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Proc. nº 818/2013
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 19 de Março de 2015

Assunto:
- Falta de audiência prévia

SUMÁRIO:
- A audiência de interessados é uma das formas de concretização do princípio da participação dos particulares no procedimento administrativo, legalmente previsto no artº 10º do CPAC, nos termos do qual os órgãos da Administração Pública devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito.
- E destina-se a evitar, face ao administrado, o efeito surpresa e, no mesmo passo, garantir o contraditório, de modo a que não fiquem diminuídos os direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados.
- A preterição da audiência prévia de interessado só pode ser ultrapassada se daí não resulte qualquer ilegalidade determinante da anulação do acto, isto é, independentemente da intervenção do interessado e das posições que o mesmo pudesse tomar, a decisão da Administração só pudesse ser aquela que foi tomada.
- Não obstante vinculado o poder de ordenar a reposição consagrada no nº 4 do artº 176º do ETAPM, é discutível o conceito de “quantias indevidamente recebidas”, quer o seu alcance, quer a sua abrangência. Com efeito, o apuramento das verbas componentes deste conceito pode comportar opiniões divergentes e, assim, envolver a margem de apreciação.
O Relator,
Ho Wai Neng

Proc. nº 818/2013
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 19 de Março de 2015
Recorrentes: - A (Recorrente)
- Directora dos Serviços de Finanças (Entidade Recorrida)
Recorridas: As Mesmas

