打印全文
Processo nº 279/2013

I

Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM

Companhia de Leilão Internacional B (Macau) Limitada, devidamente identificada nos autos, vem recorrer do despacho do Senhor Secretário para a Economia e Finanças que, em sede de recurso hierárquico, manteve a decisão da Directora dos Serviços de Finanças que lhe indeferiu a reclamação da liquidação oficiosa do imposto do selo, concluindo e pedindo que:

1. 2012年1月8日,上訴人在本澳舉辦了一場公開拍賣會。經濟財政司司長及財政局均認定,在是次拍賣會中競賣了價值HKD$525,912,000.00的商品,並要求上訴人,就拍賣會中產生的競賣行為,支付印花稅。
2. 根據有關《印花稅規章》附件的繳稅總表第5條,規定了“競賣”行為須支付印花稅。
3. “競賣”是把一物品公開拍賣,讓有意買入物品者參與競價,並最後由競價的最高出價者,按其出價支付價金買入物品。換言之,任何“競賣”行為都分為“競價”及“買賣”兩個步驟,完成兩個步驟後“競賣”方為成立。
4. 在現實環境中,“競賣”行為的“競價”及“買賣”兩個步驟一般並非同時進行。在這兩個步驟間的真空期,各方的權利義務,由拍賣規則規範,而拍賣規則一般是由拍賣會公司所定。
5. 於籌備2012年1月8日的拍賣會時,上訴人已印制了拍賣刊物,以說明有關的拍賣規則及介紹各項拍賣商品的資料。然而,由於是次拍賣會容許參與者以電話方式競買,故參與者大多沒有取得有關刊物,即使已取得的,也沒有閱讀及了解有關拍賣規則。
6. 最重要的是,上訴人發現全部參與者均沒有按有關拍賣規則交付保證金。所以,全部參與者均不符合拍賣規則所定的競買人資格,不能參與競賣,拍賣會將不能順利舉行。
7. 有見及此,而又鑑於是次拍賣會為上訴人在本澳舉辦的首個拍賣會,其主要目的是為打響頭炮、宣傳及提升公司知名度,因此,上訴人最後決定是次拍賣會不採用拍賣刊物上所載的拍賣規則,並定立一臨時拍賣規則,以便拍賣會可順利進行。
8. 上訴人為是次拍賣會所定的臨時規則如下:
9. 首先,是次拍賣會的全部參與者均無須繳付保證金,任何人已登記者均可參與拍賣會。
10. 是次拍賣會中的競賣行將分為“競價”及“買賣”兩個步驟進行。
11. 第一步驟“競價”,是讓拍賣會上各參與者就商品作出競價。
12. 第二步驟“買賣”,是在競價後,競價中的最高出價者(包括現場或以電話方式作出)須在拍賣會舉辦之日起計30天內決定是否向上訴人確認其出價並交付相等價金或定金(或押金)以買入或預約買入商品。
13. 在完成第二步的“買賣”前,各方均不享有任何權利及無須承擔任何義務。
14. 若有關最高出價者最終沒有選擇完成第二步的“買賣”,即只“競價”不 “買賣”,競賣行為便不成立,各方均無須承擔任何義務。
15. 若有關最高出價者完成上述“競價”及“買賣”兩個步驟,並交付全數價金,上訴人便將有關商品,出賣予最高出價者,至此競賣行為方為成立。
16. 在拍賣會開始前,上訴人已通知全部參與者上述的臨時拍賣規則,而全部參與者均表示明白及願意接受並參與拍賣會。
17. 由於是次拍賣會有別於一般拍賣會,競價後的最高出價者無須立即支付訂金或保證金,而且在“競價”後至“買賣”前亦無須承擔任何義務,故多名最高出價者均沒有完成第二步的“買賣”,導致大部份商品最終未被競賣出。
18. 尤其是部份最高出價者在第二步驟所定的30天期間向上訴人提出反價,要求以低於競價時的最高出價進行買賣交易,即以違反第二步驟的方式作買賣交易。雖然上訴人最終接受了該等要求,但以此等方式作出的買賣行為,由於並非以競價時的最高出價進行,故其性質已變為一般買賣行為,而非競賣行為。
19. 上訴人曾向財政局提交的“拍賣會成交收報表”(見Doc. 1-即等同拍賣會商品的最後買賣交易名單)價值HKD33,320,000的商品,當中大部份是以低於拍賣會競價時的最高出價作出的一般買賣交易。然而,由於當時上訴人並不清楚印花稅規章的規定,誤以為一切商品買賣均須支付5/1000之印花稅,因此便聯同被競賣了的商品資料一同提交予財政局並隨後誤交了相關印花稅。
20. 除了上述的價值HKD33,320,000的商品交易外,是次拍賣會的其他商品最終沒有被成功競賣出予他人。
21. 基於以上所述,由於上訴人沒有作出(或未能證實)價值HKD525,912,000 的商品的競賣行為,因此被上訴的批示決定違反《印花稅規章》附件的繳稅總表第5條的規定,因此上訴人無需支付有關之印花稅,尤其MOP2,536,849的印花稅差額。
22. 但如法院另有理解,認為上訴人成功作出了價值HKD525,912,000的商品競賣行為,上訴人則補充請求如下:
23. 正如以上所述,該次拍賣會的競價者全是在沒有支付保證金的情況下參與。所有競價者都明白及知悉,上訴人舉辦該次拍賣會是需要支付一定金額作投資成本。而明知這情況下,競價中的最高出價者也沒有於拍賣會後的30天內確認其出價及向上訴人支付有關價金或定金(涉及上述價值HKD33,320,000的商品的買賣交易部份除外)。
24. 該等行為損害作為拍賣公司的上訴人利益、影響及擾亂有關拍賣行為的正常運作及其結果。該等行為的目的旨在騙取了上訴人的信任,欺騙上訴人相信有關最高出價者具買入商品的意圖。競價中的最高出價者是故意作出有該等行為。
25. 競價中的最高出價者的行為觸犯澳門《刑法典》第211條的騙罪及第226條的擾亂競買罪。
26. 由於有關行為屬刑事不法行為,所以有關行為並非真正及有效的競賣行為,因此競賣無效,上訴人亦無需就無效競賣行為支付任何印花稅。
---***---
請求
基於以上所述,請求行政法院裁定:
1) 司法上訴之理由成立,宣告被上訴之決定無效或將其撤銷;
2) 另請求命令司法上訴所針對之實體,把有關行政卷/稅務宗送交法院,以便附入本案,作為本案的組成部份。
懇請尊敬的行政法院法官 閣下,一如既往,作出公正裁決!

