de uso - pelo que não se impugna nem recorre desta parte da sentença, sendo a mesma apenas relevante para demonstrar como a Recorrida demonstrou o não uso.
    Z. Relativamente ao justo motivo, a douta sentença decidiu em sentido favorável ao ora Recorrente. O Recorrente dá aqui por reproduzidas as considerações dispendidas na sentença nesta parte, da qual não pretende recorrer.

    B LIMITADA, na qualidade de recorrida nos autos à margem referenciados, contra-alega, dizendo:
A - Intróito
    O douto Tribunal a quo, por sentença datada de 9 de Janeiro de 2014, julgou parcialmente procedente o Recurso Judicial interposto pela ora Recorrida, contra a decisão tomada pela DSE que determinou a caducidade total da marca N/XXX. Decidiu o Tribunal a quo no sentido de julgar parcialmente procedente o pedido e a sua fundamentação, mandando cancelar a decisão de caducidade da marca acima referida no que respeita aos serviços de cafés, bares de café, refeitórios pequenos, restaurantes temporários, "snack-bar" e refeitórios pequenos de sanduiches, restaurantes de auto-serviços e restaurantes de refeições rápidas e serviços de "catering" para banquetes, mantendo. no entanto, a caducidade para os restantes serviços de hotel e motel; fornecimentos de acomodações temporárias; fornecimentos de serviços de hospedagem e quartos; serviços de reservas de pensões; fornecimentos de serviços de salão de beleza, banhos de sauna e salões de massagem; serviços de limpeza e higiene quotidianos; serviços de empregadas; cabeleireiros, barbearia, fornecimento de equipamentos para conferências; serviços de refeitórios, casas de chá, cantinas de autos-serviço; casas de mercearia finas e padarias.
B - Do excesso de pronúncia vs. conhecimento oficioso e caducidade
    O Recorrente tenta colocar em crise a sentença que dá provimento parcial ao Recurso Judicial interposto pela ora Recorrida, invocando que a Administração Pública, ao reger-se pelo artigo 59.º do Código Procedimento Administrativo, pode debruçar-se sobre "matérias não mencionadas nos requerimentos" e ainda "decidir coisa diferente ou mais ampla do que a pedida." Ora, nada disto é posto em causa pela Recorrida.
    O Recurso Judicial para o Tribunal a quo foi originado pelo facto do Recorrente ter pedido que fosse declarada a caducidade parcial da marca N/XXX relativamente aos se/viços de hotel e motel; fornecimentos de acomodações temporárias ; fornecimentos de serviços de hospedagem e quartos; serviços de reservas de pensões; fornecimentos de serviços de salão de beleza, banhos de sauna e salões de massagem; serviços de limpeza e higiene quotidianos; serviços de empregadas; cabeleireiros, barbearia, fornecimento de equipamentos para conferências; serviços de refeitórios, casas de chá, cantinas de autos-serviços; casas de mercearia finas e padarias. No entanto, a DSE declarou a caducidade total da marca, incluindo os serviços de "cafés, bares de café, refeitórios pequenos, restaurantes temporários, "snack-bar" e refeitórios pequenos de sanduiches, restaurantes de auto-serviços e restaurantes de refeições rápidas e serviços de "catering" para banquetes". Apesar da decisão final de cancelamento total, todas as comunicações feitas pela DSE à Recorrida bem como as comunicações da Recorrida à DSE, foram sempre no sentido do objecto do estudo do pedido ser a caducidade parcial da marca e nunca a total (documento 2, documento 3 e documento 4 junto com o Recurso Judicial). Por esse motivo, a Recorrida não se debruçou sobre a declaração de caducidade da marca relativamente aos serviços que não estavam compreendidos no âmbito do pedido de declaração de caducidade parcial. E não o fez porque a DSE, nas comunicações com a Recorrida, omitiu esses serviços do âmbito do pedido de declaração de caducidade e, portanto, não concedeu qualquer oportunidade à Recorrida para sobre ela se pronunciar, aduzindo prova de uso da marca.
    A Recorrida foi surpreendida pelo teor do Ofício n.º 60833/DPI, de 1 de Agosto de 2012, com a decisão da DSE declarando a caducidade total do registo da marca (apesar da Informação n.º 201/DPI, de 6 de Julho de 2012 - onde foi exarado o despacho da Chefe de Departamento da Propriedade Industrial Substituto - ter como assunto o "Pedido de declaração de caducidade parcial da Marca N/XXX"), "nos termos da alínea b) do n.º l do artigo 231.º do RJPL aprovado pelo Decreto-Lei n.ºs 97/99/M, de 13 de Dezembro, tendo o respectivo aviso sido publicado no B.O. da RAEM n.º 31, Série II, de 1 de Agosto de 2012”, elencando todos os serviços assinalados pela marca na classe 42" (documento 5 junto com o Recurso Judicial).
    A verdade é que se a Recorrida tivesse sido notificada pela DSE, no Ofício acima referido, de que a declaração de caducidade da marca que se tinha em vista era total, poderia ter demonstrado que, relativamente aos serviços que não constam do pedido de declaração de caducidade parcial, a Recorrida fizera uma utilização séria da marca há menos de três anos consecutivos, como mais a frente se falará.
    Limitemo-nos então ao objecto do recurso: o excesso de pronúncia por parte da Administração ao ter decidido pela caducidade total da marca por falta de uso, quando o que foi pedido pelo Recorrente foi somente a caducidade parcial. Note-se que até o próprio Recorrente, ao dar iniciativa ao processo de caducidade de marca, apenas requereu a caducidade parcial da mesma, pois que tinha plena noção de que a Recorrida fazia um uso efectivo da marca relativamente aos serviços excluídos do pedido.
    E estamos perante um excesso de pronúncia no sentido de que o sistema de declaração de caducidade por falta de uso do Regime Jurídico da Propriedade Industrial (doravante RJPI) se pauta pelo Princípio da Instância, ou seja, o processo que decidirá da caducidade, ou não, da marca, por falta de uso, só se inicia a pedido de terceiros interessados. Senão vejam-se os artigos:

