Processo nº 237/2015/A
Data do Acórdão: 09ABR2015
Assuntos:
Suspensão de eficácia de acto administrativo
Indeferimento da autorização especial de permanência
SUMÁRIO
O indeferimento do pedido da autorização especial de permanência formulado ao abrigo do disposto no artº 8º da Lei nº 4/2003 é de conteúdo negativo sem vertente positiva, portanto cuja eficácia não é susceptível de suspensão.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 237/2015/A
Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância
I – Relatório
A, em representação do seu filho menor B, ambos devidamente identificados nos autos, veio, ao abrigo do disposto nos artºs 120º e s.s. do CPAC, requerer a suspensão de eficácia do despacho, datado de 15JAN2015, do Senhor Secretário para a Segurança, que indeferiu o pedido, formulada por ela em representação do seu filho menor, da concessão da autorização especial de permanência na RAEM.
Citada a entidade requerida, contestou pugnando pelo indeferimento da requerida suspensão.
O Dignº Magistrado do Ministério Público emitiu o seu douto parecer de fls. 59 a 60v dos p. autos, no qual opinou no sentido de indeferimento da requerida suspensão.
Sem vistos – artº 129º/2 do CPAC, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
Verificando-se que no seu requerimento o requerente imputou ao acto administrativo de cuja eficácia ora se requer a suspensão, uma série de vícios, tais como os da falta de fundamentação, da violação da lei, da total desrazoabilidade e da falta de proporcionalidade, geradores da anulabilidade do mesmo acto.
É de frisar que o presente procedimento preventivo e conservatório não é sede própria nem meio idóneo para a apreciação dos vícios que o requerente imputou, portanto os tais vícios não serão objecto da nossa abordagem infra.
Por outro lado, o requerente requereu a produção das provas testemunhais para a comprovação da matéria vertida nos artºs 5º a 45º do requerimento.
Todavia, para nós a produção das provas testemunhais é inteiramente desnecessária por existirem nos autos elementos suficientes para a boa decisão do presente procedimento.
Indeferimos assim o pedido da produção das provas testemunhais.
Ora, de acordo com os elementos existentes nos autos, podem ser tidos por assentes os seguintes factos com relevância à decisão do presente pedido da suspensão de eficácia:
* O requerente, B, nascido na RAEM em 29JAN2014, é titular do passaporte filipino;
* A família do requerente é constituída por três elementos, ele próprio, a mãe que o representa aqui e o pai;
* A mãe do requerente, A, é trabalhadora não residente e não especializada, de nacionalidade filipina, e titular do TI/TNR, com validade até 30JUN2015, actualmente contratada pelo XX RESORT (MACAU) S.A., como ecónoma;
* O marido de A, pai do menor B, encontra-se a trabalhar na XX;
* Ao abrigo do disposto no artº 8º da Lei nº 4/2003, A, na qualidade de representante legal do seu filho menor ora requerente B, formulou o pedido para a concessão da autorização especial de permanência para o seu filho menor, até ao termo da validade do seu TI/TNR, ou seja, 30JUN2015;
* Por despacho do Senhor Comandante da PSP, o tal pedido foi indeferido;
* Inconformado com o indeferimento, o requerente, representado pela sua mãe, interpôs recurso hierárquico para o Senhor Secretário para Segurança;
* Por despacho datado de 15JAN2015 do Senhor Secretário para a Segurança, cujo teor consta das fls. 37 dos p. autos e se dá aqui por integralmente reproduzido, foi negado provimento ao recurso hierárquico e determinada a manutenção do já decidido pelo Senhor Comandante da PSP; e
* Ao abrigo do disposto nos artºs 120º e s.s. do CPAC, o menor, representado pela mãe, veio requerer a suspensão de eficácia desse despacho, datado de 15JAN2015, do Senhor Secretário para a Segurança, que indeferiu o pedido de autorização especial de permanência na RAEM.
Como se sabe, o instituto de suspensão de eficácia do acto administrativo traduz-se numa providência cautelar que visa obter provisoriamente a paralisação dos efeitos de um acto administrativo a produzir imediatamente na esfera jurídica do destinatário do acto, por forma a proteger, a título cautelar, os interesses que se dirijam à conservação de situações jurídicas já existentes.
Tratando-se in casu de indeferimento de um pedido da autorização especial de permanência, formulado por um cidadão filipino sem direito de residência em Macau.
Apesar de ser nascido em Macau, o menor tem estado numa situação irregular e clandestina, pois a ele nunca foi concedida pelas autoridades competentes da RAEM a autorização de permanência ou residência temporária.
Nestas circunstâncias, como da execução do despacho do Senhor Secretário para a Segurança, cuja eficácia o requerente pretende ver suspensa, não poderá decorrer um efeito ablativo de um bem jurídico detido pelo requerente, que no fundo inexiste, estamos obviamente perante um acto de conteúdo negativo sem vertente positiva.
Inverificado o pressuposto a que se alude o artº 120º do CPAC, é de indeferir logo a requerida suspensão da eficácia do acto em causa.
