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Proc. nº 359/2015
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 25 de Junho de 2015
Descritores:
-Delimitação objectiva do recurso
-Art. 589º do CPC

SUMÁRIO:

I. O TSI, em recurso para si interposto de decisão do TJB, está condicionado na sua actuação pela delimitação objectiva contida na respectiva alegação, nos termos do art. 589º do CPC.

II. Se num segmento da decisão recorrida o tribunal “a quo” diz que não se verificava a excepção de caso julgado relativamente a uma determinada matéria, vindo, por isso a apreciá-la no segundo segmento do ponto de vista da sua substância, fatalmente improcederá o recurso se o recorrente vem impugnar a decisão do TJB somente no pressuposto – evidentemente errado – de que o despacho recorrido julgou procedente a excepção de caso julgado.




Proc. nº 359/2015

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
B, solteiro, maior, natural de Macau, de nacionalidade chinesa, residente em Macau, na Rua do ......, nº ..., r/c, instaurou no TJB (CV1-09-0044-CEO) execução por quantia certa, em processo ordinário, contra:
1ª - C, casada,
2a - D, solteira, maior, e
3º - F, solteiro, maior, todos residentes em Macau, na Rua de ......, nº ..., ...... Fa Un, ...º andar “...”, Bloco ..., Taipa.
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Por apenso, os executados deduziram embargos, na sequência do que o exequente apresentou contestação.
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Foi, então, proferido despacho que indeferiu a excepção de caso julgado deduzida pelos embargantes. Porém, considerou inexistir título executivo de onde decorresse a obrigação de os executados/embargantes pagarem a quantia exequenda, julgou procedentes os embargos e extinta a execução (fls. 63-65).
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É contra esse despacho que vem interposto pelo exequente o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
«1) Afigura-se que os fundamentos e a conclusão referidos no douto despacho recorrido se devem a algum lapso;
2) Na Acção Executiva CV2-05-0004-CEO o exequente entendeu ter a haver dos executados a quantia de HKD250,000.00, equivalentes a MOP257,500.00;
3) O ora recorrente reclamou da conta elaborada na mesma Acção, reclamação que foi atendida parcialmente;
4) Interposto recurso do respectivo despacho, o mesmo não mereceu provimento;
5) No respectivo douto Acórdão escreveu-se além do mais o seguinte:
“no que toca à “capitalização de juros” cremos que igualmente correcta está a decisão pois que percorrendo toda a petição inicial, não se vislumbra que tal capitalização tenha sido peticionada, não nos parecendo de acolher aqui o argumento no sentido de que a mesma foi implicitamente peticionada”.
6) O recorrente pretendeu, por via da presente Acção, suprir essa deficiência, peticionando expressamente os juros capitalizados;
7) Os pedidos formulados na presente Acção e na referida na conclusão nº2 são qualitativa e quantitativamente diferentes;
8) Não se verifica a identidade de pedidos exigida pelo artigo 417º do Código de Processo Civil;
9) Não ocorre o invocado caso julgado;
10) O pedido formulado, diferente do referido na Execução CV2-05-0004-CEO, decorre do título executivo invocado cujo existência e validade não podem ser contestadas;
11) O douto despacho recorrido violou o disposto nos artigos 416º, nº 1, 417º, nº 2 e 677º, c) do Código de Processo Civil.
Pelo exposto e em provimento do recurso, deve ser revogado o despacho recorrido e ser ordenada se proceda à citação dos executados para os fins referidos na parte final do requerimento inicial.».
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Sem concluírem, os executados/embargantes responderam ao recurso, suscitando a litigância de má fé do recorrente e pedindo a condenação deste em multa e indemnização, em termos que aqui damos por reproduzidos.
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Apreciando.