Artigo 52º
(Pedidos de declaração de caducidade)
    1. Os pedidos de declaração de caducidade são apresentados na DSE.
    (…)
    2. Salvo quando o fundamento for a renúncia, o titular do registo é notificado do pedido de declaração de caducidade para responder, querendo, no prazo de 2 meses.
Artigo 232.º
(Utilização séria da marca)
    (…)
    4. O início ou reinício da utilização séria nos 3 meses imediatamente anteriores à apresentação de um pedido de caducidade. contados a partir do fim do período ininterrupto de 3 anos de não utilização, não é tomado em consideração se as diligências para o início ou reinício da utilização só ocorrerem depois do titular tomar conhecimento de que pode vir a ser requerido esse pedido de caducidade.
    (...)
    Parece claro que nestes artigos menciona-se a invocação da causa da caducidade e o pedido de caducidade. Neste caso, o terceiro interessado, agora Recorrente, requereu à DSE a caducidade parcial da marca N/XXX, sendo sobre esse pedido que a DSE deveria iniciar o processo e tomar uma decisão. No entanto tal não aconteceu: se a DSE sempre tratou o objecto em estudo como referente a serviços de hotel e motel; fornecimentos de acomodações temporárias; fornecimentos de serviços de hospedagem e quartos; serviços de reservas de pensões; fornecimentos de serviços de salão de beleza, banhos de sauna e salões de massagem; serviços de limpeza e higiene quotidianos; serviços de empregadas; cabeleireiros, barbearia, fornecimento de equipamentos para conferências; serviços de refeitórios, casas de chá, cantinas de autos - serviço; casas de mercearia finas e padarias, ao decidir, não se confinou ao pedido, decidindo declarar a caducidade total da marca, incluindo para os serviços de cafés, bares de café, refeitórios pequenos, restaurantes temporários, "snack-bar" e refeitórios pequenos de sandwiches, restaurantes de auto-serviços e restaurantes de refeições rápidas e serviços de "catering" para banquetes, sobre os quais nada foi requerido, agindo em excesso de pronúncia, o que violou o disposto nos artigos 51.º, 52.º, 231.º e 232.º do RJPI.
    Mais: não se percebe o porquê do Recorrente vir alegar que a caducidade é de conhecimento oficioso aplicando-se o artigo 325.º do Código Civil quando, para além do já supra referido sobre o pedido de declaração de caducidade para se dar início ao processo, o próprio RJPI contém disposições especiais aplicáveis a este caso concreto, como acima visto também. Portanto, segundo o Princípio da Especialidade, se há um regime especial, não se aplica o regime geral (artigo 6.º, n.º 3 do Código Civil). Para o presente caso existe lei especial que regula os Direitos de Propriedade Industrial, nomeadamente o RJPI, com disposições expressas sobre o regime da caducidade por falta de uso.
    De resto, a caducidade não é um vício que afecte a marca registada de forma inexorável. Pelo contrário, a lei dispõe que a marca, mesmo quando não tenha sido usada durante 3 anos consecutivos, pode ainda ser salva se depois de decorrido esse prazo for objecto de uma utilização séria [n.º 4 do artigo 232.º do RJPI). Isto é, a caducidade por falta de uso, para além de não ser automática, conforme resulta claro do disposto no artigo 51.º do RJPI, é ainda sanável. Tudo isto milita contra a inclusão desta específica caducidade num género mais vasto, na qual o Recorrente a pretende integrar, que seguiria o regime geral da caducidade o Código Civil ou, sequer, outras caducidades previstas no RJPI.
    Sobre o tema escreve lapidarmente Couto Gonçalves: "Este regime jurídico da caducidade do registo da marca previsto no CPI não corresponde, como é bom de ver, inteiramente, ao conceito civilista de caducidade, pois não actua automaticamente ou de pleno direito. O direito de marca não se extingue até que o registo seja declarado caducado, após um processo administrativo cujos termos correm, não oficiosamente. no Instituto Nacional da Propriedade Industrial" (Manual de Direito Industrial, 2005, pág. 319, sublinhado nosso).
    Outro ponto alegado pelo Recorrente e que não se entende é o facto de afirmar que os particulares têm pouco poder de intervenção no presente regime, quando na verdade têm à disposição toda possibilidade de interferirem e iniciarem os próprios processos. Fazemos nossas as palavras do digníssimo Tribunal a quo ao dizer que "analisando globalmente o regime vigente, a questão da caducidade de marca resultante da falta de utilização é verdadeiramente dirigida pelo interessado, pois a protecção até nova utilização da marca visa proteger interesses particulares, nomeadamente os dos outros concorrentes da indústria, sendo que a autoridade administrativa não é necessária."
    No que respeita ao n.º 4 do artigo 231º do RJPI, com o devido respeito, cremos que a interpretação do Recorrente também não é correcta. Mais uma vez, faz uma interpretação da lei no sentido de que a Administração é dona e senhora do procedimento, o que, como já referido, não é verdade, pelo menos no que respeita ao regime da caducidade por falta de uso. A interpretação feita pelo Recorrente é no sentido de que a Administração pode reduzir a sua apreciação a um cancelamento parcial, quando foi solicitado o cancelamento total. Ora a lei é muito clara e não nos parece que seja essa a intenção do legislador. Parece sim que, ao invés de estar perante uma norma permissiva, estaremos perante uma norma imperativa: "quando existam motivos para a caducidade de registo de uma marca apenas no que respeita a alguns dos produtos ou serviços para que este foi efectuado, a caducidade abrange apenas esses produtos ou serviços." Não é dado qualquer poder à Administração de escolher, ou não, reduzir o objecto do pedido. A norma é clara: a caducidade abrange apenas esses produtos ou serviços sobre os quais existe motivo de caducidade, ou seja, os produtos ou serviços em relação aos quais se não fez prova de uso.
    C - Da caducidade no sistema português
    O Recorrente faz sobre o regime vigente em Portugal observações totalmente descontextualizadas, com referências a um regime que foi já revogado há aproximadamente 6 anos. O Recorrente sabe certamente que as normas legais que previam a chamada Declaração de Intenção de Uso (conhecida por DIU) são coisa do passado, suprimida pelo Decreto-Lei n.º 143/2008, de 25 de Julho, no culminar de uma batalha travada com instâncias internacionais e europeias que se opunham à prática de uma formalidade que não tinha acolhimento, designadamente, na Directiva Comunitária sobre marcas (Directiva 2008/95/EC) e, sobretudo, por não ter guarida no Acordo TRIPS/ADPIC.
    Na vigência do regime anterior, a apresentação da DIU servia para constituir uma presunção de uso da marca, o que obrigava a que qualquer interessado na caducidade do registo tivesse de, ele próprio, aduzir prova de falta de uso, com todos os consequentes inconvenientes associados à prova de um facto negativo. Na falta de apresentação tempestiva da DIU, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) não procedia, ainda assim, à declaração de caducidade, pois que a falta de apresentação de DIU não tinha a consequência inversa de presunção de não-uso. O que sucedia era que a marca em relação à qual não fora apresentada a DIU não podia ser invocada como fundamento de oposição contra o registo de marca ulterior e, caso constituísse obstáculo à concessão de novos direitos, seria declarada caducada. Mesmo assim a situação podia ser sanada se se fizesse prova de uso.
    O regime português actual é idêntico ao de Macau, conforme resulta dos actuais artigos 269.º e 270.º do Código da Propriedade Industrial. A esse respeito, anota-se no Código da Propriedade Industrial anotado, sob coordenação de António Campinos e Luís Couto Gonçalves: "Diversamente do que sucede relativamente à nulidade e anulabilidade (vide n.º 1 do artigo 35.º), a extinção dos registos por caducidade não resulta de decisão judicial (excepto em sede de recurso), mas sim de despacho do INPI, após processo desencadeado para o efeito por qualquer interessado (salvo nos casos indicados no artigo 37.º, em que a caducidade opera independentemente de invocação" (pág. 511) e "A caducidade pode ser automática, nos casos em que resulta do decurso do prazo de duração do direito ou da falta de pagamento pelo titular das taxas relativas à sua aquisição ou manutenção (alíneas a) e b) deste artigo [37.º]) ou declarada pelo INPI, sempre que ocorra na sequência de um pedido por qualquer interessado (n.º 2 deste artigo)" (pág. 154).
