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Proc. nº 265/2015/A
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 16 de Abril de 2015
Descritores:
- Suspensão de eficácia
- Requisitos
- Prejuízos de difícil reparação

SUMÁRIO

I. Se a entidade requerida não apresentar contestação e se limitar a oferecer o merecimento dos autos, deve entender-se que não impugna a inexistência de grave prejuízo para o interesse público a que se refere a alínea b), do mesmo nº2. Nesse caso, de acordo com o disposto no art. 129º, nº1 do CPAC o tribunal deve considerar verificado o requisito constante dessa alínea a não ser que, não obstante a falta de contestação, o tribunal considere ostensiva a verificação da lesão.

II. O objectivo da providência de suspensão de eficácia é acautelar o efeito útil do recurso, evitando-se através dela que se produza uma situação danosa de muito difícil remédio ou, por maioria de razão, irremediável (periculum in mora). Isto é, visa evitar o perigo de uma lesão praticamente irreversível aos interesses relevantes no caso concreto para o requerente ou para aqueles que ele defende no recurso.

III. Para efeito da alínea a), do nº 1, do art. 121º, do CPAC, só são de considerar os prejuízos que decorram necessariamente da execução do acto e não os conjecturais, eventuais e hipotéticos que dele possam advir, sendo certo, por outro lado, que a dificuldade de reparação do prejuízo, exigida pela mesma alínea deve ser avaliada através de um juízo prognose relativo a danos muito prováveis, tendo em conta o dever de reconstrução da situação (hipotética) pela autoridade administrativa na sequência de uma eventual sentença de anulação.


















Proc. nº 265/2015/A

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
A, viúva, e ---
B, solteiro, maior,---
ambos de nacionalidade chinesa, residentes em Macau, no Pátio de XXXX, nº XX, XXXX, XXº andar, ---
requerem a suspensão de eficácia da decisão do Exmo. Secretário para a Economia e Finanças, datada de 16/12/2014, que, por delegação de poderes do Ex.mo Chefe do Executivo,---
a) Declarou nula, com base no parecer do IPIM, a renovação de autorização de fixação de residência temporária concedida em 02/07/2014 ao requerente principal C e aos ora Requerentes A e B, no âmbito do processo n.º P0246/2006/02R, do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (“IPIM”);
b) Indeferiu o pedido da renovação de autorização de fixação de residência temporária dos ora Requerentes apresentado em 15/05/2012; e
c) Indeferiu o pedido de transmissão de posição do Requerente do Processo em causa para a ora 1a Requerente A.
*
A entidade requerida, citada, limitou-se a oferecer o merecimento dos autos (fls. 37).
*
O digno Magistrado do MP opinou o seguinte:
“Exarado pelo Exmo. Senhor Secretário para Economia e Finanças na Informação n.º 00615/GJFR/2014 (Doc. de fls. 18 a 21 do P.A.), o acto objecto do pedido de Suspensão de Eficácia diz apenas «批准建議». Nos termos do art. 115º n.º 1 do CPA, a declaração «批准建議» implica que aquela faz parte integrante do despacho suspendendo.
O teor dessa Informação demonstra que o despacho suspendendo se traduz, no fundo, em declarar nulo o despacho exarado na Informação n.º 0246/居留/2006/02R, em indeferir o pedido de renovação da autorização de residência temporária subscrito por Requerente falecido C), e ainda em indeferir o pedido da posição apresentado.
Em harmonia com as jurisprudências pacíficas, trata-se in casu de um acto administrativo de conteúdo positivo, por provocar directamente a alteração do statu quo dos dois requerentes - estão actualmente a viver e, para o 2º requerente, também trabalhar em Macau.
Ao abrigo do disposto na alínea a) do art. 120º do CPAC, verifica-se a idoneidade do objecto, no sentido de ser susceptível de suspensão da eficácia o referido despacho. Resta-nos apurar se se preencherem os três requisitos previstos no n.º 1 do art. 121º do CPAC.