Citado, veio o Senhor Secretário para a Economia e Finanças, contestando pugnando pela improcedência do recurso e manutenção do acto recorrido.

Não havendo lugar à produção de provas, foram a recorrente e a entidade recorrida notificadas para apresentar alegações facultativas.

A recorrente veio dizer que prescindiu do direito de apresentar alegações facultativas, ao passo que a entidade recorrida não as apresentou.

Em sede de vista final, o Dignº Magistrado do Ministério Público opinou no seu douto parecer pugnando pelo não provimento do presente recurso.

Fica assente a seguinte matéria de facto com relevância à decisão do presente recurso:

* Em 08JAN2012, a Recorrente realizou em Macau um leilão;

* Conforme os documentos elaborados pela Recorrente, foram arrematados 138 lotes no valor de HKD$525.912.000,00;

* Em 27ABR2012, a Recorrente apresentou a lista à DSF para efectuar a liquidação e o pagamento de imposto do selo pela arrematação;

* Nesse acto, invocando que apenas uma parte de compradores ter efectuado o pagamento de preço, a Recorrente procedeu-se à liquidação do imposto do selo correspondente ao valor de HK33.320.000,00, calculada à taxa de 5‰, na quantia de MOP$171.598.00;

* O qual foi pago desde logo, na forma de selo de verba, através da Guia nº 2012-14-900144-7;

* Em face disso, por despacho da Directora dos Serviços de Finanças, foi determinada a liquidação oficiosa que incide sobre o valor de diferença (MOP$2.708.447,00 – MOP$171.598,00 = MOP$2.536.849,00);

* Inconformada com a liquidação oficiosa, a ora Recorrente reclamou para a DSF pedindo a isenção do pagamento de diferença em falta, no montante de MOP$2.536.849,00, alegando que nem todos os arrematantes efectuaram o pagamento do preço para adquirirem os lotes arrematados no leilão, pelo que o preço da arrematação não coincide com o valor real de transmissões;

* Por despacho da Directora dos Serviços de Finanças, foi negado provimento à reclamação, com fundamento de que a totalidade dos preços da arrematação é no valor de HKD$525.912.000,00, sobre o qual deveria incidir o imposto do selo;

* Novamente inconformada, interpôs o recurso hierárquico para o Chefe do Executivo; e

* Por despacho do Secretário para a Economia e Finanças, ora recorrido, foi negado provimento ao recurso hierárquico.

Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.

Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).

Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi do artº 1º do CPAC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.

Em face das conclusões na petição do recurso interposto, a recorrente imputa, a título principal, ao acto recorrido o vício de violação da lei.

E subsidiariamente invoca que integrando as licitações dos lotes que não vieram a ser efectivamente comprados a prática pelos respectivos licitantes dos crimes de burla e de perturbação de arrematações, previstos e punidos pelos artº 211º e 226º do CP, as mesmas licitações nunca podem ser objecto da tributação por terem constituído crimes.

Ora, independentemente da procedência ou não dos argumentos invocados pela recorrente para sustentar a sua posição quanto ao vício de violação da lei, imputado ao acto recorrido a título principal, esse pedido subsidiário é de logo rejeitar, pois os factos que alegou a recorrente na petição de recurso e os que resultam dos autos podem integrar, quanto muito, uma eventual situação de incumprimento contratual civilmente sancionado, não preenchendo todavia os tipos legais dos referidos crimes.

Então, só resta a única questão suscitada pela recorrente que consiste em saber qual é o valor a ser atendido para a fixação da matéria colectável para o efeito do cálculo do imposto do selo a pagar, ou seja, se é o valor dos lotes licitados ou o valor dos lotes efectivamente pagos.

Ora, a propósito da questão idêntica, este TSI já decidiu no Acórdão de 05FEV2015, tirado no processo nº 18/2014, relatado pelo ora 1º Adjunto e subscrito pelo ora 2º Adjunto.

