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Proc. nº 1/2015
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 30 de Abril de 2015
Descritores:
- Providência cautelar
- Oposição
- Alteração dos factos dados provados
- Representação sem poderes e ratificação
- Contrato-promessa de bem alheio e futuro
- Execução específica

SUMÁRIO:

I. O juiz pode alterar a matéria de facto provada por ocasião da providência cautelar não especificada sem audiência da parte contrária, se após a oposição desta vierem a ser revelados novos factos fundados em novas provas.

II. Se A promete adquirir a totalidade das acções de B e, apenas nessa qualidade, promete vender a C as fracções de um prédio pertencente a B e C, por sua vez, cede a sua posição de promitente adquirente a D, este cede essa posição a E, este cede a F e F cede a G, estando em causa a cessão de posição contratual de um contrato-promessa de coisa futura e alheia, não pode o adquirente G dessa posição contratual pretender execução específica relativamente a uma dada fracção, não estando B, o titular dessa fracção representado ou não tendo ratificado qualquer desses negócios de promessa transmissiva.
















Proc. Nº 1/2015

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I – Relatório
A, casado com B, no regime da separação de bens, de nacionalidade chinesa, residente em Macau, na…, ora Requerente, instaurou PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM no TJB (Proc. nº 14-0002-CPV),
contra:
SOCIEDADE DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO C, S.A.R.L., em chinês, C置業發展股份有限公司 e em inglês, C PROPERTY INVESTMENT COMPANY LIMITED, com sede em Macau, na… (澳門…), ora Requerida.
O pedido formulado foi o de que fosse decretada a inibição da requerida em vender e/ou transmitir, por qualquer meio, a terceiros as fracções “C7” e “D7” do prédio urbano sito em…, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º …, a fls…., do Livro….
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A sentença da 1ª instância foi no sentido da procedência do pedido.
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Tendo sido decretada a providência não especificada sem audição da parte contrária, logo que notificada da respectiva decisão, contra ela veio a requerida deduzir-lhe oposição.
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Tendo prosseguido os autos o seu normal curso, veio a ser proferida nova decisão, que julgou procedente a oposição e determinou a revogação da providência anteriormente decretada.
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É contra essa sentença que ora vem interposto pelo requerente o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
«1) Vem o presente recurso interposto da sentença proferida a fls. 406 a 421 dos autos, impugnando-se igualmente o julgamento que recaiu sobre a matéria de facto.
2) Após o requerimento de oposição e inquirição de testemunhas, veio o Tribunal recorrido colocar em causa a anterior fixação da matéria de facto, passando a dar por não provados os factos anteriormente incluídos sob os n.ºs 20, 21 e 30 da matéria de facto indiciariam ente dada por provada na sentença de fls. 190 a 206 dos autos, reformulando ainda a matéria de facto que considerara indiciariamente provada sob os n.ºs 8, 9, 16, 18, 19, 23 e 27 da sentença de fls. 190 a 206 dos autos.
3) Salvo o devido respeito por opinião contrária, perante um requerimento de oposição, não poderia o Tribunal recorrido por em causa a anterior fixação da matéria de facto (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no âmbito do processo n.º 1425/99), pelo que mal andou o Tribunal recorrido quando alterou a decisão de facto anteriormente fixada.
4) Nestes termos, deverá ser revogada a decisão sobre a matéria de facto que revogou a matéria de facto anteriormente fixada (nomeadamente, no que se refere aos n.ºs 20, 21 e 30 dos factos provados da sentença a fls. 190 a 206 dos autos), devendo ser ainda ser reformulada a matéria de facto incluída nos n.ºs 8, 9, 16, 18, 19, 23 e 27 para os termos em que foi dada como provada na sentença de fls. 190 a 206 dos autos.
5) Sem prescindir, verifica-se que as alterações à matéria de facto anteriormente dada como provada e os “factos novos” alegados em sede de Oposição dados agora como assentes - vide, em particular, factos anteriormente dados como provados constantes dos n.ºs 8, 9, 16 e 27 da sentença a fls. 190 a 206 dos autos, e, bem assim, os factos dos artigos 8.º a 11.º, 15.º a 18.º, 21.º, 22.º, 23.º, 25.º e 27.º do requerimento de Oposição - justificam-se com a junção pela Requerida do contrato-promessa outorgado pela D e pela E, bastando para tanto atentar ao teor da fundamentação da decisão de facto apresentada pela Mm.ª Juiz a quo.
6) Ora, o Tribunal a quo julgou incorrectamente a matéria de facto constante dos n.ºs 8, 16 e 27 e sob os pontos E. e I. dos factos provados, porquanto apurou, numa errada interpretação do contrato, que a D interveio em nome, interesse e por conta própria na celebração do contrato-promessa em questão, limitando-se o Mm.º Tribunal a quo a verificar que a D surge identificada, no cabeçalho do contrato, como primeira contratante, e que tal versão viria confirmada nos considerandos daquele contrato.
7) Não pode o ora Recorrente conformar-se com aquele entendimento, atento o disposto no próprio contrato-promessa, pois é, desde logo, indiscutível que a D agiu sobre um bem da Requerida e não sobre um bem próprio, sendo certo que aquele bem tão-pouco viria, em algum momento, a ser propriedade da D, mantendo-se, até à celebração das várias escrituras, na titularidade da Requerida.
8) Daí que a Requerida alegue que a D teria prometido comprar a totalidade das acções da Requerida e, a efectuar-se essa compra de participações sociais, a D passaria a deter a posição de titular “indirecta” do bem...
9) Mas ainda que a D tivesse prometido comprar a totalidade do capital social da Requerida, e ainda que a D tivesse, efectivamente, adquirido a totalidade do capital social da Requerida, a verdade é que o bem continuaria - tal como hoje - a integrar o património da Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A., ora Requerida.
10) Destarte, não corresponde à verdade que a D tenha decidido “no seu interesse e nome próprio e por conta própria” prometer vender a terceiros os direitos resultantes da concessão em causa, dado que esses direitos não lhe pertenciam nem era esperado que viessem a pertencer.
11) E da leitura da totalidade do contrato retira-se ainda que a D não se limitou a agir por conta da Requerida, já que agiu também em nome desta!
12) É da conjugação da suposta promessa da D de compra de todas as acções da Requerida e do facto da Requerida ser concessionária do terreno para a construção do edifício comercial e de escritórios, que a D vem prometer, em nome da Requerida, alienar todos os direitos e interesses das fracções autónomas daquele prédio, não porque estes lhe pertençam ou viessem a pertencer no futuro, mas antes porque alegadamente estava a agir na qualidade de futura sócia única da Requerida, procurando comprometer a Requerida com base nessa futura relação de domínio, assim se percebendo a intervenção da D num negócio sobre bens que não lhe pertenciam e que não viriam nunca a entrar no seu património (o Considerando do contrato-promessa explicita claramente que a D intervém na qualidade de futura ou expectável sócia única da Requerida).
13) Ademais, do clausulado contratual resulta que todas as obrigações relevantes decorrentes do contrato-promessa, nomeadamente a celebração da escritura pública, estariam a cargo da aqui Requerida, ou seja, o contrato prometido deveria, nos termos do referido contrato-promessa, ser celebrado pela Requerida, o que afasta desde logo a qualificação da D como promitente-vendedora.
14) Pois não faz qualquer sentido designar como “promitente-vendedora” (ou seja, a que promete vender) uma parte [designadamente a D] que, nos termos do mesmo contrato, não iria vender coisa alguma!
