Proc. nº 292/2014
(Recurso Contencioso)
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 26 de Março de 2015
Descritores:
-Conselho Superior de Advocacia
-Recorribilidade contenciosa
-Ampliação do objecto do recurso
-Modificação do objecto do recurso
SUMÁRIO:
I. Das normas especiais constantes dos arts. 15º e 16º do RICSA (Regulamento Interno do Conselho Superior de Advocacia), 44º, nº3, do CDA (Código Disciplinar do Advogado) e 10º, nºs 1 a 3 do EA (Estatuto do Advogado) resulta que das deliberações do Conselho Superior de Advocacia que punam disciplinarmente os advogados cabe reclamação ou recurso contencioso.
II. Se o interessado optar por apresentar reclamação, há-de ser da respectiva decisão que caberá recurso contencioso, o qual será interposto no prazo de dez dias ou vinte dias, consoante se esteja perante uma decisão expressa ou tácita.
III. Tendo o interessado reclamado ao abrigo das referidas disposições, não poderá recorrer da decisão punitiva primária, já que segundo as citadas disposições, aquela é irrecorrível contenciosamente.
IV. A modificação objectiva da instância permitida pelo art. 81º do CPAC exige que o recurso contencioso tenha sido interposto de um indeferimento tácito e que no seu decurso venha a ser praticado um acto expresso.
V. Não é possível ampliar ou modificar o recurso contencioso se o seu objecto inicial era a decisão punitiva da qual o interessado acabou por reclamar também.
Proc. nº 292/2014
Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.
I - Relatório
A, advogado, com domicílio profissional na......, interpôs recurso contencioso da deliberação de 7 de Março de 2014, do Conselho Superior de Advocacia, proferida no âmbito do processo disciplinar nº 11/2010/CSA, que o condenou na pena disciplinar de advertência.
Na petição inicial formulou as seguintes conclusões:
«1. A infracção já prescrevera quando foi proferido o Acórdão, nos termos do art. 11º do CDA, não havendo aplicação em processo disciplinar das disposições do Código Penal em matéria de interrupção ou suspensão do prazo de prescrição.
2. A condenação do recorrente na data em que o foi, em vista da simplicidade concreta da infracção e do procedimento, constitui abuso do direito processual, na modalidade de suppressio, nos termos resultantes do art. 326º do Cód. Civil.
3. O requerimento objecto dos autos foi da autoria do recorrente, sendo concretamente insustentável e desajustado levantar dúvida infundada sobre o mesmo.
4. Da lista de factos provados não consta, e deveria constar, que, confrontado com o seu erro, o recorrente desistiu do pedido de isenção de custas.
5. É infundada a imputação, em desfavor do recorrente, de uma hipotética estratégia, não especificada ou provada.
6. Os factos imputados ao recorrente não constituem infracção disciplinar».
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Posteriormente, e face à resposta à reclamação apresentada e ao pedido de esclarecimento do acórdão impugnado, o recorrente veio ampliar o objecto do recurso, concluindo então:
«1. Dão-se aqui por reproduzidas as conclusões formuladas no recurso interposto.
2. D objecto de recurso deve ser ampliado para passar a incluir, para além do Acórdão condenatório do Conselho, a Resposta de 19 de Maio.
3. A inacção do Conselho, tendo demorado 14 meses a nomear um instrutor e 9 meses a aprovar, em forma de Acórdão, um relatório já finalizado (que correspondem, juntos, a mais de metade do prazo de prescrição), constitui abuso de direito, na forma de abusa de processo, por exercício abusivo do direito de punir.
4. A Resposta do Conselho padece de contradição entre os fundamentos e a decisão.
5. Na Resposta de 19 de Maio o Conselho reafirma a condenação do recorrente e concede prazo para recurso, "obrigando-o" a interpor recurso, a pagar taxa de justiça e a expor num processo público uma condenação que já nasceu ilegal quando, do ponto de vista expresso pelo próprio Conselho, o processo já havia prescrito, o que constitui um lapso censurável que justificaria ser adjectivado com os termos que o Conselho usa para adjectivar o lapso do recorrente, constituindo novo fundamento do abuso de direito.
6. Certo é que o Acórdão de Março é ilegal por ter sido proferido quando o poder disciplinar já se extinguira por prescrição do procedimento disciplinar, em violação de norma legal imperativa (art. 11º do CDA), uma vez que o prazo de prescrição do procedimento disciplinar não se interrompe e prescreveu em Novembro de 2012.
Nestes termos, nos constantes do recurso de 8 de Maio e nos mais de Direito, requer que seja declarado que o procedimento prescreveu no dia 16 de Maio de 2012, antes da prolação do Acórdão recorrido de Março de 2014, e que, por isso, o seja o Acórdão anulado por violação de lei.»
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A entidade recorrida contestou, pugnando pela improcedência do recurso contencioso.
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Houve lugar a alegações facultativas, tendo-as concluído o recorrente da seguinte maneira:
«a) Existem três grupos de factos relevantes que importam à apreciação do recurso, que são os que integram o Capítulo IV Factos Provados do acórdão do CSA, os que resultaram da inquirição das testemunhas que confirmam e aprofundam os factos constantes dos pontos 18 a 21 do capítulo IV Factos Provados do acórdão do CSA e os factos do próprio processo CV3-08-0055-CEO-A e do qual, de acordo com o Ac. do Venerando Tribunal de Segunda Instância de 10.12.2009 , foi remetida este processo disciplinar cópia integral.
b) O Recorrente admite que se possa considerar que os factos que lhe são imputados não realizam o elemento objectivo da infracção disciplinar que lhe é imputada, uma vez que é pelo menos duvidoso que tenha requerido de modo claro e expresso a suspensão da instância, sendo de admitir que tenha sido o próprio Tribunal a conhecer oficiosamente da suspensão da instância por a mesma ter sido alegada pelo recorrente como fundamento da falta de um pressuposto processual.
c) O Recorrente não actuou com dolo ou negligência grosseira, pelo que também não se verifica o elemento subjectivo da infracção disciplinar, porque estava genuinamente convencido de que nunca tinha requerido a suspensão da instância, porque não lhe era exigível essa peça processual com 53 folhas, porque folheando a contestação elaborada mais de um anos antes nem os títulos desse articulado nem o pedido formulado a final indicavam ao Recorrente que tivesse sido pedida a suspensão da instância, porque a leitura do curto requerimento apresentado pouco antes pela Exma. Sra. Dra. B evidenciavam ao Recorrente que tal pedido não tinha sido formulado, porque o próprio despacho que veio a decidir a suspensão da instância o Meritíssimo Juiz nunca afirma que o Recorrente pediu a suspensão da instância, porque notificado para se pronunciar sobre o despacho do Meritíssimo Juiz Relator que admitiu que se podia vir a entender ter havido litigância de má fé o Recorrente de imediato admitiu que se tratou de um lapso, pediu desculpas ao Tribunal e à parte contrária e desistiu do pedido e ainda porque a pretensão deduzida era infirmada pelos elementos constantes do próprio processo, pelo que nunca deixaria de ser notada a sua desconformidade com a posição antes tomada nos autos.
d) Assim, decidindo de forma diferente, o acto recorrido violou o disposto nos arts. 388º e 385º/2/a) e b) do CPC e nos arts. 2º e 12º/2 do CDA.
e) De qualquer modo, nos termos do art. 11º/1 do CDA, a infracção prescreveu no prazo de 3 anos a contar da data em que ocorreu, uma vez que constitui apenas ilícito civil e não também, simultaneamente, ilícito penal e que não há aplicação do art. 299º/1 do CC aos procedimentos disciplinares previsto no CDA, pelo que prescreveu em 17.11.2012, ainda antes de ter sido proferida a decisão sancionatória.
f) O que significa que o prazo de prescrição de infracção disciplinar praticada por advogado que constitui apenas ilícito civil corre continuamente, desde a data em que tenham sido praticados os correspondentes factos constitutivos, sem intervenção dos institutos da suspensão ou da interrupção, a qual é de conhecimento oficioso.
g) Pelo que ao não declarar a prescrição da infracção disciplinar em causa o acto recorrido violou o disposto no art. 11º/1 e 3 do CDA, devendo ser substituído por outro que declare prescrita a infracção em causa.
