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Processo nº 213/2015
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Aos 10.03.2015 proferiu o ora relator a decisão sumária seguinte:

“Relatório
1. Em audiência colectiva no T.J.B. respondeu A, arguido com os sinais dos autos, vindo a ser condenado pela prática de 2 crimes de “burla qualificada”, p. e p. pelo art. 211°, n.° 1 e 4, al. a) do C.P.M., nas penas parcelares de 4 anos e 6 meses e 4 anos de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 6 anos de prisão; (cfr., fls. 208 a 213 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, o arguido recorreu.
Em sede das suas conclusões que produziu a final da sua motivação de recurso, pede uma redução da(s) pena(s); (cfr., fls. 231 a 237-v).
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Em resposta, considera o Ministério Público que o recurso não merece provimento, devendo ser rejeitado; (cfr., fls. 240 a 241-v).
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Neste T.S.I. e em douto Parecer, é o Ilustre Procurador Adjunto que o recurso deve ser julgado improcedente, afirmando o que segue:
“Cinge o recorrente a sua alegação à pretensão de redução da medida concreta da pena que lhe foi aplicada - 6 anos de prisão pretextando, para o efeito, o facto de ser ainda jovem (27anos), as suas condições familiares, encontrar-se arrependido, tendo confessado, entregando-se, inclusivamente, voluntariamente às autoridades policiais, tudo razões por que almeja redução daquela medida.
Sendo certo não se descortinar que, assumindo relevância e mostrando-se verdadeiras e integrais, aquelas considerações não tenham sido devidamente valoradas e sopesadas no douto acórdão sob análise, a verdade é que, do escrutínio que se empreende sobre o circunstancialismo que rodeou o caso, é possível concluir que a confissão dos factos por parte do recorrente ficou bastante aquém do que se poderia reportar como "integral e sem reserva ", mantendo-se silente relativamente a alguma e importante matéria concernente ao cabal esclarecimento dos factos, o que, por si, inviabiliza válido juízo de prognose relativamente a alegada contrição, ao que acresce que, para além de se não assistir a reparação voluntária perante os ofendidos, o valor assinalável do montante da burla, bem como as prementes necessidades de contenção e prevenção deste tipo de prática por parte de agente imobiliário, em terra onde cada vez mais (infelizmente) se vai assistindo a práticas congéneres, em domínio tão importante para a tranquilidade e coesão sociais, justificarão em nosso critério, a concreta pena alcançada, dentro do domínio da medida abstracta aplicável”; (cfr., fls. 252 a 253).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da manifesta improcedência do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), passa-se a decidir.

Fundamentação
Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 209 a 210, que não vem postos em causa, não se mostrando de alterar, e que por isso se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou nos termos atrás já referidos, na pena única de 6 anos de prisão.

Resulta das sua conclusões de recurso que, em sua opinião, excessivas são as penas que lhe foram fixadas.

Sendo esta a única “questão” pelo arguido colocada nas suas conclusões, (que como se sabe, delimitam o thema decidendum do recurso, com excepção das questões de conhecimento oficioso que, no caso, não há), vejamos.

Aos crimes de “burla” pelo ora recorrente cometidos cabe a pena de 2 a 10 anos de prisão.

Nos termos do art. 40° do C.P.M.:
“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.

Por sua vez, tem este T.S.I. entendido que:

“Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.02.2000, Proc. n° 2/2000, e, mais recentemente, de 13.01.2015, Proc. n° 13/2015).

E, quanto à atenuação especial da pena, tem igualmente este T.S.I. considerado que “a atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I. de 14.04.2011, Proc. n°130/2011 e de 29.01.2015, Proc. n° 22/2015).

No caso, de uma pena de 2 a 10 anos de prisão, fixou o T.J.B. a pena de 4 anos e 4 anos e 6 meses de prisão para cada 1 dos (2) crimes de “burla” pelo recorrente cometidos, evidente sendo que censura não merecem tais penas parcelares, já que motivos não existem para qualquer “atenuação especial” da pena, (uma vez que não se vislumbra nada que torne a situação dos autos “extraordinária” ou “excepcional”), não sendo também de considerar aquelas excessivas; (pois que ainda assim se encontram (próximas do seu limite mínimo).

De facto, o arguido agiu com dolo directo e intenso, causando prejuízos consideráveis aos 2 ofendidos dos autos – MOP$800.000,00 cada – e, como – bem – diz o Ilustre Procurador Adjunto, cujo douto Parecer aqui se dá como reproduzido, adequadamente valoradas tendo sido todas as circunstâncias relevantes, (como o facto de ser “primário”).