*
No actual ordenamento jurídico de Macau, constitui jurisprudência pacífica e constante que são, em regra geral, cumulativos os 3 requisitos previstos no n. º 1 do art. 121º do CPAC, e a não verificação de qualquer um deles toma desnecessária a apreciação dos restantes porque o deferimento exige a verificação cumulativa de todos os requisitos e estes são independentes entre si. (Acórdão do TUI no Processo n.º 2/2009).
E, em princípio, cabe à requerente o ónus de demonstrar, mediante prova verosímil e susceptível de objectiva apreciação, o preenchimento do requisito consagrado na alínea a) do referido n.º 1, por aí não se estabelecer a presunção do prejuízo de difícil reparação. (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º 2/2009, Acórdãos do TSI nos Processos n.º 799/2011 e n.º 266/2012/A)
Não fica tal ónus cumprido com a mera utilização de expressões vagas e genéricas irredutíveis a factos a apreciar objectivamente. Terá de tomar credível a sua posição, através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objectivos. (Acórdãos do ex-TSJM de 23/06/1999 no Processo n.º 1106, do TUI no Processo n.º 33/2009, do TSI no Processo n.º 266/2012/ A)
E, apenas relevam os prejuízos que resultam directa, imediata e necessariamente, segundo o princípio da causalidade adequada, do acto cuja inexecução se pretende obter, ficando afastados os prejuízos conjecturais, eventuais e hipotéticos. (Acórdãos do ex-TSJM de 15/07/1999 no Processo n.º 1123, do TSI no Processo n.º 17/2011/A)
No que respeite às decisões administrativas de revogar ou cancelar qualquer autorização da residência temporária ou de indeferir o pedido de renovação, a tese dominante das nossas jurisprudências dos Venerandos TSI e TUI vem sedimentando e consolidando a ideia de a interrupção do educação regular, seja primário, secundário ou universitário, constituir prejuízo de difícil reparação.
Em esteira destas criteriosas jurisprudências por não se descortinar nenhuma razão para alterá-las ou abandoná-las, e ressalvado respeito pela opinião diferente, entendemos que não merece deferimento o pedido de suspensão de eficácia em apreço, devido à inexistência da convincente prova de se preencher o consagrado na a) do n.º 1 do art. 121 º do CPAC.
Ora, os requerentes alegam apenas que a execução do acto suspendendo vai conduzir o 2º requerente a cair na dificuldade de arranjar um emprego com mesmo salário que actualmente auferido, e eles não têm presentemente outro local com condições condignas para viver. (cfr. arts. 27º e 32º do Requerimento Inicial)
Segundo a doutrina e jurisprudência pacífica, mesmo sendo real e verdadeira a alegada dificuldade, a mesma não pode constituir prejuízo de difícil reparação. Quanto à falta de «outro local com condições condignas para viver», sufragamos a tese de que tal expressão não passar, em bom rigor, de referência vagas e juízos conclusivos meramente subjectivos. (cfr. Acórdão do TSI no Processo n.º 266/2012/A).
Pelo exposto, propendemos pela improcedência do presente pedido de suspensão de eficácia”.
*
Cumpre decidir.
***
II - Pressupostos processuais
O tribunal é absolutamente competente.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 - C, marido e pai, respectivamente, da 1a e 2º requerentes, requereu junto do IPIM e pela primeira vez, em 2006, a fixação de residência temporária na RAEM, como adquirente de bens imóveis, ao abrigo do disposto do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, de 4 de Abril.
2 - Com base no mesmo diploma legal, C solicitou também a extensão do pedido de fixação de residência para a esposa, a ora 1ª Requerente, e para o filho, o ora 2º Requerente, enquanto elementos do agregado familiar.
3 - A autorização de fixação de residência temporária do C e dos ora Requerentes foi concedida em 04/09/2006.
4 - Tendo vindo a ser sucessivamente renovada junto do IPIM.
5 - No dia 15 de Maio de 2012 C através do representante D, apresentou pedido de renovação de autorização temporária, na sequência do que o Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças proferiu despacho de deferimento em 2/07/2012.