Nestes termos e nos mais de Direito, requer a V.Exa. que o acto recorrido seja anulado e substituído por outro que declare a inexistência de infracção disciplinar e, caso assim não se entenda, declare a prescrição da infracção disciplinar, o que constitui uma decisão de JUSTIÇA».
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O CSA não apresentou alegações facultativas.
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O digno Magistrado do MP opinou nos seguintes termos:
«Pugna o recorrente nas suas alegações no sentido de considerar que os factos que lhe são imputados não realizam os elementos, quer objectivo, quer subjectivo, da infracção disciplinar por que foi punido, esgrimindo com a prescrição da mesma.
Por outra banda, não abandonando expressamente os vícios que, para além dos referidos, assacara no seu petitório inicial, destes haverá também que cuidar, sendo certo que não se assistindo a uma concatenação precisa, os mesmos se reportam, de forma geral, a pretensas falhas ou irregularidades do procedimento, pelo que se optará por seguir, de forma telegráfica, o invocado, nos termos em que é apresentado.
Quanto ao abuso do processo, atinente às delongas no procedimento, que o recorrente imputa de injustificadas, bem se poderá o mesmo queixar, em parte, de si próprio, dadas as diligências probatórias que não deixou de requerer e a sua ausência da Região quando se encontravam marcadas diligências que careceriam da sua presença, compreendendo-se, por outra banda, o adiantado pela recorrida relativamente às dificuldades sentidas na procura de instrutor para o processo, dadas as inevitáveis relações pessoais existentes entre os vários advogados em terra tão pequena como Macau e a compreensível indisponibilidade para efeitos disciplinares perante um colega.
Relativamente à “autoria do requerimento”, sendo certo ter a recorrida aventado a possibilidade de o recorrente, ter, ele próprio, minutado o pedido de suspensão de eficácia que motivou o procedimento disciplinar, a verdade é que é ainda a mesma a reconhecer que pode não ter sido assim, sendo tal documento sido apenas subscrito pelo visado.
Seja como for, a verdade é que, aceitando-se que, a mostrar-se comprovado ter sido o recorrente a minutar o documento, tal facto teria sido passível de melhor lhe avivar a memória, não pode o mesmo deixar de assumir a responsabilidade pelo conteúdo respectivo, dado tê-lo subscrito, pelo que o alegado a esse nível, não sendo inócuo, é praticamente irrelevante.
Por outro lado, foi dado como provada no acto a desistência do pedido de não condenação da embargada nas custas do recurso, pelo que mal se percebe, a tal propósito, a pretensa omissão dessa factual idade na lista dos factos dados como provados, da mesma forma que mal se antevê a pretensão do recorrente no sentido de que a entidade recorrida terá entendido que o requerimento de isenção de custas obedeceria a estratégia não coadunada com a deontologia profissional, já que nada no procedimento e decisão permite alcançar tal juízo conclusivo, sendo certo que a própria recorrida, em resposta na matéria, admitiu que tal requerimento se terá fundado em convicção de boa administração da justiça.
Posto isto, no que tange à almejada prescrição, não poderemos deixar de concordar com o assumido na matéria pelo ac. deste Tribunal de 14/6/12, no âmbito do proc. 580/2006, no sentido de que “Inexistindo no Código Disciplinar dos Advogados normas reguladoras da matéria da suspensão e da interrupção do prazo de prescrição do procedimento disciplinar, é de aplicar supletivamente e mutatis mutantis o regime correspondente consagrado no direito penal, por remissão expressa operada pelo artº 65º-a) do Código Disciplinar dos Advogados”.
Nesse sentido, tendo a infracção sido praticada a 16/11/09, sendo o recorrente notificado da acusação a 12/5/11 e atento o que dispõe o artº 112º, nº1, al. b) e nº 2, C.P., haverá que constatar que, à altura da prática do acto sancionatório - 7/3/14 - não havia ocorrido a pretensa prescrição.
Sendo assim, cremos ser algo temerário sustentar a falta de registo do elemento objectivo da infracção imputada: pretender-se que o tribunal conheceu “oficiosamente da suspensão da instância por motivo de a questão ter sido suscitada pela embargada, mas sem que esta tenha feito o pedido correspondente...”, quando da contestação apresentada por aquela e subscrita pelo recorrente se expressa, claramente, que “cremos, pois, que urge suspender esta acção, nos termos do artº 223, nº 1 do C.P.C.; até que fique judicialmente estabelecido, nessa outra acção, que constitui causa prejudicial, a questão da validade e da eficácia da Deliberação de 1 de Setembro...”, é, no mínimo, querer jogar com as palavras, mostrando-se, pois, reunidos os elementos objectivos da infracção, designadamente o facto de o visado ter, efectivamente, solicitado a suspensão da instância na contestação aos embargos, sendo que o tribunal ordenou a mesma não por via oficiosa, mas por reporte, na sequência e com acolhimento dos fundamentos ali aduzidos.
Algo diversa se apresenta a problemática atinente ao elemento subjectivo.
Compreende-se, perfeitamente, a tentativa que o recorrente não deixa de efectuar (cfr. designadamente, al. c) das conclusões das respectivas alegações) no sentido de “suavizar” a sua posição, apelando a circunstâncias que, no respectivo critério, contrariariam a ocorrência, no caso, de negligência grave, permitindo-nos salientar, pelo específico relevo que lhe imputamos, o facto de a pretensão aduzida ser claramente infirmada pelos elementos constantes do próprio processo, pelo que a desconformidade não poderia deixar de ser notada, bem como a circunstância de, nos termos dados como provados, o recorrente estar “genuinamente convencido de que nunca tinha requerido a suspensão de eficácia “, circunstâncias que, quer por si, quer aliadas ao comportamento posterior do visado (admitindo ter cometido um lapso, pedindo desculpas ao tribunal e à parte contrária e desistindo do pedido) poderiam fazer questionar aquele tipo de negligência.
Tais circunstâncias, a atenuar a responsabilidade disciplinar do visado e que não deixaram, concerteza, de pesar na natureza da concreta sanção aplicada, não são, porém, em nosso critério, de molde a apagar ou fazer olvidar o que, com normalidade e senso comum, decorre da objectividade apurada: a de que o seu convencimento de que nunca havia solicitado ao tribunal que suspendesse a instância, assenta na circunstância de nunca, previamente àquele seu pedido, se ter preocupado, como era seu estrito dever, através, designadamente do processo, ou peças do mesmo a que teve acesso, em esclarecer a situação, a qual, aliás, se mostrava identificada e expressa no próprio acórdão, donde facilmente se colhia ter a suspensão sido decretada na sequência da sua contestação.