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
   Por sentença de 04/09/2013, o Tribunal Administrativo da RAEM julgou parcialmente procedente o recurso contencioso interposto pela Recorrente, A, anulando o segmento do acto recorrido da Entidade Recorrida, Directora dos Serviços de Finanças, que diz respeito às quantias que a Recorrente foi mandada a repor do ano de 2007.
   Dessa decisão, vêm, quer a Recorrente, quer a Entidade Recorrida, interpor recurso jurisdicional, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
A) Do recurso da Recorrente:
A. Entendeu o Tribunal a quo que (i) deveria ter sido garantido à Recorrente uma oportunidade para se pronunciar no procedimento administrativo antes de ser decidida a reposição de quantias, (ii) que a defesa apresentada em sede de processo disciplinar não dispensa a audiência em sede de procedimento administrativo e (iii) que os motivos de urgência invocados pela Entidade Recorrida para dispensar audiência não colhem. No entanto, entendeu ainda o Tribunal a quo que o acto recorrido tem carácter vinculado, pelo que deverá ser dada prevalência ao princípio do aproveitamento do acto, não se justificando, assim, a anulação do mesmo (já que a falta de audiência corresponde à anulabilidade do acto e não à sua nulidade);
B. Entende a Recorrente, antes de mais, que a falta de audiência prévia acarreta a nulidade do acto (seguindo jurisprudência desse Tribunal), mas se assim não se entender, sempre acarretará a anulabilidade do acto;
C. No caso em apreço, embora a decisão de repor quantias tenha carácter vinculado, a verdade é que a fórmula para o apuramento de montantes a repor deixa margem de discricionariedade ao órgão decisor e tanto assim é que a própria DSF apurou diversos montantes a repor ao longo do procedimento (nomeadamente entre valores tão díspares quanto MOP26.673,50 e MOP498.478,90), tendo, optado, a final, por uma das possíveis fórmulas (vide acto recorrido e Doc. n.º 6 junto com a petição de recurso);
D. Logo, embora a Administração não tenha margem de discricionariedade quanto à obrigação de reposição de quantias recebidas para além do limite remuneratório anual definido no artigo 176.° do ETAPM, esta tem poder decisório quanto à fórmula a utilizar para o cálculo desses montantes, motivo pelo qual foram surgindo vários valores a repor ao longo do processo administrativo que culminou com o acto recorrido;
E. Neste sentido, e ao contrário do alegado na sentença recorrida, o resultado a que chegou a Administração no caso concreto não é a única possibilidade virtual susceptível de verificação e a audiência prévia da Recorrente poderia ter levado a um resultado diferente do alcançado no acto recorrido, pelo que andou mal o Tribunal a quo ao não considerar procedente o invocado vício de forma por falta de audiência prévia da Recorrente, violando, assim, o artigo 93.º do CPA;
F. Mais, ao contrário do que entendeu a sentença a quo, a Recorrente defende que, para efeitos do artigo 176.º do ETAPM, há que ter em conta o vencimento líquido auferido e não o ilíquido, como consta do acto recorrido;
G. A referência ao termo "remuneração" no artigo 176.º do ETAPM é feita em termos abstractos e para efeitos de cálculo do limite máximo de remuneração fixado para cada ano. Nesse contexto, é mais que lógico falar em "remuneração", como todos os proventos auferidos pelos funcionários públicos ao longo do ano, incluindo o vencimento, as remunerações acessórias, os subsídios, abonos e outros;
H. No entanto, o que está em causa não é o conceito de remuneração para o cálculo abstracto do limite máximo anual, correspondente à fórmula constante do n.º 1 do artigo 176.º do ETAPM (que se traduz num valor fixo que será igual para todos os funcionários públicos), mas sim o cálculo de cada uma das componentes da remuneração auferida por cada um dos funcionários públicos para verificar, no caso concreto, se houve ou não ultrapassagem do limite abstracto fixado;
I. E nesse aspecto, difere-se do entendimento do Tribunal a quo, pois que os n.ºs 2 e 4 do artigo 176.º - que se referem em concreto ao cálculo do que foi recebido por cada um dos funcionários (e não ao cálculo em abstracto do limite anual máximo) -, fazem referência a termos como "importâncias recebidas" e "quantias indevidamente recebidas";
J. Daqui se retira que os valores que devem ser tidos em conta para efeitos do cálculo individualizado do montante de remuneração auferida num ano por cada um dos funcionários públicos são aqueles efectivamente recebidos, e não aqueles que constam de uma tabela abstracta;
K. O ETAPM foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 87/89/M, de 21 de Dezembro, altura em que os funcionários públicos estavam isentos do pagamento de imposto profissional, o que significa que, à data em que o artigo 176.º do ETAPM entrou em vigor, o limite ali fixado tinha em conta as remunerações efectivamente recebidas pelos funcionários públicos, na medida em que a remuneração era, por assim dizer, líquida (já que não havia descontos fiscais);
L. Ao contrário do entendimento vertido na decisão a quo, a Recorrente entende que tal argumento também se retira do próprio n.º 2 do artigo 176.º, que deixou de fora do limite anual máximo valores auferidos com carácter social que se destinam a combater despesas sociais e outras, como subsídio de família, subsídio de residência, subsídio de refeição, abono para falhas, ajudas de custo, despesas de representação e outras, com o intuito de limitar o rendimento àquele que é efectivamente recebido, depois de descontadas as despesas e custos suportados pelos trabalhadores;
M. Mais, se não se tiver em conta a remuneração líquida, mas sim a ilíquida, para efeitos do artigo 176.°, os funcionários públicos ficam, efectivamente, com um salário inferior ao anterior, em violação do artigo 98.º da Lei Básica
N. Um funcionário, antes da entrada em vigor da Lei n.º 12/2003, recebe $1100 por ano, sendo o limite anual de $1000 (nos termos do n.º 1 do artigo 176.º do ETAPM), tem que repor $100; depois da entrada em vigor da Lei n.º 12/2003, recebe $1100, desconta $150 para efeitos de imposto profissional (sendo o seu rendimento anual líquido de $950 - rendimento esse que está, objectivamente, abaixo do limite anual máximo de remuneração de $1000), tendo ainda que repor, na óptica da sentença recorrida, $100;
O. Deste exemplo se retira que o montante de remuneração total auferido para efeitos do artigo 176.° do ETAPM tem que, antes do mais, ser entendido como o montante líquido de imposto profissional, tal como efectivamente recebido pelo funcionário público - neste sentido vai também a Informação n.º 073/NAJ/CRF/11, junta como Doc. n.º 6;
P. Ao não considerar o vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito ao considerar o vencimento ilíquido, e não líquido, para efeitos do cálculo concreto da remuneração anual auferida pela Recorrente, a decisão a quo viola o artigo 176.° do ETAPM e o artigo 98.° da Lei Básica;
Q. Entendeu ainda o Tribunal a quo que a remuneração paga aos membros das comissões fiscais não corresponde a senhas de presença, pelo que não está incluída na excepção contida no n.º 2 do artigo 176.° do ETAPM; no entanto, como também reconhece a decisão recorrida, os membros da Comissão de Avaliação de Veículos Motorizados auferiam o suplemento remuneratório por cada sessão em que estivessem presentes, correspondente a 10% do valor do índice 100 da tabela indiciária da Função Pública;
