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Processo n.º 142/2015
(Recurso Civil)
Data : 14/Maio/2015

Recorrente : Fomento Predial A (representada por B)

Recorrido : C
Objecto do recurso : Parte da sentença que condenou em multa como litigante da má fé
    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I – RELATÓRIO
     1. Fomento Predial A, empresa comercial registada nos Serviços de Finanças sob o n.º de cadastro …, com sede na Rua …, m Macau, representada pela B, titular do Bilhete de Identidade de Residente Permanente da RAEM n.º …,
    Intentou acção contra
    C, solteiro, maior, titular do Bilhete de Identidade de Residente Permanente da Região Administrativa Especial de Macau n.º …, com residência habitual em Macau na Rua…,
    com os fundamentos apresentados constantes da p.i., de fls. 35 a 39,
    concluiu pedindo que fosse julgada procedente por provada a presente acção, e em consequência, o Réu condenado a pagar à Autora a quantia de MOP$81.880,00, a que acrescem os juros de mora (fixados com base na taxa legal) sobre o capital em dívida a partir da data da celebração da escritura (14 de Janeiro de 2011) ou, caso assim não se entenda, subsidiariamente, a partir da data da citação da Réu até integral pagamento ou ainda caso nenhum dos anteriores pedidos seja considerado, subsidiariamente, os juros devem ser contabilizados a partir da data do trânsito em julgado do Acórdão que venha a condenar o Réu no pagamento;
    E ainda ser o Réu condenado a pagar os honorários que até à data a Autora despendeu com a propositura da presente acção e que foram MOP$20.000,00.
    A final, atenta a falta de personalidade judiciária da A., foi proferida a decisão seguinte:
    “Em face de todo o que fica exposto e justificado, o Tribunal decide:
    1. Absolver o Réu, C, da instância relativo aos pedidos formulados pela Autora, Fomento Predial A;
    2. Absolver a Autora da instância relativa ao pedido formulado pelo Réu; e
    3. Declarar a Autora litigante de má fé e condená-la na multa de 10 UCs.
    Custas da acção pela Autora e da reconvenção pelo Réu. “
    
    2. Fomento Predial A, Autora nos autos à margem identificados, em que é Réu C, nos termos dos arts. 385.°, n.º 3 e 613.°, n.º 2 do Código de Processo Civil (C.P.C.), inconformada com a sentença proferida na parte em que a condenou como litigante de má-fé, vem interpor recurso, alegando em síntese conclusiva:
    A - Vem o presente recurso interposto da parte da sentença que condenou a Recorrente como litigante de má fé.
    B - Contrariamente ao entendimento sufragado na decisão recorrida, tal facto - a proposição da acção em nome da empresa - não foi motivado por qualquer aposta no desdobramento da personalidade jurídica entre B e a empresa Fomento Predial A. Tratou-se, isso sim, de um erro jurídico.
    C - Com efeito, a acção foi proposta por Fomento Predial A por se ter entendido - erradamente é certo - que tal seria suficiente para assegurar a legitimidade da Autora, sendo certo que a Autora não tinha qualquer interesse em propor uma acção, sabendo de antemão que falecia um pressuposto processual.
    D - Por tal erro a Recorrente foi suficientemente penalizada pelo facto de o Tribunal ter concluído no sentido de não poder conhecer do mérito da acção.
    E - Tal situação não foi criada ou configurada com negligência grave e, muito menos, com dolo - vontade e representação - de criar qualquer uma das situações descritas no art. 385.°, n.º 2 do Código de Processo Civil.
    F - Acresce que, no entender da Recorrente, não repugna ao sentido de direito e de justiça reclamar um montante nos termos que foram contratualmente convencionados.