Sendo certo ter-se dado como provado o “genuíno convencimento” a que acima nos reportámos, bem como o facto de que o recorrente “não agiu com intenção de faltar à verdade” (sendo que, caso contrário, se prefiguraria “via dolosa”), tendo os factos ocorrido em altura em que o mesmo se sentiria “muito cansado e desgastado psicologicamente” devido às exigências de índole pessoal e profissional, a verdade é que, nos termos avançados, por falta nítida da precaução exigida por elementar prudência e diligência exigidos a profissional de advocacia antes de “avançar” para a negação de factos que o próprio pessoalmente estabelecera, não poderá, em nosso critério, ter-se o comportamento em crise ter-se como mero erro ou lapso, sem consequência disciplinar.
Donde, afigurar-se-nos não merecer provimento o presente recurso».
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Já após os vistos, o relator suscitou oficiosamente a questão da eventual irrecorribilidade do objecto do recurso inicialmente interposto, na sequência do que se pronunciou o recorrente nos termos que aqui damos por reproduzidos e que mais adiante analisaremos.
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A parte contrária nada disse sobre a matéria e o mesmo fez o MP.
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Cumpre decidir.
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II - Pressupostos processuais
1 - O tribunal é competente em razão da matéria, nacionalidade e hierarquia.
2 - O processo é o próprio e não há nulidades.
3 - As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
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4 - Da irrecorribilidade
Foi pelo relator suscitada a questão da irrecorribilidade do acto impugnado contenciosamente através da petição inicial.
Antes, porém, de a conhecermos, alinhemos a matéria de facto que consideramos assente a partir dos elementos dos autos, inquirição de testemunhas que neles teve lugar e do procedimento administrativo.
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4.1 - Dos Factos
1 - Contra o ora recorrente, no âmbito do processo disciplinar nº 11/2010/CSA contra si instaurado pelo Conselho Superior de Advocacia no dia 24 de Março de 2010, foi deduzida a seguinte acusação:
«Contra o colega Sr. Dr. A, Advogado com Escritório na……, profiro o seguinte despacho de Acusação:
1º
Corria ou corre os seus termos pelo 3º. Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base uma Execução Ordinária ali registada sob o nº CV3-08-0055-CEO.
2º
Devidamente citada, veio a executada Sociedade de Investimento Imobiliário C opor-se á Execução deduzindo Embargos.
3º
Notificada para os termos dos Embargos a Exequente-Embargada, apresentou por via do seu mandatário, o ora arguido, a sua contestação, o que fez no mês de Novembro de 2008.
4º
Nela sustentou, além do mais, o seguinte:
a) “Relativamente à decisão da acção, atendendo a que a intervenção nesta acção foi feita por quem não tem poderes para representar a Embargante, estamos muito respeitosamente em crer que a intervenção não deverá ser aceite antes de ser sanado o vício de falta de representação e ratificada a intervenção feita por quem não tinha poderes para o efeito.”
b) “Com efeito, uma sócia da Embargante/Oponente. D, Limitada, apresentou uma acção declarativa que corre termos por esse Tribunal sob o nº. CV3-08-0061-CAO, pedindo a declaração de nulidade ou anulação da Deliberação social de 1 de Setembro de 2008, a qual está na base da procuração junta aos autos, conforme se esclarecerá melhor adiante (junto aos autos de Arresto como doc. nº. 3 do requerimento de 04-11-2008).”
c) “A aludida sociedade iniciou ainda um Procedimento Cautelar de Suspensão de Deliberações Sociais destinada a suspender a eficácia da “Deliberação”, o qual corre em apenso à acção referida no parágrafo anterior, sob o nº. CV3-08-0061-CAO-A (junto aos autos de Arresto como doc. nº. 4 do requerimento de 04-11-2008).”
d) “A Deliberação em causa procedeu à eleição dos membros do Conselho de Administração (“CA”) da sociedade Embargante, os quais por sua vez constituíram como advogados os Ilustres (alegados) mandatários da Embargante.”
e) “Como veremos, entre outras ilegalidades, a aludida Deliberação foi tomada sem a maioria qualificada exigida pelos Estatutos da Sociedade, violando os Estatutos e a lei comercial, sendo ilícita a pretensão do signatário da procuração de constituir mandatário para representar uma sociedade que ele não representa.”
f) “Aquela acção judicial foi registada na Conservatória do Registo Comercial no dia 5 de Setembro de 2008.”
g) “Ou seja, a acção estava já registada três dias antes de ter sido outorgada a procuração que consta nos autos principais (junto aos autos de Arresto como doc. nº. 1 do requerimento de 04-11-2008).”
h) “Por outro lado no âmbito do aludido procedimento cautelar, o Tribunal proferiu já um despacho suspendendo provisoriamente a eficácia da aludida Deliberação (junto aos autos de Arresto como doc. nº. 5 do requerimento de 04-11-2008).”
i) “Se a acção nº. CV3-08-0061-CAO vier a merecer provimento, com parece notório, a Deliberação da Assembleia Geral será declarada nula ou anulada, pelo ficarão sem efeito todos os actos praticados pelos autoproclamados administradores da Sociedade Embargante, designadamente a decisão do CA de constituir representantes da Embargante os Ilustres advogados que constam da Procuração de 8 de Setembro.”
j) “Poderá também ficar sem efeito a Oposição apresentada, que terá de ser ratificada pelo Conselho de Administração que efectivamente representa a Embargante”.
k) “Similarmente, se o procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais vier a merecer provimento, como parece notório, a Deliberação da AG de 1 de Setembro não produzirá quaisquer efeitos, arrastando consigo a invalidade da Procuração.”
1) “Há, de facto, fundadas duvidas sobre a falta ou irregularidade de representação da Embargante, matéria cuja decisão depende de uma acção judicial pendente.”
m) “Na verdade, a audiência de julgamento agendada para 19-11-2008 e a decisão da causa dependem, necessariamente, da admissibilidade da Oposição apresentada, a qual depende da validade e eficácia da Procuração forense, a qual por sua vez depende da validade e eficácia da Deliberação de 1 de Setembro que procedeu à alegada eleição do CA que nomeou advogados à Embargante.”
n) “Uma vez que a validade e eficácia da Deliberação de 1 de Setembro está pendente de uma decisão judicial no âmbito de um Processo pendente --- em anexo ao qual corre um procedimento cautelar de tramitação urgente --- a decisão desta causa depende da decisão que vier a ser tomada nessa outra causa, que é por isso uma causa prejudicial nos termos do artigo 223º. do CPC.”
o) “De facto, até esta questão estar resolvida não se crê que haja justificação para proceder a uma audiência demorada e custosa, com potenciais prejuízos e custos para todas as partes.”
p) “Ademais, a decisão a tomar neste procedimento implica a análise de uma Oposição de dezenas de folhas e documentos, decisão judicial cuja validade ficará dependente da decisão que vier a ser tomada por esse Tribunal nessa outra acção, pois.”
q) “Se o Tribunal julgar a Deliberação nula ou anulável, ou se suspender os seus efeitos, a procuração forense e a Oposição não serão admitidas se os vícios não forem sanados ou ratificados, o que arrastará consigo a invalidade da audiência realizada com base nas testemunhas, documentos e argumentos constantes da Oposição e, logo, a própria decisão que vier a ser tomadas.”
r) “Urge suspender esta acção, nos termos do artigo 223º. Nº. 1 do CPC, até que fique judicialmente estabelecido, nessa outra acção que constitui causa prejudicial, a questão da validade e da eficácia da Deliberação de 1 de Setembro, a qual está na base, como vimos, da procuração que terá conferido poderes à Ilustre signatária da Oposição apresentada nestes autos”.