R. Logo, tal remuneração não era fixa, mas sim variável, pois que dependia da presença, ou não, do membro para ser auferida - v. proposta de remuneração que, à semelhança dos anos seguintes, mereceu a concordância do Exmo. Senhor Secretário para a Economia e Finanças que se juntou como Doc. n.º 12 à petição de recurso, para onde ora se remete;
S. Assim, essa remuneração tem natureza de senha de presença, e, como tal, está excluída do cômputo do limite anual máximo de remunerações do 176.° do ETAPM - este entendimento foi defendido (i) no parecer emitido pelo Núcleo de Apoio Jurídico dos Serviços de Finanças que se juntou como Doc. n.º 13 à petição de recurso, (ii) no Memorando elaborado em conjunto pela DSF, ali representada pela actual Directora dos Serviços de Finanças (e autora do acto ora recorrido), pelo Comissariado Contra a Corrupção e pelo Comissariado da Auditoria, ao longo de três reuniões ocorridas em Março e Abril de 2004, conforme Doc. n.º 14 junto com a petição de recurso; e ainda, de forma indirecta, nas instruções emitidas pelo Secretário para a Economia e Finanças juntas como Doc. n.º 9 à petição de recurso, quanto ao funcionamento e remuneração das comissões e conselhos;
T. Este entendimento, que vinha sendo adoptado na prática, acabou por ser contemplado no regime da exclusividade consagrado no artigo 9.º da Lei n.º 15/2009, de 3 de Agosto, relativa às Disposições Fundamentais do Estatuto do Pessoal de Direcção e Chefia, nos termos do qual se estabeleceu que a exclusividade não abrange actividades como a participação em conselhos e comissões, ainda que remuneradas;
U. A acrescer ao que acima ficou dito, há ainda que ter em conta o Decreto-Lei n.º 14/98/M, de 27 de Abril, posterior à aprovação e entrada em vigor do ETAPM e de natureza especial em relação a este, que regula o exercício das funções de representação da DSF junto de entidades autónomas, incluindo as comissões fiscais supra referidas, no qual se determina que a remuneração dos representantes da DSF em entidades autónomas pode ter por referência o pagamento, por reunião, de senhas de presença - isto independentemente de os mesmos terem ou não isenção de horário ou exercerem cargos de chefia ou direcção;
V. Desta forma, entende a Recorrente que esta norma especial derroga o princípio geral estabelecido no ETAPM e que, assim sendo, os representantes da DSF têm direito a receber senhas de presença ou remuneração equivalente à de senhas de presença no caso concreto, as quais estão, assim, excluídas do limite remuneratório anual, por via do n.º 2 do artigo 176.º do ETAPM;
W. Por último, não se concorda com a aplicação do artigo 216.º do ETAPM ao caso concreto, como entendeu o Tribunal a quo, pois que tal preceito se aplica em caso de acumulação de remunerações pelo desempenho das mesmas funções, o que claramente não é o caso;
X. Face ao exposto, a sentença recorrida viola o artigo 216.° e n.º 2 do artigo 176.°, ambos do ETAPM, bem como o artigo 4.0 do Decreto-Lei n.º 14/98/M quanto ao exercício de funções de representação da Direcção dos Serviços de Finanças, cujas normas têm carácter especial face às normas gerais do ETAPM;
Y. A Recorrente entende ainda que as funções que desempenhou no Fundo de Pensões, na Direcção dos Serviços de Correios, na Comissão de Registo dos Auditores e Contabilistas e na Obra Social da Polícia Judiciária, bem assim, no Montepio (caso não se entenda que tal remuneração é auferida no exercício de funções em entidades privadas), são equiparáveis às funções de administrador ou delegado do Governo, pelo que seria de aplicar o Decreto-Lei n.º 13/92/M, nos termos do qual (n.º 2 do artigo 15.º) as remunerações dos delegados do Governo são acumuláveis com quaisquer outras percebidas por encargos ou funções públicas, sem prejuízo do limite estabelecido no n.º 2 do artigo 8.°, não estando sujeitas a quaisquer descontos, o que significa que não podem ser descontadas da remuneração anual da Recorrente, por via do n.º 1 do artigo 176.° do ETAPM este entendimento tem apoio na Informação n.º 073/NAJ/CFR/11, junta como Doc. n.º 4 à petição de recurso;
Z. Ao incluir as remunerações auferidas nos termos do Decreto-Lei n.º 13/92/M, que estabelece um limite próprio para esse tipo de retribuições, no limite estabelecido no ETAPM, a sentença recorrida viola não só o disposto no n.º 1 do artigo 176.° do ETAPM, como também o estabelecido no n.º 2 do artigo 15.° daquele Decreto-Lei;
AA. Ainda que não se entenda que as remunerações auferidas pela Obra Social da Polícia Judiciária, Montepio, Comissão de Registo de Auditores e Contabilistas, Fundo de Pensões e Direcção dos Serviços dos Correios se enquadram nas remunerações auferidas enquanto delegado do Governo ou equiparado, o que não se aceita, sempre se dirá que as mesmas são auferidas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 14/98/M, de 27 de Abril, que regula o exercício das funções de representação da Direcção dos Serviços de Finanças junto das entidades autónomas, já acima citado (cfr. n.º 1 do artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 50/99/M, ou artigo 2.º do Despacho do Chefe do Executivo n.º 2/2005, ou ainda o artigo 11.º do Regulamento Administrativo n.º 9/2008);
BB. Nos termos do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 14/98/M (que é lei especial em relação ao ETAPM), a remuneração mensal paga aos funcionários da DSF a desempenhar funções de representação da Direcção dos Serviços de Finanças junto das entidades autónomas pode configurar três modalidades: (i) a especialmente prevista na lei; (ii) senhas de presença; (iii) ou fixada por despacho de nomeação (quando não especialmente prevista ou fixada por referência a senhas de presença);
CC. Relembra-se que o conceito de senha de presença pressupõe que os membros sejam remunerados em função da participação, ou não, nas reuniões dos órgãos das entidades autónomas de que fazem parte;
DD. Ora, a remuneração mensal auferida pela Recorrente no Fundo de Pensões, na Obra Social da Policia Judiciária ou nos CTT era variável em função da sua presença, ou não, nas reuniões dos respectivos órgãos, tal como ficou provado na sentença recorrida (por remissão para fls. 648 e 648v), onde se pode constatar que os rendimentos auferidos pela Recorrente nas entidades acima referidas variou ao longo dos anos ali em causa;
EE. Logo, essas remunerações têm natureza de senhas de presença, pelo que, também assim, não podem ser tidas em conta no limite anual máximo de remuneração, nos termos do n.º 2 do artigo 176.º do ETAPM, como considerou a sentença recorrida, a qual viola, assim, esse preceito, bem como o Decreto-Lei n. 14/98/M;
FF. Entende ainda a Recorrente que a sentença recorrida padece de falta de fundamentação no que diz respeito à natureza e regime a aplicar às remunerações auferidas pelas funções exercidas junto do Fundo de Pensões, da CRAC, dos CTT e da Obra Social da Polícia Judiciária, pois que se limita a enumerar a legislação aplicável e a concluir, sumariamente, que a remuneração ali auferida não tem carácter de senha de presença, sem apresentar argumentos que sustentem tal posição, já que a mesma não resulta da simples leitura da legislação citada - nesta parte é, assim, a sentença nula, o que aqui se invoca para os devidos efeitos legais;
