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Processo nº 829/2013
(Autos de recurso civil)

Data: 12/Fevereiro/2015

Assuntos: Acção executiva
Condição suspensiva
Conversão em prazo prescricional ordinário
Caso julgado formal

SUMÁRIO
- Se a obrigação estiver dependente de condição suspensiva ou de uma prestação por parte do credor ou de terceiro, incumbe ao credor provar que se verificou a condição ou que se realizou ou ofereceu a prestação (artigo 688º, nº 1 do CPC).
- Uma vez que não consta da sentença condenatória que serve de base à execução qualquer matéria relacionada com a alegada condição suspensiva, a exequente ora recorrida não tem o ónus de provar essa matéria aquando da dedução do requerimento inicial de execução.
- Com o trânsito em julgado da sentença que reconheça o direito a juros a favor do credor, aquela decisão judicial converte imediatamente em prazo prescricional ordinário o prazo mais breve de prescrição da obrigação reconhecida, nos termos previstos no nº 1 do artigo 304º do Código Civil.
- Provado está que a exequente tem direito a receber do executado HKD$108.000.000,00, a título de lucros, e ainda juros sobre esse montante, à taxa de 6% ao ano, caso não consiga entregar a referida quantia antes de 31 de Dezembro de 1996, e sendo o caso, a partir daí não podemos dizer que a dívida ainda é ilíquida, antes podendo haver lugar a contagem de juros.
- A absolvição do réu da instância no processo declarativo não acarreta a “destruição” de todos os anteriores actos processuais praticados até ao momento em que aquela decisão foi proferida, isto é, tal não implica necessariamente que os actos processuais praticados até aquele momento sejam inquinados de qualquer vício, daí que a factualidade apurada em sede de julgamento, enquanto não impugnada, deve manter-se intocada, podendo ser valorada em sede de acção executiva.
- A decisão que absolveu o executado da instância, por não recair sobre o mérito da causa, mas tão-só sobre questões de carácter processual da instância executiva, faz caso julgado formal, apenas obsta a que na mesma acção se possa alterar a decisão, mas nada impede que noutra acção, mais precisamente em nova execução, seja a mesma questão processual concreta decidida em termos diferentes.
       
O Relator,

________________
Tong Hio Fong

Processo nº 829/2013
(Autos de recurso civil)

Data: 12/Fevereiro/2015

Recorrente:
- B (executado e embargante)

Recorrida:
- C Development Limited (exequente e embargada)

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
Nos autos de execução movida pela exequente C Development Limited contra o executado B, deduziu este contra aquela oposição à execução por meio de embargos, bem como contestação à liquidação, pugnando pela improcedência da execução e da liquidação deduzidas pela exequente ou, subsidiariamente, que o crédito exequendo seja considerado extinto por força da invocada excepção de compensação, ou que os autos fiquem suspensos.
Por decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base, foram julgados parcialmente procedentes os embargos, e também parcialmente procedente a liquidação, determinando-se que o montante exequendo por não distribuição de lucros corresponde, a título de capital e de juros, a HKD$81.602.852,64, acrescidos de juros vincendos de 6% ao ano sobre o valor de HKD$51.719.120,02 até integral e efectivo pagamento.
Inconformado com a sentença, dela interpôs o embargante recurso para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
I. O título que serve de base à presente execução consiste na parte do Acórdão desse Venerando Tribunal proferido no âmbito do Proc. n.º 191/2007, de 21/01/10, que não foi revogada e no Acórdão do Venerando Tribunal de Última Instância proferido no âmbito do Proc. n.º 31/2010, de 10/03/11.
II. No caso sub judice resulta documentalmente provado que a obrigação exequenda estava sujeita a condição suspensiva ou contraprestação da recorrida enquanto sinalagma funcional, a qual não se verificou até ao momento.
III. Por força do artigo 688º do Código de Processo Civil (CPC), incumbia à recorrida, o ónus de provar a sua verificação, todavia, aquela nada alegou, nem ofereceu quaisquer provas ou documentos a este respeito.
IV. Assim, a alegada dívida exequenda não é exigível, pelo que, por esta via, os embargos de executado deduzidos pelo recorrente deveriam ter sido julgados procedentes ao abrigo da al. e) do artigo 697º do CPC.
V. Ao decidir de forma diversa, a douta sentença recorrida incorreu na violação deste último normativo e do artigo 686º do CPC.
VI. O que o título executivo impõe é que se apure ab initio se há, se sim, em que valor, um crédito a executar e não apenas discernir quanto foi pago enquanto capital e quanto foi pago a título de juros.
VII. Do título executivo resulta apenas que terá havido lucros, pelo que a recorrida formula um pedido sem correspondência nesse título.
VIII. Ao decidir em contrário a douta sentença recorrida incorreu na violação da al. a) do artigo 697º do CPC.
IX. Os juros convencionais ou legais prescrevem no prazo de 5 anos, nos termos do disposto na al. d) do artigo 310º do Código Civil de 1966 (CC66), que é idêntico ao disposto na al. c) do artigo 303º do Código Civil actualmente em vigor em Macau (CC).