    No contexto europeu, em que assenta a legislação de Macau, é esta a solução natural, que o legislador comunitário adoptou também para a Marca Comunitária, quando, no artigo 51.º do Regulamento (EC) 207/2009, sob a epígrafe "Causas de Extinção", estabelece que:
    "1. Será declarada a perda dos direitos do titular da marca comunitária, na sequência de pedido apresentado ao Instituto ou de pedido reconvencional em acção de contrafacção:
    a) Quando, durante um período ininterrupto de cinco anos, a marca não seja objecto de utilização séria na Comunidade em relação aos produtos ou serviços para que foi registada e se não existirem motivos justos para a sua não utilização; todavia, ninguém poderá alegar a extinção dos direitos do titular se, entre o termo desse período e a apresentação do pedido ou do pedido reconvencional, a marca tiver sido objecto de um início ou reinício de utilização séria; no entanto, o início ou reinício da utilização durante o período de três meses anterior à apresentação do pedido ou do pedido reconvencional, desde que esse período não tenha sido iniciado antes do termo do periodo ininterrupto de cinco anos de não utilização, não será tido em consideração se os preparativos para o inicio ou reinicio da utilização apenas começarem depois de o titular ter tido conhecimento da possibilidade de vir a ser apresentado o pedido ou o pedido reconvencional",
    É certo que outras jurisdições haverá onde a caducidade será declarada oficiosamente; não é esse, de todo, o regime vigente em Macau, tal como não é esse o regime vigente em Portugal e na Europa.
    D - Da tempestividade da decisão
    No que respeita à tempestividade da decisão, volta o Recorrente a socorrer-se do regime plasmado na Lei Civil, quando estamos perante um ramo do Direito com normas próprias.
    O Recorrente refere ainda um Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, sobre o qual não nos podemos pronunciar, pelo simples facto de que parece estar transcrito apenas o sumário, não sendo possível localizar o texto completo do aresto ou a fonte da qual foi extraído.
    De todo o modo, face ao sumário que o Recorrente tem a bondade de disponibilizar, fica a Recorrida boquiaberta com a invocação de tal doutrina por parte do Recorrente. Como se viu já, o próprio RJPI (e o CPI português) fixam conteúdos diferentes à caducidade conforme a causa que lhe dá origem. No caso do sumário transcrito pelo Recorrente estará em causa uma caducidade por falta de uso? Claramente que não. Está em causa, isso sim, uma disposição do CPI de 1940 que apenas permitia a utilização de língua estrangeira em marcas detidas por nacionais quando a marca se destinasse, exclusivamente, a produtos de exportação (na altura não havia marcas de serviços). Tratava-se de disposição há muito anacrónica mas que tem, ainda, expressão no artigo 198.º do RJPI. Ora, o conhecimento oficioso de determinadas caducidades não é negado, ele existe, designadamente, quando não sejam pagas taxas ou quando tenha decorrido o prazo de protecção. Mas não em relação a outras caducidades, como o caso, já bastam ente justificado e fundamentado, da falta de uso.
    Alega ainda o Recorrente que a Recorrida confirmou que a marca nunca tinha sido utilizada para qualquer item de especificação. Tal facto nunca sucedeu. O que sucedeu foi que todas as comunicações feitas pela DSE foram sempre no sentido do cancelamento parcial da marca, uma vez que isso mesmo foi o que a Recorrente pediu. A DSE decidiu da caducidade sem dar oportunidade à Recorrida de se pronunciar sobre o uso da marca na vertente dos serviços de cafés, bares de café, refeitórios pequenos, restaurantes temporários, "snack-bar" e refeitórios pequenos de sandwiches, restaurantes de auto-serviços e restaurantes de refeições rápidas e serviços de "catering" para banquetes. Se a Administração, mesmo em excesso de pronúncia, tivesse cumprido o Princípio do Contraditório, a Recorrida teria demonstrado que o uso da marca relativamente a esses serviços por não por falhar o pressuposto previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 231.º do RJPI: tia falta de utilização séria durante 3 anos consecutivos".
    E - Demais fundamentos do recurso
    Com todo o devido respeito, a restante matéria alegada pelo Recorrente não pertence a este recurso e não é relevante para a decisão, pelo que não vai a Recorrida ocupar páginas para a rebater.
    Nestes termos, deve o recurso apresentado ser julgado improcedente, confirmando-se na íntegra a sentença recorrida.
    Foram colhidos os vistos legais.
    II - FACTOS
    Vêm provados os factos seguintes
   A. O supracitado pedido foi publicado no Boletim Oficial de Macau, n.º44, II Série, de 3/11/2005.
   B. Através do despacho proferido pelo Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual, publicado no Boletim Oficial de Macau, n.º5, II Série, de 2/2/2006, à recorrente foi concedido o registo da marca N/XXX.
   C. Em 2/3/2009, o interessado A apresentou junto da Direcção dos Serviços de Economia um pedido de declaração de caducidade parcial da marca N/XXX, sob pretexto de não uso sério da referida marca por parte da recorrente durante três anos consecutivos respeitante aos serviços seguintes: Serviços de hotéis e motéis; fornecimento de acomodações temporárias; fornecimento de serviços de hospedagem e quartos; serviços de reservas de pensões; fornecimento de serviços de salão de beleza, banhos de sauna e salões de massagem; serviços de limpeza e higiene quotidianos; serviços de empregadas; cabeleireiros, barbearia, fornecimento de equipamentos para conferências; serviços de refeitórios; casas de chá; cantinas de auto-serviço; restaurantes de auto-serviços; casas de mercearias finas e padarias.
   D. No supracitado pedido, o interessado A não pediu a declaração de caducidade parcial da marca respeitante aos serviços de cafés, bares de café, refeitórios pequenos, restaurantes temporários, “snack-bar” e refeitórios pequenos de sanduíches e restaurantes de refeições rápidas e serviços de “catering” para banquetes.
   E. A Direcção dos Serviços de Economia, através do ofício datado de 3/5/2012, notificou a recorrente para dar resposta dentro do prazo de dois meses ao pedido de declaração de caducidade parcial da marca (vd. processo administrativo, fls.280)
   F. Tendo a recorrente apresentado a resposta, em 28/6/2012 e 4/7/2012, respectivamente (cujos conteúdos constam de fls. 283 e 284, 294 a 298 do processo administrativo e aqui se dão por integralmente reproduzidos).
   G. Ao mesmo tempo, o recorrente também apresentou os documentos constantes de fls. 285 a 292 do processo administrativo (cujos conteúdos aqui se dão por integralmente reproduzidos)
   H. A Direcção dos Serviços de Economia, em 10/7/2012, proferiu a decisão de declaração de caducidade da marca N/XXX.
   I. A supracitada decisão foi publicada no Boletim Oficial de Macau, n.º31, II Série, de 1/8/2012.
   J. Em 9/11/2007, o interessado A, junto do 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, apresentou uma acção contra a recorrente pedindo a anulação da marca N/XXX (processo n.ºCV1-07-0069-CAO).
   K. O supracitado pedido foi rejeitado pelo Tribunal de primeira instância. Contudo, inconformado, o interessado recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, tendo esse Tribunal mantido a decisão do Tribunal a quo. Tal decisão transitou em julgado em 27/3/2012.
   L. Em 26/11/2009, para efeitos de contribuição industrial, a recorrente, junto da Direcção dos Serviços de Finanças, apresentou a declaração de cancelamento do estabelecimento “Trump Refeições Rápidas” (M/1)
    