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II – Os factos
Porque a situação dos presentes autos surge na sequência de um outro recurso interposto para este TSI (Acd. de 6/03/2014, Proc. nº 148/2010), a fim de que se possa alcançar a compreensão global da situação, transcrevemos aqui a matéria de facto daquele constante:
1 - B, no processo que correu termos no TJB com o nº CV2-05-0004-CEO, moveu acção executiva contra C, F e D, com base num documento particular, pelo qual aquele B emprestou a D a quantia de HKD 250.000,00, a que acresceriam juros de 10% ao ano, a pagar em 36 prestações mensais;
2 - F e D declaram-se fiadores, responsabilizando-se pelo pagamento do montante do empréstimo e pelas despesas de acção judicial provenientes de eventual incumprimento do pagamento da amortização do empréstimo (cit. doc.).
3 - Por ter pago somente a 1ª prestação, foi movida a referida acção executiva.
4 - Nesses autos, após penhora de dois imóveis, um estabelecimento comercial e diversos depósitos bancários, foi feito o depósito pelos executados da quantia exequenda e custas de Mop$ 557.000,00, na sequência do que foi ordenado o levantamento da referida penhora.
5 - Desse despacho recorreu o exequente, por considerar que à data do depósito, a quantia em dívida somava o montante de 709.946,00 (460,161,00 - a título de juros - + 249.775,00 – a título de capital).
6 - Reclamou também do despacho que incidiu sobre a reclamação da conta, por não ter ela incluído os juros de mora à taxa de 10% sobre a quantia mutuada e sobre os juros capitalizados a partir de 1/03/96 até 12/01/2005 e do despacho que a manteve, recorreu para o TSI.
7 - Ambos os recursos foram não providos.
8 - Foi depois instaurada nova acção executiva em que o mesmo exequente ainda reclamava o pagamento da quantia de Mop$ 288.330,30 e juros respectivos, por considerar que na acção executiva nº CV2-05-004-CEO não tinha sido depositada quantia suficiente para o pagamento do valor em dívida.
9 - Naqueles autos, após a petição inicial foi proferido o seguinte despacho recorrido:
«B propôs a presente acção executiva para reclamar o pagamento da quantia de MOP$258.330,30, para além dos seus honorários que computa em MOP$30.000,00, alegando para o efeito, muito em síntese, que na acção executiva que correu termos no 2º Juízo Cível deste tribunal, sob o n.º CV2-05-004-CEO, não foi depositada quantia suficiente para o pagamento da sua dívida.
Consultou-se o processo Supra aludido e cumpre agora apreciar o título dado à execução nos termos previstos no artigo 695.º do Código de Processo Civil.
No caso sub judice o título que serve de base à presente execução é o escrito articular junto a fls. 22 e 23, cuja tradução para o português consta de fls. 25 e verso,
Segundo o nele acordado, os ora executados obrigaram-se ao pagamento da quantia mutuada de HKD$250.000,00, em 36 prestações mensais, às quais acrescia à taxa de juro anual de 10%. Obrigaram-se, ainda, os executados a suportar as despesas judiciais causadas ao exequente caso o mesmo tivesse de recorrer às vias judiciais para cobrar o seu crédito.
Ora, foi este mesmo título executivo que esteve na base da acção executiva que correu termos no 2.º Juízo Cível, já julgada extinta por sentença transitada em julgado.
Analisado o requerimento executivo apresentado nessa acção e o que impulsiona esta nossa, verificamos que, para além de terem a mesma causa de pedir - o já mencionado título - os pedidos formulados, decorrentes das obrigações reveladas pelo título, já foram objecto de conhecimento jurisdicional, foi liquidada a responsabilidade dos executados de acordo com os pedidos formulados que decorriam desse título (sendo certo que o exequente já teve oportunidade de reclamar as despesas judiciais decorrentes da interposição da primeira acção executiva) e foi julgada extinta a execução por ter sido cumprida a obrigação assumida.
Estamos, portanto, salvo melhor juízo, perante uma excepção dilatória de conhecimento oficioso, que obsta ao conhecimento do mérito desta execução - a do caso julgado.
O conceito de caso julgado foi expressamente previsto pelo legislador, ao estabelecer no artigo 416.º, n º1 do Código de Processo Civil, que o caso julgado pressupõe a repetição de uma causa, sempre que tal repetição se verifique depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário.
Por sua vez, o artigo 417.º esclarece o que deve entender-se por repetição da causa ao determinar que:
“ 1 - Repete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
2 - Há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica.