No entanto, mesmo que assim se não entenda, a pretensão do requerente de ver suspensa a eficácia do acto em causa é sempre de naufragar.
Então passemos a averiguar se se verificam os requisitos para decretar a suspensão da eficácia do acto.
Para o deferimento da tal providência, a lei exige a verificação cumulativa dos seguintes requisitos – artº121º/1-a), b) e c) do CPAC:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
Sendo de verificação cumulativa que é, a inverificação de qualquer deles implica logo o não deferimento da suspensão.
Comecemos então pelos requisitos exigidos nas alíneas b) e c), que nos se afiguram ser de fácil apreciação, tendo em conta a especificidade do caso, a matéria de facto assente, assim como os elementos constantes nos autos.
No que respeita ao requisito exigido na alínea b), apesar de o requerente se encontrar numa situação irregular e clandestina em Macau, entendemos que atendendo à sua tenra idade, a continuação da sua permanência em Macau não deve ser tida, de per si, como geradora de grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto que lhe indeferiu a autorização especial de permanência.
Em relação à inexistência dos fortes indícios da ilegalidade do recurso, podemos dizer que existem sim fortíssimos indícios da legalidade do recurso, que aliás já foi interposto em 10MAR2015, tendo em conta a data de notificação do acto suspendendo ao requerente (09FEV2015) e a manifesta legitimidade do requerente para reagir contenciosamente contra o acto administrativo que representa a última palavra da Administração.
Então resta analisar a verificação ou não do requisito exigido na alínea a), ou seja, se a execução do acto causa previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso contencioso.
Para sustentar a sua tese da verificação in casu desse requisito, o requerente alega que:
……
21. Com efeito, se a decisão em causa não for suspensa, a mesma irá causar ao filho menor da Requerente (e à própria Requerente) a perda imediata da possibilidade de se manter em Macau e, em último caso, se irá traduzir numa separação inevitável da ora Requerente do seu filho menor (de pouco menos de 1 ano de vida);
22. Porquanto não é crível que o referido menor tenha de abandonar por si só a RAEM, sendo forçado a deslocar-se para um outro País ou Região, que não conhece e que não tem ninguém que possa tratar e cuidar de si;
23. O que por si só mostra que a execução imediata da decisão irá causar prejuízos de difícil reparação para a Requerente e para e filho menor, com espectáveis graves e nefastas consequências negativas para a futura formação e desenvolvimento pessoal, educacional e mesmo social por parte do menor;
24. Que igualmente justifica que seja suspensa a Decisão de intimar o filho menor da Requerente a ter de "abandonar" Macau, constante da última parte do acto suspendendo, sob pena de ocorrer um prejuízo de difícil reparação, nos termos em se acredita ser o entendimento da jurisprudência da RAEM a tal respeito, tendo em conta a tenra idade do filho da ora Requerente e as graves consequências que uma separação de sua Mãe poderá ter para o mesmo, conforme se acredita ter deixado dito;
25. Pelo exposto, deve ter-se como verificado o requisito exigido pelo artigo 121.º, n.º 1, al. a) do CPAC, isto é, que a execução do acto causará prejuízo grave e irreparável para os interesses da ora Requerente (e do seu filho menor);
……
É verdade que com execução imediata do acto suspendendo, a situação irregular do requerente continua a ficar não regularizada e o requerente poderá vir a obrigar-se a deixar de poder viver em Macau.
Para o requerente, deixar de viver em Macau implicará inevitavelmente a separação da sua mãe e a inexistência de alguém para tratar e cuidar de si.
Todavia, a produção desse resultado que o requerente configura como situação de difícil reparação, não se pode imputar ao despacho de cuja eficácia se requer a suspensão, mas sim à mãe ou/e ao pai do próprio menor, que por opção voluntária não vivem no seu país de origem onde toda a família tem direito de residir e decidiram ir trabalhar em outros locais diferentes, por forma a criar a situação que se pretende ver resolvida mediante o presente procedimento conservatório.
A tal situação de difícil reparação poderá ser simplesmente evitada por vontade de qualquer dos seus pais, que decide viver e cuidar do menor no país da sua nacionalidade ou noutro sítio do mundo onde possa obter o direito de residir.
Portanto, trata-se de uma falsa questão
Naturalmente, podemos concluir, sem mais delongas, pela inverificação do requisito exigido no artº 121º/1-a) do CPAC, o que implica o indeferimento da pretendida suspensão.
Resta decidir.
III – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam indeferir o pedido, formulado por A, em representação do seu filho menor B, da suspensão da eficácia do despacho, datado de 15JAN2015, do Senhor Secretário para a Seguranças que, em sede de recurso hierárquico, negou provimento ao recurso interposto do despacho do Senhor Comandante da PSP, que indeferiu o pedido de autorização especial de permanência do mesmo menor.
Custas pelo requerente, com taxa de justiça fixada em 4UC.
Registe e notifique.
RAEM, 09ABR2015
Lai Kin Hong
Tong Hio Fong
Choi Mou Pan
Fui presente
Mai Man Ieng
Susp.ef. 237/2015/A-9