15) Com efeito, nos termos do contrato, era à Sociedade de Investimento Imobiliário C, SA, ora Requerida, que competia “(...) assinar os contratos trilaterais de hipoteca/promessa ou/e com objecto de uma ou várias fracções autónomas do supracitado edifício, para esta ir reconhecer ao banco de crédito a aquisição legítima por parte da Outorgante B ou de qualquer terceiro por esta designado de uma ou várias fracções autónomas do edifício situado no 6º lote.” (vide 1.º parágrafo da cláusula 6.ª do contrato promessa), sendo certo que o “(…) reconhecimento referido na supracitada cláusula pode ser realizado, quando for necessário, através da elaboração de um documento de que consta directamente o contrato de promessa de compra e venda com a Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A., para posteriormente mostrar ao banco.” (vide parágrafo 2.º da cláusula 6.ª do contrato-promessa), sendo ainda a Requerida teria de “(...) tomar todos os actos necessários para proceder ao registo de condomínio logo depois da conclusão do edifício construído no 6.º lote e da emissão da notificação de entrada, assim como tratar aos respectivos processos de celebração de contrato relativo à compra e venda da supracitada fracção autónoma dentro de um mês depois do registo de condomínio. (…)” (vide cláusula 7.ª do contrato-promessa) .
16) Parece ainda claro que a possibilidade de celebração de um contrato-promessa directamente com a Requerida, para efeitos de reconhecimento por parte desta, implica necessariamente que o contrato-promessa de 23 de Julho de 1996 foi celebrado por interposta pessoa, no caso, a D, em representação da Requerida!
17) Posto isto, crê-se que não é possível concluir-se que a D agiu em nome e por conta própria, uma vez que o contrato determina a realização pela Requerida de todos os actos inerentes à posição da promitente-vendedora, nomeadamente quando se estipula que é esta que irá cumprir a obrigação principal resultante do contrato-promessa, ou seja, a celebração do contrato definitivo!
18) Aliás, se assim não fosse, e se a Requerida fosse completamente alheia ao negócio, então mal se compreenderia que esta tivesse, nos termos do contrato-promessa, de prestar qualquer confirmação do negócio, facto que, juntamente com a obrigação da Requerida de celebrar os contratos definitivos, afasta, desde logo, o entendimento segundo o qual a Requerida é uma “entidade terceira e externa” ao negócio.
19) Naturalmente, só agindo em nome e por conta da Requerida é que a D poderia prometer que a Requerida iria celebrar o contrato definitivo.
20) Ademais, considerando que a razão determinante para a alteração da decisão de facto no que concerne ao ponto n.º 16 se prende, conforme afirma o Tribunal a quo, nas razões que motivaram a que se considerasse não provada a representação da Requerida no contrato-promessa celebrado com a E, não se poderá deixar de reverter ao inicialmente decidido no que toca àquele ponto, designadamente que “Nesse contrato, a D -Sociedade de Investimento e Fomento Predial Limitada, através dos seus dois sócios e administradores, F e G, confirmaram esta cessão da posição contratual, em representação da Requerida”, perante as evidências claras de actuação da D por conta e em nome da Requerida.
21) Aliás, a propósito da intervenção da D a título de representante da Requerida em todo o processo negocial que envolve o prédio em questão, designadamente a sua intervenção nas várias cessões da posição contratual (importante para a matéria sob o n.º 27 dos factos provados), não é irrelevante, ao contrário do que julgou o Tribunal a quo, as declarações escritas e assinadas pela testemunha H (recorde-se, administrador da Requerida entre 2011 e 2013 e que esteve envolvido em contactos com o Requerente desde 2004 até 2013), às quais apôs um carimbo da D.
22) Recorde-se que naqueles documentos a D declara que, enquanto “representante da sociedade concessionária” (leia-se, a Requerida), vem informar as partes que a cessão de posição contratual teria de ser adiada por força de uma questão interna da Requerida (vide teor dos documentos de fls. 343 e 344 dos autos).
23) Aqui chegados, importa referir que não poderia o Mm.º Tribunal a quo, salvo o devido respeito por melhor juízo, procurar uma explicação para o teor daquele documento através do seu confronto com outros documentos elaborados por outras pessoas há cerca de dez anos, aventando a possibilidade da “sociedade desenvolvedora” ali referida não ser a Requerida, mas antes a D.
24) Sobretudo quando a própria Requerida reconhece no seu requerimento de 2 de Maio de 2014, a fls. 346 a 351 dos autos, que os documentos de fls. 343 a 344, consubstanciam uma informação da D através da qual se refere que a Requerida “(...) estaria em fase de reestruturação interna (…)”, o que se diz sem prejuízo das distintas leituras que a Requerida retira daquele documento.
25) Pelo que outra leitura, mormente a sufragada pelo Mm.º Tribunal a quo, não é possível, já que os documentos em causa indiciam que, efectivamente, a D é a representante da sociedade desenvolvedora, ora Requerida, no âmbito do projecto imobiliário em causa.
26) Não podendo também passar despercebida a relação existente entre o conteúdo do doc. n.º 5 junto com o requerimento inicial (nomeadamente, onde a Requerida diz que reconhece a cessão a efectuar entre a E e quaisquer terceiros) e a total ausência da D no contrato de cessão de posição contratual celebrado entre a E e a Agência Comercial I, Limitada (“I”).
27) Situação que já não se verifica na outra cessão da posição contratual, entre a I e a K.
28) O que indicia que a falta de intervenção da D no contrato de cessão de posição contratual celebrado entre a E e a I se deve ao facto da Requerida já ter afirmado, por antecipação, o respectivo reconhecimento.
29) Por outro lado, não se pode deixar de notar que a matéria incluída sob o ponto I. dos factos corresponde a um juízo conclusivo da Requerida, pelo que não deveria ser incluída no âmbito da matéria de facto provada.
30) Ainda que assim não se entendesse, não se poderá deixar de referir que o que a D e a E sabiam - a expressão partes contratantes induz em erro, dado que a D, como se viu, não é parte no contrato, mas antes representante da Requerida - é que a D não era titular dos direitos sobre as fracções a construir e o objecto do contrato-promessa.
31) Não sendo a D, ao contrário do que aquele juízo conclusivo induzia, a promitente-vendedora no negócio jurídico em questão.
32) Nestes termos, deverá a referida matéria de facto constante dos n.ºs 8, 16 e 27 dos factos provados, dada como indiciariamente provada, ser alterada em conformidade, adoptando-se os termos que resultam da matéria de facto provada na sentença de fls. 190 a 206 dos autos.
33) Devendo, consequentemente, ser dados como não provados os factos constantes da matéria de facto provada sob o ponto E. - porque é inconcebível que a D tenha, no seu próprio interesse, decidido prometer vender a terceiros os direitos resultantes da concessão em causa, uma vez que não só estava contratualmente estipulado que era a Requerida a celebrar a escritura pública como vendedora como também não é possível agir em interesse próprio sobre alheios - e sob o ponto 1., não só porque é matéria conclusiva como também a D não é parte no contrato (porquanto age em representação da Requerida, como se deixou claro) nem prometeu vender o que quer que fosse em nome próprio, pelo que não pode ser considerada promitente-vendedora.
34) Acresce ainda que na sentença que decretou a providência cautelar, ficou provado o facto incluído sob o n.º 30, segundo o qual “A Companhia de Investimento J, Limitada, estava bem ciente da existência do contrato-promessa celebrado pela ora Requerida em 23 de Julho de 1996 e das sucessivas cessões da posição contratual.”.
35) Após a segunda audiência de julgamento, o Mm.º Tribunal a quo, ao tomar a sua decisão sobre a matéria de facto, entendeu que “Relativamente ao ponto n.º 30 da mesma sentença, não se mantém provado porque a convicção do Tribunal teve por base a comparação e análise dos compostos dos administradores, mostrados nas certidões do registo comercial da Requerida, da D e da sociedade J.”.
36) Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, o juízo probatório após a oposição não pode ser modificado, muito menos com base em documentos que já tinham sido apresentados junto do Mm.º Tribunal a quo quando decretou a sentença de fls. 190 a 206 dos autos.
37) Inexistindo factos novos e elementos probatórios novos que possam colocar em causa o anteriormente decidido, não poderia o Mm.º Tribunal a quo alterar a decisão.
38) Pelo exposto, designadamente a falta de novos elementos de prova que colocassem em causa aquela matéria de facto anteriormente provada, impõe-se a sua rectificação, devendo ser reposto aquele facto nos exactos termos constantes da sentença a fls. 190 a 206 dos autos.
