Processo nº 247/2015 Data: 26.03.2015
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “condução em estado de embriaguez”.
Inibição de condução.
Suspensão da execução.
SUMÁRIO
Só se coloca a hipótese da suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução no caso de ser o arguido um motorista ou condutor profissional, com rendimento dependente do exercício da condução de veículos.
O relator,
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José Maria Dias Azedo
Processo nº 247/2015
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. A, com os restantes sinais dos autos, respondeu em processo sumário no T.J.B., vindo a ser condenado como autor da prática de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 6 meses de prisão suspensa na sua execução por 1 ano, e na pena acessória de inibição de condução pelo período de 1 ano e 3 meses; (cfr., fls. 12 a 15 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, o arguido recorreu.
Motivou para, a final, pedir a redução e suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução; (cfr., fls. 20 a 23-v).
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Em Resposta, é o Ministério Público de opinião que se deve confirmar a decisão recorrida; (cfr., fls. 28 a 30-v).
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Neste T.S.I., juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Ao que apreendemos do alegado, mostra-se o recorrente inconformado com a medida concreta do tempo de inibição de condução que lhe foi aplicada e que almeja ver reduzida de 1 ano e 3 meses para menos de 6 meses, apelando, por uma banda, à circunstância de, após ter bebido, alegadamente ter dormido cerca de 6/7 horas antes de conduzir, razão por que estaria convencido ter já passado o efeito do álcool, sendo que, por outro lado, detém apenas 5% do acervo da companhia para que trabalha, como motorista, pelo que, para o exercício desta actividade, que denota como essencial para o seu sustento, bem como da sua família, esta actividade se revela como indispensável.
Não se vê, porém, como ceder a tal argumentação.
Desde logo, para além de o suposto "sono" após a ingestão das bebidas em causa não se mostrar comprovado em termos da douta decisão sob escrutínio, a verdade é que tal circunstância se, mostra, por si mesma, face ao senso e experiência comuns, como pouco crível, designadamente em face do volume de alcoolemia detectado (2,05 gr/l)
Mostrar-se-ia terrível, para qualquer comum mortal, a noção de que, mesmo após 6/7 horas de sono, se houvesse que apresentar tal grau alcoólico, tratando-se, tudo o indica, da chamada "desculpa de mau pagador", de resto, com carácter inócuo, face à ausência de comprovação na sede própria.
Depois, ignorando-se se a percentagem que o recorrente detém na companhia para que trabalha é, ou não de apenas 5% como anuncia, o certo é que o julgador entendeu que, não sendo a sua actividade de motorista o seu exclusivo "ganha pão", se justificaria a inibição de condução aplicada, não se descortinando, em boa verdade, que o decidido se não mostre com acerto e que, de facto, os proventos derivados daquela posição, conjugados, porventura, com algum aforro, não possam validamente prover ao sustento mínimo do agregado familiar do visado.
Donde, entender-se haver que manter o decidido”; (cfr., fls. 40 a 41).
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Passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados na sentença recorrida a fls. 13 a 13-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.
Do direito
3. Vem o arguido dos autos recorrer da sentença que o condenou como autor da prática de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 6 meses de prisão com suspensão da sua execução por 1 ano, e na pena acessória de inibição de condução pelo período de 1 ano e 3 meses.
Entende – em síntese – que se lhe devia reduzir e decretar a suspensão da execução da “pena acessória de inibição de condução” que lhe foi imposta, imputando à decisão recorrida “erro de direito”.
Porém, não cremos que tenha razão.
Vejamos.
O ora recorrente não contesta a qualificação jurídico-penal da sua conduta e a sua consequente condenação como autor da prática de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”.
E, nesta conformidade, importa ter presente que nos termos do art. 90° da Lei n.° 3/2007:
“1. Quem conduzir veículo na via pública com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 gramas por litro, é punido com pena de prisão até 1 ano e inibição de condução pelo período de 1 a 3 anos, se sanção mais grave não for aplicável por força de outra disposição legal.
2. Na mesma pena incorre quem conduzir veículo na via pública sob influência de estupefacientes ou de substâncias psicotrópicas cujo consumo seja considerado crime nos termos da lei.
3. A negligência é punida”.
Por sua vez, estatui o art. 109° da mesma Lei que:
“O tribunal pode suspender a execução das sanções de inibição de condução ou de cassação da carta de condução por um período de 6 meses a 2 anos, quando existirem motivos atendíveis”.
Ora, tendo presente o estatuído no transcrito art. 90°, n.° 1, e provado estando que o arguido foi surpreendido a conduzir na via pública com uma (surpreendente) taxa de álcool no sangue de 2,05 gramas por litro, evidente é que nenhuma censura merece a “medida” da pena acessória em questão, ociosas sendo outras considerações.
Em relação à pretendida “suspensão da sua execução”, tem este T.S.I. entendido que:
“Só se coloca a hipótese de suspensão da interdição da condução, caso o arguido seja um motorista ou condutor profissional com rendimento dependente da condução de veículos ... até porque os inconvenientes a resultar ... da execução dessa pena acessória não podem constituir causa atendível para a almejada suspensão ... posto que toda a interdição da condução irá implicar naturalmente incómodos não desejados pelo condutor assim punido na sua vida quotidiana”; (cfr., v.g., o Ac. de 19.03.2009, Proc. n°. 717/2008, e, mais recentemente, de 24.10.2013, Proc. n° 641/2013).
Ora, no caso, em sede do seu recurso, diz o recorrente que é “motorista”, juntando 1 documento com o qual pretende provar tal qualidade.
Porém, como sabido é, não basta “alegar”, há que “provar”, e ao documento (particular) que apresenta, e nesta fase processual, não se pode reconhecer tal virtude.
Outrossim, há que ter em conta que “provado” está (apenas) que o ora recorrente é sócio de uma empresa, desempenhando, também, funções de “motorista”.
E, nesta conformidade, esta sendo a realidade factual e considerando que o rendimento do arguido não dependia exclusivamente do exercício da condução, entendeu o Mmo Juiz do T.J.B. que adequada não era a pretendida suspensão.
Como já deixamos adiantado, o assim decidido não merece reparo.
De facto, importa igualmente ter em conta que o ora recorrente, no “início da sua audiência de julgamento”, ao se identificar perante o Tribunal nos termos e para os efeitos do art. 323° do C.P.P.M., declarou (apenas) ser “comerciante”, razoável sendo assim de entender que as suas “tarefas de motorista” são meramente “acessórias”.
Por sua vez, em face do aumento da sinistralidade rodoviária, muitas vezes com resultados trágicos, e em que concorrem causas relacionadas com a condução em estado de embriaguez, necessária é uma adequada reacção penal, o que não deixa de contribuir para a conclusão no sentido do acerto da decisão recorrida.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.
Pagará o recorrente 4 UCs de taxa de justiça.
Macau, aos 26 de Março de 2015
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
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