Diz o mesmo Acórdão:
……
    4. Vamos então analisar a questão de fundo.
    4.1. Resume-se ela em saber se assiste à Administração Fiscal o direito de cobrar imposto de selo a uma leiloeira por três actos de licitação e arrematações que não se chegaram a concretizar relativas a três peças leiloadas no valor de várias dezenas de milhões de patacas, porquanto os licitantes, um do Canadá, alegando falta de genuidade da peça, não depositou o respectivo preço, outra de Taiwan que alegou indisponibilidade financeira e também não depositou o preço respeitante a duas peças por si licitadas.
    Isto, num quadro de actividade leiloeira, em que foi cobrado e pago o imposto de selo, respeitante a muitos outros actos em que se consumou a arrematação.
    A questão que se põe é a seguinte: é ou não devido imposto de selo pela actividade desenvolvida pela recorrente em relação àquelas três peças?
    4.2. O acto recorrido é o despacho de 15 de Outubro de 2013, da autoria do Senhor Secretário para a Economia e Finanças que indeferiu o recurso hierárquico necessário do despacho de 18 de Julho de 2013, da Senhora Directora dos Serviços de Finanças, que indeferiu o pedido de revogação do acto de liquidação oficiosa do imposto do selo por arrematação de bens, proferido em sede de reclamação graciosa.
    4.3. Pretende a recorrente que não há lugar ao imposto do selo, porque, pese o facto de terem sido licitados alguns bens que foram à praça a fim de serem vendidos em leilão por si organizado os respectivos licitantes não concretizaram a compra de tais bens, o que significa que a arrematação não foi concretizada pelo pagamento imediato do preço pelos arrematantes e, nessas circunstâncias, a venda ficou sem efeito, não tendo havido transmissão de bens, para efeitos fiscais, nem, tão pouco, houve valores sobre os quais pudesse ter sido fixada a matéria colectável do imposto do selo.
    4.4. Afirma-se no acto recorrido: "Conforme estipulado no art. 1.º do Regulamento do Imposto do Selo, este recai sobre os documentos, papéis e actos designados na Tabela geral anexa ao seu regulamento. O artigo 2.º refere que a RAEM adquire o direito ao Imposto do Selo, quer pelo facto da sua liquidação e pagamento, quer pela prática do acto em que o mesma incida".
    A entidade recorrida embora defenda que "o imposto do selo procura atingir, entre outros, os actos económicos, recaindo sobre as operações que constituem a revelação do rendimento ou riqueza (…)" , estranhamente, por outro lado, não deixa de referir que a arrematação, enquanto acto translativo tem por incidência objectiva nos termos do art. 51.° do Regulamento, apenas, as transmissões de bens imóveis, quer a título oneroso, quer gratuito e transmissões de bens móveis sujeitos a registo de valor superior a 50.000 patacas, excluindo as obras de arte e as antiguidades, porque são bens móveis não sujeitas a registo.
    4.5. Não se percebe bem a referência feita pela entidade recorrida quanto ao conceito de "arrematação" que pretende ter uma natureza de acto translativo, dentro de uma categoria de tributáveis quando referidos a bens imóveis e bens móveis sujeitos a registo de valor superior a 50.000 patacas e já não a bens móveis não sujeitos a registo.
    4.6. Vejamos o que dispõe o artigo 51º da Lei n.º 17/88/M, de 27 de Junho:
    “1. É devido imposto do selo por quaisquer documentos, papéis e actos que sejam fonte, para efeitos fiscais, de transmissão entre vivos, temporária ou definitiva:
    a) A título oneroso ou gratuito de imóveis;
    b) A título gratuito, de quaisquer outros bens, direitos ou factos sujeitos a registo, de acordo com a legislação aplicável, de valor superior a 50 000 patacas.
    2. São consideradas fontes de transmissão de bens para efeitos fiscais todos os documentos, papéis ou actos que titulem a transferência dos poderes de facto de utilização e fruição do bem.
    3. Para efeitos do disposto no número anterior são sujeitos a imposto do selo:
    a) Os contratos de compra e venda, troca, arrematação ou adjudicação por acordo ou decisão judicial ou administrativa, constituição de usufruto, uso e habitação, servidão ou direito de superfície;
    b) Os contratos-promessa de compra e venda ou outro documento, papel ou acto que, ainda que lícito, válido e eficaz, não seja susceptível de transmitir o direito de propriedade ou outro direito real de gozo;
    c) A cedência do usufruto, uso e habitação ou de servidão a favor do proprietário e a aquisição do direito de superfície pelo proprietário do solo;
    d) A aquisição de benfeitorias e a de bens imóveis por acessão;
    e) A remição de bens imóveis nas execuções;
    f) A adjudicação de bens imóveis aos credores, bem como a entrega feita directamente aos mesmos como dação em cumprimento ou em função do cumprimento, ou a entrega feita a outrem com a obrigação de lhes pagar;
    g) A remição, redução ou aumento de foros, ainda que seja por incómodo da cobrança, bem como a devolução de bens aforados ao senhorio;
    h) A cessão da posição contratual, independentemente da forma assumida;
    i) As entradas dos sócios com bens imóveis ou direitos reais sobre os mesmos para a realização do capital das sociedades comerciais e a adjudicação dos mesmos aos sócios na liquidação dessas sociedades;
    j) As entradas dos sócios com bens imóveis ou direitos reais sobre os mesmos para a realização do capital das sociedades civis, na parte em que os outros sócios adquirirem comunhão ou qualquer outro direito nesses imóveis, bem como, nos mesmos termos, as cessões de partes sociais ou de quotas ou a admissão de novos sócios;
    l) As entradas dos cooperantes com bens imóveis ou direitos reais sobre os mesmos para a realização de cooperativas e a adjudicação dos mesmos bens aos cooperantes na liquidação dessas cooperativas;
    m) A transmissão de bens imóveis por cisão das sociedades referidas nas alíneas i) e j) ou por fusão de tais sociedades entre si ou com sociedade civil;
    n) A constituição ou transmissão de concessão por aforamento ou por arrendamento, nos termos da lei de terras;
    o) A subconcessão ou trespasse das concessões feitas pela Região Administrativa Especial de Macau, para uso ou fruição de imóveis do seu domínio privado, ou para a exploração de empresas comerciais ou industriais, tenha ou não começado a exploração;
    p) As procurações ou substabelecimentos que concedam poderes de disposição do bem ao procurador e sejam irrevogáveis sem o acordo do interessado, nos termos do n.º 3 do artigo 258.º do Código Civil;
    q) Qualquer outro documento, papel ou acto que transfira os poderes de facto de utilização e fruição de um bem ou direito.
    4. O pagamento do imposto do selo nas transmissões tituladas pelos documentos referidos na alínea b) do número anterior, desoneram o respectivo sujeito passivo do seu pagamento aquando da celebração do contrato definitivo, desde que não exista alteração das partes, do objecto e se mantenha o valor da transmissão.
    5. Presume-se, sendo admitida prova em contrário, o conhecimento do mandatário ou substabelecido nas procurações ou substabelecimentos referidos na alínea p) do número anterior.
    6. O pagamento do imposto do selo nas procurações ou substabelecimentos referidos na alínea p) do n.º 3 que prevejam a celebração de negócio consigo mesmo desoneram o mandatário ou substabelecido do pagamento do imposto aquando da celebração desse negócio.
    7. Não são tributadas em imposto do selo as adjudicações ou arrematações nem as cessões da posição contratual referidas nas alíneas a) e h) do n.º 3, respectivamente, quando tenham por objecto bens imóveis que, por força de lei especial, devam ser revendidos decorrido prazo certo.”
    