X. Tendo o início da mora ocorrido em 1 de Janeiro de 1997 e tendo o recorrente sido citado para contestar a acção declarativa principal que lhe moveu a recorrida apenas em 10 de Novembro de 2002, a obrigação de juros imputada ao primeiro pela segunda já se encontrava prescrita.
XI. Consequentemente, a circunstância de haver sido proferida sentença a reconhecer essa dívida ou não, é irrelevante, não havendo lugar à aplicação do n.º 1 do artigo 311º do CC66, idêntico ao n.º 1 do artigo 304º do CC.
XII. Ao decidir de forma diversa, a douta sentença recorrida viola este último normativo e dos preceitos legais referidos na conclusão IX.
XIII. Por outro lado, a sentença do TJB foi proferida no pressuposto de que a dívida era ilíquida e foi por essa razão que condenou o recorrente no pagamento de juros de mora.
XIV. Todavia, os acórdãos dos tribunais superiores determinaram que a dívida era ilíquida.
XV. A iliquidez da dívida enquanto dado novo que não foi contemplado na sentença do TJB e que com ele colide, implica a inexistência de caso julgado quanto a esta matéria.
XVI. Nos termos do n.º 3 do artigo 805º do CC66, equivalente ao n.º 4 do artigo 794º do CC, se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido.
XVII. Deste modo, no caso sub judice, o termo inicial da contagem de juros de mora ocorre somente a partir da liquidação.
XVIII. Ao decidir diferentemente, a douta sentença recorrida incorre na violação dos normativos referidos na conclusão XVI e na da al. g) do artigo 697º do CPC.
XIX. O douto acórdão do TUI acarretou as seguintes consequências processuais:
- Tem-se por não escrito tudo o que disser respeito à apreciação e discussão da matéria que interesse à decisão de fundo, incluindo a apreciação crítica da prova produzida, relativamente ao primeiro pedido formulado pela ora recorrida na acção declarativa principal e respectiva causa de pedir.
- Não se pode, pois, estabelecer haver sequer existido um “empréstimo” da recorrida a favor do recorrente, com ou sem juros, pago ou não pago.
- Consequentemente, por maioria de razão, não se pode considerar estabelecido que o recorrente haja efectuado pagamentos destinados à liquidação de um empréstimo cuja existência não está provada.
XX. O título executivo, amputado daquela factualidade, apenas permite discutir nos presentes autos o quantitativo do crédito que a recorrida se arroga, emergente de uma alegada partilha de lucros, confrontando-o com todas as prestações que o recorrente prestou.
XXII. Foi proferido douto Acórdão por esse Venerando TSI determinando que a liquidação não poderia ser efectuada por simples cálculo aritmético e ordenando que a mesma fosse feita pelo tribunal, seguindo-se a tramitação prevista no artigo 690º e seguintes do CPC.
XXIII. Na altura, a Meritíssima Juiz a quo proferiu despacho saneador-sentença onde decidiu, e bem, em consonância com o douto acórdão do TSI, rejeitar a possibilidade de liquidação por simples cálculo aritmético mediante a aplicação da fórmula prevista no artigo 785º do CC66, e determinar que a liquidação da dívida exequenda fosse efectuada pelo tribunal, segundo a tramitação prevista nos artigos 690º e ss. do CPC.
XXIV. Em consequência, foi extinta aquela instância executiva e foi instaurada a presente execução.
XXV. Na presente execução a recorrida voltou a liquidar o alegado crédito exequendo com base em simples cálculos aritméticos mediante a aplicação do artigo 785º do CC66, desta vez limitando-se ao segundo pedido que havia sido formulado na acção declarativa.
XXVI. E a Meritíssima Juiz a quo voltou a proferir despacho saneador-sentença, só que, desta vez, aceitando aquele método de liquidação do exequente.
XXVII. Deste modo, ressalvada diversa opinião, a douta sentença incorre, por um lado, em claro erro de julgamento e, por outro lado, padece do vício de violação de caso julgado, designadamente, de violação do referido acórdão de TSI e do anterior despacho saneador-sentença, proferido na execução já extinta.
XXVIII. Ressalvada diversa opinião, o vício de violação de caso julgado assim descrito, gera a nulidade por excesso de pronúncia prevista na al. d) do n.º 1 do artigo 571º do CPC, mas implica, não o reenvio para novo julgamento e sim a revogação da douta sentença recorrida, conforme a douta lição do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 07/11/1994, Proc. n.º 9450253.
XXIX. O artigo 805º, n.º 3 do CC66, idêntico ao artigo 794º do actual CC apenas contempla as situações em que a dívida é líquida, não sendo esse o caso sub judice.
Disposições violadas: Artigos 686º, 697º, als. a), e) e g) e artigo 690º todos do CPC; artigos 310º/d), 311º/1 e 805º/3 do CC66, idênticos aos artigos 303º/c), 304º/1 e 794º/4 do actual Código Civil.