6 - Os interessados acima identificados completaram 7 anos de autorização de residência temporária em 4/09/2013.
7 - Em Novembro de 2013, os interessados apresentaram os documentos destinados à comprovação da sua situação de residência.
8 - Entretanto, em 29/01/2014, os ora 1a e 2º Requerentes foram notificados pelo IPIM para uma audiência escrita, tendo o IPIM informado que o pedido de renovação da autorização de residência feito em 15/05/2012 devia ser “inexistente” uma vez que o requerente principal C tinha falecido em 04/01/2010, e portanto, a procuração outorgada em 09/11/2005, que foi utilizada para instruir o pedido de renovação tinha caducada naquela altura (Doc. 2 dos autos, traduzido a fls. 15 a 17 do apenso “traduções”).
9 - Os ora Requerentes responderam por escrito, em 24/02/2014, oferecendo explicações à situação supra mencionada. (Doc. 3 dos autos, traduzido a fls. 18 a 25 do apenso “traduções”).
10 - Foi prestada a Informação Nº 00615/GJFR/2014, com o seguinte teor, datada de 01/12/2014:
«Exmo. Director do GJFR E,
1. O requerente, C, com observância do disposto no Regulamento Administrativo n.º 3/2005, pediu a este Instituto a autorização de residência temporária por aquisição de bem imóvel, extensiva ao seu cônjuge A e ao seu descendente B. No dia 4 de Setembro de 2006, o Senhor Chefe do Executivo deferiu o pedido de autorização de residência temporária dos interessados supramencionados, vide o processo n.º 0246/2006 onde constam as informações concernentes.
2. Consultando o processo de renovação n.º 0246/2006/02R, verifica-se que o requerente, através do seu representante D, apresentou, em 15 de Maio de 2012, pedido de renovação de autorização de residência temporária, em relação ao qual o Senhor Secretário para a Economia e Finanças proferiu despacho em 2 de Julho de 2012, concedendo ao requerente C autorização de residência temporária válida até 4 de Setembro de 2015, extensiva ao seu agregado familiar, incluindo o seu cônjuge A e o seu descendente B.
3. Os interessados acima identificados completaram 7 anos de autorização de residência temporária em 4 de Setembro de 2013, podendo, nos termos legais, pedir o reconhecimento do estatuto de residente permanente da RAEM. Por isso, em Novembro de 2013, vieram os interessados apresentar a este Instituto os documentos necessários à comprovação de que a sua situação não deixou de preencher o disposto no referido Regulamento Administrativo antes de eles completarem sete anos de residência temporária autorizada em Macau. No entanto, detectou-se na altura que o requerente C já tinha morrido no dia 4 de Janeiro de 2010.
4. Com base nisso, a interessada A enviou uma carta em 5 de Novembro de 2013, indicando o seguinte (cfr. Anexo I):
(1) C faleceu por doença a 4 de Janeiro de 2010, o que não chegou a ser comunicado atempadamente por desconhecimento da lei.
(2) Alegou que, para efeitos de renovação de autorização de residência temporária, C, enquanto estava vivo, assinou os documentos necessários ao pedido de renovação e pediu à companhia imobiliária para apresentar em 2012 o respectivo pedido de renovação.
(3) Como tinha falecido o requerente C, pediu que fosse transmitida para A a posição de requerente no respectivo processo de pedido de fixação de residência temporária.
5. Como se referiu acima, o Senhor Secretário para a Economia e Finanças, por despacho de 2 de Julho de 2012 proferido na Informação n.º 0246/Fixação de residência/2006/02R, concedeu ao requerente C autorização de residência temporária válida até 4 de Setembro de 2015, extensiva ao seu agregado familiar, incluindo o seu cônjuge A e o seu descendente B. Com a morte do requerente C, ou seja, destinatário desse despacho, tomou-se impossível o objecto da decisão em causa, daí ser nulo o mesmo despacho nos termos do art.º 122.º, n.º 2, al. c) do CPA.