GG. Por último, a remuneração auferida pela Recorrente no Montepio Geral (pessoa colectiva de direito privado) é suportada pelo próprio Montepio e não pela Administração Pública, nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 13/92/M, de 2 de Março, que regula o regime legal dos administradores e delegados do Governo, logo entende a Recorrente que tal remuneração não pode ser incluída no cômputo de remunerações auferidas no exercício de funções públicas, como entendeu a sentença recorrida - ao incluir tais valores no total auferido para efeitos do n.º 1 do artigo 176.° do ETAPM, a sentença a quo viola mais uma vez esse mesmo preceito.
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A Entidade Recorrida respondeu à motivação do recurso da Recorrente nos termos constantes a fls. 931 a 935v dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo
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B) Do recurso da Entidade Recorrida:
A. O documento apresentado com a P.I, sob o n° 15, processado por computador é parcial e não espelha os montantes objecto de título de pagamento modelo M/7 emitidos em favor, e efectivamente pagos no ano 2007 à Recorrente.
B. A informação nº17/DIR/2011 é um documento junto aos autos com um valor pelo menos equivalente ao documento n° 15 junto com a P.I..
C. Tendo sido impugnado especificadamente o valor, até por a liquidação operada pela informação nº17/DIR/2011 ser posterior e mais actual do que o documento nº15 de 14 de Fevereiro de 2008, deveria o Meritíssimo Juiz A QUO ter preferido esta última ou, na dúvida, e na falta no processo instrutor dos respectivos títulos de pagamento, de ter promovido oficiosamente a junção aos autos dos mesmos, de modo a possibilitar a justa decisão da causa - artigo 67° do CPAC.
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A Recorrente respondeu à motivação do recurso da Entidade Recorrida nos termos constantes a fls. 937 a 942 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo
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O Ministério Público é de parecer pela procedência do recurso jurisdicional da Recorrente e pela improcedência do recurso da Entidade Recorrida, a saber:
“Foram interpostos recursos jurisdicionais respectivamente pela recorrente A e pela entidade recorrida - Directora da DSF da douta sentença de fls.840 a 850 dos autos, pela qual foi dado parcial provimento ao recurso contencioso do despacho exarado, em 14/07/2011, pela mesma Directora na Informação n.º017/DIR/2011 (doc. de fls.116 a 120 dos autos).
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   1. Do recurso da recorrente A
   1.1. No caso sub iudice, o MMº Juiz a quo entendeu que a aludida entidade recorrida não tinha procedido à audiência da recorrente no procedimento conducente ao acto contenciosamente impugnado, afirmando de forma concludente que «No caso vertente houve preterição de audiência dos interessados, prevista no art.93° do CPA.».
   Porém, o mesmo decidiu em não anular tal acto, com fundamento de degradar-se em formalidade essencial a omissão de audiência e aplicar-se in casu o princípio do aproveitamento do acto anulável, em virtude de que ao praticar o dito acto, a administração não estava dotada do poder discricionário ou margem de apreciação.
   Ressalvado o elevado respeito, em sintonia com a jurisprudência adquirida e pacífica asseverando que a degradação da audiência em formalidade não essencial tem como pressuposto sine qua non que é a única possível e inevitável a decisão, objecto do recurso contencioso, tomada por parte da Administração no exercício do poder vinculado (vide. Acórdãos do TSI nos Processos n.º344/2009 e n.º620/2010, do TUI nos n.º11/2012 e n.º48/2012), não podemos acompanhar a douta tese do MMº Juiz a quo.
   Ora bem, afigura-se-nos que sendo embora vinculado o poder de ordenar a reposição consagrada no n.º4 do art.176° do ETAPM, é sempre discutível o conceito «quantias indevidamente recebidas» - o seu alcance e a sua abrangência. Com efeito, o apuramento das verbas componentes deste conceito podem comportar opiniões divergentes e, assim, envolver a margem de apreciação.
   Nestes termos, e por haver certeza de que o acto contenciosamente recorrido não representa a decisão unicamente possível e inevitável - a anulação decretada na sentença recorrida serve-se de prova plena desta certeza, não é segura mas sim seriamente duvidosa a decisão do MMº Juiz a quo, consubstanciada em degradar a comprova omissão de audiência na formalidade não essencial.
   De outro lado, a análise comparativa impulsiona-nos a perspectivar que o acto impugnado nestes autos é menos vinculado que o despacho sindicado no Processo n.°731/2009 do TSl e, em recurso jurisdicional, no Processo n.º11/2012 do TUI.
   Com efeito, o despacho objecto no Processo n.º731/2009 do TSI assentou-se nos factos dados por provados pelo Venerando TUI no douto Acórdão prolatado no Processo n.º53/2008, Acórdão ao qual é dotado das oponibilidade/presunção ilidível consignadas no art.578º do CPC.
   Daqui decorre que a doutrina propugnada pelo Alto TUI no douto Acórdão tirado no seu Processo n.º11/2012 não é suficiente para suportar a decisão do MMº Juiz a quo traduzida em degradar a comprova omissão de audiência na formalidade não essencial.
   Importa recordar-se a sensata jurisprudência que inculca (Acórdão do TUI no Processo n.º50/2012): Admitindo-se a hipótese de o interessado não vir apresentar elementos úteis susceptíveis de abalar a decisão da Administração, tal não é, porém, razão bastante nem justificativa para afastar pura e simplesmente a audiência do interessado. Em termos mais genéricos, é da nossa modesta opinião que o facto constatado de o interessado não vir apresentar, em sede de impugnação graciosa ou contenciosa, elementos ou argumentos capazes de abalar ou invalidar a decisão administrativa não pode a posteriori justificar a falta da audiência ou sanar tal vício.
   Nesta linha de consideraçã, opinamos que padece do erro de direito a douta sentença recorrida na parte de, em vez de anular o acto objecto do recurso contencioso, decidir em degradar a omissão da audiência na formalidade não essencial e em aplicar ao caso sub iudice o princípio do aproveitamento do acto anulável.
   Por cautela, vamos apreciar os restantes argumentos da recorrente.
   1.2. A locução «a qualquer título» surgida no n.º1 do art.176° do ETAPM denota a consagração do princípio de globalidade (totalidade) das remunerações, no sentido de que se tem de tomar em consideração, na determinação do limite anual máximo, todas as remunerações pagas em consequência do exercício de funções públicas.
   O n.º2 deste comando legal prevê: Não são consideradas para efeitos do limite fixado no número anterior apenas as importâncias recebidas a título de prémio de antiguidade, subsídio de turno, subsídio de família, subsídio de residência, subsídio de refeição, abonos para falhas, despesas de representação, senhas de presença e ajudas de custo, bem como as devidas pelo exercício de função de deputado e de vogal do Conselho Consultivo e membro das Assembleias Municipais.