    G - Veja-se a propósito a resposta ao quesito n.º 7 da base instrutória, na qual o Tribunal a quo deu como provado: "Tendo sido estipulado que o Réu teria que pagar à Autora o montante de HK$80.000,00 ... "
    H - Sendo ainda que considerar a inevitável conclusão de que o imóvel não "pertencia" exclusivamente a B, mas também a D (conferir, nomeadamente, resposta do Tribunal a quo ao quesito 34.° da base instrutória)
    I - Ou seja, quer em nome próprio de B, quer como titular da empresa Fomento Predial A, existiam - como existem - legítimas expectativas no recebimento de um valor que foi convencionado no contrato celebrado com o Réu. É o que resulta do disposto nos arts. 399.°, n.° 1 e 400. º, n.º 1 do Código Civil.
    J - Pelo que, no caso, não se verifica, nem verificou, por parte da Recorrente qualquer intenção de violar o disposto na alínea a) do n.° 2 do art. 385.° ou qualquer outra das previsões contempladas no mesmo normativo legal.
    Nestes termos e melhores de direito que V. Ex.ªs doutamente suprirão, deve o presente recurso ser considerado procedente por provado e, consequentemente, revogada a parte da sentença recorrida que condenou a Recorrente como litigante de má fé.
    3. O recurso não foi contra-alegado.
    4. Foram colhidos os vistos legais.
    
    II – FACTOS
    Foram provados os factos seguintes:
    “Da Matéria de Facto Assente:
    - A Autora é uma empresa comercial que se dedica ao ramo da mediação imobiliária cuja propriedade pertence à B (alínea A) dos factos assentes).
    - O Réu propôs o preço de HKD$7.500.000,00 para a compra da fracção autónoma referida no art° 1 ° (alínea B) dos factos assentes);
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    Da Base Instrutória:
    - A Autora apresentou a fracção sita em Macau na Travessa…, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n° … e inscrito na matriz sob n° … ao Réu informando-o que o preço era HK$8.500.000,00 (resposta aos quesitos 4º e 15º da base instrutória).
    
    - O Réu mostrou-se interessado em comprar a fracção autónoma referida na resposta aos quesitos 4° e 15° (resposta ao quesito 5º da base instrutória).
    - Em 8 de Novembro de 2010, a B, D e o Réu celebraram um acordo nos termos do qual os dois primeiros prometeram vender e o terceiro prometeu comprar o imóvel referida na resposta aos quesitos 4° e 15°, pelo preço de HK$7.500.000,00 (resposta ao quesito 6° da base instrutória).
    - Tendo sido estipulado que o Réu teria que pagar à Autora o montante de HK$80.000,00, como comissão pelos seus serviços, apesar de o imóvel pertencer à B (resposta ao quesito 7º da base instrutória).
    - A Autora interpelou, por várias vezes, o Réu no sentido de efectuar o pagamento da respectiva comissão (resposta ao quesito 8° da base instrutória).
    - Desde a celebração da escritura, que ocorreu em 14 de Janeiro de 2011 até à presente data, o Réu não efectuou qualquer pagamento da comissão à Autora (resposta ao quesito 10° da base instrutória).
    - Não obstante as sucessivas interpelações para o efeito levadas a cabo pela Autora (resposta ao quesito 11° da base instrutória).
    - O Réu não aceitou o preço de HK$8.500.000,00 referido na resposta aos quesitos 4° e 15° (resposta ao quesito 16° da base instrutória).
    - A Autora abordou o Réu e perguntou-lhe quanto estava disposto a oferecer pela fracção (resposta ao quesito 17º da base instrutória).
    - Após o Réu haver proposto o preço mencionado em B) dos Factos Assentes, a Autora disse ao Réu que o proprietário da fracção havia aceitado o preço (resposta ao quesito 18° da base instrutória).
    - Antes de entregar de cheque referido na resposta aos quesitos 22 e 23°, o Réu entregou à Autora HK$400.000,00, a título de sinal (resposta ao quesito 21º da base instrutória).
    - No dia 8 de Novembro de 2010, o Réu reforçou o sinal na quantia de HK$100.000,00 emitindo, no mesmo dia, a favor de B o cheque n°… do Banco… sacado da conta n° … da sua empresa "F", no valor de HK$100.000,00 e assinou o contrato referido na resposta ao quesito 6° (resposta aos quesitos 22° e 23° da base instrutória).