6. Nesta conformidade, entendeu-se que, no âmbito do processo de renovação de autorização de residência temporária n.º 0246/2006/02R, os interessados A e B, no uso ilegítimo dos documentos assinados pelo requerente C antes de morrer, obtiveram a autorização de residência temporária que não deviam ter obtido. Assim sendo, realizou-se audiência escrita dos interessados.
7. A interessada A e o descendente B apresentaram contestação escrita (cfr. Anexo II), apontando, em síntese, o seguinte:
(1) Em finais de 2009, o requerente C, sabendo que ia morrer de cancro, foi, juntamente com a interessada A e o seu descendente B, consultar o seu representante sobre a forma como se trataria da renovação da autorização de residência após a sua morte.
(2) Conforme alegaram os interessados, o representante disse-lhes então que poderiam tratar do pedido de renovação em lugar do requerente desde que este tivesse assinado previamente os documentos necessários ao pedido.
(3) Os interessados declararam ter informado o representante de que o requerente tinha morrido de doença em 4 de Janeiro no Interior da China.
(4) Mas em meados de 2012, os interessados, mediante o seu representante, apresentaram a este Instituto o segundo pedido de renovação (no uso dos documentos assinados pelo requente antes de morrer), tendo-se instaurado o processo n.º 0246/2006/02R.
(5) Realçaram os interessados que, ao praticarem os factos em apreço, não tinham a intenção de falsificar documentos, nem prejudicaram interesses alheios, e que só praticaram tais factos por terem acreditado, erradamente, no que disse o representante, pedindo, assim, compreensão e indulgência, no sentido de os autorizarem a tratar de todas as formalidades que falta cumprir, e deferirem o seu pedido de renovação.
8. Segue-se a análise da supracitada contestação escrita:
(1) De acordo com a contestação supra aludida, os diferentes interessados já chegaram a acordo em finais de 2009 sobre a forma como apresentariam pedido de renovação em 2012.
(2) E em 12 de Abril de 2012, no uso do Bilhete de Identidade de Residente Não Permanente de Macau do requerente C, já falecido nessa altura, os interessados procederam no 2º Cartório Notarial ao reconhecimento da assinatura do requerente C. Cfr. os documentos constantes de fls. 1 a 6, 10, 37 e 40 do processo n.º 0246/2006/02R.
(3) Importa salientar que, com a morte do requerente C, dissolveram-se o seu casamento e outras relações, deixando os interessados, desde então, de ser membros do agregado familiar para efeitos do pedido de fixação de residência temporária n. º 0246/2006/02R, nos termos do Regulamento Administrativo n.º 3/2005.
(4) Das alegações dos interessados decorre que os diferentes interessados, obviamente, deixaram passar a oportunidade de informar este Instituto da morte do requerente. Só em Novembro de 2013, momento em que vieram os interessados pedir o reconhecimento do estatuto de residente permanente, foi descoberto que o requerente já tinha morrido de doença em 4 de Janeiro de 2010.
(5) Nos termos acima analisados, constata-se que os diversos interessados, no seu próprio interesse, chegaram a acordo para utilizarem a procuração assinada pelo requerente falecido C antes de morrer e documentos comprovativos que tinha perdido validade com vista ao tratamento dos trâmites de renovação da autorização de residência temporária.
(6) Levaram, deste forma, a Administração Pública a pensar, erradamente, que o requerente ainda estava vivo, o que fez com que os interessados obtenham, no respectivo processo de renovação, interesses ilegítimos - a autorização de residência temporária (renovada).
9. Concluindo a análise do caso vertente da forma seguinte:
(1) Pelo facto de C, requerente no processo de pedido de fixação de residência temporária n. º 0246/2006/02R, ter falecido em 4 de Janeiro de 2010, tomou-se impossível o objecto do despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças, proferido em 2 de Julho de 2012 na Informação n.º 0246/Fixação de residência/2006/02R, que concedeu ao requerente C, ao seu cônjuge A e ao seu descendente B, autorização de residência temporária válida até 4 de Setembro de 2015. Por isso, e em consonância com o art.º 122.º, n.º 1, al. c) do CPA, propõe-se que seja declarado nulo o despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças datado de 2 de Julho de 2012.
