Processo nº 387/2015 Data: 14.05.2015
(Autos de recurso penal)
Assuntos : Crime de “condução em estado de embriaguez”.
Pena.
Suspensão da execução.
SUMÁRIO
1. O instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade.
2. Devem-se evitar penas de prisão de curta duração.
Porém, não é de suspender a execução da pena de prisão ainda que de curta duração, se o arguido, pelo seu passado criminal recente, revela total insensibilidade e indiferença perante o valor protegido pela incriminação em causa, continuando numa atitude de desresponsabilização e de incapacidade para tomar outra conduta.
O relator,
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José Maria Dias Azedo
Processo nº 387/2015
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. A, com os sinais dos autos, respondeu em processo sumário no T.J.B., vindo a ser condenado pela prática de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 3 meses de prisão e na pena acessória de inibição de condução por 1 ano; (cfr., fls. 29 a 32-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado com o assim decidido, o arguido recorreu.
Motivou para, em síntese dizer que:
“1- Por decisão proferida nestes autos o recorrente foi condenado a 3 meses de prisão efectiva pela prática do crime de condução em estado de embriaguez e de inibição de condução pelo período de um ano.
2- O recorrente considera que esta decisão enferma de excesso na medida da pena, violando o disposto nos artigos 40°, 64°, 65°, 66° e 48° do C.P.M.
3- Pois, dos factos dados como provados, não se colhe que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam ou possam, por meio dela, ser alcançadas.
4- No caso do recorrente e face às suas circunstâncias concretas esta pena é excessiva pois verifica-se que o recorrente nunca foi punido pela prática deste crime anteriormente.
5- Antes desta data o recorrente apenas foi condenado por ter cometido uma contravenção por estar a conduzir sob o efeito do álcool em 23 de Março de 2010.
6- Em 21 de Janeiro de 2014, o recorrente foi transportado até ao Ministério Público por causa de condução em estado de embriaguez mas, até à presente data, não foi proferida qualquer acusação nesse inquérito.
7- O recorrente tem uma vida familiar estável, vivendo com a sua mãe e contribuindo para o sustento desta.
8- Não estão, de forma alguma, esgotados todos os outros meios de punição não privativos de liberdade, nem se verifica que a mera suspensão da pena não vá atingir os fins de prevenção de cometimento de futuros crimes por parte do recorrente.
9- Na verdade, no caso vertente a suspensão da pena de prisão satisfaz as exigências de prevenção tanto ao nível geral como especial.
10- O legislador pretendeu, ao máximo, evitar que as penas de prisão de curta duração fossem efectivamente executadas, sem que antes se esgotassem outros meios não privativos de liberdade, sabendo quão nefasta é a influência da cadeia na personalidade dos indivíduos e para o próprio fim das penas.
11- Assim sendo, entende-se que existem motivos suficientes e ponderosos para que seja suspensa a pena de prisão efectiva aplicada ao recorrente”; (cfr., fls. 41 a 50).
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Respondendo, considera o Ministério Público que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 52 a 54).
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Admitido o recurso com efeito e modo de subida adequadamente fixados, vieram os autos a este T.S.I., onde, em sede de vista, emitiu o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte Parecer:
“Concordamos inteiramente com as doutas considerações expendidas pela Exma Colega junto do tribunal “a quo”, às quais, verdadeiramente, nada de relevante haverá a acrescentar.
O passado criminal do recorrente, designadamente em sede de prática delituosa similar (condução sob efeito de álcool) fala por si, relativamente a juízo de prognose desfavorável de que a mera censura do facto a ameaça da pena sejam, no caso, suficientes para fastar o agente da criminalidade, do mesmo passo que, como é do conhecimento comum, o fenómeno da condução sob o efeito do álcool tem vindo a acentuar-se na Região, justificando-se, pois, também em sede de prevenção geral, quer a medida concreta da pena alcançada, quer a não suspensão da execução da mesma, dado não realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.
Donde, sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, sermos a entender não merecer provimento o presente recurso”; (cfr., fls. 62).
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Cumpre decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados na sentença recorrida a fls. 29 a 32-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.
Do direito
3. Com o presente recurso pretende o arguido dos autos a revogação da sentença na parte que o condenou pela prática de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 3 meses de prisão.
E, como resulta do que se deixou relatado, bate-se (tão só) pela suspensão da execução da dita pena de 3 meses de prisão; (cfr., as atrás transcritas conclusões, nomeadamente, 3ª, 8ª, 9ª e 11ª).
Porém, não nos parece que se possa acolher a pretensão apresentada.
Vejamos.
Nos termos do art. 48° do C.P.M.:
“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.
No que ao estatuído neste art. 48° do C.P.M. diz respeito, tem este T.S.I. repetidamente afirmado:
“O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.”; (cfr., v.g., Ac. de 01.03.2011, Proc. n° 837/2011, do ora relator, e, mais recentemente, de 11.12.2014, Proc. n.° 769/2014).
E, como temos também entendido, o instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade; (cfr., v.g., o Ac. de 21.11.2013, Proc. n.° 649/2013).
Nesta conformidade, “quid iuris”?
Ora, resulta dos autos que o Tribunal a quo decidiu não suspender a execução da pena de 3 meses de prisão ao arguido fixadas, em virtude dos seus “antecedentes criminais”.
Como temos vindo a entender, devem-se evitar penas de prisão de curta duração.
Porém, como igualmente tem este T.S.I. afirmado, “não é de suspender a execução da pena de prisão ainda que de curta duração, se o arguido, pelo seu passado criminal recente, revela total insensibilidade e indiferença perante o valor protegido pela incriminação em causa, continuando numa atitude de desresponsabilização e de incapacidade para tomar outra conduta”; (cfr., v.g., o Ac. de 05.06.2014, Proc. n.° 329/2014).
No caso dos autos, constata-se que o ora recorrente já sofreu outras condenações.
Com efeito, para além de, em 23.03.2010, ter incorrido numa contravenção por “condução sob influência de álcool”, em 09.05.2012, foi condenado pela prática de 1 crime de “resistência e coacção”, p. e p. pelo art. 311° do C.P.M., na pena de 9 meses de prisão suspensa na sua execução por 2 anos, vindo em 18.03.2013, a ser (novamente) condenado pela prática de 1 crime de “consumo ilícito de estupefacientes”, p. e p. pelo art. 14°, da Lei n.° 17/2009, na pena de 1 mês e 15 dias de prisão que, cumulada com a (anterior) pena de 9 meses de prisão, resultou na pena única de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos, sendo ainda que, em 08.04.14, em consequência do incumprimento dos deveres que lhe foram impostos foi tal suspensão prorrogada por 1 ano, vindo a cometer o crime dos autos em 12.03.2015, em pleno período de suspensão da execução da dita pena única de 10 meses de prisão, revelando, efectivamente, uma insistência em levar uma vida delinquente, não aproveitando as diversas – 3 – oportunidades que lhe foram dadas.
Perante o que se deixou exposto, e concluindo-se que as finalidades que estavam na base da suspensão da execução da pena não puderam ser alcançadas, censura não merecendo a decisão recorrida que, por isso, se confirma.
Dest’arte, há que julgar improcedente o presente recurso.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.
Pagará o recorrente 4 UCs de taxa de justiça.
Macau, aos 14 de Maio de 2015
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 387/2015 Pág. 12
Proc. 387/2015 Pág. 13