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Processo nº 324/2015 Data: 14.05.2015
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “desobediência qualificada”.
Pena.
Suspensão da execução.



SUMÁRIO

1. O instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade.

2. Devem-se evitar penas de prisão de curta duração.

Porém, não é de suspender a execução da pena de prisão ainda que de curta duração, se o arguido, pelo seu passado criminal recente, revela total insensibilidade e indiferença perante o valor protegido pela incriminação em causa, continuando numa atitude de desresponsabilização e de incapacidade para tomar outra conduta.

O relator,

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José Maria Dias Azedo


Processo nº 324/2015
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A, com os restantes sinais dos autos, respondeu no T.J.B., vindo a ser condenado como autor material de 1 crime de “desobediência qualificada”, p. e p. pelo art. 92°, n.° 2 da Lei n.° 3/2007 e art. 312°, n.° 2 do C.P.M., na pena de 6 meses de prisão; (cfr., fls. 133 a 136, que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado o arguido recorreu para, em síntese, dizer (apenas) que a decisão recorrida viola o art. 48° do C.P.M.

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Respondendo, considera o Ministério Público que nenhuma censura merece a decisão recorrida; (cfr., fls. 151 a 154).

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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação (fls.147 a 149 dos autos), o recorrente A pediu a concessão, à luz do art.48.° do CPM, a suspensão da execução da pena de seis meses de prisão, alegando a confissão espontânea e sem reserva dos factos, o arrependimento e reflexão sinceros, a iminência de levar a sua namorada ao hospital, e o encargo de sustentar pais e a filha menor por ser a única fonte económica da família.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações da nossa ilustre Colega na Resposta (cfr. fls.151 a 154 dos autos), no sentido do não provimento do recurso em exame.
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O próprio art.48° n.°l do CPM evidencia que a suspensão da pena de prisão depende do preenchimento cumulativo de dois pressupostos: o formal e objectivo traduz em a pena aplicada não ser superior a 3 anos; e o material consubstancia-se na razoável conclusão (do julgador) de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam, adequada e suficientemente, as finalidades da punição.
E à luz deste segmento legal, tal conclusão tem de angular-se em apreciação e valorização prévias, de índole prudente e prognóstico, de personalidade do agente, das condições da sua vida, da conduta anterior e posterior ao crime e das circunstâncias deste.
Interessa ter na mente que mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão, não será decretada a suspensão se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. (Acórdãos do TSI nos Processos n.° 242/2002, n.° 190/2004 e n.° 192/2004)
No caso sub judice, acontece que a condução detectada nos autos teve lugar durante a suspensão da execução das penas impostas nos Processos CRl-13-0130-PCS e CRl-13-0181-PSM. O que implica, de modo inegável, que tal suspensão da execução falhou, não logrando os efeitos reeducativos e pedagógicos.
Tudo isto torna nitidamente previsível que não é adequada para a realização das finalidades da punição a suspensão da execução da pena aplicada na sentença em causa. Daí flui que o pedido da suspensão de execução fica desprovido de qualquer razão.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso”; (cfr., fls. 173 a 173-v).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados na sentença recorrida a fls. 133-v a 134-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Insurge-se o arguido dos autos contra a sua condenação como autor material de 1 crime de “desobediência qualificada”, p. e p. pelo art. 92°, n.° 2 da Lei n.° 3/2007 e art. 312°, n.° 2 do C.P.M., na pena de 6 meses de prisão.

Pede (apenas) a “suspensão da execução da pena” decretada, considerando que a decisão objecto do seu recurso colide com o estatuído no art. 48° do C.P.M..

Porém, e como – bem – opina o Ministério Público, nenhuma razão lhe assiste.

Vejamos.

Nos termos do art. 48° do C.P.M.:

“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.

Sobre o assim estatuído tem este T.S.I. (repetidamente) afirmado que:

“O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime”; (cfr., v.g., Ac. de 01.03.2011, Proc. n° 837/2011, do ora relator, e, mais recentemente, de 11.12.2014, Proc. n.° 769/2014).

Nota-se ainda que o instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade; (cfr., v.g., o Ac. de 21.11.2013, Proc. n.° 649/2013).

No caso dos autos, o arguido ora recorrente, não é primário, tendo já sido condenado numa pena única de 5 anos e 6 meses de prisão pela prática em concurso real de 1 crime de “ofensa grave à integridade física” e outro de “arma proibida”, (que cumpriu), certo sendo também que o crime dos autos foi cometido a pouco mais de 3 meses depois de ter sido (novamente) condenado em pena de prisão suspensa na sua execução e inibição de condução pela prática de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, (portanto, em pleno período da suspensão de execução da pena), revelando, assim, uma total ausência de vontade de aproveitar as oportunidades que lhe foram dadas e de levar uma vida em conformidade com as normas de convivência social, tornando evidentes as fortes razões de prevenção criminal especial, (e geral, em virtude do tipo e natureza dos crimes cometidos), e que comprometem, de todo, a pretendida suspensão da execução da pena (de 6 meses de prisão em que foi condenado).

Como igualmente temos vindo a considerar, devem-se “evitar penas de prisão de curta duração”.
Porém, não é de suspender a execução da pena de prisão ainda que de curta duração, se o arguido, pelo seu passado criminal recente, revela total insensibilidade e indiferença perante o valor protegido pela incriminação em causa, continuando numa atitude de desresponsabilização e de incapacidade para tomar outra conduta; (cfr., v.g., o Ac. de 05.06.2014, Proc. n.° 329/2014).

Dest’arte, há que julgar improcedente o presente recurso.

Decisão

4. Em face do exposto, em conferência acordam negar provimento ao recurso.

Pagará o arguido 4 UCs de taxa de justiça.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.

Macau, aos 14 de Maio de 2015
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa

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