3 - Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico.
4 - Há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzidas nas duas acções procede do mesmo facto jurídico.”
Ora, no caso sub judice, pese embora o exequente pretenda extrair outros efeitos jurídicos do título executivo, nomeadamente capitalizando juros e peticionando o pagamento de outras despesas de justiça, a verdade é que nessa acção o Tribunal definiu o âmbito da obrigação exequenda e, como tal, terá de se concluir que, neste momento, os pedidos vão além do título, havendo excesso de execução.
Assim sendo e seguindo aqui este entendimento, forçoso é concluir que estamos perante uma situação de caso julgado, pois que se encontram preenchidos todos os seus pressupostos.
Pelo exposto, indefere-se liminarmente o requerimento executivo, por se verificar a excepção dilatória de caso julgado (e falta de título executivo quanto ao novo pedido deduzido de pagamento de honorários) e, em conformidade, absolvem-se os executados da instância.
Custas pelo exequente.
Notifique».
10 - Desse despacho foi interposto recurso para o TSI (a que coube o nº 148/2010), a que foi dado provimento por acórdão de 6/03/2014, revogando o despacho de indeferimento liminar referido e determinando o prosseguimento da execução com vista aos “juros capitalizados”.
11 - Tendo os autos de execução prosseguido, então, D e F, deduziram embargos (Proc. nº CV1-09-0044-CEO-A), o mesmo tendo feito C (Proc. nº CV1-09-0044-CEO-B).
12 - No processo nº CV1-09-0044-CEO-A foi apresentada contestação pelo exequente B, na sequência do que foi proferido o seguinte despacho (recorrido):
«O tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
Não existem nulidades que invalidem todo o processo.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias. São legítimas e estão devidamente representadas.
*
Do caso julgado:
Os executados, ora embargantes D e F, arguiram a excepção dilatória de caso julgado argumentando, em resumo, que há identidade de sujeitos, causas de pedir e pedidos entre a presente execução e a que correu os seus termos sob o n.º CV2-05-0004-CEO, no 2º Juízo Cível do TJB, através da qual o embargado foi pago da quantia de MOP$508,371.00, montante que incluía juros à taxa de 10% no período de 01.03.1996 a 12.01.2005 e juros à taxa legal a partir de 13.01.2005, e no qual a capitalização dos juros foi indeferida, por acórdão do TSI, transitado em julgado.
Em resposta, o embargado argumentou, muito em síntese, que o Acórdão do TSI proferido no âmbito dos presentes autos decidiu que não havia identidade de pedidos entre as duas execuções na medida em que na primeira os juros capitalizados não foram pedidos.
Ora, julgamos que não há necessidade de discorrer grande argumentação relativamente a esta questão...
Como os embargantes bem sabem, o requerimento executivo foi liminarmente indeferido exactamente por se ter entendido que estava verificada a excepção de caso julgado, sendo que esta decisão veio a ser revogada por douto acórdão do Tribunal de Segunda Instância que julgou que naquela outra acção executiva os juros capitalizados não foram pedidos, pelo que, na falta dessa tríplice identidade - falta de identidade de pedidos - estava afastado o caso julgado.
Por tal razão, improcede a enunciada excepção.
*
Das excepções de pagamento e de nulidade do título/falta de título:
Argumentam ainda os embargantes que já depositaram a quantia de MOP$504,197.00 à ordem do tribunal nos autos de execução ordinária n.º CV2-05-0004-CEO, pagamento esse que abrange a dívida de capital e juros; e que não deram o seu acordo à capitalização de juros.
Vejamos.
Os embargantes pagaram, efectivamente, o capital e os juros que foram peticionados naquela outra execução, razão pela qual foi a mesma declarada extinta, conforme cópia da douta sentença constante dos autos principais a fls. 108.
Nessa execução, o ora embargado pediu e recebeu o capital em dívida de MOP249.775,00, os juros remuneratórios à taxa legal acordada de 10% ao ano, contabilizados entre o dia 01 de Março de 1996 e o dia 12 de Janeiro de 2005, ainda os juros remuneratórios calculados à taxa legal de 6% até ao dia 10.07.2006 e à taxa de 9,75% até ao dia 15 de Fevereiro de 2007, num total de MOP508.371,00.