Conclui, pedindo a revogação da sentença, com as consequências legais, e se assim se não entender, que se revogue parcialmente a decisão recorrida na parte em que liquida a dívida exequenda imputando-lhe juros de mora.
*
Notificada, contra-alegou a recorrida, apresentando em sede conclusiva o seguinte:
O objecto do recurso apresentado pelo recorrente encontra-se delimitado pelas conclusões das respectivas alegações.
O acórdão do Tribunal de Segunda Instância (TSI), de 21/01/2010, confirmou a sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Base, de 23/10/2006, nos autos principais, pela qual condenou B, ora recorrente, no pagamento na quantia HKD$51.278.437,17 equivalente a MOP$52.816.790,29, acrescida de juros moratórios vencidos e vincendos à taxa de 6%, até efectivo e integral pagamento à recorrida, constitui o único título executivo da presente acção.
O acórdão do TSI considerou que o crédito da recorrida carecia de “ser liquidado em sede de execução de sentença”, o que foi oportuna e devidamente concretizado pelo tribunal a quo.
A obrigação tornou-se certa, líquida e exigível.
É extemporânea qualquer discussão sobre a prescrição de juros, uma vez que a sentença na qual aqueles foram objecto de discussão já transitou em julgado.
Não tendo jamais havido qualquer acordo sobre a imputação dos pagamentos a juros ou capital, facto que jamais foi colocado em causa pelo recorrente, o art.º 785º do CC de 1966 (com redacção idêntica ao vigente art.º 774º, n.º 1 do CC) determina que as prestações se têm por sucessivamente feitas por conta das despesas, da indemnização, dos juros e só a final no capital.
O acordo efectuado entre recorrente e recorrida em 09/10/1996, dado como provado na acção declarativa (e confirmado pelo TSI), estabelece claramente qual o montante da dívida e da taxa de juro aplicável (6%), caso não fossem pagos os lucros devidos até 31/12/1996.
O título executivo que constitui a base dos presentes autos de execução continha já todos os instrumentos necessários e suficientes para a liquidação da dívida exequenda pelo Tribunal a quo.
Não ocorreu a prescrição pela simples mas decisiva razão de ter sido reconhecido por sentença transitada em julgada o direito do crédito da exequente, ora recorrida.
Nos termos da decisão que transitou, os juros contam-se desde 31/12/2001, não sendo o atraso na liquidação que impede o vencimento da obrigação.
Não enferma o despacho-saneador-sentença recorrido de qualquer erro de julgamento, nem do vício de violação de caso julgado, inexistindo excesso de pronúncia.
O exercício do direito da recorrida não ficou dependente do preenchimento de nenhuma condição suspensiva ou contraprestação.
A mera discordância do recorrente em relação ao conteúdo de uma decisão transitada não constitui fundamento para o protelamento da sua execução.
O despacho recorrido não padece, pois, de quaisquer vícios, não ocorrendo, nem sequer remotamente, violação dos art.ºs 686º, 697º, als. a), e) e g) e art.º 690º, todos do CPC, ou dos art.ºs 310º, al. d), 311º, n.º 1, 805º, n.º 3 do CC66 (idênticos às disposições aos art.ºs 303º, al. c) e 304º, n.º 1 e 794º, n.º 4 do CC vigente), invocados pelo recorrente.
Conclui, pugnando pela improcedência do recurso interposto pelo embargante.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
***
II) FUNDAMENTOS
Atenta-se à seguinte factualidade relevante para a decisão do recurso:
Em 28.12.2001, a autora ora recorrida instaurou contra o réu ora recorrente uma acção declarativa.
Por sentença de 23.10.2006, foi julgada parcialmente procedente a acção, tendo o recorrente sido condenado a pagar à recorrida a quantia de HKD$51.278.437,17 equivalente a MOP$52.816.790,29, acrescida de juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa de 6% por ano, desde a citação até efectivo e integral pagamento, pela não distribuição tempestiva dos lucros a que a recorrida tinha direito.
E absolveu o recorrente do pedido no pagamento de HKD$58.745.578,44, por se entender que os juros moratórios respeitantes a um mútuo já se encontravam prescritos.
Ambas as partes recorreram da referida decisão, tendo o TSI, por Acórdão de 21.1.2010 (Processo nº 191/2007), julgado procedente o recurso interposto pela autora ora recorrida e parcialmente procedente o recurso interposto pelo réu ora recorrente, nos seguintes termos:
- no respeitante ao recurso da autora ora recorrida, entendeu que o crédito reclamado pela mesma no montante de HKD$58.745.578,44 não estava prescrito;
- em relação ao recurso do réu ora recorrente, em vez de o condenar no pagamento à autora da quantia de HKD$51.278.437,17 equivalente a MOP$52.816.790,29, decidiu não conhecer o seu valor, por ser mais adequado proceder-se à liquidação dos montantes a que a autora tem direito em sede de execução de sentença.