    - O remanescente do preço devido, no valor de HK$7.000.000,00 deveria ser pago em dois cheques, um a favor de G, no valor de HK$3.580.000,00 (resposta ao quesito 29° da base instrutória).
    - E outro a favor de B, no valor de HKD$3.420.000,00 (resposta ao quesito 30° da base instrutória).
    - No dia 10 de Janeiro de 2011 o Réu deslocou-se ao escritório do advogado Dr. Rui Afonso para celebrar a escritura de compra e venda da fracção autónoma referida na resposta aos quesitos 4° e 15° com o original promitente vendedor e titular do direito de propriedade da fracção, "Empresa de Construção e Fomento Predial H, Limitada" (resposta ao quesito 32° da base instrutória ).
    - No mesmo dia e mesmo acto de celebração das escrituras, o Réu assinou igualmente o contrato de cessão da posição contratual de promitente-comprador da fracção, com o original promitente comprador, G, os cessionários deste e cedentes do Réu, B e D, e pagou um por cento do preço original de HK$2.580.000,00, ou seja, a quantia de HK$25.800,00 à Companhia de Construção e Investimento Predial I, Limitada que representou a sociedade promitente-vendedora cedida na celebração do contrato promessa originalmente celebrado, nos termos da clausula S deste último contrato (resposta ao quesito 33° da base instrutoria).
    - Em 4 de Novembro de 2010, no escritório do advogado Dr. Rui Afonso, na B, juntamente com o seu parceiro D, assinaram um contrato para a aquisição da posição contratual de promitente comprador de G pelo preço de HK$5.5S0.000,00, que, em 30 de Outubro de 2010, tinham acordado também por escrito (resposta ao quesito 34° da base instrutoria ).
    - A fracção autónoma referida na resposta aos quesitos 4° e 15° tinha sido colocada à venda "J Properties" pelo preço de HK$5.580.000,00 (resposta ao quesito 35° da base instrutória).
    - A B e D adquiriram a fracção pelo preço de HK$5.580.000,00 para a revender por preço superior (resposta ao quesito 35°A da base instrutória).
    - Para o efeito, a B e D reservaram na assinatura do contrato promessa de cessão da posição contratual celebrado com G em 4 de Novembro de 2010 a possibilidade de designar terceiro para celebrar o contrato definitivo de compra e venda ou a cessão da posição contratual de promitente-comprador (resposta ao quesito 35°B da base instrutória).”

    III – FUNDAMENTOS
    1. O objecto do presente recurso passa apenas pela análise da condenação como litigante de má-fé , na medida em que a Mma Juíza entendeu que houve uma atitude dolosa da A., ao intentar a acção usando o nome da firma quando sabia não ter personalidade judiciária para tanto.
2. Atentemos no que exarado foi na douta sentença proferida:
    “O Réu pede também a condenação da Autora como litigante de má fé porque a Autora jogou "no 'desdobramento da personalidade', entre a empresa Autora e a pessoa sua proprietária" quando "só existe" ... "uma 'única pessoa de carne e osso', B, Autora.".
    Pela análise dos articulados apresentados pela Autora, verifica-se que a mesma manteve-se sempre a posição de que a Autora e B são duas entidades totalmente independentes que não se confundem para defender que os direitos que alegadamente assistem àquela nada tem a ver com esta.
    Quando se debruçou sobre a personalidade judiciária da Autora foi já salientado que esta é uma mera empresa comercial destituída de personalidade jurídica.
    Em termos jurídicos, a Autora mais não é do que um bem através do qual B exerce a sua actividade comercial. Por força disso, todos os direitos e obrigações que advêm dessa actividade são imputados na pessoa de B, sua proprietária. Isso retira-se claramente do disposto no artigo 82º do Código Comercial acima citado.
    No entanto, a Autora insiste em afirmar que é uma entidade diferente.
    Tendo em conta os factos alegados pela Autora, o de ter sido esta a mediadora do Réu na aquisição feita e B um dos cessionários da posição contratual de promitente-comprador cedido ao Réu, vê-se claramente que a autonomização da Autora da pessoa de B se destina a evitar que se venha a concluir que lhe não assiste qualquer direito à comissão peticionada tendo em conta o disposto no artigo 708º do Código Comercial.