    III - FUNDAMENTOS
    1. O que está em causa no presente recurso é, no fundo, saber se a caducidade do registo de marca por uso não sério é de conhecimento oficioso.
    Fora formulado o pedido de cancelamento do registo da marca N/1859, por parte do interessado Donald J.Trump, registo a favor de B Limitada, em relação a alguns dos serviços incluídos na classe 42º e a Direcção dos Serviços de Economia decidiu-se pelo cancelamento em relação a todos os serviços daquela classe.
     2. As linhas-força da argumentação do recorrente são as seguintes:
    - Sendo a DSE uma entidade administrativa que zela pelo interesse público no registo de Propriedade Intelectual, nomeadamente pelos valores da concorrência leal e da protecção da propriedade intelectual, não há excesso de pronúncia quando se visa salvaguardar esses valores;
    - A Administração Pública, na condução de processos administrativos, rege-se segundo o Código do Procedimento Administrativo o qual no seu art. 59.° dispõe que a Administração não só pode debruçar-se sobre "matérias não mencionadas nos requerimentos", como ainda "decidir coisa diferente ou mais ampla do que a pedida";
    - A actuação de uma entidade administrativa pode constituir uma violação da lei pela não aplicação da mesma - em particular o art. 231.° n.º 1, alínea b) do Regime Jurídico da Propriedade Intelectual ("RJPI"), que determina a caducidade de uma marca após a não utilização séria durante 3 anos consecutivos;
    - A caducidade neste caso é de conhecimento oficioso, como resulta do art. 315.° do Código Civil;
    - O regime existente em Portugal é bastante diferente do de Macau, concedendo maior importância à intervenção dos particulares (pelo mecanismo do DIU, declaração de intenção de uso da marca) e invertendo o ónus da prova, obrigando os contra-interessados a ilidir essa presunção. Não obstante estas diferenças, o regime vigente em Portugal não limita ou cerceia os poderes da Administração em declarar oficiosamente a caducidade;
    - O regime da caducidade por não uso prossegue eminentemente um interesse público, que não está sujeito à disponibilidade das partes;
    - O entendimento de que só existe conhecimento oficioso para as causas de caducidade que operam "automaticamente" está errada e desconforme à lei. Sempre que os factos em apreciação pela Administração demonstram que há um não uso total da marca, não resta senão (a uma entidade que zela pelo interesse público) declarar a caducidade total da mesma.
    