Desta decisão recorreu o recorrente para o Venerando TUI, e por Acórdão de 24.11.2010 (Processo nº 31/2010), foi negado provimento ao recurso nos seguintes termos:
“2.2 Sobre o primeiro pedido da autora
(…)
Ora, o Tribunal Judicial de Base não apreciou o primeiro pedido da autora por considerar procedente a excepção peremptória de prescrição do direito da autora e consequentemente ficar prejudicado o conhecimento do tal pedido.
Uma vez declarada nula a sentença de primeira instância nesta parte pelo Tribunal de Segunda Instância, a este impunha-se o conhecimento do mérito do mesmo pedido por força do n.° 2 referido do art.° 630.° do CPC.
No entanto, o Tribunal de Segunda Instância limitou-se a julgar que o Tribunal Judicial de Base incorreu no excesso de pronúncia quanto à prescrição do direito da autora consubstanciado no primeiro pedido, não avançou para conhecer do seu mérito, pois, na realidade, o Tribunal de Segunda Instância não referiu nada na fundamentação do acórdão recorrido sobre o pedido, nem a final decidiu nada quanto ao seu mérito, no sentido de condenar ou absolver o réu.
Deste modo, o acórdão recorrido omitiu a questão de saber se tal pedido era ou não procedente.
Mas a autora, a própria interessada, não suscitou essa omissão de pronúncia, sendo certo que este vício não é de conhecimento oficioso, transitou assim o acórdão recorrido nesta parte.
Com a declaração de nulidade da parte da sentença de primeira instância, desaparece a pronúncia do Tribunal Judicial de Base sobre o primeiro pedido da autora. O Tribunal de Segunda Instância limitou-se a declarar nula a sentença e não apreciou o mérito daquele pedido, ou seja, não condenou o réu a pagar a respectiva quantia à autora nem absolveu o réu. E a autora, sem tomar a iniciativa de recorrer desta decisão, deixou transitada esta decisão de segunda instância. Na prática, é como se o réu tivesse sido absolvido de instância em relação ao primeiro pedido da autora.
(…)
2.3 Sobre o segundo pedido da autora
Com excepção da liquidez da quantia peticionada (sublinhado nosso), foi confirmada pelo tribunal recorrido a decisão de primeira instância relativa ao segundo pedido da autora na acção em que se pede a condenação do réu no pagamento à autora da quantia de HKD$51.278.437,17, equivalente a MOP$52.816.790,29, a título de capital em dívida e de juros moratórios vencidos, à taxa de 6% ao ano, pela não distribuição dos lucros de HKD$240.000.000,00, acrescida de juros moratórios vincendos à mesma taxa, até ao seu efectivo e integral pagamento.
Assim, a parte do acórdão recorrido confirmativa da decisão de primeira instância sobre o segundo pedido da autora é irrecorrível nos temos do art.° 638.°, n.° 2 do CPC.
Já é recorrível a parte do acórdão recorrido que determinou a liquidação dos montantes do segundo pedido a que a autora tem direito em sede de execução de sentença, e só a autora, como parte vencida, tem legitimidade para recorrer desta parte do acórdão recorrido, mas não fez.
(…)”
Em 26.6.2012, foi deduzida pela autora ora recorrida a presente execução de sentença, onde liquidou o pedido no montante de MOP$101.319.616,35 e também os juros vincendos.
Em 20.9.2012, o ora recorrente opôs-se à execução por meio de embargos e apresentou, no mesmo articulado, a sua contestação à liquidação.
Por sentença de 24.5.2013, foram julgados improcedentes os embargos apresentados pelo recorrente, tendo sido fixada a quantia exequenda no montante líquido de HKD$81.602.852,64, a que acrescem os juros vincendos, sempre à taxa legal de 6% ao ano, sobre o valor de HKD$51.719.120,02 até integral e efectivo pagamento.
Esta é a decisão recorrida.
*
São várias as questões suscitadas pelo recorrente.
Vejamos cada uma das referidas questões.
Comecemos pelo recurso da decisão dos embargos de executado.
Da inexigibilidade da dívida exequenda e da excepção de incumprimento
Entende o recorrente que a alegada dívida exequenda não é exigível, na medida em que o cumprimento dessa obrigação exequenda estava sujeito à obrigação dos sócios da recorrida cederem as quotas de que eram titulares na “Sociedade de Fomento Predial D, Limitada”.
Para sustentar a sua tese, refere que tal facto resulta de forma clara dos documentos juntos aos autos.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, não julgamos assistir razão ao recorrente.
Sem dúvida, se a obrigação estiver dependente de condição suspensiva ou de uma prestação por parte do credor ou de terceiro, incumbe ao credor provar que se verificou a condição ou que se realizou ou ofereceu a prestação (artigo 688º, nº 1 do CPC).
De facto, o Código de Processo Civil não proíbe que os títulos se reportem a obrigações condicionais1, e para que a execução pudesse prosseguir, o credor/exequente teria que provar que a condição já se verificou, sob pena de a obrigação se tornar inexigível.
Quanto ao nosso caso, não se vislumbra que a obrigação exequenda ficou sujeita a qualquer condição suspensiva.