    Segundo essa norma, "É considerado mediador quem põe em contacto dois ou mais interessados para a celebração de um negócio, sem estar ligado a qualquer dos interessados por uma relação jurídica de colaboração. de dependência ou de representação." (sublinhado nosso)
    Nem pelo facto de, antes da cessão, o direito cedido pertencer também a um terceiro se pode dizer que a Autora, melhor, B é uma entidade desinteressada como impõe a norma acima transcrita. É que, sendo B um dos cessionários, por maioria de razão, a mesma deve ser considerada como parte interessada e o que a lei exige é a inexistência de qualquer ligação entre o mediador e qualquer dos outorgantes do negócio.
    Dada a clareza da relação existente entre a Autora e B, é manifesto que a Autora actuou com dolo ao tentar apresentar-se como um ente autónomo na presente acção a fim de deduzir uma pretensão que sabe que, por força do disposto no artigo 708º do Código Comercial, não tem qualquer fundamento.
    Assim, é de declarar a Autora litigante de má fé e, tendo em conta a situação dos autos, julga-se adequada uma multa de 10 UCs.”
3. Dispõe o art. 385º do CPC:
“1. Tendo litigado de má fé, a parte é condenada em multa.
2. Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
3. Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má fé.”
4. Desde logo se anota um contra-senso, na medida em que não se vê como se pode condenar como litigante de má-fé alguém destituído de personalidade jurídica e judiciária, havendo que interpretar, no entanto, habilmente o decidido e direccionar essa condenação para a pessoa que se assume no processo como seu “representante”
5. A má-fé traduz-se, em última análise, na violação do dever de probidade que o art. 9º impõe às partes.1
As imperfeições e um ou outro excesso de alegação inserem-se ainda dentro de algum calor de patrocínio ou numa interpretação subjectiva dos factos, o que não basta para sofrer qualquer condenação como litigante de má-fé no âmbito de qualquer dos processos e meios processuais.
De realçar que o litigar conscientemente contra lei expressa integra lide temerária e menos proba sendo susceptível de integrar a previsão do artº 385º/2 do CPC.
Aí se distingue entre dolo substancial (1ª parte) e dolo instrumental (2ª parte).
Sendo que a má-fé material diz respeito ao fundo da causa, à relação substancial deduzida em juízo; a má-fé instrumental diz respeito a questões de natureza processual.2
Ora, o nº 2 do art. 9º do CPC exige que as partes litiguem sem que formulem conscientemente pedidos ilegais e sem que articulem “factos contrários à verdade” ou requeiram “diligências meramente dilatórias”.
Na má-fé material o dolo pode surgir directo, caracterizado pela alteração consciente da verdade dos factos ou omissão de factos essenciais, ou indirecto, com dedução de pretensão cuja falta de fundamento se não ignora.
Não obstante a existência de um nexo típico entre a alteração da matéria de facto e a intencionalidade do agente, a lei prescinde dele, desinteressando-se das finalidades últimas do agente. A ilicitude reside, desde logo, na actuação da parte, que viola os deveres de verdade e de boa fé processual.3
Já a má-fé instrumental consiste no uso de “meios processuais” reprováveis, “com o fim de conseguir um objectivo ilegal ou de entorpecer a acção da justiça”4.
Para que se verifique esta litigância de má-fé é necessário que a parte tenha feito do processo ou dos meios processuais um uso, não apenas reprovável, mas manifestamente reprovável.
6. Estamos em crer que não há elementos que possam sufragar o entendimento de que se tratou de uma aposta do A. em desdobrar a sua própria individualidade com a empresa por si possuída.
    É a própria recorrente que admite que a acção foi indevidamente proposta em nome de Fomento Predial A, razão pela qual não recorre, por ausência de fundamento legal, da parte da sentença que absolveu as partes da instância com fundamento em ilegitimidade da Autora.