    4.7. Na verdade, o art. 51.°, n.º 2, do Regulamento do Imposto do Selo, prescreve que: "São consideradas fontes de transmissão de bens para efeitos fiscais todos os documentos, papéis ou actos que titulem a transferência dos poderes de facto de utilização e fruição do bem" e, por sua vez, o n.º 3, estipula: "Para efeitos do disposto no número anterior são sujeitos a imposto do selo": "(...) q) Qualquer outro documento, papel ou acto que transfira os poderes de facto de utilização e fruição de um bem ou direito.”
    Se a entidade recorrida se refugiou na falta de um conceito legal de "arrematação", alegando que deve ser extraído da interpretação sistemática de todo o diploma - Regulamento do Imposto do Selo - , sempre se dirá que o seu art. 55.°, n.º 1, estabelece que "A matéria colectável do imposto do selo previsto neste capítulo tem por base o valor do bem ou direito transmitido, constante do documento, papel ou acto respectivo". Isto é, não deixa de estar subjacente para a entidade recorrida a existência de uma transmissão do bem, mesmo que se afirme ser claro que o facto tributário previsto no art. 5.° da Tabela Geral do Regulamento do Imposto do selo "é a realização da actividade económica em si, processo especial com vista à comercialização de produtos, pela melhor oferta de valores, efectuada de forma aberta e aceita por um leiloeiro, não sendo decisivo o momento no qual se transmite o direito de propriedade de bens arrematados".
    Há, no entanto, que referir que as transmissões tributadas são as previstas no n.º 1, o que não abrange a situação dos autos.
    
    Temos assim que nos voltar para a base de incidência contemplada no artigo 5º da Tabela, devendo ser essa e apenas essa a base do imposto.
    4.8. Antes, porém, de analisar este artigo, vejamos da natureza do imposto de selo.
    A vida civil e económica na sua complexidade é constituída de actos numerosos que o Direito disciplina e é sobre grande variedade e diversidade desses actos que se concretizam na emissão de documentos e actividades que incide o chamado imposto de selo. É dos capítulos mais complicados e difíceis da teoria dos impostos, obrigando o Fisco e os juristas a delimitar o seu alcance. A dificuldade adensa-se da confusão entre selo-meio-de-cobrança e selo-imposto.
    Na origem do imposto está uma necessidade de os poderes públicos controlarem uma série de actos através da venda de suporte documental oficial para os mesmos e rapidamente se tornou num modo de tributar as realidades mais diversas, abrangendo hoje actividades que se encontram tributadas pelos mais diferentes impostos.1 Na exposição de motivos que antecedeu a publicação do Código do Imposto do Selo, na sua versão de 1999, em Portugal, escreve-se logo no início: "o Imposto do Selo é hoje geralmente identificado como um elemento anacrónico do sistema fiscal português. As suas bases de incidência, liquidação e pagamento consistiriam, segundo um ponto de vista vulgarizado na opinião pública, em excrescências do passado, a suprimir com a necessária modernização do ordenamento jurídico tributário. “Esta característica anacrónica manifesta-se basicamente no seu intenso casuísmo e na ausência de princípios que possam ajudar à sua interpretação e aplicação como norma jurídica, além da sua excessiva adesão a conceitos importados do Direito Civil, geralmente inadequados para a previsão normativa no Direito Fiscal, pelo seu carácter excessivamente formalista.
     “Isto comporta a dupla consequência da dificuldade da sua interpretação e da imprevisibilidade das suas consequências jurídicas. Acresce a facilidade com que a sua previsão normativa pode ser contornada por mera alteração de forma, com a consequente frustração da intenção normativa.”, continua o Autor acima citado.
    Na teleologia do Imposto do Selo descortina-se que ele deve recair sobre as operações que, constituindo a revelação do rendimento ou riqueza, por qualquer outro motivo não sejam abrangidas por qualquer outro tipo de tributação indirecta.
     Para uns autores a relação de imposto do selo é a que liga o vendedor ao comprador do valor selado e que se traduz na aquisição do selo em contrapartida de um preço, que é a verdadeira receita fiscal que ingressa nos cofres públicos. Para outros, todavia, essa relação é uma simples relação preliminar da verdadeira obrigação tributária que nasce quando se verifica o facto a que a lei liga a consequência do imposto. Este, em qualquer das suas formas é uma designação genérica que encobre realidades muito heterogéneas, sendo já “ muito diversos os pressupostos de facto das obrigações tributárias submetidas àquele regime de cobrança. À cobrança por selo podem estar sujeitos impostos, impostos tão diversos como as quotizações para o Fundo de Desemprego, o imposto sobre especialidades farmacêuticas, anúncios, bilhetes de espectáculos, letras, contratos, etc.”2
     4.9. Vejamos, entre nós, o que se passa.
    Como impostos sobre os actos e documentos encontra-se o imposto do selo, previsto no Regulamento do Imposto do Selo (RIS) e na Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), aprovados pela Lei n.º 17/88/M, de 27 de Junho.
    “O imposto do selo tem sido classificado na categoria dos impostos indirectos, pois trata-se, geralmente, de um imposto de prestação única e que, incidindo sobre a despesa, tributa actos e factos isolados, cuja matéria colectável se manifesta indirectamente na capacidade contributiva do sujeito passivo. Através do imposto do selo tributa-se a circulação de riqueza, de bens e de valores, principalmente quando tais valores ou bens não tenham podido ser tributados por outra via. A par destes casos de tributação, a Tabela Geral do Imposto do Selo e outros diplomas prevêem numerosos casos de inutilização de estampilhas fiscais, como forma de pagamento de taxas devidas por serviços prestados pelo Território [cf, TGIS. art.º 8.º, 11.º, 12.º, 35.º, etc.], embora não seja de excluir que, conjuntamente com a importância da taxa, esteja a ser cobrado um imposto. (...) o legislador não definiu qualquer norma geral de incidência do imposto do selo, sendo a incidência deste imposto fixada por remissão para a Tabela Geral do Imposto do Selo, pois "o imposto do selo recai sobre todos os documentos, papéis e actos designados na Tabela Geral anexa ao presente regulamento, a qual faz parte integrante dele (RIS, art.1º). Para uma melhor compreensão da sua natureza e aplicação, pode decompor-se o imposto do selo de acordo com os diferentes actos e documentos passíveis de tributação. “3
    