39) Por outro lado, perante os erros de julgamento acima indicados, nomeadamente a ausência de qualquer actuação da D em nome da Requerida que, como vimos, teve manifestamente lugar -, veio o Tribunal a quo a considerar que o doc. n.º 5 junto com o requerimento inicial não configuraria uma situação de ratificação (“ (…) apenas agora o Tribunal forma juízo probatório diferente de que o doc. n.º 5 junto com o requerimento inicial não é considerado como ratificação (…)” - vide sentença proferida a fls. 406 a 421 dos autos).
40) Demonstrada que está a representação da Requerida por parte da D, dúvidas não restam que através do referido doc. n.º 5 junto com o requerimento inicial a Requerida ratificou o negócio celebrado em sua representação pela D.
41) Ressalvado o devido respeito por opinião contrária, e perante o teor da declaração junta como doc. n.º 5 ao requerimento inicial, não tem qualquer sentido limitar o efeito daquela declaração ao teor da cláusula 6.ª do contrato-promessa, como o faz o Tribunal a quo na fundamentação da decisão de facto, na sequência do alegado pela Requerida.
42) Aliás, nem se percebe em que termos é que a declaração subscrita pela Requerida está relacionada, exclusivamente, com a cláusula 6.ª do contrato-promessa (e não com uma ratificação de todo o contrato), quando o próprio Tribunal recorrido deu por não provado o facto alegado no artigo 47.º do requerimento de Oposição, tendo antes ficado provado sob o ponto N. (2.ª parte), que a Requerida emitiu aquela declaração porque a E pretendia ceder a sua posição contratual (matéria que também fora alegada pela Requerida)!
43) Aceitar que o único fito da declaração era o de permitir a obtenção de financiamento bancário (para aquisição das fracções, naturalmente) e que aquela apenas confirmava perante os bancos o que se refere no contrato-promessa ou que, no mesmo sentido, apenas serviria para conferir algum conforto junto das instituições bancárias para efeitos de financiamento, é o mesmo que afirmar que a Requerida iludiu os cessionários e os bancos, prestando-lhes um documento através do qual os cessionários poderiam contrair um empréstimo junto daqueles para aquisição de fracções tituladas por um contrato-promessa que, afinal, a Requerida, apesar de emitir aquela declaração, não se vinculou a cumprir e relativamente ao qual era “parte externa e alheia”!
44) Sendo certo que afirmar que um declaratório normal não poderia entender a declaração da Requerida como uma ratificação ou adesão ao contrato-promessa seria atentar contra a realidade dos factos, até porque não só o documento foi emitido porque a E, promitente-compradora, pretendia ceder a sua posição contratual (facto que foi dado como provado sob o ponto N. (2.ª parte) dos factos provados da sentença proferida a fls. 406 a 421 dos autos), como também esta só começou a ceder a sua posição de promitente-compradora após a emissão daquela declaração pela Requerida (concretamente, quatro dias depois daquela declaração), conforme resulta do confronto dos does. n.ºs 5, 6 e 7 juntos com o requerimento inicial.
45) Mais, está ainda provado que a E, ao ceder a sua posição contratual (quatro dias depois da declaração da Requerida compreendida no doc. n.º 5 junto com o requerimento inicial), garantiu ao cessionário que a Requerida iria celebrar a escritura pública (vide “Na Cláusula 8.ª dessa primeira cessão da posição contratual a E garante que a Sociedade de Investimento Imobiliário C) S.A.R.L., vai proceder ao registo da propriedade horizontal e tratar das formalidades necessárias à celebração da escritura pública” (matéria provada de acordo com o ponto P. dos factos provados da sentença proferida a fls. 406 a 421 dos autos).
46) Sem esquecer que na cláusula 10.ª do mesmo contrato (junto aos autos com o requerimento inicial sob o docs. n.ºs 6 e 7) se diz que “O 1.º Outorgante [E] declara que a Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A.R.L. reconhece que o 1.º outorgante tem direito a transmitir ao 2.º outorgante a sua posição contratual como adquirente e vai cumprir as cláusulas 7) e 8) do presente contrato”.
47) O que é esclarecedor quanto ao entendimento que a E tinha do contrato-promessa, nomeadamente no que se refere à intervenção da D em representação da Requerida, e quanto à ratificação do negócio por parte desta, assumindo assim a obrigação de celebrar o contrato definitivo.
48) Tratando o doc. n.º 5 junto aos autos com o requerimento inicial como uma ratificação, a E garantiu à cessionária que a Requerida iria tratar das formalidades necessárias à celebração da escritura pública.
49) Com relevância para apreciação de toda a matéria de facto, impõe-se ainda referir que o senhor F esteve envolvido em todos os documentos aqui em discussão.
50) Com efeito, o senhor F foi um dos outorgantes do contrato-promessa de 23 de Julho de 1996, em representação da D, na qualidade de sócio administrador desta Sociedade (vide Doc. n.º 1 junto com a Oposição).
51) O senhor F foi também uma das pessoas que outorgou, em representação da Requerida, a declaração emitida por esta no dia 2 de Dezembro de 1996, mediante a qual ratificou o contrato-promessa, sendo aquele naquela altura administrador desta Sociedade (vide Doc. n.º 3 junto com o requerimento inicial).
52) Não pode, também por estes factos, afirmar-se que a Requerida é completamente alheia ao contrato-promessa e que nunca o ratificou.
53) Nestes termos, perante os elementos constantes dos autos, está demonstrado à saciedade que a Requerida ratificou o contrato-promessa celebrado pela D em seu nome e que, como tal, deverá passar a constar dos factos provados, sob o n.º 9, a seguinte matéria: “Vindo a ora Requerida, por documento datado de 2 de Dezembro de 1996, a declarar válido o referido contrato-promessa de 23 de Julho de 1996, ratificando dessa forma o referido negócio.” (conforme n.º 9 dos factos provados da sentença a fls. 190 a 206 dos autos).
54) Foi ainda dado como indiciariamente provado que “Na 1.ª Cessão de Posição - a cessão entre a E e a I -, a Requerida não teve qualquer intervenção, não foi identificada como promitente-vendedora, nem foi afirmado que esta tenha prometido vender à cedente as fracções do edifício a construir.” (cfr. matéria constante do ponto O. dos factos provados).
55) No entanto, para prova do facto acima transcrito, o Tribunal recorrido baseou-se nos does. n.ºs 6 e 7 junto com o requerimento inicial.
56) Com efeito, diz o Tribunal na douta decisão que recaiu sobre a matéria de facto que “ (…) Em relação aos factos dos art. 35º e 36º da mesma peça, a convicção do tribunal formou-se essencialmente na análise e ponderação do teor dos does. n.º 6 e n.º 7 juntos com o requerimento inicial. (...) ”.
57) Ora, aqueles documentos já tinham sido apreciados pelo douto Tribunal quando decidiu decretar a providência cautelar, não sendo permitido ao Mm.º Tribunal a quo recorrer a documentos já examinados para daí retirar uma nova opinião sobre o mesmo facto, designadamente quanto ao facto da Requerida ser ou não ali referida como promitente-vendedora.
58) Ainda que assim não se entenda, o que não se concede, sempre se dirá que aquele facto choca frontalmente com o conteúdo do documento em causa, já que a E, ao ceder a sua posição contratual (quatro dias depois da declaração da Requerida compreendida no doe, n.º 5 junto com o requerimento inicial), garantiu ao cessionário que a Requerida iria celebrar a escritura pública (vide “Na Cláusula 8.ª dessa primeira cessão da posição contratual a E garante que a Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A.R.L., vai proceder ao registo da propriedade horizontal e tratar das formalidades necessárias à celebração da escritura pública” e cláusula 10.º; “O 1.º Outorgante [E] declara que a Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A.R.L. reconhece que o 1.º outorgante tem direito a transmitir ao 2.º outorgante a sua posição contratual como adquirente e vai cumprir as cláusulas 71 e 81 do presente contrato”).