    3. O regime da caducidade do registo por uso não sério
    Importa apreciar qual o regime da caducidade do registo por uso não sério consagrado no RJPI.
    O artigo 315° do Código Civil dispõe :"A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes" e ainda dos artigos 51.° e 231.° do RJPI.
    O Regime Jurídico da Propriedade Industrial, dispõe no seu art.º 231.º, n.º1, al. b) que o registo de marca caduca pela falta de utilização séria durante 3 anos consecutivos, salvo justo motivo.
    O mesmo Regime Jurídico da Propriedade Industrial, em sede de extinção dos direitos de propriedade industrial, dispõe no art.º 51.º, n.º 3 , que
    
    “1. Os direitos de propriedade industrial caducam:
    a) Expirado o seu prazo de duração;
    b) Por falta de pagamento das taxas devidas;
    c) Por renúncia do titular.
    2. As causas de caducidade previstas nas alíneas a) e b) do número anterior operam automaticamente e são independentes de publicação.
    3. A causa geral de caducidade prevista na alínea c) do número anterior e as restantes causas específicas de caducidade previstas no presente diploma não operam automaticamente, mas podem ser invocadas por qualquer interessado em juízo ou fora dele.
    4. Pode igualmente qualquer interessado requerer o averbamento da caducidade relativa a causas que operem automaticamente, se este não tiver sido feito.”
     Nos termos do art.º 52.º, n.º1 do referido regime jurídico, os pedidos de declaração de caducidade são apresentados na DSE e seguem um processo próprio.
     A propósito da caducidade do registo da marca aí se estabelece:
    “1. O registo de marca caduca:
    a) Nos casos previstos no n.º 1 do artigo 51.º;
    b) Pela falta de utilização séria durante 3 anos consecutivos, salvo justo motivo;
    c) Se sofrer alteração que prejudique a sua identidade.
    2. O registo da marca caduca ainda se, após a data em que o mesmo foi efectuado:
    a) A marca se tiver transformado na designação usual no comércio do produto ou serviço para que foi registada, como consequência da actividade ou inactividade do titular;
    b) A marca se tornar susceptível de induzir o público em erro, nomeadamente acerca da natureza, qualidade e origem geográfica desses produtos ou serviços, no seguimento da utilização feita pelo titular da marca ou por terceiro, com o seu consentimento, para os produtos ou serviços para que foi registada;
    c) A marca for utilizada em Macau, nos casos em que a mesma tiver sido registada somente para exportação.
    3. Deve ser declarada a caducidade do registo da marca colectiva:
    a) Se deixar de existir a pessoa colectiva a favor da qual a marca foi registada, salvo os casos de fusão ou cisão;
    b) Se a pessoa colectiva a favor da qual a marca foi registada consentir que esta seja utilizada de modo contrário aos seus fins gerais ou às prescrições estatutárias.
    4. Quando existam motivos para a caducidade de registo de uma marca apenas no que respeita a alguns dos produtos ou serviços para que este foi efectuado, a caducidade abrange apenas esses produtos ou serviços.
    5. Sem prejuízo do disposto nos n.º os 2 e 4 do artigo 51.º, as causas de caducidade especificadas no presente artigo podem ser invocadas por qualquer interessado, em juízo ou fora dele.”
    
    Além disso, prevê o artigo 232.º:
    “1. É considerada utilização séria da marca:
    a) A utilização da marca tal como está registada ou que dela não difira senão em elementos que não alterem o seu carácter distintivo, nos termos do presente diploma, feita pelo titular do registo ou por seu licenciado devidamente inscrito;
    b) A utilização da marca, tal como definida na alínea anterior, para produtos ou serviços destinados apenas a exportação;
    c) A utilização da marca por um terceiro, desde que sob o controlo do titular e para efeitos da manutenção do registo.
    2. A utilização séria da marca de associação afere-se por aqueles que dela fazem uso com o consentimento do titular.
    3. A utilização séria da marca de certificação afere-se pelas pessoas habilitadas para dela fazerem uso.
    4. O início ou reinício da utilização séria nos 3 meses imediatamente anteriores à apresentação de um pedido de caducidade, contados a partir do fim do período ininterrupto de 3 anos de não utilização, não é tomado em consideração se as diligências para o início ou reinício da utilização só ocorrerem depois do titular tomar conhecimento de que pode vir a ser requerido esse pedido de caducidade.
    5. Cumpre ao titular do registo ou a seu licenciado, se o houver, provar a utilização da marca, sem o que esta se presume não utilizada.”
    
    4. O que dizer deste acervo normativo?
    À primeira vista parece claro daí resultar que a declaração de caducidade da marca por falta do uso deve ser efectuada a pedido do interessado.
    Há todo um processo e formalismo ligado ao pedido de caducidade do registo de marcas que se afiguraria desnecessário se essa causa de caducidade pudesse ser oficiosamente, a qualquer tempo e por qualquer modo, conhecida pela autoridade administrativa.
    Por outro lado, a norma do n.º 3 do artigo 51º é muito clara ao dizer que as causas específicas de caducidade previstas no presente diploma não operam automaticamente, mas podem ser invocadas por qualquer interessado em juízo ou fora dele. Pretende-se não ver aí um argumento decisivo, porquanto o que estaria em causa era a produção de efeitos de forma automática e a possibilidade de arguição pelos interessados não excluiria a intervenção oficiosa na declaração de caducidade. Não nos parece que assim seja, pois não faria sentido, sob pena de excrescente a referência à invocação da caducidade por qualquer interessado, se essa intervenção não se traduzisse numa necessidade, tanto mais que a lei regula de uma forma própria a formulação dos pedidos de caducidade no artigo 52º, fazendo depender prorrogações do prazo de resposta do consentimento da parte contrária, o que não se compagina com uma concepção oficiosa da declaração oficiosa da caducidade do registo.
    