É o que se retira da sentença de 23.10.2006, proferida pelo Tribunal Judicial de Base, que serve de base à presente execução, embora parcialmente revogada/confirmada pelos Acórdãos do Tribunal de Segunda Instância e do Tribunal de Última Instância.
Nessa mesma sentença nunca se referiu que o pagamento da dívida exequenda ficava dependente de qualquer acto de cessão de quotas sociais a favor do recorrente.
Mesmo que os documentos indicados pelo recorrente fossem suficientes para demonstrar que ele se obrigou a pagar à recorrida os lucros na quantia de HKD$108.000.000,00 até 31.12.1996, na condição de a recorrida deixar de ter qualquer participação social na sociedade “D” até àquela data, também não devemos perder de vista que os documentos juntos pelas partes mais não sejam do que meios de prova destinados à prova dos factos articulados pelas partes.
E, uma vez que não consta da sentença condenatória que serve de base à presente execução qualquer matéria relacionada com a alegada condição suspensiva, a exequente ora recorrida não tem o ónus de provar essa matéria aquando da dedução do requerimento inicial de execução.
E não se diga que a resposta aos quesitos 14º e 15º da base instrutória constante da referida sentença condenatória permitiria tirar a ilação da existência da alegada condição suspensiva.
Pois, encontra-se provado apenas que “em 9 de Outubro de 1996, sob solicitação da Autora, o Réu concordou que a Autora cessaria a sua participação na sociedade D antes de 31 de Dezembro de 1996” (resposta ao quesito 14º), “bem como restituir à Autora as quantias referidas em I) dos factos assentes e entregar os respectivos juros e os lucros” (resposta ao quesito 15º).
Em nossa opinião, e ao contrário do que entende o recorrente, não se vislumbra que a cessação da participação na sociedade D por parte da recorrida constituía condição necessária para a restituição à recorrida das quantias, juros e lucros acordados.
Nem se diga que há lugar a excepção de não cumprimento do contrato, por que não foi matéria abordada na própria sentença condenatória que serve de base à presente execução.
Nessa medida, verificado não está que a exequibilidade da obrigação subjacente ao título executivo dependia de qualquer condição suspensiva nem contraprestação da recorrida, não se pode afirmar que a dívida exequenda é inexigível nos termos previstos no artigo 688º do CPC.
*
Da insuficiência do título executivo face ao pedido executivo
Defende o recorrente que a recorrida formula um pedido executivo sem correspondência no título executivo, por entender que desse título resulta apenas que terá havido lucros, sendo portanto, na sua opinião, necessário apurar qual o exacto montante que o recorrente devia entregar à recorrida enquanto partilha de lucros, bem como quanto pagou o recorrente a esse título e quando se efectuou o respectivo pagamento.
Sem embargo de melhor opinião, não se nos afigura ter razão o recorrente.
Dispõe o artigo 677º do CPC que podem servir de base à execução, entre outros, as sentenças condenatórias.
E são sentenças condenatórias todas aquelas cujo comando encerre uma condenação, sejam ou não proferidas em acções de condenação, considerando que em qualquer tipo de acção, e não apenas de condenação, pode haver lugar a condenação em custas, multa ou indemnização, e a decisão que a profere constitui título executivo para o efeito da sua cobrança coerciva.
Ademais, salvo o devido respeito, quando serve de título executivo uma sentença condenatória, não nos devemos atentar só à sua parte decisória, mas também a sua fundamentação.
Diz o recorrente que da sentença resulta apenas que a recorrida só tem direito a lucros, mas não se sabe qual o seu montante, nem quanto pagou a esse título e quando foi efectuado o seu pagamento.
Mas não parece ser a melhor interpretação.
De facto, apurou-se na sentença de primeira instância que o réu ora recorrente assumiu todos os riscos do projecto relacionado com o terreno, tendo aceitado ficar a seu cargo os juros e outras quantias, bem como os lucros no montante de HKD$108.000.000,00. Em consequência, foi o réu ora recorrente condenado, naquela instância, a pagar à autora ora recorrida a quantia de HKD$51.278.437,17, equivalente a MOP$52.816.790,29, acrescida de juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa de 6% por ano, desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Desta decisão foi interposto pelo réu ora recorrente recurso para o TSI, tendo este dado parcialmente provimento ao recurso, no sentido de que em relação ao recurso da parte da sentença que condenou o recorrente no pagamento à autora da quantia de HKD$51.278.437,17 equivalente a MOP$52.816.790,29, decidiu não conhecer o seu valor, por ser mais adequado proceder-se à liquidação dos montantes a que a autora tem direito em sede de execução de sentença.
Novamente inconformado com a decisão, dela recorreu o recorrente para o Venerando TUI, mas este acabou por negar provimento ao recurso, por se entender que é irrecorrível a parte do acórdão recorrido (do TSI) confirmativa da decisão de primeira instância sobre aquele pedido.