59) Ora, perante o teor destas cláusulas, não é possível afirmar que a Requerida não era considerada como parte contrária naquele contrato-promessa, pelo que deveria apenas ficar provado que “Na 1.ª Cessão de Posição, a Requerida não teve qualquer intervenção.”.
60) Por outro lado, foi também dado como indiciariamente provado que “Na 3.ª Cessão de Posição - a cessão entre a K e A -, não se refere que a Requerida seja a promitente vendedora ou que tenha reconhecido a K, ou o terceiro a quem esta tenha cedido a sua posição, como promitente-comprador” (cfr. matéria constante do ponto Q. dos factos provados) e que “Nesta 3.ª Cessão de Posição, a Requerida não teve qualquer intervenção, não foi ali identificada como promitente vendedora, nem foi afirmado que esta tenha prometido vender à cedente K as fracções do edifício a construir.” (cfr. matéria constante do ponto S. dos factos provados).
61) De todo o modo, sempre se dirá que aquele facto atenta contra o conteúdo do documento em causa, tendo em conta os Considerandos daquele contrato de cessão da posição contratual, onde se diz que: “De acordo com a declaração outorgada pela declarante Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A.R.L., no escritório de advogados Neto Valente, no dia 2 de Dezembro de 1996, a proprietária da referida fracção declarou válido o contrato celebrado em 23/07/1996 entre a D - Sociedade de Investimento e Fomento Predial Limitada e a Companhia de Investimentos Imobiliários E, Limitada, sendo que a Companhia de Investimentos Imobiliários E, Limitada, pode, pelo referido contrato, adquirir a posição contratual como adquirente, e celebrar com qualquer terceiro a transmissão da fracção do referido edifício em construção”.
62) Mais, nas cláusulas 5.ª e 6.ª do contrato de cessão da posição contratual em causa, é ainda dito que caberia ao 2.º outorgante (o ora Requerente) combinar a data da escritura pública de compra e venda (o contrato-prometido!) com a proprietária (ou seja, a Requerida), pelo que é inconcebível considerar que a Requerida não era vista como parte contrária naquele contrato-promessa.
63) A propósito, não se pode deixar de fazer aqui referência ao facto da D ter actuado em representação da Requerida em todo este processo negocial relativo à venda das fracções, tendo tomado conhecimento da cessão da posição contratual da I para a K (cfr. doc. n.º 9) e do facto dos documentos de fls. 343 e 344 dos autos confirmarem que apenas por uma questão interna da Requerida não se poderia avançar com o negócio da cessão da posição contratual entre a K e o Sr. A, o que leva a concluir que a Requerida tinha conhecimento da posição de promitente-comprador da K.
64) Pelo que, quanto muito, deveria apenas ficar provado que: “Na 3.ª Cessão de Posição não se refere que a Requerida tenha reconhecido o terceiro, a quem a K cedia a sua posição, como promitente-comprador.”, facto que é perfeitamente natural, dado que o negócio é celebrado entre duas outras partes e a Requerida não tinha nem podia ser informada do negócio que se estava a concluir.
65) Relativamente ao ponto S. dos Factos Provados, e por razões idênticas, deveria, no limite, ter sido dado como provado que “Na 3.ª Cessão de Posição, a Requerida não teve qualquer intervenção.”
66) Ora, o que está em discussão nos presentes autos é saber se estão verificados os pressupostos de procedência do procedimento cautelar comum: a probabilidade séria da existência do direito do ora Recorrente adquirir, através do instituto da execução específica do contrato-promessa ora em apreço, a propriedade da fracção “B7” do edifício melhor identificado nos presentes autos (v., artigo 326.º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
67) Conforme acima se defendeu, a matéria de facto constante dos n.ºs 8, 9, 16, 18, 19, 23 e 27, que foi dada como provada na sentença de fls. 190 a 206, não deve ser alterada, ao contrário do que foi decidido pelo Tribunal recorrido, mantendo-se assim assente que foi em representação da Requerida que a sociedade comercial D prometeu vender à E o imóvel em causa e que a Requerida veio, no dia 2 de Dezembro de 1996, a ratificar aquele negócio celebrado em seu nome pela D, não restando dúvidas que a cessão de posição contratual era permitida nos termos da cláusula 9.ª do contrato-promessa outorgado pela D, em representação da Requerida, e da E, enquanto promitente-compradora.
68) Pelo que, nos termos do artigo 418.º, n.º 2, do Código Civil, bastaria ao ora Recorrente, notificar a Requerida do contrato de cessão, o que foi feito, aliás, dos factos indiciariamente provados sob os n.ºs 18, 19, 22 e 23 resulta que foram entregues ao representante da Requerida, o seu administrador H, os documentos que titulavam a posição do Requerente como promitente-comprador das fracções “C7” e “D7”, e que este administrador da Requerida afirmou que o Requerente não tinha com o que se preocupar!
69) Donde se retira que, efectivamente, a Requerida foi notificada da aquisição, pelo Requerente, da posição de promitente-comprador das fracções “C7” e “D7”, propriedade da Requerida.
70) Resulta ainda da matéria sob os n.ºs 24 a 27 dos factos provados que a Requerida não tem qualquer intenção de cumprir o contrato-promessa de 23 de Julho de 1996, nomeadamente no que concerne à venda das fracções “C7” e “D7” ao Requerente, ora Recorrente.
71) Donde se verifica o fundado receio de lesão grave ou dificilmente reparável do direito do Requerente, pelo que não estando em causa a adequação ou proporcionalidade da providência cautelar requerida ao conflito de interesses em jogo, deverão V. Ex.ªs considerar o presente recurso procedente e, em consequência, revogar a sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Base e substituí-la por outra que determine o decretamento da providência cautelar conforme requerida.
72) Ainda que se venha a entender que a matéria de facto anteriormente fixada pelo Tribunal poderia ser objecto de revisão, após a oposição da Requerida, sempre se dirá que, ressalvado o devido respeito, o Tribunal recorrido errou no julgamento que fez da matéria de facto em discussão nos presentes autos, conforme se expôs acima, dando-se aqui por inteiramente reproduzidos os apontados vícios na decisão.
73) Como se disse, dos Considerandos do contrato-promessa de 23 de Julho de 1996 - doc. n.º 1 junto com o requerimento de oposição - resulta que a D, enquanto alegada futura sócia única da Requerida, prometeu alienar, em nome e por conta da Requerida, todas as fracções autónomas do prédio melhor identificado nos autos.
74) Tal facto retira-se não só dos considerandos previstos no contrato-promessa mas, também, das cláusulas contratuais que prevêem várias obrigações para a Requerida, entre as quais, a de celebrar o contrato definitivo, facto que bastará para afastar a qualificação da D como promitente-vendedora, uma vez que não se comprometeu a vender o que quer que fosse, para além de se prever a elaboração de um documento que titule aquela promessa directamente com a Requerida, o que implica necessariamente que o contrato-promessa de 23 de Julho de 1996 foi celebrado por interposta pessoa, no caso, a D, em representação da Requerida.
75) Factos que são confirmados pelo teor da declaração da Requerida de 2 de Dezembro de 1996, emitida porque a E pretendia cederem a sua posição contratual (conforme o ponto N. dos factos provados indiciariamente), a qual nada mais é que a ratificação pela Requerida do negócio celebrado em seu nome pela D, e ainda pelos documentos de fls. 343 e 344 juntos pelo Requerente, ora Recorrente.
76) Note-se, aliás, que a E apenas começou a ceder a sua posição contratual depois de ter obtido a ratificação do negócio por parte da Requerida, dando-se ainda o caso das várias cessões de posição contratual tratarem sempre a Requerida como a parte contrária no negócio, designadamente a 1.ª Cessão de Posição Contratual, na qual a E garantiu que a Requerida iria tratar das formalidades necessárias à celebração da escritura pública (cfr. facto indiciariamente provado sob o ponto P.).
77) Não tendo o menor cabimento que um administrador da Requerida, que se apresentou como o representante do projecto, tivesse requerido o pagamento de uma diferença do preço de construção se, efectivamente, o Requerente não fosse promitente-comprador e se a Requerida considerasse que não tinha recebido qualquer quantia pela venda daquelas fracções (cfr. facto indiciariamente provado sob o n.º 19).