   A interpretação enunciativa do adverbio «apenas» utilizado neste segmento legal legitima-nos a sufragar a brilhante explanação do ilustre Colega no Parecer de fls.641 a 645v., onde se lê: Aliás, que os montantes a considerar terão que ser os brutos ou ilíquidos resulta também da circunstância de o n.º2 do artigo 176.° elencar exaustivamente todas as importâncias recebidas no exercício de funções públicas que não constam para efeitos de cômputo do limite anual máximo de remuneração.
   Acresce-se que patente e incontroverso é que a tese da recorrente o cálculo do limite anual máximo de remuneração deve estribar-se no rendimento anual líquido - não tem um mínimo de correspondência verbal na letra do citado art.176°, pelo que não pode ser acolhida sob pena de infringir o preceituado no n.º2 do art.8° do CC.
   É notoriamente impertinente a arguida violação do art.98° da Lei Básica, dado que mesmo sendo verdadeira, a situação de a recorrente receber menos rendimento ilíquido foi provocada por pagamento anual do imposto profissional a partir da entrada em vigor da Lei n.º12/2003, não sendo imputável ao acto recorrido que tinha sido praticado ao abrigo do art.176° do ETAPM.
   O que nos leva a acompanhar inteiramente a penetrante asseveração do MMº Juiz a quo que representa a cabal impugnação: No seu caso, o que ele deveria fazer é impugnar contra a cobrança de imposto profissional de $150, se eventualmente a entendesse como violadora do art.98° da Lei Básica.
   1.3. Quanto aos argumentos aduzidos nas conclusões Q) a X) das alegações do recurso jurisdicional em apreço, é de apontar, em primeiro lugar, que não faz sentido algum imputar à douta sentença recorrida a violação do disposto no art.216° do ETAPM.
   Parece-nos incontestável que não se aplica à Comissão de Avaliação de Veículos Motorizados prevista no art.15° do RIVM aprovado pela Lei n.º5/2002 o D.L. n.º14/98/M que regula o exercício das funções de representação da DSF junto das entidades autónomas.
   Sem prejuízo do muito respeito pela melhor opinião em sentido diferente, subscrevemos a douta posição do MMº Juiz a quo, traduzida em não poderem ser consideradas em senhas de presença as remunerações percebidas pela recorrente, em virtude de desempenhar o cargo de presidente na referida Comissão de Avaliação de Veículos Motorizados.
   A luz do previsto no n.º1 do art.215° do ETAPM e como o seu nome indica, as senhas de presença são retribuição atribuída aos trabalhadores da Administração Pública por participação efectiva em reuniões que resultam da sua integração em conselhos, comissões, equipas de projecto ou grupo de trabalho.
   Assim que seja, e por Natureza das Coisas, as senhas de presença devem ser estabelecidas, por norma legal ou regulamentar, em função da sessão ou reunião. No entanto, já não é certa a argumentação a contrario sensu - pois, nem todas as remunerações fixadas em função de sessão ou reunião são senhas de presença.
   Para devido efeito, nunca se pode esquecer do preceito no n.º3 do art.215° do ETAPM: Ao pessoal com isenção de horário de trabalho, nomeadamente de direcção e chefia, não são devidas senhas de presença. Trata-se duma proibição legal sem excepção.
   A recorrente exercia o cargo de presidente na Comissão de A valiação de Veículos Motorizados em regime de inerência consignada na 1) do n.º1 do art.15° do citado RIVM, por ela desempenhar, na devida altura, o director da DSF.
   Sendo assim, e tomando por pressuposto presumir-se a legalidade do despacho contemplado no n.º3 do mesmo art.15°, entendemos que não se pode considerar senhas de presença a remuneração fixada nesse despacho à recorrente como inerente presidente na Comissão de Avaliação de Veículos Motorizados.
   O que implica que não pode deixar de ser juridicamente ilegítima e reprovável a interpretação dada pela recorrente à remuneração fixada no despacho contemplado no n.º3 do art.15° do RIVM, e mostra acertada e inatacável a douta sentença na pertinente parte.
   1.4. Repita-se que por Natureza das Coisas, não têm natureza de senhas de presença quaisquer retribuições, desde que, por determinação legal ou regulamentar, sejam pagas periodicamente - por mês ou ano, e o n.°3 do art.215° do ETAPM veda peremptoriamente senhas de presença ao pessoal com isenção de horário de trabalho, nomeadamente ao pessoal de direcção e chefia.
   No caso vertente, sucede que enquanto desempenhava as funções no FP, na DSC, na Comissão de Registo dos Auditores e Contabilistas, na Obra Social da P.J. e no Montepio (cfr. conclusão Y) das alegações do recurso jurisdicional em apreço), a recorrente ocupava cargo de subdirectora ou directora da DSF, e os correspondentes regimes jurídicos bem como despachos de nomeação fixaram sempre retribuições periódicas.
   Perante tudo isto, e na firme convicção de que manifestamente não prestam os argumentos aduzidos nas conclusões Z) a AA) das alegações do presente recurso jurisdicional, perfilhamos, sem hesitação e com toda a tranquilidade, a sã decisão do MMº Juiz a quo, no sentido de nenhuma das cincos verbas se assumirem a natureza de senhas de presença.
   Na conclusão FF) das alegações de fls.858 a 893 dos autos, a recorrente invocou ainda falta de fundamentação, alegadamente consistente em sem apresentar argumento para sustentarem a posição de julgar improcedente as razões aduzidas pela recorrente, limando-se a sentença recorrida à simples leitura da legislação citada.
   Percorrendo minuciosamente a douta sentença em causa, entendemos que se trata duma invocação manifestamente indefensável, já que o MMº Juiz a quo procedeu à concisa e sintética interpretação e explicação das normas legais julgadas aplicáveis.
   1.6. Relativamente à conclusão GG) das referidas alegações, é de pôr em ênfase que o n.º1 do art.176° do ETAPM prevê «em consequência do exercício de funções públicas, a qualquer título» (sublinha nossa), não exigindo que toda a remuneração tenha de ser paga directamente pela Administração ou pela Fazenda Pública.
   Assim, e dado que era legalmente de índole público a função exercida pela recorrente, como delegada do Governo, no Montepio Geral, tal conclusão GG) não pode ter outra sorte senão a improcedência, embora a correspondente remuneração fosse paga pelo Montepio.
   2. Do recurso da recorrente Directora dos Serviços de Finanças
   Procedendo à leitura das alegações de fls.895 a 898 dos autos, não podemos de deixar de sufragar a douta consideração do ilustre Colega no Parecer de fls.641 a 645 v.: «Na sua contestação, a entidade recorrida, para além de não impugnar aquele doc.15, também não impugnou a alegação - cf. Artigo 49.°. E em alegações remeteu para o que dissera na contestação.»
   Daí extraiu o ilustre Colega, «Face ao exposto, e dado que nada em contrário resulta do processo administrativo, tem que se ter por demonstrado o invocado erro nos pressupostos de facto quando ao montante recebido pela recorrente, a título de comissões de impostos, no ano de 2007,»
   Sendo tal raciocínio acolhido com acrescência da base legal (art.54º do CPAC) e explicação mais desenvolvida (cfr. página 20 da própria sentença), temos por impecável e não censurável a douta sentença na parte de anular «este segmento do acto recorrido».