Para melhor explicitação, transcreve-se a seguir um trecho do Acórdão do Venerando TUI:
“Com excepção da liquidez da quantia peticionada, foi confirmada pelo tribunal recorrido a decisão de primeira instância relativa ao segundo pedido da autora na acção em que se pede a condenação do réu no pagamento à autora da quantia de HKD$51.278.437,17, equivalente a MOP$52.816.790,29, a título de capital em dívida e de juros moratórios vencidos, à taxa de 6% ao ano, pela não distribuição dos lucros de HKD$240.000.000,00, acrescida de juros moratórios vincendos à mesma taxa, até ao seu efectivo e integral pagamento.” – sublinhado nosso
Aqui chegados, não é difícil concluir que o Venerando TUI seguiu o mesmo raciocínio do TSI, no sentido de que a autora ora recorrida tem direito à distribuição dos lucros, a título de capital em dívida e de juros moratórios vencidos à taxa de 6%, acrescidos dos juros moratórios vincendos à mesma taxa.
Entretanto, o que acontece é que o TSI, no seu Acórdão de 21.1.2010, não logrou confirmar a decisão de primeira instância por que não sabia como se chegar aos valores peticionados, na quantia de HKD$51.278.437,17 equivalente a MOP$52.816.790,29, considerando que na própria sentença de primeira instância não foi dada qualquer explicação sobre a forma de cálculo daquele montante.
Sendo assim, não faz sentido dizer agora que a recorrida formula um pedido executivo sem correspondência no título executivo, visto que na própria fundamentação da sentença que serve de base à execução, é facilmente constatável que dos lucros no montante de HKD$240.000.000,00, a recorrida tinha direito a receber HKD$108.000.000,00, e uma vez que foram efectuados a favor da recorrida alguns pagamentos em diferentes datas, não se descortina a alegada insuficiência do título executivo, bastando proceder-se à respectiva liquidação para determinar com clareza o valor para ser executado.
Se ficarmos atentos ao que foi decidido num outro Acórdão do TSI (Processo nº 85/2012), relativamente a um recurso da decisão que julgou procedentes os embargos à execução, podemos logo concluir que a exequente ora recorrida tem toda a razão em proceder-se à liquidação da dívida.
Transcreve-se a seguir parte do referido aresto:
“Ora, é justamente este ponto que evidencia a liquidação da dívida em causa não depender de simples cálculo aritmético, já que, por um lado, ficou provado que o Embargante pagou determinadas quantias a título de lucros e juros, sem no entanto saber em que proporção para cada um deles, e por outro, não se sabe se houve ou não acordo entre o Embargante e a Embargada quanto ao modo de imputação dos pagamentos feitos.
Uma vez que estes pontos não foram esclarecidos no Ac. Condenatório que serviu como título executivo, a liquidação da dívida em causa só pode ser feita pelo Tribunal nos termos do artigo 690º e seguintes do CPCM.”
Nesta conformidade, julga-se improcedente o recurso quanto a esta parte.
*
Da prescrição da obrigação de pagamento de juros de mora
Entendeu a decisão recorrida que por força do disposto no nº 1 do artigo 304º do Código Civil, os juros convencionais ou legais, ainda que ilíquidos, em vez de prescreverem no prazo de 5 anos, passam a sujeitar-se ao prazo ordinário de prescrição de 20 anos, tendo em conta que o direito a juros está reconhecido por sentença.
O recorrente é contra esta posição, argumentando que o início da mora teria ocorrido em 1.1.1997, enquanto a citação do recorrente para contestar a acção declarativa ocorreu em 10.11.2002, daí que a obrigação de juros já se encontrava prescrita nos termos da alínea c) do artigo 303º do CC.
Em nossa opinião, sem razão o recorrente.
Ora bem, caso os juros vencidos já se encontrassem prescritos em 10.11.2002, poderia o recorrente invocar a respectiva prescrição na própria acção declarativa, mas não o tendo feito, ou mesmo que o tivesse feito mas julgado improcedente a tal excepção peremptória, com o trânsito em julgado da sentença que reconheça a existência desse direito, esta converte imediatamente em prazo prescricional ordinário o prazo mais breve de prescrição da obrigação reconhecida2.
No caso vertente, foi reconhecido pelo Acórdão do Venerando TUI, de 24.11.2010, que “com excepção da liquidez da quantia peticionada, foi confirmada pelo tribunal recorrido a decisão de primeira instância relativa ao segundo pedido da autora na acção em que se pede a condenação do réu no pagamento à autora da quantia de HKD$51.278.437,17, equivalente a MOP$52.816.790,29, a título de capital em dívida e de juros moratórios vencidos, à taxa de 6% ao ano, pela não distribuição dos lucros de HKD$240.000.000,00, acrescida de juros moratórios vincendos à mesma taxa, até ao seu efectivo e integral pagamento” ― sublinhado nosso ―, razão pela qual entendemos que o direito a juros, uma vez reconhecido por decisão transitada em julgado do mais alto tribunal, passa a ficar sujeito ao prazo ordinário de prescrição, isso significa que aquele direito ainda não se encontra prescrito.