(2) A morte do requerente no processo de pedido de fixação de residência temporária, ocorrida no dia 4 de Janeiro de 2010, fez com que os interessados A e B, em 15 de Maio de 2012, já não tivessem condições para pedir a renovação da autorização de residência temporária, pelo que se propõe o indeferimento do pedido de renovação de autorização de residência apresentado pelos interessados no dia 15 de Maio de 2012.
(3) Da análise das circunstâncias deste caso concreto pode resultar que os diferentes interessados pretenderam encobrir o facto de ter morrido o requerente e utilizaram, de forma ilegítima, os referidos documentos comprovativos no respectivo processo de renovação, induzindo em erro a Administração Pública, com a intenção de obter interesses ilegítimos no processo de renovação. Os interessados, pela prática desses factos, terão violado a lei penal, podendo ser responsabilizados criminalmente. Por esse motivo, propõe-se que seja rejeitada a transmissão para A da posição de requerente no respectivo processo de pedido de fixação de residência temporária, peticionada pelos interessados A e B.
Submete-se a proposta à consideração superior». (fls. 18 e sgs. dos autos, com tradução a fls. 7 a 14 do apenso “Traduções”).
11 - O director do Gabinete Jurídico e de Fixação de Residência, em 9/12/2014 emitiu o seguinte “parecer”:
“ Concordo com a presente informação, a qual propõe que seja declarado nulo o despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças datado de 2 de Julho de 2012, que concedeu ao requerente C e ao seu agregado familiar, composto pelo seu cônjuge A e seu descendente B, autorização de residência temporária válida até 4 de Setembro de 2015, visto que se tornou impossível o objecto desse despacho pelo facto de, com a morte do requerente C ocorrida em 4 de Janeiro de 2010, se terem dissolvido o seu casamento e outras relações.
Ao mesmo tempo, a morte do requerente fez com que os interessados não reunissem condições para pedir a renovação da autorização de residência temporária, pelo que se propõe o indeferimento do pedido de renovação de autorização de residência apresentado pelos interessados A e B no dia 15 de Maio de 2012.
Ademais, da análise das circunstâncias deste caso concreto pode resultar que os interessados pretenderam encobrir o facto de ter morrido o requerente, induzindo em erro a Administração Pública, com a intenção de obter interesses ilegítimos no processo de renovação. Os ditos interessados, suspeitos duma infracção penal, poderão ser criminalmente responsabilizados. Por esse motivo, propõe a informação que seja rejeitada a transmissão para A da posição de requerente no respectivo processo de pedido de fixação de residência temporária, peticionada pelos interessados A e B.
Submete-se o assunto à apreciação da Comissão Executiva” (fls. 18 dos autos e fls. 6 e 7 do apenso “Traduções”).
12 - O Presidente do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau pronunciou-se:
“Concordo com a proposta. A despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças” (fls. 18 dos autos e 6 do apenso “Traduções”).
13 - O Ex.mo Secretário para a Economia e Finanças despachou, em 16/12/2014:
“Autorizo a proposta” (fls. 18 dos autos e 6 do apenso “Traduções”).
14 - A requerente, que não exerce qualquer profissão, vive com o seu filho, que é “croupier” na Sociedade de Jogos de Macau, onde aufere um salário mensal de Mop$ 23.000,00.
***
IV - O Direito
1 - A situação de facto
Revisitando a matéria de facto, temos que a C foi sendo concedida autorização de residência temporária desde 4/09/2006, direito extensivo aos ora requerentes, na qualidade de esposa e filho, respectivamente.
E o facto é que em Novembro de 2013 já todos estes três interessados tinham completado 7 anos consecutivos de residência em Macau, o que lhes permitia requerem a residência permanente. E tal aconteceu, efectivamente. Assim, nessa altura foram apresentados os documentos pertinentes com vista à realização desse propósito.