5º
Por douto despacho proferido no dia 3 de Abril de 2009, o Meritíssimo Juiz do processo, acolhendo os fundamentos que antecedem, decidiu suspender “os presentes Autos até que haja decisão com trânsito em julgado dos Autos CV3-08-0061-CAO”.
6º
Tal despacho foi logo notificado às partes, nas pessoas dos seus mandatários.
7º
Não se conformando com o mesmo despacho, dele interpôs a Embargante recurso para o Tribunal de Segunda Instância.
8º
Notificada da apresentação das alegações do recurso, veio a embargada, pela pena da sua mandatária Srª. Drª. B, renunciar ao direito de contra-alegar.
9º
No respectivo requerimento, formulado no dia 9 de Julho de 2009, fez-se constar, além do mais, o seguinte:
a) Por outro lado, ao que a recorrente alega, a ora requerente nunca solicitou ao Tribunal que suspendesse a instância.
b) Permitindo-se por fim, ainda, sublinhar que não tendo dado causa ao recurso nem a ele deduzindo oposição devem as respectivas custas ficar a cargo da recorrente…”.
10º
Por douto Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, proferido no dia 29 de Outubro de 2009, o recurso em causa foi julgado procedente, tendo a recorrida ---- embargada sido condenada em custas.
11º
Por requerimento formulado no dia 16 seguinte no âmbito dos mesmos Autos, a Embargada veio requerer a reforma daquele Acórdão quanto a custas sustentando, nuclearmente, que:
a) Não requereu a suspensão instância.
b) Não deu causa á decisão recorrida.
12º
Admitindo-se que se viesse a entender ter havido litigância de má fé, o Exmº. Sr. Juiz-Relator ordenou se notificasse a Embargada para se pronunciar sobre esse ponto.
13º
A Embargada veio esclarecer que a posição processual tomada se devia a um lamentável e involuntário erro do seu mandatário, subscritor do requerimento.
14º
Tanto este como o referido no artigo 4, foram subscritos pelo colega arguido.
15º
Por Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, proferido no dia 10 de Dezembro de 2009 a requente em questão foi condenada em multa de 10 UC como litigante de má fé.
16º
No mesmo Acórdão foi entendido que o colega arguido tinha responsabilidade pessoal nos actos reveladores dessa má fé.
17º
Ao afirmar que a Embargada não havia requerido a suspensão da instância e portanto não tinha dado causa à decisão recorrida, o colega arguido não agiu com a intenção de faltar à verdade.
18º
Fez tais afirmações inverídicas sem ter previamente consultado os respectivos Autos.
19º
A posição processual que assumiu, conforme o próprio declara, deveu-se assim a mero erro.
20º
À data em que o colega arguido formulou aquele requerimento, o “ a sua vida profissional e pessoal não lhe permitia ocupar-se dos seus assuntos com vagar”.
21º
O mesmo “ via-se forçado a trabalhar não só durante o dia como ao longo de noite”.
22º
Além disso “sentia-se causado e desgastado psicologicamente”.
23º
O colega arguido “estava genuinamente convencido de que nunca tinha requerido a suspensão da instância”
24º
Mas estava disso convencido por não ter apurado, podendo fazê-lo, se tinha dado causa à decisão recorrida, consultando, para tanto, o processo no qual havia sido proferida a condenação em custas ou pelo menos as cópias das pertinentes peças processuais de que dispusesse.
25º
A maioria dos profissionais do foro, face a uma situação idêntica àquela perante a qual o colega arguido se viu colocado, não deixaria de adoptar tal procedimento antes de deduzir oposição contra a decisão proferida.
26º
Recaia, pois, no arguido o estrito dever de consultar os elementos disponíveis antes de dar o dito por não dito.
27º
Tinha pelo menos o dever de ler com cuidado o próprio teor do Acórdão condenatório no qual se transcreve a fundamentação invocada na Primeira Instância e a respectiva decisão.
28º
Nessa fundamentação expressamente se afirma que “ veio a embargada na parte inicial da sua douta contestação suscitar como questão prévia a falta de poderes de representação de E, como Administrador e legal representante legal da Embargante, alegando que está a correr em paralelo aos presentes autos uma outra acção CV3-08-0061-CAO deste mesmo Juízo e Tribunal em que se pedia a declaração de nulidade ou anulação da deliberação social de 1 de Setembro de 2008, o qual está na base da procuração que se serviu para os presentes autos”, para, após outras breves considerandos se concluir assim: “Nesta conformidade decide-se suspender os presentes autos até que haja decisão com trânsito em julgado dos Autos CV3-08-0061-CAO”.
29º
Dessa leitura e atenta a referência à “Embargada”, logo concluiria o colega arguido que a suspensão tinha sido decretada na sequência da sua contestação.
30º
Não tendo tomado essas precauções, agiu o arguido com negligência grosseira, sendo de notar que o conjunto de circunstâncias referidas pelas testemunhas inquiridas não justifica essa conduta.
31º
Formulando tal requerimento, nos termos em que o fez, acabou por promover uma diligência perfeitamente inútil para a correcta aplicação da Lei.
Afirmando nunca ter requerido a suspensão da instância no âmbito daquela Acção e não ter dado causa á decisão recorrida e promovendo uma diligência perfeitamente inútil para a correcta aplicação da lei, violou o colega arguido as alíneas a) e b) do nº. 2 do artigo 385º do Código de Processo Civil com referência ao artigo 2º do Código Disciplinar, assim como o disposto no artigo 12º, nº. 2 do Código Deontológico».
2 - O relatório final do instrutor data de 26 de Junho de 2013.
3 - No âmbito do referido processo disciplinar, o recorrente foi condenado na pena de advertência, por deliberação Conselho Superior de Advocacia de 7 de Março de 2014, que lhe foi notificada por carta registada expedida com aviso de recepção e recebida no dia 26/03/2014
4 - No mencionado acórdão de 7/03/2014, foram dados como provados os seguintes factos:
«1. Corria ou corre os seus termos pelo 3.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base uma Execução Ordinária ali registada sob o n.º CV3-08-0055CEO.
2. Devidamente citada, veio a executada Sociedade de Investimento Imobiliário C opor-se à Execução deduzindo Embargos.
3. Notificada para os termos dos Embargos a Exequente-Embargada, apresentou por via do seu mandatário, o ora arguido, a sua contestação, o que fez no mês de Novembro de 2008.