78) Pelo exposto, não pode afirmar-se que a Requerida é completamente alheia ao contrato-promessa e que não teve qualquer intervenção em todo este processo negocial, até porque estava contratualmente prevista a confirmação do negócio por parte da Requerida (confirmação que foi efectuado através do documento de fls. 99 dos autos)?
79) Acresce que as teses sufragadas pela Requerida são absolutamente implausíveis, dado que não há aqui nenhuma promessa de venda de bem alheio como futuro, pois nem sequer há bem futuro, porquanto o prédio objecto do contrato-promessa de 23 de Julho de 1996 não viria a ser propriedade da D, razão pela qual, a Requerida se vê forçada a utilizar conceitos jurídicos inexistentes, como o da “titularidade indirecta” de bens para sustentar a sua tese.
80) Em suma, tem o ora Recorrente o direito à execução específica do contrato-promessa.
81) Considerando que a Requerida já manifestou a sua intenção de não cumprir o contrato-promessa em causa, nomeadamente através da celebração de um outro contrato-promessa que tem por objecto as mesmas fracções autónomas “C7” e “D7”,
82) Não subsistem quaisquer dúvidas quanto à verificação dos requisitos relativos à aparência de existência do direito do Recorrente e do fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável a esse direito, sendo manifestamente adequada e proporcional, atento os interesses em jogo, a providência cautelar requerida nos presentes autos.
83) Ainda que se entenda que não se verificou qualquer erro de julgamento no que toca à matéria de facto, sempre se dirá que mal andou o Tribunal recorrido na apreciação do sentido da declaração negocial emitida pela Requerida e consubstanciada no Doc. n.º 5 junto com o requerimento inicial, nomeadamente quanto ao entendimento que um declaratório normal teria em face daquele documento.
84) Não se pode olvidar que os declaratórios, no caso, eram a E (cfr. facto provado sob o ponto N. (2ª parte)) e os respectivos cessionários, sendo que a Requerida bem sabia que esta pretendia aquela declaração para poder ceder a posição contratual, daí que considerando o entendimento que foi dado pela E e pelos demais cessionários, parece claro que um declaratório normal entenderá a declaração da Requerida como, no mínimo, uma assunção das obrigações do contrato-promessa, uma promessa de cumprimento.
85) A determinação da vontade real das partes nas declarações negociais constitui matéria de facto, da exclusiva competência da 1.ª instância, só cabendo ao TSI exercer censura sobre o resultado interpretativo quando, tratando-se da situação prevista no n.º 1 do artigo 228.º do Código Civil, tal resultado não coincida com o sentido que um declaratório normal, colocado na posição do real declaratório, pudesse deduzir do comportamento do declarante.
86) Sendo que essa questão é de direito e, como tal, pode e deve ser conhecida pelo Tribunal ad quem, na medida em que a interpretação efectuada pelo Tribunal recorrido é feita ao arrepio de critérios normativos - contrariando a teoria da impressão do destinatário acolhida no n.º 1 do artigo 228.º do Código Civil.
87) Não sendo possível aceitar que um declaratório normal não entendesse a declaração emitida pela Requerida como uma promessa de cumprimento, a Requerida sempre estaria vinculada ao cumprimento do contrato-promessa do qual o ora Recorrente é promitente-comprador, pelo que se verificam, também assim, todos os requisitos legais para o decretamento da providência cautelar, conforme acima exposto.
Nestes termos deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a sentença proferida, devendo ser substituída por outra que decrete a providência cautelar requerida, em especial que:
a) Ordenar à Requerida que se abstenha de vender, prometer-vender e/ou transmitir, por qualquer outro meio, as fracções “C7” e “D7” do prédio urbano sito em Macau, no…, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º…, a fls…, do Livro…;
b) Ordenar à Requerida que se abstenha de celebrar quaisquer contratos de natureza obrigacional ou real com a “COMPANHIA DE INVESTIMENTO J, LIMITADA” ou com qualquer outro terceiro, que tenham por objecto as mesmas fracções;
c) Ordenar a Direcção de Serviços para os Assuntos de Justiça da RAEM para notificar todos os notários públicos e privados para se absterem de intervir em quaisquer contratos que tenham por objecto as mesmas fracções “C7” e “D7”, nos termos acima mencionados».
*
A requerida/recorrida, por seu turno, respondeu ao recurso, nos seguintes termos conclusivos:
«A) Entende a Recorrida que andou mal o Tribunal a quo ao fixar efeito suspensivo ao presente recurso, pelo que deverá ser, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 619.º do CPC, corrigido esse efeito, passando o mesmo a ter efeito meramente devolutivo ao abrigo do disposto na alínea e) do artigo 605.º e 607.º, ambos do CPC;
B) Não obstante a falta de indicação da violação do preceito legai que fundamenta a posição do Recorrente quanto à alteração da matéria de facto anteriormente fixada, sempre se dirá que, andou bem o Tribunal a quo e que a decisão recorrida não merece qualquer reparo no que diz respeito à alteração da matéria de facto fixada na sentença que inicialmente decretou a providência cautelar sem audiência da Recorrida;
C) Tendo a sentença recorrida fundado a decisão sobre a matéria de facto também no depoimento das testemunhas ouvidas, não pode o Tribunal ad quem atender ao recurso do Recorrente no que à impugnação da matéria de facto diz respeito, por não ter à disposição todos os meios de prova analisados pelo tribunal recorrido, ou seja, por não ter à disposição a gravação do depoimento das testemunhas em causa, sob pena de violação da alínea a) do n.º 1 do artigo 629.º do CPC, e, bem assim, dos princípios da imediação e da livre apreciação da prova;
D) O Recorrente alegou apenas que a D agiu em representação da Recorrida, não tendo alegado também que agiu por conta da Recorrida (o qual levaria à ponderação da aplicação do instituto da gestão de negócios), pelo que não pode agora vir alegar que a D agiu por conta da Recorrida, como faz nos artigos 24.º, 26.º, 45.º, entre outros; neste sentido, não poderá o Tribunal ad quem ter em consideração as novas afirmações feitas aqui pelo Recorrente quanto à possibilidade de a D ter agido por conta da Recorrida, em gestão de negócios;
E) Ainda assim, a D não agiu em representação, no interesse ou por conta da Recorrida na celebração do Contrato Promessa de 23 de Julho de 1996, na medida em que aquela tinha a expectativa de adquirir a totalidade das acções da Recorrida, e, quando assim tosse, a disposição dos bens que integram o acervo patrimonial da Recorrida ou a celebração de quaisquer outros actos jurídicos por parte desta iriam, única e exclusivamente, depender da vontade e beneficiar a que, de modo expectável, se poderia vir a tornar na sua accionista única, ou seja, a D;
F) O Contrato Promessa não determina a realização, pela Recorrida, de todos os actos inerentes à posição de promitente compradora, como peremptoriamente afirma o Recorrente, mas sim que a D se obrigou a interceder junto da Recorrida nesse sentido, o que é totalmente diferente;
G) Deixando de parte a questão da representação, acima já esclarecida, sempre se dirá que a argumentação da interposta pessoa, não só é nova, não podendo por isso ser atendida pelo Tribunal de recurso, como não faz qualquer sentido, pois que, com ela só pode o Recorrente estar a fazer referência ao instituto da simulação, o que claramente não aconteceu;
H) Mais, o conhecimento que determinada pessoa tem de determinado facto não é matéria conclusiva e traduz-se, no caso concreto, na vontade real das partes aquando da celebração do contrato, bem como na interpretação que dele fizeram. Logo, tal matéria não é conclusiva, mas sim de facto - como, aliás, bem sabe o Recorrente, ao afirmar, no artigo 180.º das suas alegações que a determinação da vontade real das partes constitui matéria de facto;
I) Face ao que acima ficou exposto, não merece reparo a decisão recorrida no que diz respeito à matéria de facto sob os n.ºs 8.º, 16.º e 27.º e nos pontos e) e i);
