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Processo nº 971/2012
(Reclamação para a conferência)

Data: 29/Janeiro/2015

Reclamente:
- A

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
A, melhor identificado nos autos, notificado do Acórdão proferido por este TSI que negou provimento ao recurso jurisdicional por si apresentado, deduziu recurso com fundamento em oposição de acórdãos, alegando que o Acórdão proferido no âmbito dos presentes autos está em oposição, sobre a mesma questão de direito, com os Acórdãos nos Processos 164/2007, 683/2008 e 331/2008, todos deste TSI.
Por despacho do relator, foi liminarmente indeferido o tal recurso, por se entender não haver contradição entre o Acórdão recorrido e as decisões anteriores que servem de fundamento para o recurso.
Inconformado com a decisão, reclamou para esta conferência.
Cumpre decidir.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
Segundo o reclamante, a questão sobre a qual há divergência é o seguinte:
No nosso Acórdão, julgou não ter o Governo da RAEM personalidades jurídica e judiciária, quem a detém é a própria RAEM, ao passo que nos referidos três Acórdãos, segundo refere o reclamante, todos reconheceram que o Governo da RAEM podia ser accionado como Réu, tendo, portanto, personalidade jurídica e legitimidade passiva.
Dispõe a alínea b) do nº 1 do artigo 161º do Código de Processo Administrativo Contencioso que:
“Excepto quando a solução neles perfilhada esteja de acordo com jurisprudência obrigatória, há lugar a recurso com fundamento em oposição de acórdãos:
b) Do Tribunal de Segunda Instância, proferidos em segundo grau de jurisdição que, na hipótese prevista na alínea anterior, perfilhem solução oposta à de acórdão desse mesmo Tribunal ou do Tribunal de Última Instância.”
Em síntese, são os seguintes pressupostos do recurso com fundamento em oposição de acórdãos:
- Se foram proferidos acórdãos no Tribunal de Segunda Instância em segundo grau de jurisdição;
- Se as decisões foram proferidas no domínio da mesma regulamentação jurídica;
- Se, relativamente à mesma questão de direito, o acórdão recorrido assentou solução oposta à de acórdão do TSI ou do TUI.
Entende o Venerando TUI, no Acórdão do Processo 6/2009, o seguinte:
“Relativamente ao pressuposto em questão – existência de dois acórdãos que, relativamente, à mesma questão de direito, assentam em soluções opostas ― tem-se considerado que:
As decisões devem ser diversas, opostas, não necessariamente contraditórias.
A oposição entre as decisões deve ser expressa e não meramente implícita. Não basta que numa das decisões possa ver-se aceitação tácita de doutrina contrária a outra decisão.
A questão decidida pelos dois acórdãos deve ser idêntica e não apenas análoga. A este respeito tem-se entendido que os factos fundamentais sobre os quais assentam as decisões, ou seja, os factos nucleares e necessários à resolução do problema jurídico, devem ser idênticos.
A questão sobre a qual se verifica a oposição deve ser fundamental. Ou seja, a questão de direito deve ter sido determinante para a decisão do caso concreto.
A questão sobre a qual há oposição tem de ser uma questão de direito. Não pode ser uma questão de facto, até porque o Tribunal de Última Instância não aprecia, normalmente, matéria de facto.”
Sobre a mesma questão, também observa José Cândido de Pinho que “deve entender-se que só relevam as decisões expressas, isto é, aquelas que foram efectivamente objecto de ponderação específica sobre determinado tema. Não servem esse propósito, assim, as decisões implícitas, as opiniões manifestadas incidentalmente ou os juízos circunstâncias vertidos no âmbito de uma decisão, porque podem não representar uma autêntica e profunda meditação sobre o caso”.1
Ora bem, salvo o devido respeito, entendemos que, no caso em apreço, embora se reúnam os primeiros dois pressupostos, mas não se verifica a alegada oposição entre as decisões relativamente à mesma questão de direito.
Senão vejamos.
O Acórdão recorrido considerou não ter o Governo da RAEM personalidade jurídica e, consequentemente, personalidade judiciária, devendo as acções para efectivação da responsabilidade civil extracontratual serem intentadas contra a própria RAEM.
Em relação ao Acórdão no Processo 164/2007 deste TSI, embora se trate igualmente de um recurso jurisdicional em matéria administrativa de decisão do TA relativamente a acção de efectivação de responsabilidade civil extracontratual, mas nesse mesmo Acórdão não se debruçou sobre a questão de personalidade jurídica ou judiciária do Governo da RAEM ou da RAEM.
Ademais, não obstante que se chegou a referir na parte de fundamentação desse mesmo Acórdão que deveria o Governo da RAEM suportar o valor da indemnização arbitrada, mas fazendo uma análise integral do Acórdão, não podemos deixar de assinalar que, ao fim e ao cabo, foi a própria RAEM que se responsabilizou pelo pagamento da respectiva indemnização.
O reclamante invocou ainda os Acórdãos nos Processos 683/2008 e 331/2008 deste TSI, que dizem respeito a dois recursos jurisdicionais em matéria administrativa de decisão do TA relativamente a acção de efectivação de responsabilidade civil extracontratual.
Nesses Acórdãos também não se debruçou especificamente sobre a questão de personalidade jurídica ou judiciária do Governo da RAEM ou da RAEM, apenas se referiu na parte de fundamentação que “não deverá haver lugar à condenação do Governo da RAEM”, e que terminaram, na parte decisória, com a absolvição dos Réus do pedido.
É bom de ver que a questão de personalidades jurídica e judiciária do Governo ou da RAEM foi apreciada de forma explícita e concreta no Acórdão recorrido, mas nunca foi objecto de apreciação nos restantes três Acórdãos citados pelo reclamante.
Convém ainda ter em vista o Acórdão do Venerando TUI, no Processo 31/2005, nele se refere que “Não basta uma oposição tácita de resoluções, em termos de aceitação tácita da doutrina contrária à enunciada noutra, exige antes que seja estabelecida uma doutrina, e por forma expressa, em sentido contrário ao fixado na outra”.
Nesta conformidade, na falta de verificação do pressuposto de existência de contradição entre o Acórdão recorrido e as decisões anteriores que servem de fundamento para o recurso, não resta outra alternativa senão manter o despacho reclamado, ao abrigo do disposto no artigo 163º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
***
III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em indeferir a reclamação, confirmando o despacho reclamado.
Custas pelo reclamante, fixando a taxa de justiça em 4 U.C., sem prejuízo do apoio judiciário de que o mesmo beneficiava.
Fixando ainda os honorários em MOP$300,00, a suportar pelo GPTUI.
Notifique.
***
Macau, 29 de Janeiro de 2015

Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
1 José Cândido de Pinho, in Manual de Formação de Direito Processual Administrativo Contencioso, CFJJ, 2013, página 356
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Processo (Reclamação) 971/2012 Página 1