4. Nela sustentou, além do mais, o seguinte:
a) “Relativamente à decisão da acção, atendendo a que a intervenção nesta acção foi feita por quem não tem poderes para representar a Embargante, estamos muito respeitosamente em crer que a intervenção não deverá ser aceite antes de ser sanado o vício de falta de representação e ratificada a intervenção feita por quem não tinha poderes para o efeito.”
b) “Com efeito, uma sócia da Embargante/Oponente D, Limitada, apresentou uma acção declarativa que corre termos por esse Tribunal sob o n.º CV3-08-0061-CAO, pedindo a declaração de nulidade ou anulação da deliberação social de 1 de Setembro de 2008, a qual está na base da procuração junta aos autos, conforme se esclarecerá melhor adiante (junto aos autos de Arresto como doc. n.º 3 do requerimento de 04-11-2008).”
c) “A aludida sociedade iniciou ainda um Procedimento Cautelar de Suspensão de Deliberações Sociais destinada a suspender a eficácia da “Deliberação”, o qual corre em apenso à acção referida no parágrafo anterior, sob o n.º CV3-08-0061-CAO-A (junto aos autos de Arresto como doc. n.º 4 do requerimento de 04-11-2008).”
d) “A Deliberação em causa procedeu à eleição dos membros do Conselho de Administração (o “CA”) da sociedade Embargante, os quais por sua vez constituíram como advogados os Ilustres (alegados) mandatários da Embargante.”
e) “Como veremos, entre outras ilegalidades, a aludida Deliberação foi tomada sem a maioria qualificada exigida pelos Estatutos da Sociedade, violando os Estatutos e a lei comercial, sendo ilícita a pretensão do signatário da procuração de constituir mandatário para representar uma sociedade que ele não representa.”
f) “Aquela acção judicial foi registada na Conservatória do Registo Comercial no dia 5 de Setembro de 2008.”
g) “Ou seja, a acção estava já registada três dias antes de ter sido outorgada a procuração que consta nos autos principais (junto aos autos de Arresto como doc. n.º 1 do requerimento de 04-11-2008).”
h) “Por outro lado no âmbito do aludido procedimento cautelar, o Tribunal proferiu já um despacho suspendendo provisoriamente a eficácia da aludida Deliberação (junto aos autos de Arresto como doc. n.º 5 do requerimento de 04-11-2008).”
i) “Se a acção n.º CV3-08-0061-CAO vier a merecer provimento, como parece notório, a Deliberação da Assembleia Geral será declarada nula ou anulada, pelo que ficarão sem efeito todos os actos praticados pelos auto-proclamados administradores da Sociedade Embargante, designadamente a decisão do CA de constituir representantes da Embargante os Ilustres advogados que constam da Procuração de 8 de Setembro.”
j) “Poderá também ficar sem efeito a Oposição apresentada, que terá de ser ratificada pelo Conselho de Administração que efectivamente representa a Embargante.”
k) “Similarmente, se o procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais vier a merecer provimento, como parece notório, a Deliberação da AG de 1 de Setembro não produzirá quaisquer efeitos, arrastando consigo a invalidade da Procuração.”
1) “Há, de facto, fundadas dúvidas sobre a falta ou irregularidade de representação da Embargante, matéria cuja decisão depende de uma acção judicial pendente.”
m) “Na verdade, a audiência de julgamento agendada para 19-11-2008 e a decisão da causa dependem, necessariamente, da admissibilidade da Oposição apresentada, a qual depende da validade e eficácia da Procuração forense, a qual por sua vez depende da validade e eficácia da Deliberação de 1 de Setembro que procedeu à alegada eleição do CA que nomeou advogados à Embargante.”
n) “Uma vez que a validade e eficácia da Deliberação de 1 de Setembro está pendente de uma decisão judicial no âmbito de um Processo pendente --- em anexo ao qual corre um procedimento cautelar de tramitação urgente --- a decisão desta causa depende da decisão que vier a ser tomada nessa outra causa, que é por isso uma causa prejudicial nos termos do artigo 223.º do CPC.”
o) “De facto, até esta questão estar resolvida não se crê que haja justificação para proceder a uma audiência demorada e custosa, com t potenciais prejuízos e custos para todas as partes.”
p) “Ademais, a decisão a tomar neste procedimento implica a análise de uma Oposição de dezenas de folhas e documentos, decisão judicial cuja validade ficará dependente da decisão que vier a ser tomada por esse Tribunal nessa outra acção, pois.”
q) “Se o Tribunal julgar a Deliberação nula ou anulável, ou se suspender os seus efeitos, a procuração forense e a Oposição não serão admitidos se os vícios não forem sanados ou ratificados, o que arrastará consigo a invalidade da audiência realizada com base nas testemunhas, documentos e argumentos constantes da Oposição e, logo, a própria decisão que vier a ser tomada.”
r) “Urge suspender esta acção, nos termos do artigo 223.º n.º 1 do CPC, até que fique judicialmente estabelecido, nessa outra acção que constitui causa prejudicial, a questão da validade e da eficácia da Deliberação de 1 de Setembro, a qual está na base, como vimos, da procuração que terá conferido poderes à Ilustre signatária da Oposição apresentada nestes autos.”
5. Por douto despacho proferido no dia 3 de Abril de 2009, o Meritíssimo Juiz do processo, acolhendo os fundamentos que antecedem, decidiu suspender “os presentes Autos até que haja decisão com trânsito em julgado dos Autos CV3-08-0061-CAO”.
6. Tal despacho foi logo notificado às partes, nas pessoas dos seus mandatários.
7. Não se conformando com o mesmo despacho, dele interpôs a Embargante recurso para o Tribunal de Segunda Instância.
8. Notificada da apresentação das alegações do recurso, veio a embargada, pela pena da sua mandatária Sr.ª Dr.ª B, renunciar ao direito de contra-alegar.
9. Por douto Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, proferido no dia 29 de Outubro de 2009, o recurso em causa foi julgado procedente, tendo a recorrida - embargada sido condenada em custas.
10. Admitindo-se que se viesse a entender ter havido litigância de má-fé, o Exmº. Sr. Juiz-Relator ordenou se notificasse a Embargada para se pronunciar sobre esse ponto.
11. A Embargada veio esclarecer que a posição processual tomada se devia a um lamentável e involuntário erro do seu mandatário, subscritor do requerimento.
12. Tanto este como o referido na contestação apresentada no mês de Novembro de 2008, foram subscritos pelo colega arguido.
13. Por Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, proferido no dia 10 de Dezembro de 2009 a requerente em questão foi condenada em multa de 10 UC como litigante de má-fé.
14. No mesmo Acórdão foi entendido que o colega arguido tinha responsabilidade pessoal nos actos reveladores dessa má-fé.
15. Ao afirmar que a Embargada não havia requerido a suspensão da instância e portanto não tinha dado causa à decisão recorrida, o Colega Arguido não agiu com a intenção de faltar à verdade.
16. Fez tais afirmações inverídicas sem ter previamente consultado os respectivos Autos.
17. A posição processual que assumiu, conforme o próprio declara, deveu-se assim a mero erro.
18. À data em que o colega arguido formulou aquele requerimento, “a sua vida profissional e pessoal não lhe permitia ocupar-se dos seus assuntos com vagar”.
19. O mesmo “via-se forçado a trabalhar não só durante o dia como ao longo de noite”.
20. Além disso, “sentia-se cansado e desgastado psicologicamente”.
21. O colega arguido “estava genuinamente convencido de que nunca tinha requerido a suspensão da instância”.
22. Mas estava disso convencido por não ter apurado, podendo fazê-lo, se tinha dado causa à decisão recorrida, consultando, para tanto, o processo no qual havia sido proferida a condenação em custas ou pelo menos as cópias das pertinentes peças processuais de que dispusesse.
23. A maioria dos profissionais do foro, face a uma situação idêntica daquela perante a qual o colega arguido se viu colocado, não deixaria de adoptar tal procedimento antes de deduzir oposição contra a decisão proferida.
24. Recaía, pois, no Arguido o estrito dever de consultar os elementos disponíveis antes de dar o dito por não dito.
25. Tinha pelo menos o dever de ler com cuidado o próprio teor do Acórdão condenatório no qual se transcreve a fundamentação invocada na Primeira Instância e a respectiva decisão.