J) Decidiu bem o Douto Tribunal a quo ao dar como não provado o facto constante do n.º 30.º do Requerimento Inicial, pois que já tendo concluído que a Recorrida não é parte contratante, nem teve qualquer intervenção no aludido Contrato Promessa de 23 de Julho de 1996, nunca poderia permanecer provado que “A Companhia de Investimento J, Limitada, estava bem ciente da existência do contrato-promessa celebrado pela ora Requerida em 23 de Julho de 1996 e das cessões da posição contratual”;
K) A declaração junta como Doc. n.º 5 com o Requerimento Inicial, interpretada no contexto do Contrato Promessa junto pela Recorrida com a sua Oposição, não pode ser vista como a ratificação de qualquer negócio, como bem decidiu o Tribunal a quo;
L) Com efeito, essa declaração não mais é do que um documento que visava dotar a E - promitente compradora no Contrato Promessa - de um instrumento que, na cedência da sua posição contratual a terceiros, porque o contrato tinha corno objecto um bem alheio como bem futuro, facilitasse o inicio do processo negocial no sentido da angariação de fundos junto das instituições bancárias que financiassem a aquisição dos imóveis - desta declaração não se retira que a Recorrida tenha aceite e se tenha submetido às obrigações decorrentes do Contrato Promessa;
M) Os factos sob os pontos o), q) e s) correspondem a factos novos que a Requerida trouxe aos autos, pois que não foram alegados pelo Recorrente, e que têm suporte em documentos que já constavam dos autos - sendo factos novos, pode, e deve, o Tribunal tê-los em conta, nos termos do artigo 333.º do CPC, o que fez, e bem, na sentença recorrida, a qual, assim, não merece reparo nesta questão;
N) Face ao exposto e analisados todos os factos considerados, e bem, como provados, só se pode concluir, tal como fez o Douto Tribunal a quo, que a Recorrida, pese embora proprietária das fracções autónomas que são objecto do Contrato Promessa e subsequentes cessões da posição contratual, nunca foi, nem é, parte em quaisquer desses contratos, não foi representada neles pela D - promitente vendedora no contrato-promessa original -, nem nunca ratificou por qualquer meio ou se obrigou por qualquer forma perante todo ou qualquer promitente-comprador nessa cadeia de negócios jurídicos;
O) Pelo que, porque o objecto do litígio tal como configurado pelo Requerente, ora Recorrente, é a execução específica de um contrato-promessa sobre uma fracção autónoma da qual a Recorrida é titular mas, por ser esta, como já referido, completamente alheia aos aludidos contratos-promessa e ulteriores cessões da posição contratual, não se poderá preencher o requisito da aparência ou da probabilidade séria da existência do direito invocada pelo Recorrente, logo nunca poderá a providência requerida ser decretada;
P) Com efeito, e conforme ficou provado, a D prometeu vender, no seu próprio interesse, nome e conta, um bem que não lhe pertencia, tendo o promitente comprador disso conhecimento, tal como consta do Considerando do Contrato Promessa (e como ficou provado no facto sob o ponto i) da matéria de facto provada);
Q) Nos termos do artigo 882.º do CC, a venda de bem alheios é nula, sendo, no entanto, pacífico, que a sua promessa é válida (entre outros, veja-se GALVÃO TELLES, Direito das Obrigações, pág. 109, ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 5a ed, pág. 326);
R) Mais, determina o artigo 883.º do CC que a venda de bens alheios fica, porém, sujeita ao regime da venda de bens futuros, se as partes os considerarem nesta qualidade - o que assim fizeram (vide facto provado sob o n.º 18.º i);
S) Deste modo; o Contrato Promessa corresponde, assim, à promessa de venda de bem alheio como bem futuro, nos termos do artigo 883.º CC, seguindo assim o regime da venda de bens futuros, que determina, nos termos do artigo 870.º do CC que, na venda de bens futuros, o vendedor fica obrigado a exercer as diligências necessárias para que o comprador adquira os bens vendidos, segundo o que for estipulado ou resultar das circunstâncias do contrato - tal como aconteceu no Contrato Promessa (nomeadamente, nas cláusulas 6.a e 7.a);
T) Mais, como considerou a sentença recorrida, a declaração da Recorrida (Doc. n.º 5) não pode ser entendida, por um declaratário normal, como ratificação, nem como promessa unilateral de venda, pelo que a mesma não vincula a Recorrida, nem é fonte de obrigações perante o Recorrente;
U) Com efeito, qualquer declaratório na posse do Contrato Promessa (e conhecedor dos seus termos, nomeadamente, do Considerando, da cláusula 6,0 e da cláusula 7.ª) - que não era o caso do Recorrente, que assumiu uma posição contratual num contrato cujos termos desconhecia (não sendo essa a prática normal ou comum, como bem salienta a sentença recorrida) - não poderia interpretar o Doc. n.º 5 como o interpretou o Recorrente;
V) Sendo certo que o mesmo sabia, ou não tinha como desconhecer, que os direitos que adquiriu eram frágeis ou sujeitos a risco, pois que acordou com o cedente que lhe fossem concedidos direitos de representação desse mesmo cedente, no âmbito da sua posição de promitente comprador, motivo pelo qual foi outorgado, no mesmo dia da celebração do contrato de cessão de posição contratual, um substabelecimento dando-lhe poderes para representar a promitente compradora da fracção B7 perante a Recorrida;
W) Face à prova produzida nos autos, entende a Recorrida que andou bem o Tribunal a quo, não tendo violado o n.º 1 do artigo 228.º do Código Civil, como alega o Recorrente - em suma, não sendo o Recorrente titular do direito que invoca contra a Recorrida, não está, desde logo, preenchido o primeiro requisito para o decretamento da presente providência cautelar, nos termos do n.º1 do artigo 326.º do CC, pelo que andou bem o Tribunal a quo ao revogar a anterior decisão de decretamento da providência cautelar;
X) Ainda que se considerasse que a D agiu em representação da Recorrida e que esta ratificou o negócio, por via da declaração junta como Doc. n.º 5 com o Requerimento Inicial, salienta-se que a Recorrida declarou que apenas reconheceria a validade do contrato de cessão de posição contratual que a E celebrasse com terceiros - isto é o que resulta do teor do documento e do facto provado sob o n.º 10 - logo, como o Recorrente não adquiriu a sua posição contratual directamente da E, a Recorrida não se encontraria; sob a óptica da tese da ratificação, que não se aceita, vinculada é reconhecer a alegada qualidade de promitente comprador, pelo que, também assim, não poderia a presente providência cautelar ser decretada.
Nestes termos, e nos mais de Direito aplicáveis, deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se a douta decisão recorrida de fls. 406 a 421, em toda a sua plenitude, Fazendo, mais uma vez, V. Exas. a costumada JUSTIÇA».
*
Cumpre decidir.
***
II – Os Factos
A sentença impugnada deu por assente a seguinte factualidade:
«Mantêm-se os seguintes factos constantes na sentença que anteriormente decretou a providência cautelar:
I. A Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A., é uma sociedade comercial anónima, com sede em Macau, na…(澳門…), matriculada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º…, que tem por objecto social a “indústria de construção civil, fomento imobiliário, compra, venda e administração de propriedades”.
2. A Requerida é a titular do direito resultante da concessão por arrendamento do prédio urbano sito em Macau, no…, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º…, a fls. .., do Livro….
3. A referida concessão por arrendamento, para a construção de um aterro inserido no projecto do fecho…, havia sido inicialmente registada na Conservatória do Registo Predial, a favor da Sociedade de Investimentos L, S.A.R.L., em 8/08/1991, sob a inscrição n.º… do Livro ….
4. Posteriormente, e com base no Despacho n.º 94/SATOP/94, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 30, de 27/07/1994, aquele direito resultante da concessão por arrendamento foi transmitido pela Sociedade de Investimentos L, S.AR.L., à Requerida.