***
   Por todo o expendido, propendemos pelo provimento do recurso jurisdicional da recorrente A, por não se verificar o pressuposto imprescindível para se degradar na fonualidade não essencial a preterição da audiência, e pela improcedência do recurso da Directora da DSF. ”.
*
   Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
*
II – Factos
Foi assente a seguinte factualidade pelo Tribunal a quo:
1) Em 26 de Janeiro de 2010, o instrutor concluiu o balanço do procedimento disciplinar n.º 1/GCE/PD/ACMS/2009, confirmando a responsabilidade disciplinar dos três agentes da DSF (incluindo a Recorrente) (vd. fls. 42 e 133v do processo administrativo, cujo conteúdo dá-se aqui por integralmente reproduzido).
2) Em 29 de Janeiro de 2010, o Chefe do Executivo proferiu um despacho que concordou com os fundamentos de facto e de direito no balanço supracitado, e que, nos termos do artigo 300, n.º 1, al. c), artigo 303, n.º2, al. a), artigo 314, n.º 3 e artigo 316, n.º 2 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, aplicou à Recorrente uma pena de suspensão de função pelo período de 90 dias (vd. fls. 4 e v do processo administrativo, cujo conteúdo dá-se aqui por integralmente reproduzido).
3) A seguir, veio a Recorrente interpor para o TSI recurso da decisão do Chefe do Executivo (vd. processo n.º 208/2010 do TSI).
4) Em 02 de Dezembro de 2010, o TSI proferiu o acórdão no processo n.º 208/2010, anulando o supracitado despacho de 29 de Janeiro de 2010 proferido pelo Chefe do Executivo. Tal acórdão foi depois mantido pelo acórdão do TUI no processo n.º 23/2011 (vd. fls. 448 a 524 dos autos).
5) Em 31 de Maio de 2011, o agente da DSF concluiu a informação n.º 073/NAJ/CRF/11 (vd. fls. 186 a 197v do processo administrativo, cujo conteúdo dá-se aqui por integralmente reproduzido).
6) Em 24 de Junho de 2011, a Directora da DSF proferiu um despacho na informação n.º 073/NAJ/CRF/11 (vd. fls. 197 do processo administrativo, cujo conteúdo dá-se aqui por integralmente reproduzido):
“…
Ao NAJ
Analisado o parecer e ponderada a legislação aplicável à situação em apreço, nomeadamente a interpretação que dela faço, entendo que o procedimento a adoptar é o explanado no verso da página 1 da presente informação.
Proceda-se em conformidade.”
7) Em 29 de Junho de 2011, o Chefe do Executivo proferiu o despacho n.º 77/CE/2011, cujo conteúdo se vê a seguir (vd. fls. 34 do processo (administrativo):
“O acórdão de 10 de Junho de 2011 do TUI anulou o despacho por mim proferido em 29 de Janeiro de 2010 que aplicou a A, funcionária pública da DSF, uma pena de suspensão de função pelo período de 90 dias.
Vem agora a Administração, nos termos do artigo 174 do Código de Processo Administrativo Contencioso, cumprir a decisão em causa no prazo de 30 dias desde a sua transição em julgado, e pretender obter, quanto possível, a reposição da situação actual hipotética.
Pelo que, a fim da execução da decisão em causa, deve a DSF reembolsar à funcionária pública acima referida a verba descontada durante o período de pena da suspensão de função, e contar o tempo de serviço para efeitos de aposentação e antiguidade.
Remeta-se este despacho ao Secretário para a Economia e finanças. A decisão é executada pela DSF.”
8) Em 30 de Junho de 2011, o Chefe do Executivo proferiu o seguinte despacho (vd. fls. 24 e v do processo administrativo):
“O acórdão de 10 de Junho de 2011 de TUI anulou, com base no erro no pressuposto legal, o despacho de 20 de Janeiro de 2010 proferido por mim para aplicar a A, funcionária pública da DSF, uma pena de suspensão de função pelo período de 90 dias. A anulação fundamenta-se, por um lado, em que a constituição da respectiva infracção disciplinar exige o dolo do agente, o despacho, entretanto, aplicou, com base na negligência, o disposto no artigo 315, n.º 2, al. n) do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau; por outro lado, na violação do princípio de proibição de dupla valoração, por o despacho ter considerado as respectivas circunstâncias, que já tinham sido requisitos constitutivos legais de tal infracção disciplinar, como circunstâncias agravantes.
Nos termos do artigo 174, nºs 1 e 2 do Código de Processo Administrativo Contencioso, mandou-se executar tal decisão.
Tendo em conta as matérias de facto referidas e provadas pelo processo disciplinar e confirmadas pelas decisões declaradas, forma-se a conclusão de que a suspeita violou o dever de isenção referido no artigo 279, n.º 2, al. a) e n.º 3 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, o dever de zelo referido no n.º 2, al. b) e n.º 4 do mesmo artigo e o dever de lealdade referido no n.º 2, al., d) e n.º 6 do artigo, encontrando-se na sua conduta culpa e grave desinteresse pelo cumprimento dos deveres profissionais, pelo que é preenchido o requisito previsto no artigo 314, n.º 1 do Estatuto.
Consideramos as circunstâncias atenuantes indicadas pelo processo disciplinar e a inexistência de qualquer circunstância agravante indicada pelo Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau.
Nos termos do artigo 314, n.º 1 e n.º 3, artigo 279, n.º 2, al.s a), b), d) e nºs 3, 4 e 6, artigo 300, n.º 1, al. c) e artigo 316, n.º 1 do ETAPM, decido aplicar à suspeita A uma pena de suspensão de função pelo período de 90 dias. Entendo que a pena foi cumprida dado que o seu trabalho tinha sido suspenso.
Notifique-se A e remeta-se este despacho ao Secretário para a Economia e Finanças para a execução da decisão.”
9) Em 01 de Julho de 2011, através do ofício n.º 0974/GSEF/2011, a Secretaria para a Economia e Finanças entregou o despacho n.º 77/CE/2011 proferido pelo Chefe do Executivo para a DSF a fim do acompanhamento (vd. fls. 36 do processo administrativo).
10) Em 07 de Julho de 2011, através do ofício n.º 0984/GSEF/2011, a Secretaria para a Economia e Finanças entregou o supracitado despacho de 30 de Junho de 2011 proferido pelo Chefe do Executivo para a DSF para a aplicação de medidas necessárias (vd. fls. 30 do processo administrativo).
11) Ao mesmo dia, a Directora da DSF proferiu novamente despacho na informação n.º 073/NAJ/CRF/11 (vd. fls. 197 do processo administrativo):
“Revogo o meu despacho datado de 24/06/2011.
Determino a reinstrução do processo capeado pela informação n.º 073/NAJ/CRF/11, à luz dos despachos de Sua Ex.a o Chefe do Executivo remedidos à DSF através dos ofícios nºs 974 e 984/GSEF/2011.”
12) Em 11 de Julho de 2011, o agente da DSF elaborou a informação n.º 017/DIR/2011, em que se propôs, que “...propõe-se seja levada à superior consideração do Ex.mo Senhor Secretário para a Economia e Finanças, a homologação do valor total de reposição na Recebedoria da Repartição de Finanças de Macau, por parte da Técnica superior assessora principal da DSF, lic. A, , de dinheiros públicos recebidos “em contravenção do limite anual máximo de remuneração previsto no artigo 176.º do ETAPAM, ainda não prescritas” (pág.ª 182 do Relatório), nos anos económicos de 2006, 2007, 2008, respectivamente de MOP$7.018,40, MOP$257.558,10 e MOP$233.902,40, num total de MOP$498.478,90...”. À informação anexam-se os três quadros seguintes (vd. fls. 198 a 208 do processo administrativo, cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido):
, A
REMUNERAÇÕES DE 2006