Não se pode porém esquecer que a “confissão parcial” – como é o caso dos autos – tem reduzido valor atenuativo, que esta não confirma qualquer “arrependimento”, e que fortes são as necessidades de prevenção criminal.

Vejamos agora a “pena única”.

Nos termos do art. 71° do C.P.M.:
“1. Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena, sendo na determinação da pena considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.
2. A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 30 anos tratando-se de pena de prisão e 600 dias tratando-se de pena de multa, e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
3. Se as penas concretamente aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, é aplicável uma única pena de prisão, de acordo com os critérios estabelecidos nos números anteriores, considerando-se as de multa convertidas em prisão pelo tempo correspondente reduzido a dois terços.
4. As penas acessórias e as medidas de segurança são sempre aplicadas ao agente, ainda que previstas por uma só das leis aplicáveis”.

E, no caso, em causa estando uma pena com uma moldura de 4 anos e 6 meses a 8 anos e 6 meses de prisão, evidente se mostra que a fixada, de 6 anos, (não atingindo o meio da pena) não é passível de ser considerada inflacionada.

Como recentemente decidiu o Tribunal da Relação de Évora:
“I - Também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico, pelo que o tribunal de recurso deve intervir na pena (alterando-a) apenas e só quando detectar incorrecções ou distorções no processo de determinação da sanção.
II – Por isso, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de apreciação livre reconhecida ao tribunal de 1ª instância nesse âmbito.
III - Revelando-se, pela sentença, a selecção dos elementos factuais elegíveis, a identificação das normas aplicáveis, o cumprimento dos passos a seguir no iter aplicativo e a ponderação devida dos critérios legalmente atendíveis, justifica-se a confirmação da pena proferida”; (cfr., Ac. de 22.04.2014, Proc. n.° 291/13, in “www.dgsi.pt”, aqui citado como mera referência).

Mostrando-se de subscrever o assim entendido, e tudo visto, resta decidir.

Decisão

4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o recurso.

Pagará o recorrente a taxa de justiça que se fixa em 4 UCs, e pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique”; (cfr., fls. 255 a 259-v, que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Notificado do assim decidido, e em tempo, veio o arguido reclamar, repisando o antes já alegado na sua motivação de recurso e insistindo no seu pedido de “redução da pena”; (cfr., fls. 272 a 282).

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Em sede de vista, assim se pronunciou o Ilustre Procurador Adjunto:

“Não se vê que, verdadeiramente, o recorrente introduza qualquer “apport” que se possa considerar inovador relativamente ao que já processara em termos do seu recurso.
Mostrando-se estimável o seu anúncio de disposição para pagamento de indemnização ao ofendido e para submissão a tratamento da dependência do jogo, a verdade é que tais “boas intenções”, não são, por si, passíveis de alterar o essencial relativamente à comprovada e devida apreciação, por parte da decisão alvo de escrutínio, de todos os factores relevantes com vista à apreciação do caso, bem como à justeza e adequação da medida concreta da pena alcançada, razão por que se mantêm, na íntegra, as considerações já vertidas em sede do “Parecer” constante de fls 252 e 253, pelo que, à míngua de qualquer dado argumentativo verdadeiramente inovador e sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, somos a entender ser de indeferir a reclamação, mantendo-se o decidido”; (cfr., fls. 284).

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Colhidos os vistos dos Mmos Juízes-Adjuntos, vieram os autos a Conferência.

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Passa-se a decidir.

Fundamentação

2. No uso da faculdade que lhe é legalmente reconhecida pelo art. 407°, n°. 8 do C.P.P.M., vem o arguido reclamar da decisão sumária nos presente autos proferida.

Porém, em resultado de uma análise aos autos efectuada mostra-se de concluir que evidente é que não se pode reconhecer mérito à sua pretensão, muito não se mostrando necessário aqui consignar para o demonstrar.

Com efeito, a decisão sumária agora reclamada apresenta-se clara e lógica na sua fundamentação – nela se tendo efectuado correcta identificação e tratamento das questões colocadas – e acertada na solução.

Na verdade, patente se mostra que justo e adequado foi o decidido no Acórdão do T.J.B. objecto do recurso pelo ora reclamante trazido a este T.S.I., o que, por sua vez, implica, a necessária e natural conclusão de que deve ser confirmado, o mesmo sucedendo com a decisão sumária que neste sentido decidiu.

Dest’arte, inevitável é a improcedência da reclamação apresentada.

Decisão

3. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam julgar improcedente a reclamação.

Pagará o arguido/reclamante a taxa de justiça de 3 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$500,00

Macau aos 09 de Abril de 2015
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José Maria Dias Azedo
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Chan Kuong Seng
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Tam Hio Wa
Proc. 213/2015 Pág. 8

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