Acontece que nessa ocasião os serviços detectaram que o marido da 1ª requerente, o referido C, já havia falecido no dia 4 de Janeiro de 2010, sem que desse facto tivesse sido dado conhecimento à entidade competente.
Nessa medida, quando foi apresentado o pedido de renovação em 15/05/2012, através do representante D, já o principal interessado C, havia falecido. Com base nisso, e com fundamento no art. 122º, nº2, al. c), do CPA, o Ex.mo Secretário declarou nulo o acto de 2/07/2012 que havia renovado a autorização de residência.
Ou seja, a declaração de nulidade teve por fundamento a impossibilidade do objecto do despacho de 2/07/2012.
Ao mesmo tempo, por se ter entendido que os requerentes (esposa e filho do falecido) já não dispunham de condições para pedirem a renovação, foi indeferida a pretensão de renovação e, por terem encoberto a situação real, foi rejeitada a transmissão para a ora requerente da posição do marido.
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2 - Dos fundamentos do pedido
Pretendem os requerentes a suspensão de eficácia do dito despacho de 16/12/2014.
Ora bem. Em primeiro lugar, não há lugar a dúvidas que o acto suspendendo tem um conteúdo positivo, em virtude de alterar o statu quo ante dos interessados ora requerente. Com efeito, a execução da decisão administrativa interfere com a situação de residência legal autorizada de que até então dispunham. Por conseguinte, na medida em que uma eventual sentença judicial puder manter o quadro de facto anterior, daí advindo um efeito útil para eles, deve entender-se, pois, que o acto em causa é suspensível (art. 120º, nº1, do CPAC).
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2 - O art. 121º do CPAC dispõe:
“1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.”
Por razões que se compreenderão, comecemos a análise dos requisitos legais pelo da alínea b), do nº 1, deixando para o fim o exame do da alínea a).
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O requisito da alínea b)
No caso dos autos, é conservatória a providência requerida, cuja procedência depende, geralmente, da verificação cumulativa1 dos requisitos vazados no art. 121º, um positivo (alínea a), do nº1), outros negativos (alíneas b) e c), do mesmo nº1).
E por geralmente serem de verificação usualmente cumulativa, bastará a falta de algum deles, para que a providência não possa já ser decretada.
A afirmação acabada de fazer só cederá nos casos em que no caso concreto concorra alguma das excepções previstas nos nºs 2 a 4 do art. 121º do CPAC. Porém, na situação dos autos, não estamos seguramente perante a situação do nº 2, nem a do nº 3. Por outro lado, o nº 4 do art. 121º também não merece ser aqui convocado, na medida em que ele parte do pressuposto da existência de um grave prejuízo para o interesse público - o mesmo é dizer, da falta de prova do requisito da alínea b), por parte do requerente -, ainda que “desproporcionadamente” inferior ao que para o requerente resultaria da não suspensão, i.e., da imediata execução do acto.
Em face de tais circunstâncias, continuaria a impor-se-nos a indagação acerca da existência conjunta dos apontados requisitos.
A nossa tarefa mostra-se, no entanto, facilitada, quanto ao estudo da existência do requisito da alínea b), em apreço.
Com efeito, a entidade requerida – que não chegou a fazer uso do mecanismo do art. 126º, nº 2 do CAPC – não apresentou nenhuma contestação articulada com impugnação dos factos, nem deduzindo qualquer matéria exceptiva. Limitou-se a oferecer o merecimento dos autos, não invocando “alegação de que a suspensão de eficácia do acto causa grave lesão do interesse público”. Significa isto que o digno Secretário para a Economia e Finanças não contestou a existência do requisito. E, portanto, sendo assim, e uma vez que também a nós não parece ser ostensiva a existência de tal lesão, outro remédio nos não resta senão cumprir a determinação do art. 129º, nº 1, do CPAC e “considerar verificado o requisito previsto na alínea b) do nº1 do art. 121º”.