    Se é certo que a caducidade automática que, nos termos do art.º 51.º, n.º 2 do RJPI, ocorre pelo decurso do prazo ou por falta de pagamento das taxas devidas, não se reconduz à questão da sua apreciação oficiosa, na medida em que, por causa dessa via de extinção do direito, ela opera por força da lei, isso não implica que, nesses casos ou nos restantes, se imponha ou se exclua necessariamente tal conhecimento oficioso.
    Há que procurar então o regime aplicável, em particular, em relação à caducidade que está em causa, que é a da extinção do direito por falta de utilização séria por um período de 3 anos consecutivos.
    Ora aí o que se observa é que a lei concede tolerância e impõe condicionantes que não se compaginam com a interpretação que concede à entidade administrativa a faculdade de cancelar um registo sem que tal lhe seja pedido, passado esse período de 3 anos. É o que se passa com a previsão do n.º 4 do artigo 232º do RJPI em que se faculta o início ou reinício de uma utilização séria nos três meses após esse período de não utilização por 3 anos, se o titular inscrito desconhecesse a interposição do pedido de cancelamento. Isto contraria a possibilidade de intervenção da DSE, logo após os 3 anos, na medida em que cercearia aquela possibilidade de início ou reinício.
    Por outro lado, parece que aí se se permite o início ou reinício de actividade nos três meses antes do pedido é porque se tolera o consentimento do interessado opositor naquela actividade, não obstante a inactividade por 3 anos consecutivos.
    Acresce que a lei, ao falar de reinício e em três anos consecutivos, tal significa que o titular do registo desenvolveu a actividade e, depois de estar parado por 3 anos consecutivos, teve possibilidade de a reiniciar, reinício esse que pode ser relevante em termos de efeitos jurídicos de manutenção de uma situação jurídica que, de outra forma, teria de ter caducado.
    A redacção da lei e a sua articulação inculcam no sentido de que a caducidade do registo da marca por utilização não séria por um certo período está dependente da iniciativa dos interessados.
    Tanto assim que o averbamento da caducidade no registo só é efectuado a requerimento dos interessados (artigo 58º do RJPI, por referência ao artigo 57º, n.º 1, c)), exceptuando-se a possibilidade de averbamento oficioso pela DSE nos casos do n.º4 daquele art. 58º, casos que não contemplam a caducidade.
    Para já não falar - argumento meramente marginal – que, a não se entender assim, impor-se-ia à Administração um ónus pesado e de difícil concretização quanto ao apuramento dessa causa de caducidade em todos os registos de marca, passe o facto, que se concede, de essa dificuldade poder não se traduzir num impedimento para a consagração do regime. Tanto mais que, nos termos do art.º 232.º, n.º 5 do mesmo diploma, cumpre ao titular do registo ou a seu licenciado, se o houver, provar a utilização da marca, sem o que esta se presume não utilizada, donde decorre que se imporia que, na generalidade dos casos, se impusesse a prova, decorridos os 3 anos do registo, ficando-se sem saber, a partir daí, de quanto em quanto tempo essa prova deveria ser feita, bastando pensar, exemplificativamente, que o titular do registo podia ter cessado a actividade ao fim do primeiro ano, só vindo a caducar o direito ao fim do quarto.
    
    5. Posto isto, argumentação que se extrai do texto e articulação das normas, vamos analisar outro tipo de fundamentos que possam sustentar esta interpretação, na certeza de que esta não se deve ater apenas à letra da lei mas reconstituir, a partir dos textos, o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada - artigo 8º, n.º 1 do Código Civil.
    Para tanto, vamos tentar rebater os argumentos doutamente alinhados pelo recorrente.
    
    6. Interesse público prosseguido pela DSE
    Estando em causa valores de salvaguarda da concorrência, transparência e defesa do consumidor, a questão assumiria contornos de salvaguarda do interesse público e, como assim, à Administração competiria intervir oficiosamente e cancelar um registo sempre que verificasse que ocorriam os respectivos pressupostos.
    Estaríamos, se assim fosse, perante uma perspectiva redutora, interventora e tutelar de toda a actividade económica desenvolvida, na linha de uma concepção de Estado de Polícia e não já Estado-Polícia, reconduzindo toda a actividade económica privada à necessidade de hetero-regulação.
    Não se escamoteia o facto de aqueles valores prosseguidos pelo registo e regulação do exercício e extinção dos direitos daí decorrentes conterem ainda uma componente de interesse público, só que esse interesse público não deixa de se configurar como um interesse indirecto, reflexo, mediato, em função da concertação dos interesses particulares, imediatos, concretos, dos diferentes interessados que disputam no terreno uma determinada marca.
    O titular da marca registada adquire o direito de a usar, em exclusivo, para os produtos ou serviços da actividade económica ou profissional indicados no respectivo registo, pelo que outras marcas escolhidas por terceiros têm que ser distintas desta e não confundíveis para os mesmos ou semelhantes produtos ou serviços.
     O registo tem eficácia constitutiva e confere ao titular um direito exclusivo.
    Há que distinguir valores e interesses prosseguidos pelo Direito da Propriedade Industrial dos valores e interesses prosseguidos pelo registo das marcas.
    Esta distinção está bem assinalada no artigo 1º do RJPI, enquanto aí se diz que “O presente diploma regula a atribuição de direitos de propriedade industrial sobre as invenções e sobre as demais criações e os sinais distintivos nele previstos, tendo em vista, designadamente, assegurar a protecção da criatividade e do desenvolvimento tecnológicos, da lealdade da concorrência e dos interesses dos consumidores”, ao passo que o registo da propriedade industrial é assegurado pela DSE, tem “por finalidade proporcionar o conhecimento, a todo o tempo, dos direitos de propriedade industrial concedidos, bem como dos actos que os modificaram ou extinguiram.”
    Nesta linha, assinala Couto Gonçalves, “Com o registo, a marca torna-se um bem jurídico autonomamente protegido sendo atribuído ao respectivo titular um direito absoluto. O registo opera pois o acertamento de um bem incorpóreo, exteriorizado por um facto humano, e culmina um longo processo de constituição complexa de um direito. Fora do registo não há direito de marca. Sobre a marca de facto o único direito que existe é o direito de prioridade ao registo dentro do prazo de seis meses. E sendo certo que possa ser protegida para além desse prazo (e mesmo depois do registo de outro direito conflituante) no âmbito das normas punitivas da concorrência desleal, o que então se protegerá não será, em rigor o direito da marca.”1
    O n.º 1 do artigo 1227º do Código Civil, embora declare que os direitos de propriedade industrial sujeitos a legislação especial, dispõe, no seu n.º 2, que são subsidiariamente aplicáveis a tais direitos as disposições do Código, quando se harmonizem com a natureza desses direitos e não contrariem o regime para eles especialmente estabelecido.
A intervenção de um órgão da Administração, a DSE, não visa aí a satisfação concreta de necessidades colectivas, antes, se produz, apenas, "numa relação jurídica privada e, por isso, essa intervenção não contende com interesses públicos secundários, quando muito com o interesse da "paz jurídica" e da "justa composição concreta de conflitos de interesses" alheios à Administração. Daí que há quem entenda que «esses actos, que integram aquilo que se denomina a "Administração Pública dos direitos ou interesses privados" não são actos administrativos, porque o órgão estadual não define os direitos ou deveres do Estado no confronto de outros sujeitos de direitos, limita-se a criar ou a reconhecer direitos e deveres de um particular perante um ou outros; a Administração não é parte na relação jurídica... e, portanto, a sua intervenção não se consubstancia na prática de actos administrativos».2
    Em face do exposto, não é difícil concluir que o interesse que primeiramente releva no registo da propriedade intelectual é o conhecimento e o reconhecimento dos direitos e da tutela da sua titularidade e exercício, donde bem se poder entender que, também por essa razão, nos situamos em matéria não excluída da disponibilidade das partes .
    