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Ainda quanto à questão de juros, defende o recorrente que, pelo facto de os Acórdãos dos tribunais superiores terem determinado que a dívida era ilíquida, não podia a decisão recorrida socorrer-se do título executivo (a sentença transitada em julgado) e condenar o devedor ora recorrente no pagamento de juros de mora, crendo ele que o termo inicial da contagem de juros ocorre somente a partir da liquidação.
Em nosso modesto entender, julgamos não ter razão o recorrente quanto a este aspecto.
Estatui-se no nº 4 do artigo 794º do CC que “se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor”.
Contudo, da factualidade provada na sentença de primeira instância resulta que a recorrida tem direito aos lucros no montante de HKD$108.000.000,00.
Este valor corresponde ao capital em dívida, isso significa que, em relação ao valor dos lucros devidos pelo recorrente, já não se trata de um crédito ilíquido.
De facto, da análise da fundamentação do Acórdão do TSI não resulta que esse Tribunal tenha logrado alterar a decisão da matéria de facto no tocante à obrigação de pagamento do capital e dos juros por parte do recorrente, nomeadamente está provado que a recorrida tem direito a receber do recorrente HKD$108.000.000,00, a título de lucros, e ainda juros sobre esse montante, à taxa de 6% ao ano, caso o recorrente não consiga entregar a referida quantia antes de 31 de Dezembro de 1996, e foi o caso.
Sendo assim, é fácil perceber que a razão que levou ao TSI a determinar a liquidação da dívida foi porque não logrou saber como se chega aos valores peticionados pela recorrida e confirmados pelo tribunal de primeira instância, na quantia de HKD$51.278.437,17 equivalente a MOP$52.816.790,29, uma vez que na sentença de primeira instância não foi dada qualquer explicação sobre a forma de cálculo daquele montante, e não foi por causa de não saber qual o montante ou o objecto exacto da prestação que o recorrente cumpre realizar.
Aqui chegados, não se pode dizer que a contagem de juros só ocorre a partir da liquidação, contanto que provado está que desde 1 de Janeiro de 1997, a recorrida já tem direito a receber do recorrente a quantia de HKD$108.000.000,00, a título de lucros, bem assim juros sobre esse montante, à taxa de 6% ao ano.
Termos em que se julga improcedentes as razões do recorrente.
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Vejamos agora o recurso da decisão da liquidação
Dos efeitos do Acórdão do TUI que conforma o título executivo
Tal como acima se referiu, no recurso interposto pelo recorrente para o Venerando TUI, decidiu-se, entre outras questões, o seguinte:
“Com a declaração de nulidade da parte da sentença de primeira instância, desaparece a pronúncia do Tribunal Judicial de Base sobre o primeiro pedido da autora.

Na prática, é como se o réu tivesse sido absolvido da instância em relação ao primeiro pedido da autora.”
Com base nessas asserções, o recorrente retira, segundo a sua opinião, as seguintes consequências:
- Tem-se por não escrito tudo o que disser respeito à apreciação e discussão da matéria que interesse à decisão de fundo, incluindo a apreciação crítica da prova produzida, relativamente ao primeiro pedido formulado pela ora exequente e respectiva causa de pedir;
- Não se pode estabelecer haver sequer existido um “empréstimo” da recorrida a favor do recorrente, com ou sem juros, pago ou não pago;
- Consequentemente, por maioria de razão, não se pode considerar estabelecido que o recorrente haja efectuado pagamentos destinados à liquidação de um empréstimo cuja existência não está provada.
Salvo o devido respeito por diferente opinião, não temos o mesmo entendimento.
Nesse mesmo Acórdão proferido pelo Venerando TUI, foram apreciados os dois pedidos formulados pela autora ora recorrida na sua petição inicial.
Aqui focamos a nossa atenção no primeiro pedido.
O TSI limitou-se a julgar que o TJB incorreu no excesso de pronúncia quanto à prescrição do direito da autora ora recorrida, mas não avançou para conhecer do seu mérito, pois, na realidade, o TSI não referiu nada na fundamentação do seu Acórdão sobre o primeiro pedido, nem a final decidiu nada quanto ao seu mérito, no sentido de condenar ou absolver o réu ora recorrente.
Com efeito, entende aquele douto Acórdão do TUI que, uma vez que o TSI se limitou a declarar nula a sentença e não apreciou o mérito daquele primeiro pedido, ou seja, não condenou o réu a pagar a respectiva quantia à autora nem absolveu o réu, nem a autora tomou a iniciativa de recorrer daquela decisão, deixou transitada esta decisão de segunda instância.
Ainda segundo o mesmo Acórdão, entende-se que na prática, é como se o réu tivesse sido absolvido de instância em relação ao primeiro pedido da autora.
Posto isto, teremos que dar-se por não escrito tudo o que disser respeito à apreciação e discussão da matéria que interesse à decisão do mérito, incluindo a apreciação da prova produzida, tal como foi entendido pelo recorrente?
Salvo o devido respeito, entendemos que não.