    4.10. Posto isto, há que dilucidar no objecto que integra a base de tributação o âmbito deste imposto, sendo que no artigo 1º nada se concretiza, pelo que urge indagar na Tabela qual o acto que concretamente se visa tributar.
    O que está em causa nos autos é o artigo 5º da Tabela que faz tributar as “Arrematações de produtos, de géneros e de bens ou direitos sobre móveis ou imóveis, sobre o preço da arrematação ou da adjudicação.” A taxa é de 5‰ e a forma de pagamento é por Estampilha ou selo de verba. Naquele artigo mais se refere que “Esta permilagem é paga por meio de estampilhas coladas no respectivo auto e inutilizadas por quem presidir à praça ou conceder a remição ou distrate.
    Quando se trate, porém, de arrematações ou adjudicações feitas perante quaisquer autoridades ou em serviços da RAEM ainda que personalizados, órgãos municipais, empresas públicas e pessoas colectivas de utilidade pública e de utilidade pública administrativa, pode cobrar-se por meio de selo de verba a respectiva taxa, efectuando-se o pagamento no primeiro dia útil que se seguir ao da realização da praça, remição ou distrate.
    Nos documentos que titulem a arrematação, remição ou distrate é sempre mencionada a a importância do imposto do selo pago.”
    
    4.11. A primeira dificuldade reside na densificação do que seja a arrematação ou adjudicação, à falta de uma noção legal para tais actos. Merecendo o mesmo tratamento, será que traduzem realidades diferentes? Concretamente em que se traduzem? Implicam a transmissão da coisa?
    4.12. Na falta de uma previsão própria para as leiloeiras, vamo-nos servir do que se mostra regulado para as vendas judiciais. A arrematação é o “acto processual da venda judicial (quando esta seja feita sob a forma de arrematação em hasta pública), que consiste na colocação em leilão de cada bem ou lote e abertura de licitação entre os interessados. Fala-se também de arrematação em relação a cada bem ou lote e chama-se arrematante àquele licitante a quem, por ter feito o lanço mais elevado, o objecto ou lote é adjudicado.”4 “Por outro lado, a adjudicação, em processo civil, é o ”Acto processual pelo qual o tribunal transmite em favor de um ou vários interessados (por exemplo, co-licitantes na venda em hasta pública, co-proponentes na venda por meio de propostas em carta fechada, com­ proprietários da coisa comum divisível ou indivisível, co-herdciros ou outros interessados na partilha no processo de inventário, etc.) a totalidade ou parte de uma coisa, por ter sido reconhecido o direito dessa ou dessas pessoas à coisa, por terem direito de preferência, terem licitado mais alto no acto de arrematação e/ou cuja proposta em carta fechada tenha prevalecido. Por vezes, existindo co-interessados ou co­proponentes em igualdade de circunstâncias, a determinação daquele a quem deve ser adjudicada a coisa (ou a determinação de a quem deve ser adjudicado cada quinhão no caso de uma universalidade de coisas a partilhar e adjudicar) é feita por sorteio.”5
    No âmbito do Processo Civil, aceite alguma proposta o proponente é notificado para, no prazo de 15 dias depositar o preço - art. 792º do CPC - e se o não fizer é liquidada a sua responsabilidade (no direito antigo, antes de 1977, ía preso) e o juiz pode determinar que a venda fique sem efeito, procedendo-se a nova venda - art. 793º.
    
    4.13. Daqui somos a retirar que mesmo na venda judicial o contrato se consubstancia com a arrematação, sendo um contrato quoad effectum, isto é o direito de propriedade adquire-se por mero efeito do contrato - art. 402º, n.º 1 do CC-, sendo a entrega da coisa e o pagamento do preço meros efeitos do contrato, como resulta do art. 869º do CC. Na verdade, só nos contratos ad constitutionem a entrega da coisa integra um elemento constitutivo do próprio contrato (casos do mútuo, depósito, comodato).
    No nosso caso, o que terá faltado foi o pagamento do preço e a entrega também não se consumou, mas o contrato de venda deve ter-se por realizado.
    