Sucede, porém, que, como bem evidenciou o tribunal de segunda instância, e sem prejuízo daquilo que já foi pago ao embargado, importa apurar se as obrigações que constam do título executivo se esgotaram naquela outra execução ou se, pelo contrário, esse título consente que o embargante peça a capitalização de juros à taxa anual de 10% (sendo certo que transitou em julgado a decisão que julgou haver falta de título executivo relativamente ao pedido de honorários, liquidado em MOP30.000,00).
Analisemos, desde logo, o teor do título executivo, cuja tradução para português consta de fls.25 dos autos principais, e que aqui se transcreve para facilitar a sua interpretação:
G (ilegível), por ter aberto uma fábrica de vestuário na Cidade de Shun De, Vila de Le Liu, R.P.C., tem dificuldades em manter convívio com filhos residentes em Macau, esperando que possa mudar para Macau para reagrupamento familiar, pelo que vem pedir emprestado a B uma quantia de HK$250.000,00, sob as seguintes condições:
1) É fixada a taxa anual de juros em 10%;
2) O pagamento do empréstimo será feito no prazo de três anos, ou seja, em 36 prestações mensais, sendo o capital e respectivos juros liquidados no dia 1 de cada mês.
3) O pagamento do empréstimo não poderá ser atrasado por mais de três meses (sic.).
4) A duração do empréstimo será de 01 de Janeiro de 1996 até 31 de Dezembro de 1998.
Caso o signatário não consiga liquidar o referido empréstimo no prazo de três anos, B terá direito a interpelar o signatário e seus fiadores F e D para pagamento do empréstimo, bem como tratar do assunto por meio judicial.
São exclusivamente da responsabilidade do signatário e dos seus fiadores as eventuais despesas causadas para B devido a procedimentos judiciais.
O creditado,
ass.) YYYYYY (30XXXX)
16 de Janeiro de 1996
Segundo o título os executados obrigaram-se ao pagamento de uma taxa de juros de 10%. Que tipo de juros?
A declaração das partes não deixa grande margem para dúvidas - as partes acordaram uma taxa de juro superior à legal para remunerar o embargado da privação do capital que mutuou.
O que está em causa nesta execução já não é a obrigação de juros que representa o rendimento da obrigação de capital (cfr. artigo 204.º, n.º 2 do Código Civil).
Os juros remuneratórios, como vimos, já foram pedidos e pagos...
Tal como o embargado alega no artigo 8.º do requerimento executivo e resulta discriminado na tabela que o mesmo elabora, ali reproduz, e consta de fls.16 dos autos principais (cf. também a conclusão que consta do artigo 10.º do requerimento executivo), o montante que liquidou e pede nesta execução corresponde à capitalização de juros, à taxa de 10%, durante 13 anos e 4 meses, num total de MOP258.330,30; isto é, os juros em dívida do ano anterior foram sendo incluídos no capital de cada ano.
Ora, como o documento particular dado à execução foi assinado em 16 de Janeiro de 1996, o regime jurídico que o regula será o que vigorava no momento da estipulação, ou seja, o do artigo 5.º da Lei n.º 4/92/M de 6 de Julho, tendo em mente o que dispõe o artigo 19.º do diploma que aprovou o actual Código Civil.
De acordo com esse artigo 5.º, as partes poderiam convencionar por escrito, a todo o tempo, a capitalização de juros e os períodos por que deva efectuar-se (…); sendo certo que esta norma foi transposta para o actual n.º 1 do artigo 554.º do Código Civil, não tendo havido qualquer modificação na figura do anatocismo.
Admite, assim, a lei de Macau que, por acordo escrito das partes, contemporânea ou posterior à constituição da dívida, se estabeleça que os juros vencerão juros e por que período.
Ora, salvo melhor juízo, do título executivo não se extrai qualquer convenção, qualquer acordo entre as partes, que autorize o embargado a capitalizar juros... E o embargado também não juntou qualquer outro documento escrito celebrado posteriormente onde os embargados tenham dado o seu acordo a essa capitalização.