5. Encontra-se ainda registada uma hipoteca legal incidente sobre o direito resultante da concessão por arrendamento daquele prédio, inscrita a favor do Banco Industrial e Comercial da China (Macau), S.A, com fundamento na abertura de crédito em concessão de facilidades bancárias gerais, até ao montante de HKD250.000.000,00.
6. Bem como uma consignação de rendimentos incidente sobre o mesmo direito resultante da concessão por arrendamento daquele prédio, inscrita a favor do Banco Industrial e Comercial da China (Macau), S.A, no valor de HKD250.000.000,00.
7. No dia 30 de Maio de 2013, foi registada provisoriamente a constituição da propriedade horizontal do referido prédio, conforme inscrição n.º… do Livro….
8. Em 23 de Julho de 1996, a empresa D - Sociedade de Investimento e Fomento Predial Limitada, sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada, com sede em Macau, na…, matriculada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º…, prometeu vender à Companhia de Investimentos Imobiliários E, Limitada, sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada, com sede em Macau, na…, matriculada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º…, todas as fracções autónomas, destinadas a comércio e escritório, do referido prédio.
9. Vindo a ora Requerida, por documento datado de 2 de Dezembro de 1996, a declarar válido o referido contrato-promessa de 23 de Julho de 1996.
10. No mesmo documento, a ora Requerida deu o seu consentimento prévio à Companhia de Investimentos Imobiliários E, Limitada, na qualidade de promitente-compradora, para ceder a quaisquer terceiros a sua posição contratual, com referência a todas as fracções do referido prédio.
11. O documento em causa (doc. n.º 5 junto com o requerimento inicial) foi assinado por dois administradores da Requerida, um dos quais o Sr. F que é sócio-administrador da promitente-compradora (Companhia de Investimentos Imobiliários E, Limitada) desde Fevereiro de 1994 até ao presente, sendo ainda sócio-administrador do Grupo A da D - Sociedade de Investimento e Fomento Predial Limitada desde 1993 até aos dias de hoje.
12. Nestes termos, e mediante contratos datados de 6 de Dezembro de 1996, a Companhia de Investimentos Imobiliários E, Limitada veio a ceder a sua posição contratual (de promitente-compradora) à Agência Comercial I, Limitada, sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada, com sede em Macau, na…, matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o n.º….
13. Os referidos contratos de cessão da posição contratual limitaram o seu objecto às fracções autónomas “C7” e “D7”, a que correspondem o 7.º andar “C” e 7.º andar “D”, do referido prédio urbano.
14. A Agência Comercial I, Limitada celebrou dois contratos através dos quais adquiriu a posição contratual de promitente-comprador das fracções “C7” e “D7” pelos quais prestou, respectivamente, um montante de MOP2.108.410,00, correspondente a HKD2.047.000,00, e de MOP2.108.410,00, correspondente a HKD2.047.000,00, valores integralmente realizados.
15. Posteriormente, e através de contratos celebrados em 26 de Agosto de 1998, a Agência Comercial I, Limitada cedeu a sua posição contratual de promitente-compradora à Empresa de Importação e Exportação K, Limitada, sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada, com sede em Macau, na… (澳門…), matriculada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º…, que tem por objecto social a “importação e exportação de grande variedade de mercadorias”.
16. Nesse contrato, a D-Sociedade de Investimento e Fomento Predial Limitada, através dos seus dois sócios e administradores, F e G, confirmaram esta cessão da posição contratual.
17. Em 11 de Março de 2005, a referida Empresa de Importação e Exportação K, Limitada, cedeu a sua posição contratual de promitente-compradora das fracções “C7” e “D7” ao Requerente.
18. Desde essa altura, o ora Requerente tem mantido várias reuniões com o Sr. H, que naquela altura declarou ser representante do projecto, para discutir todos os assuntos relacionados com as fracções em causa e a outorga do contrato definitivo de compra e venda daqueles imóveis a seu favor, tendo informado o Sr. H de que tinha adquirido a posição de promitente-comprador, no que se refere às fracções “C7” e “D7”, por diversas ocasiões.
19. No decurso de uma das reuniões em causa, o Sr. H, já nomeado como administrador da Requerida, disse inclusivamente ao Requerente que, este, terá que ou deverá pagar a diferença do preço de construção, no valor de HKD649.00, o equivalente a MOP668.47, por pé quadrado.
20. (x).
21. (x).
22. No dia 5 de Novembro de 2012, aquelas pessoas voltaram a reunir-se no mesmo local, tendo o ora Requerente apresentado ao Sr. H, mais uma vez, todos os documentos que titulavam a sua posição de promitente-comprador como o Requerente se entendeu, nomeadamente o contrato de cessão celebrado com a Empresa de Importação e Exportação K, Limitada.
23. O Sr. H tinha declarado que o ora Requerente não teria com o que se preocupar.
24. No dia 31 de Maio de 2013, a ora Requerida apresentou, junto da Conservatória do Registo Predial, um requerimento para registo da aquisição (provisória), nos termos consentidos pelo artigo 41.º, n.º I, do Código do Registo Predial, das fracções autónomas designadas por AC/V3-66, DR/C, LR/C, MR/C, H1, A5, B5, C5, A7, B7, C7, D7, H7, A11, G17, B20, C20 e H20, a favor da COMPANHIA DE INVESTIMENTO J, LIMITADA, sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada, com sede em Macau, na…(澳門…), matriculada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis sob o n.º….
25. Declarando a Requerida que prometeu vender à COMPANHIA DE INVESTIMENTO J, LIMITADA, todas as 18 fracções acima mencionadas, através dum contrato-promessa de compra e venda unilateral.
26. Foram juntos, com aquele requerimento, documentos comprovativos do pagamento do imposto do selo devido pelo referido contrato-promessa, sendo que nesses documentos se refere expressamente que o contrato-promessa fora outorgado no dia 8 de Maio de 2013.
27. A Requerida prometeu vender e mandou registar a aquisição, a título provisório, de 18 fracções, onde se incluem as fracções “C7” e “D7”.
28. Não foi possível, até agora, celebrar o contrato definitivo porquanto ainda não foi emitida a licença de utilização relativa ao edifício.
29. É intenção da Requerida transferir, ioga que passível, o direito de propriedade sobre aquelas 18 fracções para a COMPANHIA DE INVESTIMENTO J, LIMITADA.
30. (x).
31. A sociedade J tem a sua sede precisamente no mesmo local que a Requerida.
Os factos alegados no requerimento da oposição:
a. A Requerida nunca recebeu qualquer quantia a título de sinal, antecipação de pagamento ou a qualquer outro título no âmbito dos contratos juntos pelo Requerente aos autos (7.º do requerimento da oposição).
b. Algum tempo antes da celebração do contrato-promessa com a E, a D prometeu comprar a totalidade do capital social da Requerida por contrato promessa de cessão de acções de 23 de Julho de 1993 (8.º da peça).
c. A D tinha, assim, a legitima expectativa de vir a adquirir a totalidade do capital social da Requerida (9.º da peça).
d. A D esperava adquirir o controlo total da Requerida e, em consequência, o dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do prédio urbano sito em Macau, no…de que a Requerida era, e é, titular (10.º da peça).
e. A D decidiu, no seu interesse próprio e não no interesse da Requerida, prometer vender a terceiros os direitos resultantes da concessão em causa, de que ainda não era titular, mas que contava vir a ser indirectamente num futuro próximo (11.º da peça).
f. No cabeçalho do Contrato Promessa a D vem identificada claramente como “promitente vendedora”, dali em diante designada por “Primeira Contratante”, sendo a E identificada como “promitente compradora”, dali em diante designada por “Segunda Contratante” (15.º da peça).
g. No considerando do Contrato Promessa lê-se que a D prometeu comprar, por contrato de 23 de Julho de 1993, a totalidade do capital social da “Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A.R. L.”, a aqui Requerida (16.º da peça).
h. No mesmo Considerando é claramente identificada a Requerida como titular dos direitos resultantes da concessão, por arrendamento, do prédio urbano sito em Macau, no…onde ia ser construído o edifício cujas fracções são prometidas vender (17.º da peça).