26. Nessa fundamentação expressamente se afirma que “veio a Embargada na parte inicial da sua douta contestação suscitar como questão prévia a falta de poderes de representação de E, como Administrador e representante legal da Embargante, alegando que está a correr em paralelo aos presentes autos uma outra acção CV3-08-0061-CAO deste mesmo Juízo e Tribunal em que se pedia a declaração de nulidade ou anulação da deliberação social de 1 de Setembro de 2008, a qual está na base da procuração que serviu para os presentes autos”, para, após outros breves considerandos se concluir assim: “Nesta conformidade decide-se suspender os presentes autos até que haja decisão com trânsito em julgado dos Autos CV3-08-0061-CAO”.
27. Dessa leitura e atenta à referência à “Embargada”, logo concluiria o colega arguido que a suspensão tinha sido decretada na sequência da sua contestação.
28. Não tendo tomado essas precauções, agiu o arguido com negligência grosseira, sendo denotar que o conjunto de circunstâncias referidas pelas testemunhas inquiridas não justifica essa conduta.
29. Formulando tal requerimento, nos termos em que o fez, acabou por promover uma diligência perfeitamente inútil para a correcta aplicação da Lei.
Demais, os factos constantes dos artigos 9.ºe 11.º da acusação passam a ter o seguinte teor:
30. No respectivo requerimento formulado no dia 9 de Julho de 2009 e assinado pela Sr.ª Dr.ª B, fez-se constar, além do mais, o seguinte:
a) Por outro lado, contrariamente ao que a recorrente alega, a ora requerente nunca solicitou ao Tribunal que suspendesse a instância.
b) “Permitindo-se por fim, ainda, sublinhar que não tendo dado causa ao recurso nem a ele deduzindo oposição devem as respectivas custas ficar a cargo da recorrente…”.
31. Por requerimento formulado no dia 16 de Novembro de 2009 assinado pelo Colega Arguido, no âmbito dos mesmo Autos, a Embargada veio esclarecer que tinha renunciado ao direito de contra-alegar por não ter interesse na manutenção da decisão impugnada, bem como requerer a reforma daquele Acórdão quanto a custas sustentando, nuclearmente, que:
a) Não requereu a suspensão da instância.
b) Não deu causa à decisão recorrida.
Os factos considerados como provados resultam de análise do depoimento do arguido, das testemunhas e das provas documentais constantes dos autos.
O arguido é primário».
5 - O acórdão do CSA concluiu, então:
«Tal como se refere acima, o presente processo teve como origem um expediente recebido do Tribunal de Segunda Instância, no âmbito dos autos de Recurso Civil e Laboral n.º 757/2009 (emergentes dos autos de Embargos à Execução n.º CV3-08-0055-CEO-B, instaurados por apenso aos de Execução Ordinária nº CV3-08-0055-CEO), sendo cópia extraída de todo o processado daqueles autos, constantes das fls. 4 a 350 dos autos do presente processo disciplinar, em que se reconheceu que o arguido teve responsabilidade pessoal nos actos pelos quais se revelou a má-fé, nos termos do art.º 388.º do Código de Processo Civil de Macau.
Para averiguar a responsabilidade pessoal do arguido, parece ser indispensável apurar em que consiste a má-fé processual.
O conceito de má-fé consta do n.º 2 do artigo 385.º do Código de Processo Civil, que determina:
“2. Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.”
De acordo com o Código de Processo Civil de Macau anotado e Comentado1, diz-se, relativamente à alínea a) do n.º 2 do artigo 385.º do Código de Processo Civil que “antes de afirmar determinados factos, a parte deve assegurar-se da sua veracidade, e deve ser diligente na procura do enquadramento jurídico da sua pretensão ou da sua oposição”(sublinha do nosso ).
Maia Gonçalves deu definição ao conceito de negligência grave, que consiste “na falta das precauções exigidas pela mais elementar prudência ou das aconselhadas pela previsão mais elementar que devem ser observadas nos actos correntes da vida...” (cfr. Código Penal Português, 10a Ed., pg. 145).2
Parece-nos indubitável que está subjacente ao comportamento do arguido em causa a falta de diligência, a qual se consubstancia em negligência grave ou grosseira.
Como resulta claro dos factos provados, nomeadamente o referido sob o n.º 16, tendo o arguido requerido a suspensão da instância, antes de afirmar que não tinha requerido suspensão nenhuma, devia ele ter-se assegurado da sua veracidade e da sua correspectividade com a verdade histórica; não o fez, porém.
Pese embora o facto de o arguido ter andado ocupado e esgotado no momento em que alegou não ter requerido suspensão da instância, tal como ficou provado nos factos nºs 18 a 20 e sustentado pelas testemunhas e por ele próprio na contestação, a verdade é, porém, que tal não dispensa o dever de agir ponderadamente e de não promover diligências reconhecidamente inúteis que incumbem a todo e qualquer advogado tal como previsto no n.º 2 do artigo 12.º do Código Deontológico.
Somos de opinião de que, se tivesse sido colocada na mesma situação, a maioria dos advogados colegas teria consultado o processo, quer o arquivado no escritório quer no foro, antes da apresentação de quaisquer diligências junto do Tribunal.
Não o tendo feito, o arguido omitiu “precauções exigidas pela mais elementar prudência ou das aconselhadas pela previsão mais elementar que devem ser observadas nos actos correntes da vida”.
Nesta medida, consideramos que, o arguido, ao afirmar nunca ter é requerido a suspensão da instância no âmbito daquela Acção e não ter dado causa à decisão recorrida e promovendo uma diligência perfeitamente inútil para a correcta aplicação da lei, violou as alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 385.º do Código de Processo Civil com referência ao artigo 2.º do Código Disciplinar dos Advogados, assim como o disposto no artigo 12.º, n.º 2 do Código Deontológico.
Tendo em consideração que ninguém ficou prejudicado pelo comportamento do arguido, e atendendo ao facto de o mesmo ter estado muito ocupado por razões de vida e de trabalho, afigura-se-nos não dever condenar o arguido na pena muito mais grave da de advertência, prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do Código Disciplinar dos Advogados.
DECISÃO
Tudo analisado e ponderado, este Conselho delibera dar por provada a maior parte da acusação, aderindo ao Relatório Final do Ilustre Instrutor, e acrescentando apenas as seguintes considerações:
A desatenção do arguido foi clamorosa: olvidou que ele próprio tinha assinado e provavelmente minutado o requerimento de suspensão da instância, esquecimento esse que é singular dada a extensão e a complexidade do requerimento de suspensão (e, consequentemente, o tempo que a sua elaboração seguramente requereu) e a importância que o mesmo deve ter tido, na altura em que foi apresentado, na estratégia de defesa dos interesses da parte (ou, doutro modo, o pedido não se justificaria); olvidou a decisão proferida em primeira instância que deferiu ao pedido de suspensão, colhendo os seus fundamentos; olvidou o acórdão do Tribunal de Segunda Instância que, ao revogar a decisão da primeira instância e rejeitar a suspensão, refutou os argumentos do arguido. Estes lapsos de memória referem-se a actos processualmente distintos e ocorridos em momentos separados no tempo, o que toma a falta do arguido mais acentuada do que se a mesma se reportasse a uma sequência que tivesse acontecido num único dia.