Em nossa modesta opinião, cremos que a absolvição do réu da instância é uma questão de natureza processual, com impacto somente na própria relação jurídica processual.
Conforme se decidiu no douto Acórdão do TUI, uma vez declarada a nulidade parcial da sentença pelo TSI, e não logrando este prosseguir com a apreciação do mérito daquela mesma questão, nem que a parte interessada tivesse tomado a iniciativa de recorrer dessa decisão, esta considerava-se transitada em julgado.
Mas esta situação não acarreta a “destruição” de todos os anteriores actos processuais praticados ao longo da tramitação processual.
Em relação ao nosso caso, se a autora ora recorrida deixou de recorrer duma decisão do TSI que lhe seja desfavorável e, em consequência, fez com que o réu ora recorrente fosse absolvido da instância em relação ao primeiro pedido da autora, isso não implica necessariamente que os anteriores actos processuais praticados até aquele momento sejam inquinados de qualquer vício, isso significa que a factualidade apurada naquela sede, enquanto não impugnada, deve manter-se intocada, podendo ser valorada em sede de acção executiva.
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Do erro de julgamento da liquidação
Alega o recorrente que a decisão da liquidação está inquinada do erro de julgamento, por entender que o artigo 785º do CC de 1966 não é aplicável ao caso vertente.
Sem embargo de melhor opinião, não vemos qualquer obstáculo à aplicação do referido preceito legal.
Dispõe o nº 1 do artigo 785º do CC de 1966, o qual corresponde ao actual nº 1 do artigo 774º do CC de Macau, que “quando, além do capital, o devedor estiver obrigado a pagar despesas ou juros, ou a indemnizar o credor em consequência da mora, a prestação que não chegue para cobrir tudo o que é devido presume-se feita por conta, sucessivamente, das despesas, da indemnização, dos juros e do capital”.
No vertente caso, por um lado, provado que a recorrida tem direito a receber do recorrente os lucros na quantia de HKD$108.000.000,00, a título do capital, bem assim os juros à taxa de 6% ao ano.
Por outro, provado ainda que foram efectuados a favor da recorrida alguns pagamentos em diferentes datas, e não tendo havido qualquer acordo sobre a imputação dos pagamentos, pelo que, não merece qualquer reparo a liquidação efectuada com base naquele preceito legal.
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Da violação de caso julgado
Alega o recorrente que há violação de caso julgado, por que entende que a liquidação proposta pela recorrida na presente execução é, de forma inequívoca, metodologicamente igual à liquidação que havia proposto na execução extinta, na medida em que a recorrida faz a liquidação exactamente do mesmo modo em ambos, apenas sendo diversa a numeração de artigos.
Sem necessidade de delongas considerações, julgamos igualmente sem razão o recorrente.
É verdade que a recorrida chegou a deduzir uma acção executiva contra o recorrente, com conteúdo mais ou menos semelhante à presente execução.
E nessa execução, a primeira instância decidiu pela iliquidez da obrigação exequenda e concluiu pela absolvição da instância.
Inconformada, interpôs a recorrida recurso para o TSI, e por Acórdão de 24.5.2012 (no Processo 85/2012), decidiu-se que a liquidação da dívida não dependia de simples cálculo aritmético, já que, para além de ter ficado provado que o executado ora recorrente pagou determinadas quantias a título de lucros e juros, sem no entanto saber em que proporção para cada um deles, nem se sabia ainda se houve ou não acordo entre a exequente e o executado quanto ao modo de imputação de pagamentos feitos.
Com efeito, determinou que a liquidação da dívida só podia ser feita pelo Tribunal nos termos do artigo 690º e seguintes do CPC, e acabou por negar provimento ao recurso.
Ora bem, em nossa opinião, a referida decisão, proferida no âmbito de um outro processo, não recaiu sobre o mérito da causa, mas tão-só sobre a relação jurídica processual (mais precisamente sobre questões de carácter processual da instância executiva), daí que a decisão que absolveu o executado ora recorrente da instância faz caso julgado formal, ou seja, apenas obsta a que na mesma acção se possa alterar a decisão, mas nada impede que noutra acção, mais precisamente na nossa execução em apreço, seja a mesma questão processual concreta decidida em termos diferentes.
Daí que, tendo a recorrida deduzido nova execução tramitada em processo autónomo, não se vislumbra a alegada violação de caso julgado, tanto formal como material.
Por tudo o que se disse, outra solução não resta senão negar-se provimento ao recurso interposto pelo recorrente.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso interposto pelo recorrente B, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente.
Registe e notifique.
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Macau, 12 de Fevereiro de 2015

(Relator) Tong Hio Fong

(Primeiro Juiz-Adjunto) Lai Kin Hong

(Segundo Juiz-Adjunto) João A. G. Gil de Oliveira
1 José Alberto dos Reis, in Processo de Execução, Volume 1º, pág. 462
2 Acórdão da Relação de Coimbra, 9.4.1991: BMJ, 406º-732
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Processo 829/2013 Página 1