Total
Abrangidas no cálculo do Limite Máximo - ETAPM 176º
Não abrangidas no cálculo do Limite Máximo - ETAPM 176º
DIRECÇÃO DOS SERVIÇÕES DE FINANÇAS



VENCIMENTOS
548,100.00
548,100.00

RECUPERAÇÃO DO VENC. EXERCICIO PERDIDO
1,522.70
1,522.70

PRÉMIO DE ANTIGUIDADE
4,560.00

4,560.00
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
46,055.00
46,055.00

SUBSÍDIO DE NATAL
46,055.00
46,055.00

SUBSÍDIO DE FAMÍLIA
9,960.00

9,960.00
AJUDAS DE CUSTO DIÁRIAS
49,508.60

49,508.60
DESLOCACÕES – COMPENSAÇÃO DE ENCARGOS
1,650.30

1,650.30
AJUDAS DE CUSTO DE EMBARQUE
2,500.00

2,500.00
REMUNERAÇÕES – COMISSÕES DE IMPOSTOS*
120,225.00
120,225.00

ABONO P/LICENÇA ESPECIAL
135,153.00

135,153.00
OUTROS ENCARGOS DE DESLOCAÇÕES
722.40

722.40
REMUNERAÇÕES – CRAC***
69,300.00
69,300.00

SOMA
1,035,312.00
831,257.70
204,054.30
CONSELHO EXECUTIVO – SENHAS PRESENÇA
525.00

525.00
DSAFP – AJUDAS DE CUSTO DIÁRIAS
366.70

366.70
OBRA SOCIAL DA POLÍCIA JUDICIÁRIA**
31,500.00
31,500.00

DIRECÇÃO DOS SERVIÇOS DE CORREIOS **
5,785.50
5,785.50

FUNDO DE PENSÕES **
56,700.00
56,700.00

MONTEPIO GERAL DE MACAU*
525.00
525.00

TOTAL DOS RENDIMENTOS DE TRABALHO
1,130,714.20
925,768.20
204,946.00
LIMITE MÁXIMO = [(1000 x $52,5 x 125)/100] x 14

918,750.00

DIFERENÇA A REPÔR

7,018.20


OBS.:(*) Acumulação de funções públicas por inerência; (**) Acumulação de funções de representante da Direcção dos Serviços de Finança nos termos do Decreto-Lei n.º 14/98/M, para fiscalização ou controlo de dinheiros públicos; (***) Acumulação de funções de Presidente da Comissão de Registo dos Auditores e dos Contabilistas, nos termos do Anexo do Despacho do Chefe do Executivo n.º2/2005.

Limite máximo – ANEXO INF 17DIR_18DIR2011
, A
REMUNERAÇÕES DE 2007

Total
Abrangidas no cálculo do Limite Máximo - ETAPM 176º
Não abrangidas no cálculo do Limite Máximo - ETAPM 176º
DIRECÇÃO DOS SERVIÇÕES DE FINANÇAS



VENCIMENTOS
627,825.00
627,825.00

RECUPERAÇÃO DO VENC. EXERCICIO PERDIDO
2,912.20
2,912.20

PRÉMIO DE ANTIGUIDADE
7,049.00

7,049.00
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
55,570.00
55,570.00

SUBSÍDIO DE NATAL
55,570.00
55,570.00

SUBSÍDIO DE FAMÍLIA
9,960.00

9,960.00
AJUDAS DE CUSTO DIÁRIAS
81,419.70

81,419.70
DESLOCACÕES – COMPENSAÇÃO DE ENCARGOS
1,427.80

1,427.80
AJUDAS DE CUSTO DE EMBARQUE
5,000.00

5,000.00
REMUNERAÇÕES – COMISSÕES DE IMPOSTOS*
326,150.00
326,150.00
0.00
REMUNERAÇÕES – CRAC***
42,856.00
42,856.00

REEMBOLSOS POR OUTROS MOTIVOS
9,404.40

9,404.40
SOMA
1,225,144.10
1,110,883.20
114,260.90
AJUSTAMENTO DERIVADO DO AUMENTO DO ÍNDICE MÁXIMO DE 1000 PARA 1100 A PARTIER DE 1/7/2007
38,500.00
38,500.00

SOMA
1,263,644.10
1,149,383.20
114,260.90
OBRA SOCIAL DA POLÍCIA JUDICIÁRIA**
16,500.00
16,500.00

DIRECÇÃO DOS SERVIÇOS DE CORREIOS **
68,199.90
68,199.90

FUNDO DE PENSÕES **
29,700.00
29,700.00

MONTEPIO GERAL DE MACAU*
4,400.00
4,400.00

TOTAL DOS RENDIMENTOS DE TRABALHO
1,382,444.00
1,268,183.10
114,260.90
LIMITE MÁXIMO = [(1000 x $55 x 125)/100] x 7

481,250.00

LIMITE MÁXIMO = [(1100 x $55 x 125)/100] x 7

529,375.00

DIFERENÇA A REPÔR

257,558.10


OBS.:(*) Acumulação de funções públicas por inerência; (**) Acumulação de funções de representante da Direcção dos Serviços de Finança nos termos do Decreto-Lei n.º 14/98/M, para fiscalização ou controlo de dinheiros públicos; (***) Acumulação de funções de Presidente da Comissão de Registo dos Auditores e dos Contabilistas, nos termos do Anexo do Despacho do Chefe do Executivo n.º2/2005.

Limite máximo – ANEXO INF 17DIR_18DIR2011
, A
REMUNERAÇÕES DE 2008

Total
Abrangidas no cálculo do Limite Máximo - ETAPM 176º
Não abrangidas no cálculo do Limite Máximo - ETAPM 176º
DIRECÇÃO DOS SERVIÇÕES DE FINANÇAS



VENCIMENTOS
708,000.00
708,000.00

RECUPERAÇÃO DO VENC. EXERCICIO PERDIDO
1,222.30
1,222.30

PRÉMIO DE ANTIGUIDADE
6,840.00
6,840.00

SUBSÍDIO DE FÉRIAS
59,570.00
59,570.00

SUBSÍDIO DE NATAL
59,570.00
59,570.00

SUBSÍDIO DE FAMÍLIA
2,700.00

2,700.00
AJUDAS DE CUSTO DIÁRIAS
48,529.80

48,529.80
DESLOCACÕES – COMPENSAÇÃO DE ENCARGOS
805.10

805.10
AJUDAS DE CUSTO DE EMBARQUE
5,000.00

5,000.00
REMUNERAÇÕES – COMISSÕES DE IMPOSTOS*
314,630.00
314,630.00
0.00
ABONO P/LICENÇA ESPECIAL



OUTROS ENCARGOS DE DESLOCAÇÕES



REMUNERAÇÕES – CRAC***



SOMA
1,206,867.20
1,149,832.30
57,034.90
AJUSTAMENTO DERIVADO DO AUMENTO DO ÍNDICE MÁXIMO DE 1000 PARA 1100 A PARTIER DE 1/7/2007
82,600.00
82,600.00

SOMA
1,289,467.20
1,232,432.30
57,034.90
CONSELHO EXECUTIVO – SENHAS PRESENÇA
1,770.00

1,770.00
OBRA SOCIAL DA POLÍCIA JUDICIÁRIA**
0.00
0.00

DIRECÇÃO DOS SERVIÇOS DE CORREIOS **
131,360.10
131,360.10

FUNDO DE PENSÕES **
0.00
0.00

MONTEPIO GERAL DE MACAU*
5,860.00
5,860.00

TOTAL DOS RENDIMENTOS DE TRABALHO
1,428,457.30
1,369,652.40
58,804.90
LIMITE MÁXIMO = [(1100 x $59 x 125)/100] x 14

1,135,750.00

DIFERENÇA A REPÔR

233,902.40


OBS.:(*) Acumulação de funções públicas por inerência; (**) Acumulação de funções de representante da Direcção dos Serviços de Finança nos termos do Decreto-Lei n.º 14/98/M, para fiscalização ou controlo de dinheiros públicos; (***) Acumulação de funções de Presidente da Comissão de Registo dos Auditores e dos Contabilistas, nos termos do Anexo do Despacho do Chefe do Executivo n.º2/2005.