    4.14. Passemos agora o olhar sobre a Jurisprudência Comparada que possa de alguma forma ajudar à dilucidação da melhor interpretação, ainda que respeitante a vendas judiciais.
    - “O facto de a compradora ainda não ter pago integralmente o preço à data da entrada do pedido de remição no tribunal é de todo indiferente. O que para o efeito releva e importa é a assinatura do auto da arrematação. Não, seguramente, o pagamento integral do preço, como o recorrente defende. E isto, não só por à adquirente ter sido concedido o prazo legal de 15 dias para satisfazer o resto do preço (artigo 904, n. 3 do Código de Processo Civil), como também por a transmissão dos bens a favor do adjudicatário, quando estes são vendidos em hasta pública, se operar com a assinatura do auto de arrematação - suficiente para se requerer o registo provisório da transmissão, desde que feita a prova dela e do depósito da 10 parte do preço e das despesas prováveis (artigo 48 do Cód. Reg. Pred.) - e, portanto, na data da praça. O facto de a entrega dos bens se não poder efectuar sem o pagamento ou o depósito da totalidade do preço e de o registo definitivo da transmissão só se poder requerer com base no título de arrematação, o qual, como ninguém ignora, só pode ser passado depois de depositado o preço e de paga a sisa, quando devida (artigo 905 do CPC), não tem importância de maior. Significa que a transmissão verificada com a arrematação susceptível de levar ao registo provisório a que se fez referencia, se acha sujeita a uma cláusula resolutiva, cessando, consequentemente, se a sisa, sendo devida, não for paga ou o arrematante não completar o pagamento do preço da compra no prazo legal (J. A. dos Reis in ob. e doc. cit., página 374 e 375 e Lopes Cardoso in Manual da Ac. Exec., 3. ed., página 612 e 613) ... Uma vez que a lei, ao fixar, no caso da venda de bens por arrematação, o momento até ao qual os titulares do direito de remição o podem exercer - até ser assinado o auto de arrematação - , não faz qualquer distinção entre o estar ou não estar já pago todo o preço aquando do exercício do mesmo - nem faria sentido que o fizesse, visto conceder aos licitantes um prazo de 15 dias para se completar o pagamento do devido quando não pago integralmente logo de início (artigo 904 n. º 3), também o intérprete a não deve fazer. Apesar de a velha máxima, segundo a qual "ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus" já haver merecido o qualificativo de obsoleta (A. Varela in Rev. Leg. Jur., 123/30), não se vêem razões para dar ao comando da alínea b) do artigo 913º do Código de Processo Civil uma interpretação que se afaste do respeito por este axioma no caso concreto.” - Ac. do STJ, Proc. n.º JSTJ00022101, de 02/17/1994.
    - “(…) O arrematante, ao arrematar bens numa praça pagando, no acto desta, apenas parte do preço, se não pagar o restante, perderá o que pagou, ficando, em princípio, sem efeito a compra que fizera. (…) O arrematante remisso ainda que tenha pago no acto da praça mais do que a décima parte do preço perderá tudo o que pagou desde que, no prazo legal, não venha a pagar o restante, ainda que seja uma quantia mínima… Toda a estrutura da venda judicial demonstra que a parte paga pelo adquirente no acto da venda não tem a natureza de sinal, tal como é considerado no direito civil nem se trata de uma compra e venda a prestações.” - Ac. da RL, Proc. n.º 0036372, de 17/1/1991.
    
    - “I - A expressão "arrematação de bens imóveis" - utilizada no artigo 15º da Tabela Geral do Imposto de Selo, deve ser interpretada em sentido jurídico, como acto translativo de propriedade sobre esses bens imóveis, que dispensa para esse efeito qualquer escritura notarial posterior;
II - Se um município aprovar um regulamento para venda de imóveis do seu domínio privado, e nele incluir um acto de arrematação e uma escritura notarial, deve o acto de arrematação entender-se como um mero concurso para apurar o candidato que oferece lanço mais alto, a fim de com este candidato outorgar a escritura; (…)” - Ac. do STA, Proc. Procº nº 61 869, de 21/3/95 e Ac. STA, Proc. n.º 0779/03, de 22/2/2003

- “A arrematação a que alude o art. 15 da Tabela do Imposto de Selo, na versão vigente em Maio de 1996, era a arrematação que tinha por efeito imediato a transmissão da propriedade dos imóveis arrematados ou a fazia dependente, quando muito, apenas, da prolação de um acto administrativo integrativo posterior que com aquela formava um bloco constitutivo de tal efeito jurídico.
Havendo a arrematação servido como simples procedimento administrativo da formação da vontade de vender, nomeadamente para determinação, sujeita à condição de posterior aceitação do órgão autárquico competente, do contraente e do preço por que a venda devia ser feita, ela não cabe na categoria de facto tributário de facto tributário definido no art. 15 da Tabela do Imposto de Selo.” - Ac. do STA, proc. n.º 024281, de 27/10/1999
    
- “O termo arrematação não tem na legislação administrativa o significado restrito, jurídico- processual, de adjudicação ou compra em hasta pública, leilão ou almoeda. Antes, usa-se geralmente para designar o processo por que se faz a adjudicação de obras públicas e de fornecimentos, com emprego indiferente e simultâneo das palavras arrematação e adjudicação. Um contrato de adjudicação de fornecimentos esta, por isso, sujeito ao pagamento do imposto do selo, previsto no artigo 23 da tabela geral do imposto do selo, na redacção que lhe deu o Decreto-Lei n. 36608.” - Ac. do STA, Proc. n.º 000655, de 8/5/1952
    - “Sendo a arrematação de imóveis essencialmente uma forma de venda por meio de licitação destinada a corrigir erros que se cometam na fixação do valor real dos bens, será de reconhecer que o acto não chega a preencher a tipicidade legal do art. 15 da TGIS, apostado em sujeitar ao tributo a formalização de uma verdadeira venda, quando no acto falte a adjudicação dos bens arrematados e a consequente transferência efectiva do direito de propriedade dos imobiliários”.- STA 024198, de 10/11/1999 e Ac. do STA, Proc. n.º 024369, de 2/2/2000.
    