Contudo, ninguém ficou prejudicado pelo comportamento do arguido e a sua desatenção, apesar de clamorosa, foi apenas isso, ou seja, uma desatenção, além de que o arguido não agiu com dolo e estava muito ocupado por razões de vida e de trabalho na altura dos factos, e pediu desculpas ao Tribunal e à parte contrária, pelo que aplica ao arguido, a pena disciplinar de ADVERTÊNCIA, nos termos da alínea a) do artigo 41.º do Código Disciplinar dos Advogados».
6 - Em 8/04/2014 o recorrente apresentou para o Conselho Superior de Advocacia uma reclamação (fls. 37-45 dos autos).
7 - O CSA decidiu a reclamação no dia 19/05/2014, indeferindo-a (fls. 64-68 dos autos).
8 - Ao recorrente, advogado escrupuloso, empenhado e atento aos aspectos deontológicos, nunca foi instaurado, antes deste, qualquer outro processo disciplinar.
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4.2 - Apreciando (Cont.)
Na sequência do despacho do relator de fls. 207-208, veio o digno recorrente sustentar a recorribilidade do objecto do recurso.
Para melhor se compreender o que está em causa, transcreve-se o teor do dito despacho:
«O douto advogado, Dr. A, recorreu contenciosamente para este TSI da deliberação de 7/03/2014 do Conselho Superior de Advocacia, que, no âmbito de um procedimento disciplinar, o puniu com a pena de advertência.
A petição de recurso foi apresentada no dia 8/05/2014 e, antes ainda do despacho liminar, o recorrente veio “ampliar o objecto do recurso”, de modo a abranger a deliberação do mesmo CSA datada de 19/05/2014, tomada em sede de reclamação que o interessado acometeu contra a deliberação punitiva.
Quando proferimos o despacho de citação, não teremos tomado na devida consideração o disposto nos arts. 10º, nº1 a 3, do Estatuto do Advogado (EA), 15º e 16º, nºs 1 e 2, do Regulamento Interno do Conselho Superior de Advocacia (RICSA) e, bem assim, art. 44º, nºs 1 e 3 do Código Disciplinar do Advogado (CDA).
E a verdade é esta: ninguém nos autos, nem mesmo a própria entidade recorrida, suscitou qualquer questão prévia ou exceptiva a respeito do alcance eventualmente preclusivo que possa emergir dos dispositivos legais citados.
E, agora que nos preparávamos para proceder ao relato do aresto, demo-nos conta de que, provavelmente, o recurso contencioso de fls. 2 a 18, tendo por objecto a deliberação de 7/03/2014, não deveria ter sido interposto.
Expliquemo-nos.
Daqueles normativos parece fluir esta ideia:
De qualquer deliberação do CSA cabe - um pouco segundo o critério pessoal do interessado, e daí até a estranheza e anomalia de tal normação, ao arrepio do que conhecemos a propósito das regras mais ou menos imperativas sobre recorribilidade administrativa ou contenciosa dos actos lesivos – duas formas de impugnação: contenciosa e/ou administrativa.
O interessado dispõe de dez dias contados da notificação da deliberação para o fazer. Querendo, recorre contenciosamente; se preferir, pode reclamar. Se, no entanto, optar por esta segunda via, então o recurso contencioso só será interposto para o TSI dentro daquele prazo de dez dias após a notificação da decisão da reclamação (cfr. art. 44º, nºs 1 e 2, do CDA).
É assim que nos parece dever ser interpretado o preceito quando afirma: “Das deliberações do Conselho há recurso para o tribunal de segunda instância no prazo de dez dias, contados da respectiva notificação, salvo se tiver sido deduzida reclamação, caso em que o prazo se contará a partir da notificação da decisão da reclamação ou do termo do prazo previsto no número anterior” (destaque a negro nosso).
Ou seja, se o interessado tiver recorrido contenciosamente da deliberação punitiva, no prazo de dez dias, já não poderá reclamar (44º, nº1, cit.). Significa que, por livre alvedrio do interessado, o acto se tornou definitivo e, por isso mesmo, recorrível contenciosamente.
Mas, se dentro desse prazo preferir reclamar, deverá aguardar pela decisão da reclamação, para só então - e só dela - poder interpor o recurso contencioso (o objecto do recurso contencioso será a decisão da reclamação).
Trata-se, assim, de uma reclamação facultativa, mas que parece ter todos os condimentos para se tornar numa impugnação com eficácia suspensiva, (como se de uma impugnação necessária se tratasse ou como se da deliberação punitiva primária não coubesse recurso contencioso) e que tem por efeito tornar não definitiva deliberação punitiva reclamanda (cfr. art. 150º, nº1, do CPA). Verdade que o art. 150º, nº2 do CPA dispõe que a “reclamação de acto de que caiba recurso contencioso não tem efeito suspensivo…”. Mas, por outro lado, é a própria lei (art. 150º, nº2, in fine), que admite o contrário disposto na lei. E parece-nos que este caso se inscreve na excepção. Quer dizer, o caber ou não caber imediatamente recurso contencioso apenas depende, segundo as normas especiais do regime da advocacia, da vontade do interessado. Mas, a partir do momento em que faça a opção, os efeitos desta confundem-se com os da previsão do art. 150º referido.
Por conseguinte, e com base nos artigos citados, particularmente no art. 44º do CDA, outra parece não ser a solução: na medida em que o ora recorrente preferiu apresentar reclamação (tempestiva) para o CSA, teria que ser da respectiva deliberação (secundária) que haveria de interpor o devido recurso, não já da deliberação punitiva (primária). Apesar da deliberação da reclamação manter a deliberação punitiva primária, certo é que o caso é de acto meramente confirmativo. Definitivo e recorrível passou a ser o acto decisor da reclamação, não o acto que foi objecto do recurso contencioso inicial.
Eis, pois, as razões pelas quais se nos afigura que este tribunal pode não estar em condições de tomar conhecimento do recurso da deliberação de 7/03/2014, circunstância que, por força da não recorribilidade desse acto, poderá importar, em relação a ele, a absolvição da entidade recorrida da instância.
Antes, porém, para que se cumpra o direito ao contraditório e para se evitar uma decisão-surpresa, notifique as partes, nos termos do art. 3º, nº3, do CPC, “ex vi”, art. 1º do CPAC, para sobre este assunto se pronunciarem.
Prazo: dez dias».
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4.3 - Por entender que as razões subjacentes ao despacho transcrito são correctas, este colectivo faz seu, para os termos do presente acórdão, o respectivo conteúdo.
Acrescenta, porém, a fundamentação que se segue, em resposta à peça processual de fls. 212 a 219.
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4.4 - Pontos 1 a 6 da peça de fls. 212-219
Defende o recorrente que o prazo de recurso pode ser de vinte dias, nos termos dos arts. 15º e 16º do RICSA (Regulamento Interno do Conselho Superior de Advocacia),44º, nº3, do CDA (código Disciplinar do Advogado).
Pois pode. Mas nada disso contraria o que foi dito no despacho de fls. 207-208. É que aquele prazo de 20 dias apenas nasce para o interessado recorrente se o CSA não proferir decisão expressa sobre a reclamação apresentada. Tal significa que havendo reclamação – como aqui sucedeu – o interessado deve esperar pela respectiva deliberação. Se houver sido expressa e tempestivamente tomada, o prazo para o recurso será de dez dias (art. 44º, nº3, CDA; 16º, nº1, RICSA). À falta de deliberação no prazo consignado, o caso resolve-se pelo indeferimento tácito, o que confere ao reclamante o direito de recorrer, para o que disporá, então sim, do prazo de vinte dias.
