Processo nº 208/2015
(Autos de Recurso Civil e Laboral)
Data: 26 de Março de 2015
Recorrente: A (Autor)
Recorrida: B (Macau) - Serviços e Sistemas de Segurança, Lda. (Ré)
ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I - RELATÓRIO
Por sentença de 26/11/2014 julgou-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a Ré B (Macau) - Serviços e Sistemas de Segurança, Lda. a pagar ao Autor A a quantia total de MOP$126,152.00, acrescida de juros de mora legais.
Dessa decisão vem recorrer o Autor, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao Recorrente a atribuição de uma compensação devida pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal na medida de um dia de salário em dobro.
2. Porém, ao condenar a Recorrida a pagar ao Recorrente apenas o equivalente a um dia de trabalho (em singelo) pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, o Tribunal a quo procedeu a uma não correcta aplicação do disposto na al. a) do n.º 6 do artigo 17.° do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, pelo que a decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Ré em conformidade com o disposto na referida Lei Laboral;
3. Com efeito, resulta do referido preceito que o trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser remunerado pelo dobro do salário normal, entendido enquanto duas vezes a retribuição normal, por cada dia de descanso semanal prestado;
4. Do mesmo modo, ao condenar a Recorrida a pagar ao Recorrente apenas e tão-só um dia de salário em singelo, o Tribunal a quo desviou-se da interpretação que tem vindo a ser seguida pelo Tribunal de Segunda Instância sobre a mesma questão de direito, no sentido de entender que a compensação do trabalho prestado em dia de descanso semanal deverá ser feita em respeito à seguinte fórmula: (salário diário X n.º de dias de descanso não gozados X 2);
5. De onde, resultando que o Recorrente prestou trabalho durante todos os dias de descanso semanal durante toda a relação de trabalho, deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$126,152.00 a título do dobro do salário - e não só de apenas MOP$63,076.00, correspondente a um dia de salário em singelo conforme resulta da decisão ora posta em crise – mantendo-se a douta Decisão no restante relativamente à condenação da Ré pela não concessão ao Autor de dias de descanso compensatório, acrescida de juros legais até integral e efectivo pagamento.
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A Ré respondeu à motivação do recurso do Autor, nos termos constantes a fls. 196 a 204, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II - FACTOS
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
- Entre 12 de Dezembro de 1995 a 31 de Maio de 2008, o Autor prestou para a Ré funções de "guarda de segurança", enquanto trabalhador não residente. (alínea A) dos factos assentes)
- Entre o referido período, o Autor trabalhou sobre as ordens, direcção, instruções e fiscalização da Ré. (alínea B) dos factos assentes)
- A Ré sempre fixou o local, o período e o horário de trabalho do Autor de acordo com as necessidades. (alínea C) dos factos assentes)
- O Autor sempre respeitou os períodos e horários de trabalho fixados pela Ré, e sempre prestou trabalho nos locais indicados pela Ré. (alínea D) dos factos assentes)
- Ao longo de toda a relação laboral a Ré pagou ao Autor uma quantia fixa mensal, acrescida de uma quantia determinada em função do número de horas de trabalho extraordinário efectivamente prestadas pelo Autor. (alínea E) dos factos assentes)
- Entre 12 de Dezembro de 1995 a 31 de Dezembro de 2007, o Autor auferiu da Ré, a título de salário anual e de salário normal diário, as quantias que abaixo se discrimina (Cfr. fls.9, Certidão de Rendimentos - Imposto Profissional, que se junta e se dá por reproduzido para todos os legais efeitos):
Ano
Salário anual
Salário diário
1995
90
1996
43412
121
1997
46023
128
1998
54892
152
1999
59534
165
2000
59296
165
2001
56688
157
2002
56454
157
2003
57165
159
2004
53569
149
2005
59747
166
2006
61724
171
2007
72210
201
(alínea F) dos factos assentes)
- Para além das referidas quantias, o Autor não auferiu quaisquer outras por parte da Ré, ou de qualquer outra entidade patronal. (alínea G) dos factos assentes)
- Enquanto trabalhador não residente, o Autor apenas estava autorizado a exercer a sua actividade profissional para a Ré. (alínea H) dos factos assentes)
- Entre 12 de Dezembro de 1995 a 31 de Dezembro de 2007, a Ré nunca atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal. (alínea I) dos factos assentes)
- Entre 01 de Julho de 1999 a 31 de Dezembro de 2007, a Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, com excepção de 34 dias em 2000, 52 dias em 2001, 52 dias em 2002, 45 dias em 2003, 37 dias em 2004, e 5 dias em 2005. (alínea J) dos factos assentes)
- Entre 12 de Dezembro de 1995 a 30 de Junho de 1999, por solicitação da Ré o Autor prestou trabalho todos os dias da semana, de modo a garantir o contínuo e diário funcionamento da actividade da Ré. (Resposta ao quesito 1° da base instrutória)
- Entre 12 de Dezembro de 1995 a 30 de Junho de 1999, a Ré nunca fixou ao Autor, em cada período de sete dias, um período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição. (Resposta ao quesito 2° da base instrutória)
- Entre 12 de Dezembro de 1995 a 31 de Dezembro de 2007, a Ré nunca fixou ao Autor um outro dia de descanso compensatório, em virtude do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (Resposta ao quesito 3° da base instrutória)
- O trabalho que prestou em dias de descanso semanal foi remunerado pela Ré com o valor de um salário diário, em singelo. (Quesito 8° da base instrutória, aceite pelas partes)
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III – FUNDAMENTAÇÃO
Quanto à fórmula de compensação do descanso semanal, considerando que se trata de matéria mais do que analisada e decidida por este TSI1, vamo-nos remeter para a Jurisprudência quase uniforme deste Tribunal no sentido de que o trabalhador tem o direito de receber, por cada dia de descanso semanal não gozado, o dobro da remuneração correspondente, para além do singelo já recebido.
Assim, o Autor tem direito a receber, a título da compensação do não gozo dos dias de descanso semanal no valor reclamado.
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IV – DECISÃO
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em:
- conceder provimento ao recurso interposto;
- revogar a sentença recorrida na parte respeitante à condenação do pagamento da compensação pelo não gozo dos dias de descanso semanal;
- condenar a Ré a pagar ao Autor, a título da compensação pelo não gozo dos dias de descanso semanal, a quantia de MOP$126,152.00, com juros de mora à taxa legal a partir da data do presente aresto; e
- manter a sentença recorrida na restante parte.
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Custas pela Ré.
Notifique e D.N.
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RAEM, aos 26 de Março de 2015.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
(Votei vencido quanto à fórmula adoptada na compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal, por entender que, sendo o trabalho prestado nesses dias pago pelo “dobro da retribuição”, este “dobro” é constituído por um dia de salário normal mais um dia de acréscimo.
Provado que o Autor ora recorrente já recebeu da Ré ora sua entidade patronal o salário diário em singelo, para efeitos de cálculo do valor da compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal, terá que deduzir esse montante pago em singelo, sob pena de estar o Autor a ser pago, não pelo dobro, mas pelo triplo do valor diário, ao que acresce ainda o dia de descanso compensatório, o Autor estar a ser pago pelo quádruplo do valor diário.)
1 Os Acs. do TSI, de 30/10/2014, Proc. nº 396/2014; de 23/10/2014, Proc. nº 338/2014; de 27/11/2014, Proc. nº 654/2014.
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