Limite máximo – ANEXO INF 17DIR_18DIR2011
13) Em 12 de Julho de 2011, a Directora da DSF emitiu na informação n.º 017/DIR/2011 o seguinte parecer:
“Concordo com o conteúdo desta informação. Reavaliado o valor total de reposição na Recebedoria da Repartição de Finanças de Macau, por parte de A, , encontrou-se uma diferença entre este e o escrito no relatório elaborado pelo instrutor, pelo que peço ao Exmo. Senhor Secretário que defira que o valor de reposição, por parte de A, , de dinheiro nos anos económicos de 2006, 2007, 2008, seja respectivamente de MOP$7.018,40, MOP$257.558,10 e MOP$233.902,40.” (vd. fls. 208 do processo administrativo)
14) Em 14 de Julho de 2011, o Secretário para a Economia e Finanças proferiu o despacho de “deferimento” na informação n.º 017/DIR/2011 (vd. fls. 208 do processo administrativo).
15) A Directora da DSF proferiu no mesmo dia o seguinte despacho: “À DAF. Ao abrigo do disposto no artigo 176 do ETAPM, determino à reposição das quantias indevidamente recebidas. Notifique-se em conformidade.” (vd. fls. 208 do processo administrativo).
16) Em 15 de Julho de 2011, através do ofício n.º 10008/DAF/11, a DSF notificou a Recorrente do despacho de 14 de Julho de 2011 proferido pela Directora da DSF que determinou à reposição das quantias por aquela indevidamente recebidas. (vd. fls. 37 a 41 do processo administrativo, cujo conteúdo dá-se aqui por integralmente reproduzido).
17) Em 22 de Agosto de 2011, a Recorrente interpôs recurso contencioso do despacho de 14 de Julho de 2011 proferido pela directora da DSF na informação n.º 017/DIR/2011.
*
III – Fundamentação:
A- Recurso da Recorrente:
Como fundamentos do presente recurso jurisdicional, a Recorrente invocou essencialmente o seguinte:
- a falta de audiência prévia
- a errada qualificação jurídica das remunerações pagas; e
- o erro no cálculo do limite de remunerações auferidas.
Vamos analisar se lhe assiste razão.
1. Da falta de audiência prévia:
Como é sabido, a audiência de interessados é uma das formas de concretização do princípio da participação dos particulares no procedimento administrativo, legalmente previsto no artº 10º do CPAC, nos termos do qual os órgãos da Administração Pública devem assegurar a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objecto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito.
E destina-se a evitar, face ao administrado, o efeito surpresa e, no mesmo passo, garantir o contraditório, de modo a que não fiquem diminuídos os direitos ou interesses legalmente protegidos dos administrados.
No caso em apreço, não foi realizada a audiência da Recorrente antes da tomada da decisão do acto recorrido.
   A doutrina e a jurisprudência, tanto da RAEM como de Portugal, cujo sistema jurídico deste último é igual ou semelhante ao nosso, pelo que a citamos a título do Direito Comparado, têm vindo a entender que a preterição dessa formalidade pode, em certos casos, ser ultrapassada se daí não resulte qualquer ilegalidade determinante da anulação do acto, isto é, quando, atentas as circunstâncias concretas, a intervenção do interessado se tornou inútil, seja porque o contraditório já se encontre assegurado, seja porque não haja nada sobre que ele se pudesse pronunciar, seja porque, independentemente da sua intervenção e das posições que o mesmo pudesse tomar, a decisão da Administração só pudesse ser aquela que foi tomada (Ac. do TUI, de 25/04/2012, proferido no Proc. nº 11/2012 e Ac. do TSI, de 07/07/2011, proferido no Proc. nº 801/2009, bem como os Ac. do STA, proferidos nos Recursos nºs 1240/02, 671/10 e 833/10, respectivamente, de 03/03/2004, 10/11/2010 e 11/05/2011).
Na perspectiva da sentença recorrida, não obstante se verificar a falta de audiência prévia, “a sua omissão se degrada em formalidade não essencial”, uma vez que “sobre a matéria de apuramento dos montantes indevidamente recebidos para o efeito de reposição, a administração não está dotada do poder discricionário ou margem de apreciação – até porque tem de proceder em conformidade com as regras consagradas do artº 176º nºs 1 e 2 do ETAPM”.
Salvo o devido respeito, não podemos concordar com essa posição.
Bem observou o Dignº Magistrado do Mº Pº junto deste Tribunal que “sendo embora vinculado o poder de ordenar a reposição consagrada no nº 4 do artº 176º do ETAPM, é sempre discutível o conceito - o seu alcance e a sua abrangência. Com efeito, o apuramento das verbas componentes deste conceito pode comportar opiniões divergentes e, assim, envolver a margem de apreciação”.
Na verdade, foram suscitadas várias questões relativas ao quantum a repor, tanto sobre matéria de facto como de direito.
Por exemplo, suscitou-se o erro no pressuposto de facto relativo à quantia total auferida como membro das comissões fiscais no ano de 2007, tacto esse que foi atendido pela sentença recorrida, determinando-se a anulação do acto recorrido nesta parte.
Tudo isto evidencia que o acto recorrido não é a única possível, pelo que a audiência prévia da Recorrente poderia ter levado a um resultado diferente.
Nesta conformidade, é de julgar procedente este argumento do recurso, revogando a sentença recorrida e anulando, em consequência, o acto recorrido.
Desta forma, fica prejudicado o conhecimento dos restantes vícios invocados, já que a anulação do acto recorrido impõe à Administração a reformulação da decisão que determina o quantum das quantias indevidamente recebidas, caso entenda que ainda subsistam os pressupostos legais para o efeito.
*
B- Recurso da Entidade Recorrida:
Pelas mesmas razões acima expostas, a procedência do recurso interposto pela Recorrente prejudica também o conhecimento do recurso interposto pela Entidade Recorrida.
*
IV DECISÃO:
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam:
- em conceder provimento ao recurso interposto pela Recorrente, revogando a sentença recorrida e anulando, em consequência, o acto recorrido.
- em não conhecer do recurso interposto pela Entidade Recorrida.
*
Sem custas.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 19 de Março de 2015.

Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong

Fui presente
Mai Man Ieng



33
818/2013