Assim sendo, julgamos que dúvidas não restam que a figura do anatocismo, no vertente caso, não é permitida (cf. também artigos 212.º e 213.º ambos do Código Civil).
Como decorre do disposto no artigo 12.º, n.º 1 do Código de Processo Civil a acção executiva tem por base um título, pela qual se determinam os seus fins e os seus limites.
O título executivo contém o acertamento ou determinação do direito que se pretende fazer valer, sendo pois, o ponto de partida da acção executiva, na medida em que a realização coactiva da prestação pressupõe a anterior definição dos elementos (subjectivos e objectivos) da relação jurídica de que ela é objecto.1
Uma vez que o embargado não tem título executivo de onde decorra a obrigação dos executados/embargantes em pagarem a quantia exequenda correspondente aos juros capitalizados, sem necessidade de apreciar as outras excepções suscitadas, julgo procedentes os presentes embargos de executado e, ao abrigo do disposto nos artigos 697.º, n.º a) do Código de Processo Civil, julgo extinta a execução de que os mesmos são dependência.
Custas pelo embargado.
Notifique.
Registe».
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III – O Direito
1 - O despacho recorrido afirmou que a excepção de caso julgado invocada pelos embargantes quanto aos juros capitalizados não existia, julgando assim improcedente a respectiva excepção.
Mas, quanto à capitalização dos juros, decidiu que o título dado à execução não a prevê, nem considera que os “juros sobre juros” (anatocismo) tenham sido, por qualquer modo, convencionados posteriormente.
Daí que tenha julgado extinta a execução, ante a procedência dos embargos.
*
2 - O exequente esgrime contra o despacho impugnado o seguinte argumento, se bem o interpretamos:
O juiz “a quo” incorreu em “lapso manifesto”, pois que, tal como decorre do aresto do TSI, a execução deveria prosseguir quanto ao pedido de capitalização de juros.
E assim, conclui:
“ (…) 7) Os pedidos formulados na presente Acção e na referida na conclusão nº2 são qualitativa e quantitativamente diferentes;
8) Não se verifica a identidade de pedidos exigida pelo artigo 417º do Código de Processo Civil;
9) Não ocorre o invocado caso julgado;
10) O pedido formulado, diferente do referido na Execução CV2-05-0004-CEO, decorre do título executivo invocado cujo existência e validade não podem ser contestadas;
11) O douto despacho recorrido violou o disposto nos artigos 416º, nº 1, 417º, nº 2 e 677º, c) do Código de Processo Civil.”
Mas, em boa verdade, o lapso não foi do despacho recorrido, mas do recorrente, se respeitosamente no-lo é permitido dizer.
Na realidade, o despacho em crise não disse que a vexata quaestio atinente aos juros capitalizados estava coberta por decisão anterior transitada em julgado. E não o disse, nem podia dizer. Com efeito, o acórdão acima transcrito deste TSI (proferido no Proc. nº 148/2010), precisamente por entender que se não verificava caso julgado quanto à capitalização de juros, determinou o prosseguimento da execução para apreciar o respectivo pedido, visto que ele tinha sido liminarmente indeferido por decisão da 1ª instância de 19/10/2009 (fls. 29 daqueles autos).
Portanto, o processo de execução prosseguiu, e bem, para apuramento dessa questão.
Foi no âmbito desse prosseguimento que o despacho começou por negar razão aos embargantes, expressando-o de forma absolutamente inequívoca: “…por falta dessa tríplice identidade – falta de identidade de pedidos – estava afastado o caso julgado”. Ou seja, o despacho em apreço acabou por reconhecer que não se tinha formado caso julgado sobre a existência ou não da capitalização de juros. Acatou, como lhe cumpria, o julgamento do TSI.
Foi, aliás, por isso mesmo que, enquanto negava razão aos embargantes, acabou depois por conhecer expressamente dessa matéria, para averiguar se, sim ou não, o título permitia ao exequente pedir a capitalização de juros nesta execução.