    7. Comparação com o regime em termos de Direito Comparado
    Trata-se de apurar qual o regime em Portugal, já que foi essa legislação que serviu de matriz à legislação vigente na RAEM quanto a esta matéria.
    Importa salientar que o regime em Portugal, ainda que divergente do que vigora entre nós, é ainda regulado pelo Direito Comunitário, mas neste particular domínio, das causas extintivas dos direitos de propriedade industrial, mantém-se alguma semelhança com o nosso regime.
    Com o Código da Propriedade Industrial aprovado pelo Dec-Lei 16/95, de 24 Janeiro, não só se reviu o CPI de 1940, como se transpôs para a ordem interna portuguesa legislação comunitária, a Directiva nº 89/104/CEE, de 21 de Dezembro de 1989.

     O Código da Propriedade Industrial de Portugal aprovado pelo D.L n.º16/95, de 24 de Janeiro que previa no art. 195.º que, de cinco em cinco anos, devia ser apresentada no organismo respectivo uma declaração de intenção de uso da marca, foi estendido e aplicado em Macau.
     O Dec.-Lei n.º 176/80 introduzira alterações ao nível da caducidade das marcas. A razão de ser de tais alterações constam no preâmbulo do diploma, que se transcreve: “A efectivação da caducidade por falta de uso da marca é uma exigência de todas as legislações, incluindo a portuguesa, mas que tem sido entre nós inoperante e que manifestamente convém tornar eficaz. Assim, será possível considerar caducos muitos registos de marcas que nos chegam do estrangeiro, que não têm sido aplicados em Portugal e que, por isso mesmo, constituem, sem qualquer utilidade prática, um impedimento para novos registos.”
O artigo 1º do diploma estipulava que “de cinco em cinco anos, salvo quando forem devidas as taxas relativas à renovação do registo, os titulares dos registos de marcas deverão apresentar uma declaração de uso da sua marca, sem a qual esta se presumirá não usada”. Porém, declarada a caducidade, “a partir da publicação do aviso de caducidade por falta de declaração de intenção de uso, o titular do registo terá o prazo de um ano para pedir a revalidação do registo fazendo prova do uso da marca.” (art.º 2.º do diploma).
A obrigatoriedade do uso da marca foi expressamente consagrada, ao nível comunitário, na Directiva do Conselho, de 21.12.1988 (89/104/CEE), que visou a harmonização das legislações do Estados-membros em matéria de marcas. No respectivo artigo 10.º n.º 1 determinou-se que “se, num prazo de cinco anos a contar da data do encerramento do processo do registo, a marca não tiver sido objecto de uso sério pelo seu titular, no Estado-membro em questão, para os produtos ou serviços para que foi registada, ou se tal uso tiver sido suspenso durante um período ininterrupto de cinco anos, a marca fica sujeita às sanções previstas na presente directiva, salvo justo motivo para a falta de uso.”
No art.º 12.º da Directiva, sob a epígrafe “motivos de caducidade”, estipulou-se, no n.º 1, o seguinte:
“O registo de uma marca fica passível de caducidade se, durante um período ininterrupto de cinco anos, não tiver sido objecto de uso sério no Estado-membro em causa para os produtos ou serviços para que foi registada e se não existirem motivos justos para o seu não uso …”
O Código de Propriedade Industrial aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16/95, de 24 de Janeiro, integrou no seu seio normas destinadas a cumprir a aludida Directiva (cfr. art.º 216.º).
Também o actual CPI tem em conta o aludido instrumento comunitário.
Assim, no n.º 1 do art.º 269.º estipula-se que “a caducidade do registo deve ser declarada se a marca não tiver sido objecto de uso sério durante cinco anos consecutivos, salvo justo motivo e sem prejuízo do disposto no n.º 4 e no artigo 268.º”
O n.º 4 do art.º 269.º estabelece que “o registo não caduca se, antes de requerida a declaração de caducidade, já tiver sido iniciado ou reatado o uso sério da marca, sem prejuízo do que se dispõe no n.º 4 do artigo anterior.”
O n.º 4 do art.º 268.º dispõe que “o início ou o reatamento do uso sério nos três meses imediatamente anteriores à apresentação de um pedido de declaração de caducidade, contados a partir do fim do período ininterrupto de cinco anos de não uso, não é, contudo, tomado em consideração se as diligências para o início ou reatamento do uso só ocorrerem depois de o titular tomar conhecimento de que pode vir a ser efectuado esse pedido de declaração de caducidade.”
A falta da referida declaração terá como efeito que a marca não será oponível a terceiro, “sendo declarada a caducidade do respectivo registo pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial, a requerimento de qualquer interessado, ou quando se verifique prejuízo de direitos de terceiros no momento da concessão de outros registos” (n.º 3 do art.º 256.º). Porém, “se não tiver sido pedida nem declarada a caducidade do registo, este é novamente considerado em pleno vigor desde que o titular faça prova de uso da marca” (n.º 4 do art.º 256.º).
No CPI de 1995 a obrigação de declaração de intenção de uso foi prevista em termos idênticos aos que passaram para o actual Código (art.º 195.º do CPI de 1995), com a diferença de que no CPI de 1995 se manteve a expressa menção, herdada do Dec.-Lei n.º 176/80, de que sem a falta de declaração de intenção de uso presumir-se-ia que esta não estava a ser usada. Por outro lado, tanto no CPI de 1995, como no de 2003, deixou de se prever, contrariamente ao que acontecia no Dec.-Lei n.º 176/80, a possibilidade de, no prazo de um ano a contar da “publicação do aviso de caducidade por falta de declaração de intenção de uso, o titular do registo (…) pedir a revalidação do registo fazendo prova do uso da marca.” (art.º 2.º do diploma).
Em todas as situações recairá sobre o titular do registo o ónus da prova do uso da marca. Com efeito, no nº 6 do art.º 270.º do CPI estabelece-se que, no âmbito do processo desencadeado pelo pedido de declaração de caducidade “cumpre ao titular do registo ou a seu licenciado, se o houver, provar o uso da marca, sem o que esta se presume não usada.” Estabelece-se, aqui, uma inversão do ónus da prova, que recai sobre o titular do registo ou o seu licenciado. A declaração de intenção de uso que gerava muitos problemas levou à revogação do artigo 256º pelo Dec.-lei 143/2008, clarificando um regime que se apresentava confuso.3
    A falta de uso sério da marca pelo período ininterrupto de cinco anos fundamenta a caducidade da marca, que pode ser suscitada por qualquer interessado.
Em situações em que o titular da marca não a usou durante cinco anos, é-lhe dada a possibilidade de obstar à caducidade do respectivo registo se demonstrar que havia reiniciado o seu uso sério antes da apresentação do requerimento de declaração de caducidade.
O n.º 3 do art.º 256.º do CPI de 2003 (assim como o n.º 3 do art.º 195.º do CPI de 1995) estipula que “as marcas para as quais essa declaração não foi apresentada não serão oponíveis a terceiro, sendo declarada a caducidade do respectivo registo pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial, a requerimento de qualquer interessado, ou quando se verifique prejuízo de direitos de terceiros no momento da concessão de outros registos”. E o n.º 4 do aludido artigo 256.º (assim como no n.º 4 do art.º 195.º do CPI de 1995) dispunha que “se não tiver sido pedida nem declarada a caducidade do registo, este é novamente considerado em pleno vigor desde que o titular faça prova de uso da marca”.
Ou seja, aparentemente o titular não poderia fazer prova de uso da marca, se a caducidade já tivesse sido pedida.4
    Com a referida alteração de 2008 as coisas clarificam-se e o regime aproxima-se do que se mostra consagrado entre nós, salvaguardando o prazo do não uso sério, e o que importa é que pelos diversos regimes sempre perpassa a necessidade da caducidade ter de ser desencadeada a pedido dos interessados.
    Aliás, é a própria Doutrina portuguesa, ao laborar sobre o respectivo regime que assim o diz. Os autores do referido Código de Propriedade Industrial assinalam que a decisão do INPI pode ser tomada após processo desencadeado por qualquer interessado,5 não deixando Couto Gonçalves de afirmar noutro passo, "Este regime jurídico da caducidade do registo da marca previsto no CPI não corresponde, como é bom de ver, inteiramente, ao conceito civilista de caducidade, pois não actua automaticamente ou de pleno direito. O direito de marca não se extingue até que o registo seja declarado caducado, após um processo administrativo cujos termos correm, não oficiosamente, no Instituto Nacional da Propriedade Industrial". 6
    