    Ela própria admite ter cometido um erro jurídico, erro esse que, se virmos bem, passa até pelo crivo do advogado, sendo um erro não pouco frequente.
    Com efeito, a acção foi proposta por Fomento Predial A por se ter entendido, erradamente, que tal seria suficiente para assegurar a legitimidade da Autora.
    A Autora não tinha qualquer interesse em propor uma acção, sabendo de antemão que falecia um pressuposto processual, tanto assim que já é penalizada pelo facto de o Tribunal ter decidido não conhecer do mérito da acção, absolvendo o réu do pedido com fundamento na ilegitimidade de Fomento Predial A.
    Estamos em crer que não há elementos que permitam concluir que tal situação foi criada ou configurada com negligência grave e, muito menos, com dolo de criar qualquer uma das situações descritas no art. 385.°, n.º 2 do Código de Processo Civil.
    7. Acresce que não repugna ao sentido de direito e de justiça reclamar um montante, nos termos que foram contratualmente convencionados, tendo-se interiorizado que uma das partes se assumia com a denominação da A., assumindo a questão jurídica da personalidade jurídica e judiciária um detalhe que, na maior parte dos casos passa ao lado dos interessados, sendo antes um conceito a tratar pelos técnicos juristas e profissionais do foro.
    8. Curiosamente, como assinala a recorrente, repare-se, aliás, que, em resposta ao quesito n.° 7 da base instrutória, o Tribunal a quo deu até como provado: "Tendo sido estipulado que o Réu teria que pagar à Autora o montante de HK$80.000,00, como comissão pelos serviços, apesar de o imóvel pertencer à B".
    Reconhece-se aí, contra a lógica do decidido, a A. como entidade negocial.
    Sendo ainda de considerar a inevitável conclusão de que o imóvel não "pertencia" exclusivamente a B, mas também a D, e que o acordo existiu nos termos que vêm até comprovados.
    Não estando em causa a razão fundamento do pedido, não se alcança malévola intenção no facto de se ter posto uma entidade sem personalidade a encabeçar os interesses de uma verdadeira parte negocial, tanto mais que seria assim que ela se identificava no mundo dos negócios.
    9. Diz a Mma Juíza que a forma como foi delineada a acção foi para contornar o disposto no artigo 708º do C. Comercial, na medida em que só pode ser mediador de um negócio quem não esteja ligado a qualquer dos interessados por uma relação jurídica de colaboração, de dependência ou representação.
    Não cremos que essa estratégia pudesse convencer quem quer que fosse, pois desde logo esbarraria com a falta de um pressuposto processual atinente à falta de personalidade judiciária como esbarrou. Mutatis mutandis, dir-se-á que o crime impossível não é crime. Também um meio processualmente impossível não tem a virtualidade de entorpecer a acção de justiça se os primeiros prejudicados são os seus fautores, não logrando qualquer efeito útil com a acção prosseguida.
    Depois, sempre essa ligação não deixaria de poder ser evidenciada pelo R., como foi.
    Nesta conformidade não se vê razão para sufragar a condenação sobrevinda de litigância por má-fé.
Entende-se, pois, não haver elementos para concluir no sentido de que a Autora litigou com má-fé, não se tendo assim por óbvio que, com dolo, tenha alterado a verdade dos factos relevantes para a decisão da presente causa ou se tenha servido de um estratagema para lograr os seus intentos.

    IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão proferida na parte em que condenou a A. como litigante de má-fé.
Custas pelo recorrido.
Macau, 14 de Maio de 2015,
João Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 - Manuel de. Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 356
2 - Alberto dos Reis, Código de Processo Civil, Anotado”, II, 263
3 Já antes da expressa consagração de um dever de boa fé processual no art. 266-A, escrevia ALBERTO DOS REIS : “As partes têm o dever de, conscientemente, não formular pedidos injustos, não articular factos contrários à verdade, não requerer diligências meramente dilatórias, numa palavra, têm o dever de proceder de boa fé”. Código de processo Civil anotado, vol. II, sub art. 465, p. 263.
4 - Prof. M. Andrade, ob. cit. 357
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