E a conclusão a que chegou foi lapidar: O título não inclui qualquer convenção sobre capitalização dos juros (anatocismo), nem os autos mostram que posteriormente a ele tenham as partes alcançado qualquer acordo sobre tal capitalização.
E, por assim ter concluído, a decisão tomada, a pretexto do art. 12º, nº1, do CPC e repousando no conteúdo do título executivo o fundamento para a execução possível, acabou por ajuizar que o exequente não dispõe de título de onde decorra a obrigação dos executados no pagamento dos juros capitalizados peticionados.
Por conseguinte, as alegações do presente recurso são claramente o produto de uma errada laboração. Na verdade, se o recorrente defende que não se formou caso julgado sobre aquela matéria, tal foi o que precisamente o concluiu também o despacho sob censura na sua primeira parte. Quanto a esse segmento, pois, não havia, nem há, dissensão.
Quanto à 2ª parte do despacho, ele não foi objecto de impugnação, pelo que sobre ela não nos pronunciaremos. Com efeito, o TSI, em recurso para si interposto de decisão do TJB está condicionado na sua actuação pela delimitação objectiva contida na respectiva alegação, nos termos do art. 589º do CPC.
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3 - Isto visto, fatalmente improcederá o recurso se o recorrente vem impugnar a decisão do TJB somente no pressuposto – evidentemente errado – de que o despacho recorrido julgou procedente a excepção de caso julgado.
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4 - Na resposta ao recurso, os embargantes (recorridos) invocaram a litigância de má fé do recorrente, pedindo a condenação do recorrente em multa e indemnização por danos não patrimoniais, que computam em não menos de Mop$ 5.000,00, bem como no reembolso dos honorários ao seu mandatário, que até ao momento dizem terem ascendido já a Mop$ 30.000,00.
Vejamos. Para se subsumir um determinado comportamento processual ao conceito de litigância de má fé é necessário que se verifiquem os requisitos previstos no art. 385º do CPC.
Ora, sem bem que uma alegação como a do recorrente nos pareça completamente desajustada da realidade jurídico-processual que podemos colher do despacho sob escrutínio, tal como já referimos, ainda assim não temos elementos adicionais que sirvam para suportar uma conclusão sobre a imputada litigância malévola com os contornos censuráveis que do preceito citado emanam.
Que a alegação do recurso é insustentável, isso é mais do que claro. Mas, se pensarmos que esta impugnação, em vez de ter ínsita uma intenção dilatória com o fito de atrasar o termo do processo, assenta num evidente lapso, então não teremos razões para acompanhar o pensamento dos recorridos.
Se repararmos bem, a alegação deste recurso é o decalque da alegação do anterior recurso por si mesmo interposto do despacho de indeferimento liminar (cfr. fls. 37 a 43 dos autos de execução). Isto leva-nos a pensar que podemos estar em presença de um “copy–paste” traidor ou de uma má interpretação, por distracção ou negligência, do despacho ora recorrido na parte em que ele se pronuncia sobre o invocado caso julgado e que, por esse motivo, pode ter levado o recorrente a pensar (erradamente) que, por ser igual a decisão, igual podia ser a alegação.
Por outro lado, não vemos que interesse podia apresentar o recorrente num desejado prolongamento - tão inerte, quão inconsequente - de um processo, se a sua vontade, presumivelmente, só poderia ser a de tentar convencer o tribunal “ad quem” da ilegalidade do despacho que lhe não reconheceu o direito à capitalização dos juros.
Por tudo isto, não cremos que haja aqui justificação para a condenação do recorrente como litigante de má fé.
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IV - Decidindo
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso, mantendo e confirmando a decisão impugnada.
Custas pelo recorrente.
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Vai também improcedente o pedido de condenação de má fé do recorrente.
Pelo incidente, taxa de justiça em 2 UC a cargo dos embargantes.

TSI, 25 de Junho de 2015

(Relator)
José Cândido de Pinho

(Primeiro Juiz-Adjunto)
Tong Hio Fong

(Segundo Juiz-Adjunto) Lai Kin Hong
1 Cf. Lebre de Freitas, A acção executiva, Coimbra Editora, 1993, pág. 29.
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