De resto, também a situação de facto não parece levar a concluir que o retardamento na execução do acto pelo tempo por que durar o recurso contencioso é de molde a trazer qualquer lesão ao interesse público relevante, porquanto nenhuns fins de segurança e tranquilidade, bem como nenhuns outros ligados à necessidade do respeito pelas regras de convivência social estão em risco. O mesmo é dizer que nada custa pensar que o interesse público em nada fica beliscado com a permanência dos requerentes na RAEM até ao momento em que for decidido o recurso contencioso com trânsito em julgado2.
Mostra-se, pois, demonstrado o requisito da alínea b), do nº 1.
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O requisito da alínea c)
Do mesmo modo, a partir de uma perfunctória análise da petição do recurso contencioso entrada em 18/03/2015 (Proc. nº 265/2015), não nos parece que haja indícios fortes que apontem no sentido da ilegalidade da sua interposição, sabido, como é, que o requisito estabelecido na alínea c), do nº1, do art. 121º se refere às causas de ilegalidade adjectiva ou de natureza processual respeitantes, por exemplo, à carência de algum pressuposto processual3, e não às causas que se reportem ao insucesso dos fundamentos invalidantes invocados e, portanto, aos motivos de fundo ou de mérito do pedido.
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O Requisito da alínea a)
Resta, portanto, apurar da existência do requisito da alínea a), isto é, indagar se a execução do acto implica um prejuízo de difícil reparação para os requerentes.
Tem este TSI dito e reafirmado invariavelmente que o objectivo da providência de suspensão de eficácia é acautelar o efeito útil do recurso, evitando-se através dela que se produza uma situação danosa de muito difícil remédio ou, por maioria de razão, irremediável (periculum in mora). Isto é, visa evitar o perigo de uma lesão praticamente irreversível aos interesses relevantes no caso concreto para o requerente ou para aqueles que ele defende no recurso.
Logo, ela não se satisfaz com uma alegação vaga e sintética dos danos que o acto administrativo pode provocar. Mesmo não sendo necessária uma prova cabal, perfeita e exaustiva dos prejuízos, isso é verdade («...cause previsivelmente...»), é, ao menos, importante que o requerente traga aos autos um acervo de factos indiciariamente reveladores da existência de um verdadeiro dano na sua esfera decorrente da execução do acto, ou seja, é necessário alegar factos que permitam estabelecer um nexo de causalidade ou de causa-efeito entre a execução do acto e o invocado prejuízo4, ficando cometido ao tribunal o juízo de prognose acerca dos danos prováveis.
A este propósito, os requerentes invocaram:
- A execução do acto vai causar-lhes a necessária saída Macau, terra que os acolheu e onde vivem há cerca de 9 anos consecutivos e onde mantêm a sua vida familiar e social;
- A requerente sempre dependeu do marido, tornando-se com a morte daquele ainda mais débil, dependendo agora a nível económico, psicológico e afectivo do filho;
- O requerente trabalha para a SJM e na China não conseguirá obter um vencimento equivalente ao que aufere presentemente como “croupier”;
- Quando vieram para Macau, o marido e pai dos requerentes tinha vendido todos os bens, incluindo a casa de morada que possuía na China, pelo que não têm outro local com condições condignas para viver.
- É aqui que ambos têm a casa de morada de família, os seus amigos, as suas rotinas, o emprego.
No que respeita à requerente, não temos motivos para duvidar que a morte do marido lhe causa transtornos e adversidades, mesmo sem ser necessário apurar se ela dependia totalmente dele. Todavia, já não temos dados acerca da sua verdadeira situação familiar: se não tem mais descendentes ou outros parentes na República Popular da China. Quer dizer, o problema dos afectos não é necessariamente insuperável. E se outras razões não houvesse a apontar, diríamos que este filho, ora 2º requerente, se único for, haverá decerto de continuar a prestar à mãe o apoio que lhe compete enquanto filho.
No que respeita à alegada dependência económica do marido, a morte deste certamente não será suprível. Mas, esse é o destino da requerente na qualidade de viúva, tanto em Macau, como em qualquer outra parte do mundo onde viva.
Claro que a requerente também invocou a dependência económica actual do filho. Cremos, porém, que isso não está minimamente demonstrado, quando podia tê-lo sido por documentos (bancários, por exemplo).