    - “A arrematação de imóveis tributável em imposto de selo, nos termos do art. 15 do RGIS, há-de necessariamente envolver, enquanto verdadeira venda judicial de bens, a respectiva adjudicação e consequente transmissão efectiva do direito de propriedade dos imóveis arrematados.” - Ac. do STA, Proc. n.º 024369, de 2/2/2000
    
    4.15. Importa ainda abordar a questão, não descurando o sentido da natureza jurídica da arrematação, entrando ainda em linha de conta com o conceito de arrematante relapso ou remisso.
    A análise desta jurisprudência comparada parece, à primeira vista, contraditória, mas logo se consegue compatibilizar com a harmonização dos princípios gerais se tivermos em conta que na maior parte dos casos, quando se afirma que o imposto de selo não é devido, estão em causa bens imóveis, em que se afigura essencial a documentação translativa corporizada no auto de arrematação.
    No caso “sub judice” estão em causa bens móveis que foram indubitavelmente arrematados. O efeito adjudicativo, ou seja, constitutivo da propriedade, operou por efeito do próprio contrato, se bem que falte a entrega da coisa e da propriedade. A transferência da propriedade da coisa é efeito do contrato de alienação e não da entrega da coisa.6
    Nesta conformidade não é difícil autonomizar um acto produtor ou apto a produzir efeitos próprios, gerador de responsabilidades para os adquirentes e comitentes dos alienantes que, enquanto leiloeiros, têm de se organizar e precaver de aventureiros e licitantes relapsos.
    4.16. Na verdade, como bem alega a recorrente, os leiloeiros são tão só organizadores de vendas em leilão que, no âmbito da sua actividade económica, propõem a venda de um bem, em seu nome, mas por conta do comitente, nos termos de um contrato de comissão de venda, com vista à sua adjudicação em leilão; a classificação das Ocupações Profissionais de Macau (COPM), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 45/97/M de 10 de Novembro, integra os Avaliadores e os Leiloeiros no GRUPO BASE 341, definindo-os assim: "Os Avaliadores e Leiloeiros vendem em leilões diversos géneros de bens ou avaliam-nos, tais como bens imobiliários, objectos de arte, produtos agrícolas e gado e as tarefas consistem em: a) Avaliar bens imobiliários, mercadorias e outros; b) Promover a venda em hasta pública de diferentes tipos de bens; c) Apregoar publicamente diferentes tipos de bens, tendo em vista a respectiva venda; d) Executar outras tarefas similares; e) Coordenar outros trabalhadores".
    Das receitas que vierem a apurar a título de comissão, terão que pagar os respectivos impostos à Autoridade Tributária; nesta sua especial actividade têm a responsabilidade de arrecadar o imposto do selo devido pelas transmissões de bens que forem realizadas e que constituem um encargo do arrematante, ou seja, do adquirente do bem.
    Desta forma se responde ao argumento usado pelo recorrente, enquanto diz que “ se o facto tributário subjacente ao acto de liquidação do imposto do selo, nas arrematações feitas no âmbito de um leilão, fosse a realização da actividade económica em si, processo especial com vista à comercialização de produtos, pela melhor oferta de valores efectuada de forma aberta e aceite por um leiloeiro, não sendo decisivo o momento no qual se transmite o direito de propriedade de bens arrematados não existiria essa profissão ou, melhor dizendo, nenhuma pessoa singular ou colectiva poderia desenvolver tal actividade” pois que não se trata tão-somente uma mera oferta, mas sim o que se tributa é a arrematação ou adjudicação ao melhor ofertante. Se a venda vem a ficar sem efeito e existe uma venda, tal como se enquadrou essa actividade – aliás, o próprio requerente o admite ao reclamar contra uma venda que diz ter ficado sem efeito -, então, as responsabilidades não podem deixar de ser assacadas ao comprador relapso, como acontece também nas vendas judiciais.
    Nem se diga que estaria encontrada a galinha de ovos de ouro para a Fazenda por, tal como diz o Exmo Magistrado do MP, na sua expressão feliz, ser caricata a tributação de um lance desmesuradamente excessivo “a partir da alegre martelada”, não se vendo razão para distinguir das situações reguladas nos termos das vendas judiciais e eximir esse licitante das suas responsabilidades.
    
    4.17. Se o ordenamento jurídico da RAEM não imputa responsabilidade criminal aos arrematantes relapsos - como acontecia em Portugal, antes da publicação do Decreto-Lei n.º 368/77, de 3 de Setembro, certo sendo que o Código de Processo Civil, determinava que o arrematante remisso fosse preso, por prazo não superior a um ano, até que se encontrasse cobrada a quantia por que era responsável, já o Código de Processo Civil de Macau, como acima se disse e ora se repete, no seu art. 793.°, prevê sanções que podem ir desde o arresto de bens para garantir o pagamento do preço por si indicado (art. 740.°, n.ºs 2 e 3, com as devidas adaptações), à impossibilidade de voltar a ser admitido como arrematante, ficando ainda responsável pela diferença do preço que vier a ser licitado numa outra venda.
    Ainda é o próprio recorrente que nos dá razão, ao dizer ser óbvio que estas sanções são aplicadas quando se trata de vendas no âmbito de um processo judicial de execução, situação que é muito mais grave do que aquela em que está em causa uma venda particular; porém, não se pode perder de vista que a lei processual civil prevê que as vendas de bens móveis - em certas circunstâncias - se faça em empresa de leilão (art. 800.° do CPCM), o que quer dizer que é reconhecido que as arrematações de bens móveis no âmbito de um leilão organizado por empresa particular têm carácter translativo.
    Não deixaremos de reforçar este apontamento, invocando o n.º 3 desse art. 800º que prevê que a venda se faça pelo pessoal da empresa de leilões segundo as regras em uso.
    Sendo certo que a previsão da base tributária - art. 5º da TIS - e a natureza do imposto em causa não implicam a realização da venda que na argumentação por nós desenvolvida não se deixa de tomar como o parâmetro mais exigente e que de acordo com as regras civilistas não se deixa de ter por verificada.
    
