Processo n.º 447/2015 Data do acórdão: 2015-6-4 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– furto em valor consideravelmente elevado
– art.o 198.o, n.o 2, alínea a), do Código Penal
– fichas de jogo de avultado montante
– suspensão da execução da pena
S U M Á R I O
Por estarem sobretudo em causa no caso duas furtadas fichas de jogos cada uma delas no montante avultado de um milhão de dólares de Hong Kong, reclamando isto elevadas exigências da prevenção geral do crime de furto em valor consideravelmente elevado em questão, p. e p. pelo art.o 198.o, n.o 2, alínea a), do Código Penal, a mera censura dos factos e a ameaça da execução da prisão não conseguirão prosseguir, de modo adequado, as finalidades da punição, ainda que as duas fichas de jogos já se encontrem apreendidas nos autos e seja o arguido recorrente um delinquente primário, com arrependimento dos factos, pelo que não é de suspender a execução da pena em sede do art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 447/2015
(Recurso em processo penal)
Recorrente arguido: A
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA
REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido em 20 de Março de 2015 a fls. 170 a 176 do Processo Comum Colectivo n.o CR4-14-0320-PCC do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), que o condenou como autor material de um crime consumado de furto qualificado (em valor consideravelmente elevado), p. e p. pelos art.os 196.º, alínea b), 197.º e 198.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal (CP), na pena de três anos de prisão efectiva, veio o arguido A, já melhor identificado nesses autos subjacentes, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para imputar a essa decisão condenatória o excesso na medida concreta da pena de prisão, a fim de rogar que passasse a ser condenado no mínimo legal da pena, com almejada suspensão da execução da prisão em sede do art.º 48.º, n.º 1, do CP, alegando, para o efeito, e em essência, que confessou os factos na audiência de julgamento, com arrependimento demonstrado e era um delinquente primário (cfr., com detalhes, a motivação de recurso apresentada a fls. 194 a 202 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, respondeu o Ministério Público (a fls. 204 a 206v) no sentido de não provimento.
Subido o recurso, a Digna Procuradora-Adjunta emitiu parecer (a fls. 219 a 220), pugnando também pela manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre agora decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Estando o arguido a sindicar do mérito da decisão condenatória da Primeira Instância na parte propriamente relativa à medida da pena, é de tomar a factualidade aí já dada por provada como fundamentação fáctica do presente acórdão de recurso, sob aval do art.º 631.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, ex vi do art.º 4.º do Código de Processo Penal.
Segundo essa factualidade provada, e no seu essencial:
– o arguido, um engenheiro na Coreia do Sul, com cerca de seis milhões mensais de rendimento na moeda local, vivendo só e sem ter alguém a cargo, tendo como habilitações literárias curso de nível superior, e sendo delinquente primário em Macau, entrou, em 15 de Agosto de 2014, no meio-dia, num casino em Macau, e aí deu voltas, com intenção de furtar alguém;
– no dia seguinte, por volta das 01:47 horas da madrugada, o arguido acabou por retirar uma mala de mão de um jogador (ora ofendido) que na altura estava concentrado na máquina de jogar, após o que o arguido se retirou imediatamente do local, apropriando a mala para si, ficando com os bens do ofendido no interior da mesma, que continha um bilhete de identidade de Macau emitido a favor do ofendido, MOP$400,00 em numerário e duas fichas mortas de jogos, cada uma no valor de HKD$1.000.000,00;
– em 30 de Agosto de 2014, cerca das 22:30 horas, o arguido foi interceptado num outro casino, e durante as averiguações, e com seu consentimento, o pessoal da Polícia Judiciária encontrou na posse dele a mala do ofendido (ora apreendida nos autos), que continha no interior apenas o bilhete de identidade do ofendido e duas fichas de jogos, cada uma no valor de HKD$1.000.000,00;
– o arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, querendo subtrair e fazer seus os bens do ofendido no valor de MOP$2.060.400,00, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Na fundamentação probatória do acórdão recorrido, o Tribunal Colectivo a quo afirmou que a sua convicção relativamente aos factos dados por assentes resultou da apreciação crítica das provas, nomeadamente, a confissão do arguido quanto a todos os factos (salvo o respeitante ao valor) e os depoimentos das testemunhas ouvidas.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Sempre se diz que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
O arguido começou por pedir, na motivação do recurso, a redução da pena de prisão aplicada no acórdão recorrido, para o respectivo mínimo legal.
Entretanto, vistas todas as circunstâncias fácticas já apuradas (incluindo as de que o arguido era um delinquente primário, confessou ele os factos salvo o respeitante ao valor, e as duas fichas de jogos acabaram por ser apreendidas nos autos) pelo Tribunal recorrido com pertinência à medida concreta da pena de prisão do crime de furto qualificado (em valor consideravelmente elevado) do art.º 198.º, n.º 2, alínea a), do CP, dentro da respectiva moldura penal de dois a dez anos, mostra-se ao presente Tribunal ad quem justa e equilibrada, aos padrões vertidos nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, e 65.º, n.os 1 e 2, do CP, a pena de três anos de prisão achada no acórdão impugnado.
Por fim, quanto ao pedido de suspensão da execução da pena, crê-se que por estarem sobretudo em causa duas furtadas fichas de jogos cada uma delas no montante avultado de HKD$1.000.000,00, o que faz reclamar elevadas exigências da prevenção geral do crime de furto qualificado em questão, a mera censura dos factos e a ameaça da execução da prisão não conseguirão prosseguir, de modo adequado, as finalidades da punição, ainda que as duas fichas de jogos já se encontrem apreendidas nos autos e seja o recorrente um delinquente primário, com arrependimento dos factos.
IV – DECISÃO
Nos termos expostos, acordam em julgar não provido o recurso do arguido A.
Custas do recurso pelo arguido, com quatro UC de taxa de justiça e três mil patacas de honorários a favor da sua Ex.ma Defensora Oficiosa.
Comunique a presente decisão ao ofendido B.
O presente acórdão é irrecorrível nos termos do art.º 390.º, n.º 1, alínea g), do Código de Processo Penal.
Macau, 4 de Junho de 2015.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chou Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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