    8. Quanto à possibilidade de decidir coisa diferente ou mais ampla do que a pedida
    Sustenta o recorrente que a Administração Pública, na condução de processos administrativos, rege-se segundo o Código do Procedimento Administrativo que, no art. 59.°, dispõe que a Administração não só pode debruçar-se sobre "matérias não mencionadas nos requerimentos", como ainda "decidir coisa diferente ou mais ampla do que a pedida".
    Sobre esta linha argumentativa importa interpretar bem o alcance do artigo 59º do CPA, sob pena de se postergarem princípios por que se devem reger os órgãos administrativos, em particular o da decisão, plasmado no artigo 11º.
    Este conhecimento não pode ser ilimitado. Ele deve der produzido em respeito pela competência do órgão competente,7 devendo ser devidamente balanceado entre o princípio da decisão e o do inquisitório.8
    Ora, se concluímos no sentido de que esse conhecimento não é de iniciativa oficiosa por parte da Administração, deixa ela de ser competente para extravasar do pedido que lhe foi submetido.
    
    9. Por todas estas razões, considerando que as diferentes linhas de argumentação da recorrente se reconduzem aos vectores acima delineados e que fundamentam a decisão que vai no sentido de excluir do conhecimento oficioso a caducidade do registo pelo não uso ou pelo uso não sério de determinada marca, não se deixará de julgar improcedente o recurso, na convicção de que este ensaio não deixa de estar já implícito em douta decisão tomada nesta Instância, como se alcança do Proc. n. 282/2007, de 3/3/2011, enquanto ali se afirmou taxativamente: “A ser assim, buscando nesse diploma a norma adequada, seremos forçados a dizer que aquela caducidade não operaria automaticamente e, antes, carecia de um pedido nesse sentido e declarada em processo próprio (art. 36º, n. 4 e 216º, n.1. al. a), do CPI). Ora, ninguém requereu a caducidade. Logo, nenhuns efeitos se podem atribuir ao não uso durante aquele lapso de tempo e a eficácia do registo permaneceu, desse modo, intocada até 7/02/2003. É a segunda grande conclusão que se impõe.”
Reconduzindo-se o recurso apenas a estas questões, importa decidir.
    
    IV - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
    Custas pela recorrente.
Macau, 15 de Janeiro de 2015,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 - Manual de Dto Industrial, Almedina, 2005, 162
2 - Mário Esteves de Oliveira, Direito Administrativo, 1980, I, 392 e 393
3 - Código de Propriedade Industrial, Anotado, António Campinos , Couto Gonçalves e outros, 2010, 490
4 - Vd. Ac. do STJ, proc. n.º 02B2488, de 24.11.2002.
5 - ob. cit. 511; vd ainda Maria Cruz Garcia, em opinião postada sob As duas faces do uso, http://oje.pt/as-duas-faces-do-uso/: vd anot. de Jorge Cruz ao CPI, Lx, 2003, 709; embora, contra, Mota Maia, Propriedade Industrial, II, Almedina, 2005, 494 e 495, com referência aos casos de desistência do pedido de caducidade, no que é contrariado por Américo da Silva Carvalho, Dto de Marcas, Coimbra Editora, 2004, 558 que diz que nos casos de desistência do pedido de caducidade ela já não pode ser declarada pelo INPI.
6- Manual de Direito Industrial, Almedina, 2005, pág. 319
7 - Vd. Lino Ribeiro e José Cândido Pinho, CPA Anot. e Com., 1988, 378
8 - No mesmo sentido, Esteves de Oliveira, Costa Gonçalves e Pacheco Amorim, CPA Comentado, 2ª ed., Almedina, 2001, 310
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