    4.18. Sufraga-se o entendimento da Administração Fiscal de que no caso do imposto em causa não se torna necessária a transferência da coisa, - o que é diferente da investidura da propriedade, pois tal como acontece nas vendas judiciais, "os bens apenas são adjudicados e entregues ao proponente após se mostrar integralmente pago o preço e cumpridas as obrigações fiscais" (art. 795.° do CPCM).
    Embora constitua uma responsabilidade da leiloeira liquidar o imposto do selo para o entregar à Autoridade Tributária, tal imposto calculado sobre o valor do bem transmitido constitui um encargo do adquirente do bem que o arrematou, após ter licitado o bem, na nossa interpretação, independentemente do pagamento do preço a que estará adstrito.
    
    4.19. Refere ainda a recorrente que no despacho proferido pela Senhora Directora dos Serviços de Finanças que indeferiu o seu pedido de revogação do acto de liquidação, defendeu-se que "a particularidade quanto às arrematações é a de que o pagamento do imposto apenas pode ser efectuado através de estampilhas fiscais, que são apostas nos documentos e inutilizadas pela pessoa que receber o valor da transacção, no caso, por quem presidir à praça, no momento em que se pratica o acto sujeito a imposto."
    Essa é uma interpretação que não significa necessariamente que seja interpretação autêntica. Não deixará ela, no entanto, de reflectir uma prática e uma normalidade, pois não será todos os dias que os arrematantes deixem de cumprir as suas obrigações, impondo-se a adaptação da conduta da Autoridade Fiscal a cada uma das situações em presença.
    Prescreve o art. 5.°, in fine, da Tabela Geral do Regulamento do Imposto do Selo que "Nos documentos que titulem a arrematação, remição ou distrate é sempre mencionada a importância do imposto do selo pago". Daqui se pretende retirar o argumento de que, não tendo havido transmissão dos bens acima referidos, não houve quaisquer documentos que tivessem titulado a transmissão de bens por arrematação. Ora, não é o hábito que faz o monge, isto é, não pode ser um procedimento a condicionar a substância da cobrança fiscal. Por outras palavras, não pode ser a falta de um impresso que conduz ao não pagamento do imposto devido.
    Em lado algum se diz que a empresa leiloeira, devidamente licenciada, apenas, pode cobrar o imposto do selo relativamente aos negócios realizados pelos quais recebeu o valor da transacção.
    
    4.20. A afirmação da recorrente (artigo 30º da sua petição de recurso) de que “os bens acima referidos - que foram licitados e tudo indicava que seriam arrematados, ou seja, comprados em leilão - continuam a pertencer aos respectivos proprietários, isto é, não foram transmitidos, sendo certo que poderão ir novamente à praça - se os proprietários assim o desejarem - e, caso venham a ser transmitidos, então, serão tributados com o imposto do selo” não deixa de entrar em contradição quando noutro passo defende que a venda fique sem efeito, tal como por nós também já referido.
    
    4.21. Não é o Tribunal que tem de ensinar os agentes económicos a actuarem e a precaverem-se num mercado muito específico, especializado, reservado e que exige uma adequação e alta preparação técnica, seja em função do tipo do mercado, das peças que são transaccionadas, dos valores envolvidos, da discrição requerida e dos clientes frequentadores desses mercados, tudo apontando para um profissionalismo que tem de prever e responsabilizar quem ali actua.
    
    4.22. A facilitar-se no sentido da pretensão que vem aos autos, poderia - não é que seja o caso - abrir-se a porta a vendas que, por essa via, fugissem aos impostos devidos, bastando pensar em conluios entre alienante e adquirente, com pagamentos no exterior, mesmo à revelia da própria leiloeira.
    Tudo na mesma linha que leva o legislador a consagrar que, mesmo no caso de acto inválido, ineficaz ou ilícito. Assim o art. 52º, n.º 1 do RIS: “O imposto do selo é devido ainda que o documento, papel ou acto seja inválido, ineficaz ou ilícito, sem que o pagamento sane a invalidade, a ineficácia ou a ilicitude.” E que nos termos do n.º 2 só “ a apresentação pelo sujeito passivo de sentença transitada em julgado, que reconheça a invalidade ou ineficácia do documento, papel ou acto que titulou a transmissão, impede a cobrança do imposto do selo e, se já tiver sido pago, confere direito à sua restituição.
    5. Por todas estas razões o recurso não deixará de improceder.

Tendo o presente recurso por objecto uma questão de direito idêntica à questão tratada nesse Acórdão, damos aqui por integralmente reproduzido o segmento desse Acórdão para, mutatis mutandis, se servir de fundamentos para julgar improcedente o presente recurso.

Resta decidir.

III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente, com taxa de justiça fixada em 6 UC.

Registe e notifique.

RAEM, 30ABR2015

(Relator)
Lai Kin Hong

(Primeiro Juiz-Adjunto)
João A. G. Gil de Oliveira

(Segundo Juiz-Adjunto)
Ho Wai Neng

Fui presente
Mai Man Ieng
1 - Saldanha Sanches, Man. Dto Fiscal, Coimbra Editora, 3ª ed., 432
2 - Ma. Dto Fiscal, LisboaManuais da FDL, 1974, 85 e 87
3 - José Rato Rainha, Impostos de Macau, UM, FDM, FM, 1997, 220
4 - Ana Prata, Dicionário Jurídico, 4ª ed., Almedina, 123
5 - Autora e ob. acima citada, 49
6 - Galvão Telles, Obrigações, 3ª ed., 60
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------

279/2013-1