Dito isto, não é líquido que os prejuízos decorrentes da execução do acto para a requerente sejam irreparáveis ou de difícil reparação.
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No que respeita ao requerente filho, sabemos apenas que ele é empregado de casino ao serviço da SJM, na posição de “croupier”, onde aufere o salário mensal de Mop$ 23.000,00.
O requerente acha que é um salário que dificilmente conseguirá obter fora de Macau, nomeadamente na RPC. Difícil será obter o mesmo tipo de emprego, isso sim, concordamos. Mas, já não é absolutamente certo que não possa vir a obter um rendimento equivalente na RPC. Tudo depende de um conjunto de circunstâncias, umas endógenas, outras exógenas, umas pelas quais se baterá com esforço e abnegação, outras que decorram das contingências do destino ou da sorte do acaso.
Como disse este TSI noutra ocasião, “…difícil é para o tribunal - num juízo de boa prognose - estabelecer qualquer fundado nexo de causalidade entre a situação actual e os efeitos futuros nefastos invocados que possam inelutavelmente derivar da execução do acto”5.
Não esqueçamos, por outro lado, que só são de considerar os prejuízos que decorram necessariamente da execução do acto e não aqueles conjecturais, eventuais e hipotéticos que dele possam advir6 e que a dificuldade de reparação do prejuízo, exigida pelo artº 121º, nº1, al. a), do CPAC deve ser avaliada através de um juízo prognose relativo a danos muito prováveis, tendo em conta o dever de reconstrução da situação (hipotética) pela autoridade administrativa na sequência de uma eventual sentença de anulação7. Ora, neste sentido, a reposição da actual situação hipotética não se mostra de todo impossível ante o eventual êxito do recurso contencioso com uma decisão transitada que obrigue a uma decisão administrativa de sinal contrário e que, consequentemente, permita ao requerente reaver o actual emprego. A perda de rendimento durante este interlúdio – em consequência da saída da RAEM – seria assim quantificável e, por isso, recuperável pela via indemnizatória.
Eis as razões pelas quais se entende que, neste caso, não está demonstrado o requisito da alínea a), do nº1, do art. 121º, do CPAC.
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V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em indeferir a requerida providência.
Custas pelos requerentes, com taxa de justiça em 2 UC para cada um (arts. 87º e 89º, nº1, do RCT).
TSI, 16 de Abril de 2015
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
Presente
Victor Manuel Carvalho Coelho,


1 Neste sentido, entre outros, Acs. do TUI de 2/06/2010, Proc. nº 13/2010 ou de 13/05/2009, Proc. nº 2/2009, TSI de 10/03/2011, Proc. nº 41/2011/A.
2 Neste sentido, ver, por exemplo, os Acs. do TSI de 21/12/2011, Proc. nº 785/2011/A; ou de 5/12/2011, Proc. nº 800/2011.
3 Neste sentido, Ac. do STA de 5/07/2000, Proc. nº 046219. Ver ainda José Eduardo Figueiredo Dias, em anotação ao Ac. do TSI de 30/05/2002, Proc. nº 94/2002, in BFD da Universidade de Macau, ano VIII, nº 18, 2004, pag. 179. Ainda, Acs. do TSI, de 30/05/2002, Proc. nº 92/2002; de 25/01/2007, Proc. nº 649/2006/A; de 15/12/2011, Procs. nºs 785/2011/A e 799/2011, DE 26/04/2012, Proc. nº 229/2012/A.
4 Neste sentido, ver os Ac. do TSI, de 23/07/2009, Proc. nº 586/2009 e de 15/12/2011, Proc. nº 799/2011, 3/05/2012, Proc. nº 266/2012/A, Ac. TSI, de 6/11/2014, Proc. nº 485/2014/A, entre outros.
5 Ac. TSI, de 12/03/2015, Proc. nº 91/2015
6 Ac. TSI, de 10/03/2011, Proc. nº 17/2011/A
7 Ac. TSI, de 18/12/2014, Proc.ç nº 785/2014
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