É isso o que resulta dos apontados normativos.
E, obviamente, nesse caso o objecto do recurso contencioso haverá de ser o indeferimento tácito (art. 32º, do CPAC), ainda que os fundamentos (vícios) a esgrimir acabem por remeter para a invalidade da deliberação punitiva primária (que o indeferimento tácito, ao fim e ao cabo, acaba por confirmar).
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4.5 - Pontos 7 a 9 da peça de fls. 212-219
O problema não é de tempestividade; é de recorribilidade.
O despacho em causa não colocou a tónica da tempestividade do recurso contencioso. Preferiu dizer que, tendo o interessado reclamado para o Conselho, haveria de ser da respectiva decisão que haveria recurso contencioso (que, repetimos, seria interposto em dez ou vinte dias, consoante se tratasse de decisão expressa ou tácita, respectivamente).
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4.6 - Pontos 10 e sgs. da peça de fls. 212-219
Neste passo, o recorrente acha que os presentes autos, afinal, são de recurso da deliberação que foi tomada em 19/05/2014 na sequência da reclamação, ao ter ampliado o objecto do recurso em 5/06/2014 (a fls. 49 dos autos). Ou seja, com a pretendida ampliação o recorrente teria, em sua óptica, acabado por interpor recurso da deliberação secundária.
Não é verdade, com o devido respeito o dizemos. A ampliação só teria sentido se o objecto do recurso inicialmente interposto (cfr. petição de fls. 2 e sgs.) tivesse sido o indeferimento tácito recaído sobre a reclamação. Mas não. O Dr. A recorreu inicialmente da deliberação (primária) de 7/03/2014 do CSA que o puniu disciplinarmente com a pena de advertência (da qual reclamou).
Assim, a peça de fls. 49 não pode ter o condão de desvirtuar as regras próprias processuais sobre a escolha inicial do objecto do recurso.
Só se pode ampliar aquilo que processualmente constitui, desde o início dos autos, o objecto escolhido para a causa. Neste caso, o que deveria o recorrente ter feito era impugnar contenciosamente o indeferimento tácito e, logo que proferida a decisão expressa, vir aos autos pedir a modificação objectiva da instância, trocando o impugnado acto tácito pelo expresso supervenientemente praticado, cometendo-o eventualmente de novos e diferentes vícios (art. 81º, do CPAC).
Por outro lado, e respondendo ao art. 13º da referida peça, pouco importa o que a notificação de fls. 57 tenha referido. Como se sabe, as informações correctas ou erradas dos órgãos administrativos não podem alterar as regras (de ordem pública adjectiva) que dominam o ritualismo de cada espécie processual.
De resto, a informação de fls. 57 até parece estar correcta, tanto quanto nos é dado ver, uma vez que ela indica ao recorrente que da deliberação tomada (sobre a reclamação) cabe recurso contencioso para o TSI. Ora, foi isso, precisamente, o que o despacho de fls. 207-209 asseverou e agora reafirmamos.
Acresce que o art. 31º do CPAC não tem aqui o préstimo que poderia ter, se a situação do caso não fosse especial. A referida reclamação, que como vimos é facultativa, uma vez accionada torna não definitivo o acto primário. E assim, definitivo e recorrível será apenas o secundário (expresso ou tácito) que viesse a ser produzido. A rejeição, por isso, não se pode basear neste preceito.
Embora não deixemos de compreender o receio que o recorrente manifestou nos arts. 14 a 15 da peça em análise, o certo é que a escolha do objecto do recurso contencioso “ab initio” lhe coube exclusivamente, recaindo sobre si as consequências da opção tomada.
Contrariamente ao que parece sugerir no art. 18º da referida peça, este tribunal não acha que o prazo de recurso se deveria contar da notificação da deliberação expressa secundária. O que dizemos é que, uma vez apresentada a reclamação, seria dessa decisão que caberia recurso contencioso a interpor no prazo de 10 dias (caso a houvesse) ou de 20 dias, caso a entidade em apreço se remetesse ao silêncio.
É verdade que no art. 22º do mesmo articulado o recorrente invoca em seu favor o art. 81º, nº1, do CPAC. Todavia, tal como afirmámos anteriormente, este preceito só permite a modificação do objecto do recurso inicial se este for um indeferimento tácito, desde que na pendência do processo venha a ser praticado acto expresso. Ora, esse pressuposto normativo não se mostra aqui verificado. Não é, pois, verdadeira a afirmação contida nos arts. 23º e 24º da peça em análise.
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4.7 - Pontos 25 a 29 da peça
Pelo que se acaba de dizer, também não pode proceder a argumentação vertida nestes artigos. Na verdade, e repetindo o que já se disse, a ampliação só faz sentido ante razões que não interfiram com o objecto do recurso.
Pode haver modificação ou ampliação, sim, mas apenas dentro do objecto inicial eleito pelo recorrente no recurso contencioso. Se assim não fosse, estaria encontrada a fórmula para, a meio do percurso do processo, o interessado desviar o ataque contencioso feito a um determinado acto para outro, o que atentaria contra a estabilidade objectiva da instância, enquanto princípio, e contra as regras constantes dos arts. 32º, 79º a 91º do CPAC.
Também não releva o facto constante do ponto 29 da peça que temos vindo a analisar, segundo o qual o recorrente apresentou pedido de aclaração da deliberação primária. Na verdade, o art. 592º, nº2, do CPC não lhe confere protecção, pela simples razão de que a sua aplicação à situação vertente estar prejudicada pela circunstância de o recorrente não ter esperado pela resposta da aclaração e ter avançado directamente para o recurso contencioso de acto que não era sequer o aclarando.
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4.8 - Em suma, mesmo compreendendo as dúvidas do recorrente que o levaram, em jeito de precaução ou cautela, a mover o recurso contencioso nos termos em que o fez, a verdade é que não podemos ir contra as normas especiais constantes dos arts. 15º e 16º do RICSA (Regulamento Interno do Conselho Superior de Advocacia), 44º, nº3, do CDA (Código Disciplinar do Advogado) e 10º, nºs 1 a 3 do EA (Estatuto do Advogado) e do art. 81º, do CPAC.
Resta, portanto, concluir que nem a ampliação de fls. 49 é possível, nem o acto impugnado na petição inicial é recorrível contenciosamente.
Estamos, pois, perante uma excepção dilatória.
E não tendo o tribunal procedido à rejeição liminar (art. 46º, nº2, al. c), do CPC), cremos que agora (não obstante o que dispõe o art. 62º, nº4, do CPAC) nos parece mais condizente com as regras do processo civil (“ex vi” art. 1º do CPAC) a absolvição da instância, nos termos do art. 230º, nº1, al.e) e 231º, nºs 2 e 3 do CPC.
***
III - Decidindo
Face ao exposto, acordam em indeferir o pedido de ampliação do recurso e em absolver a entidade recorrida da instância.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça em 6 UC (art. 89º, nº1, do RCT).
TSI, 26 de Março de 2015
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Estive presente Lai Kin Hong
Victor Coelho
1 Cândida da Silva Antunes Pires e Viriato Manuel Pinheiro de Lima, Código de Processo Civil de Macau Anotado e Comentado, Vol. II, página 527, 2008, Faculdade de Direito da Universidade de Macau.
2 Cfr. Acórdão do TUI, proferido no âmbito do processo n.º 42/2009.
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292/2014 1