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Processo nº 301/2015 Data: 30.04.2015
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime(s) de “furto qualificado”.
Medida da pena.



SUMÁRIO

1. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau (no seu art.º 65.º), a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.

2. O recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de livre apreciação reconhecida ao Tribunal de 1ª Instância e também em matéria de pena, mantém o arquétipo de “remédio jurídico”, pelo que o tribunal de recurso apenas deve intervir na pena decretada, (alterando-a), quando detectar incorrecções ou distorções no processo que levou à sua determinação.

O relator,

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José Maria Dias Azedo

Processo nº 301/2015
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A, (1°) arguido com os sinais dos autos respondeu em audiência colectiva no T.J.B. vindo a ser condenado como autor material da prática em concurso real de 2 crimes de “furto qualificado” p. e p. pelo art. 198°, n.° 2, al. e) do C.P.M., nas penas parcelares de 3 anos e 6 meses de prisão e 4 anos e 6 meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 6 anos e 6 meses de prisão; (cfr., fls. 1538 a 1562, que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Do assim decidido, e porque inconformado, o arguido recorreu, motivando para dizer apenas que excessivas eram as penas, que deviam ser reduzidas para as de 2 anos e 6 meses e 3 anos e 6 meses de prisão, e em cúmulo, para a de 4 anos e 6 meses de prisão; (cfr., fls. 1585 a 1592).

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Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 1596 a 1597).

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Neste T.S.I., juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Na Motivação de fls.1586 a 1592 dos autos, o recorrente pretendeu que a pena cominada no Acórdão recorrido seria substituída pela única de 4 anos e 6 meses de prisão ou pela mais favorável, argumentando que tal Acórdão infringia as disposições no art.40° e na alínea d) do n.°2 do art.65° do Código Penal de Macau.
Antes de mais, subscrevemos inteiramente as criteriosas explanações da ilustre Colega na Resposta (cfr. fls.1596 a 1597 dos autos), no sentido de não provimento do presente recurso. E, com efeito, nada temos, de relevante, a acrescentar-lhes.
Note-se que por ter praticado, como autor material e na forma consumada, dois crimes de furto qualificado p.p. pela e) do n.°2 do art.198° do CPM, o recorrente foi condenado, devido ao cúmulo jurídico, na pena única de seis anos e seis meses de prisão, absolvendo as penas parcelares de três anos e seis meses e de quatro anos e seis meses de prisão.
Percorrendo atenciosamente os autos, temos a firma certeza de não se descortinar nenhuma circunstância com condão de atenuar a responsabilidade do recorrente.
Bem pelo contrário, os factos dados como provados pelo Tribunal a quo demonstram inquestionavelmente a grave lesividade do modo de execução (danificando as portas das casas dos dois ofendidos), O muito elevado grau de gravidade da ilicitude, a fortíssima intensividade do dolo directo, a negação da prática dos factos ilícito durante audiência e, nesta medida, a alta perigosidade da personalidade do recorrente.
Sendo assim, e considerando a moldura penal consignada no n.°2 do art.198° do CPM que é de 2 a 10 anos de prisão, não há margem para dúvida de que aquela pena única bem como as duas parcelares são muito benevolentes e absolutamente irredutíveis.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do recurso em apreço”; (cfr., fls. 1630 a 1630-v).

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Passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 1547-v a 1557, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.


Do direito

3. No seu recurso coloca o arguido uma só questão, insurgindo-se contra as penas fixadas para os 2 crimes de “furto qualificado” que cometeu, pedindo a sua redução.

Vejamos se tem razão.

Os crimes pelo arguido cometidos – certo sendo que não discute o mesmo a “decisão da matéria de facto” nem a sua “qualificação jurídico-penal”, que igualmente não merece censura – são punidos com a pena de 2 a 10 anos de prisão; (cfr., art. 198°, n.° 2 do C.P.M.).

Nos termos do art. 40° do C.P.M.:

“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.
3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.

Por sua vez, preceitua o art. 65° do mesmo Código:

“1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.
2. Na determinação da medida da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
3. Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da determinação da pena”.

Em relação a este art. 65° do C.P.M. tem este T.S.I. considerado que “na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.02.2000, Proc. n° 2/2000, e, mais recentemente, de 13.01.2015, Proc. n° 13/2015).

Dito isto, quid iuris?

Pois bem, ponderada a matéria de facto dada como provada há que dizer que para além do facto de ser “primário”, nenhuma outra matéria relevante se mostra de considerar como “favorável” ao ora recorrente.

E, inversamente, verifica-se que cometeu os crimes com dolo directo e intenso, elevado sendo o grau da sua ilicitude.

Com efeito, o ora recorrente, natural de WU NAM (R.P.C.), veio a Macau como “turista”, cometendo os crimes pouco tempo – dias – depois de aqui chegar, introduzindo-se, à noite, em habitação (particular) para o consumar e causando um prejuízo de quase MOP$280,000.00, (MOP$167,000.00, no “2° crime de furto”).

Perante isto, e sendo que a favor do mesmo apenas milita a circunstância de ser “primário”, cremos que – atenta a moldura penal aplicável, as restantes circunstâncias apuradas e às fortes necessidades de prevenção criminal, (especialmente geral, pela cada vez maior ocorrência deste tipo de crime em circunstâncias idênticas, por “turistas”), – censura não merece a decisão recorrida.

Com efeito, as penas parcelares situam-se (mesmo assim) não muito longe do seu mínimo legal, a cerca de 2 anos e 6 meses e 1 ano e 6 meses (do mínimo da pena), não nos parecendo de considerar “exageradas”, (pois que ainda estão a 6 anos e 6 meses e 5 anos e 6 meses do seu limite máximo que é de 10 anos de prisão).

Como decidiu o Tribunal da Relação de Évora:
“I - Também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico, pelo que o tribunal de recurso deve intervir na pena (alterando-a) apenas e só quando detectar incorrecções ou distorções no processo de determinação da sanção.
II – Por isso, o recurso não visa nem pretende eliminar alguma margem de apreciação livre reconhecida ao Tribunal de 1ª Instância nesse âmbito.
III - Revelando-se, pela sentença, a selecção dos elementos factuais elegíveis, a identificação das normas aplicáveis, o cumprimento dos passos a seguir no iter aplicativo e a ponderação devida dos critérios legalmente atendíveis, justifica-se a confirmação da pena proferida”; (cfr., Ac. de 22.04.2014, Proc. n.° 291/13, in “www.dgsi.pt”, aqui citado como mera referência, e decisão sumária do ora relator de 03.07.2014, Proc. n.° 433/2014, de 10.07.2014, Proc. n.° 369/2014 e Ac. de 10.07.2014, Proc. n.° 414/2014).

Mostrando-se de subscrever o assim entendido, e de consignar que inobservados não foram os critérios do art. 40° e 65° do C.P.M., há que dizer que igual solução se nos afigura de adoptar em relação à pena única (de 6 anos e 6 meses de prisão), resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares e achada entre o mínimo de 4 anos e 6 meses e o máximo de 8 anos de prisão, apresentando-se-nos, desta forma, igualmente observado o estatuído no art. 71° do C.P.M., e, assim, de confirmar, com a consequente improcedência do recurso.

Decisão

4. Em face do exposto, acordam negar provimento ao recurso.

Pagará o arguido a taxa de justiça de 5 UCs.

Honorários no montante de MOP$1.800,00.

Macau, aos 30 de Abril de 2015
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 301/2015 Pág. 12

Proc. 301/2015 Pág. 11