i. Ambas as partes contratantes sabiam que a promitente vendedora no Contrato Promessa não era a titular dos direitos sobre as fracções a construir e objecto do Contrato Promessa (18.º da peça).
j. Na Cláusula 5.a desse mesmo Contrato que “O edifício será gerido por uma companhia de administração designada pela Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A.R.L. para manter a salubridade ambiental e a manutenção dos elevadores (…) ” (21.º da peça).
k. A Cláusula 6.a do Contrato Promessa estabelece que “A Primeira Outorgante [a D] obriga-se a promover junto da Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.AR.L. todos os actos necessários à confirmação, por parte desta, junto de instituições bancárias financiadoras da aquisição de uma ou mais das fracções que compõem o edifício do Lote 6, da legitimidade da Segunda Contratante, ou de qualquer terceiro por ela devidamente indicado, em outorgar promessas de hipoteca e/ou contratos tripartidos que tenham por objecto uma dada fracção, ou fracções, do referido edifício.” (22.º da peça).
l. No segundo parágrafo da Cláusula 6.a lê-se ainda que “A confirmação referida no número anterior, a prestar pela Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.AR.L., poderá ser efectuada, se necessário, através da formalização de um instrumento que titule a promessa de compra e venda a celebrar directamente com a referida Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.AR.L. para efeitos de apresentação junto da respectiva instituição bancária.” (23.º da peça).
m. A Cláusula 7.a desse mesmo Contrato estipula que “A Primeira Contratante [D] obriga-se também a promover junto da Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.AR.L. todos os actos necessários ao registo da propriedade horizontal do edifício projectado para o Lote 6, logo após a sua conclusão e emissão da respectiva licença de ocupação, bem como à marcação da escritura, ou escrituras, de compra e venda das referidas fracções autónomas no prazo de 1 (um) mês após o registo da propriedade horizontal, salvo se as partes acordarem noutro prazo.” (25.º da peça).
n. Como o capital social da Requerida ia ser adquirido, na totalidade, pela D e porque a E pretendia ceder a sua posição contratual, a Requerida emitiu, uns meses depois da celebração do Contrato Promessa, a declaração datada de 2 de Dezembro de 1996 junta ao requerimento inicial como Doc. n.º 5 (27.º da peça).
o. Na 1.a Cessão de Posição - a cessão entre a E e a I -, a Requerida não teve qualquer intervenção, não foi identificada como promitente vendedora, nem foi afirmado que esta tenha prometido vender à cedente as fracções do edifício a construir (35.º da peça).
p. Na Cláusula 8.a a E garante que a Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A.R.L., ora Requerida e não identificada como parte no contrato do qual se cede a posição, vai proceder ao registo da propriedade horizontal e tratar das formalidades necessárias à celebração da escritura pública (36.º da peça).
q. Na 3.a Cessão de Posição - a cessão entre a K e A -, não se refere que a Requerida seja a promitente vendedora ou que tenha reconhecido a K, ou o terceiro a quem esta tenha cedido a sua posição, como promitente-comprador (48.º da peça).
r. Nos termos da Cláusula 3.a desta 3.a Cessão de Posição, a K, que cedeu a sua posição de promitente compradora, outorgou duas procurações que entregou ao Requerente, para que este representasse aquela, na qualidade de promitente compradora, no tratamento das formalidades e procedimentos relacionados com as outorgas das escrituras de compra e venda (50.º da peça).
s. Nesta 3.a Cessão de Posição, a Requerida não teve qualquer intervenção, não foi ali identificada como promitente vendedora, nem foi afirmado que esta tenha prometido vender à cedente K as fracções do edifício a construir (53.º da peça).
t. Na verdade, a D nunca chegou a ser, nem é, accionista da Requerida (61.º da peça).
***
III – O Direito
1 – A situação de facto
A, instaurou no TJB uma providência cautelar, tendente a obter uma sentença que inibisse a requerida, “Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A.R.L.”, de vender e/ou transmitir por qualquer meio as fracções “C7” e “D7” de um prédio urbano ali melhor identificado, das quais que se dizia ser promitente-comprador por efeito da aquisição da posição contratual de “K, Ld”.
Pois bem. Para melhor se perceber o enquadramento factual, importa que nos embrenhemos nos meandros negociais sucessivos que aqui tiveram lugar, expurgados para já de alguns aspectos de pormenor menos interessantes, nomeadamente os que dizem respeito à completa designação das sociedades que abaixo referiremos.
1º - “L, SARL” foi titular da concessão por arrendamento de um terreno para construção.
2º - “C, SA” (ora requerida) viria a suceder àquela sociedade na titularidade da referida concessão.
3º - “D” prometeu comprar a totalidade do capital social (acções) de “C, SA” por contrato de promessa de cessão de acções de 23/07/1993;
4º - “D” em 23/07/1996 prometeu vender todas as fracções autónomas a construir no referido terreno a “E, Ldª”;
5º - “E Ldª” em 6/12/1996 cedeu a sua posição contratual a “I, Lda” (1ºcessão);
6º - “I, Lda”, em 26/08/1998 cedeu a sua posição contratual relativamente às fracções “C7” e “D7” a “K, Ldª” (2ª cessão);
7º - “K, Ldª”, em 11/03/2005 cedeu a posição contratual relativamente àquelas fracções a A, ora requerente (3ª cessão).
8º - “C, SA” (ora requerida), em 31/05/2013 celebrou contrato de promessa de venda das fracções autónomas identificadas no doc. de fls. 46 e sgs,, entre as quais se incluem as “C7” e “D7” acima aludidas a “J, Limitada”.
*
2 – A decisão da providência
O tribunal “a quo”, sem ouvir a requerida, decretou a providência, por entender ser séria a probabilidade de estar perante um direito à execução legítima do contrato de promessa e por considerar existir fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável desse direito (“periculum in mora”).
Ouvida a requerida em sede de oposição, teve lugar oportunamente a produção de prova testemunhal e documental.
A seu tempo veio a ser proferida a segunda decisão dos autos, que julgou procedente a oposição, o que, em consequência, determinou a revogação da providência anteriormente decretada1.
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3 – A matéria do recurso
No que respeita aos fundamentos do recurso, estamos perante uma quase duplicação dos utilizados no recurso jurisdicional que deu origem ao aresto deste TSI proferido no Proc. nº 591/2014, que também versava sobre os mesmos factos num litígio que opõe exactamente as mesmas partes.
Podia-se, aliás, remeter na íntegra para o teor do aludido aresto (proferido no dia 12/02/2015), sendo até certo que estaríamos perante uma situação que podia ser resolvida pela via da apensação de processos.
Vamos, não obstante, fazer a remissão parcelar, em função de cada um dos temas a abordar.
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3.1 - Conclusões 1) a 4)
Nelas o recorrente insurge-se contra a circunstância de o mesmo tribunal ter na 2ª sentença (que julgou procedente a oposição) alterado a anterior matéria de facto fixada na primeira sentença (que decidiu julgar procedente a providência).
Com a devida vénia, remetemos para o que sobre o assunto foi dito no aludido acórdão proferido em 12/02/2015, pelo TSI, no âmbito do recurso 591/2014:
  «Não faz sentido que após a audição da parte contrária o juiz não possa alterar os factos, desmentidos pelos novos factos e provas apresentadas pela parte contrária. Para que serviria, então, essa audição?
  Refugia-se o recorrente num argumento, qual seja o de que se não houver factos novos, os que foram primeiramente fixados permanecem imutáveis, porventura numa interpretação restritiva do disposto no art. 333º, n.º, b) do CPC. Mas esquece-se que é a própria norma que prevê que o requerido pode deduzir oposição quando pretenda alegar factos novos ou fazer uso de meios de prova não considerados pelo tribunal.
  Para além de que a negação de um facto articulado pelo requerente implica, no fundo, a alegação do facto contrário. No caso, o que está essencialmente em causa é saber se a sociedade “D” decidiu, no seu próprio interesse e não no interesse da requerida, prometer vender a terceiros os direitos resultantes da concessão em causa de que contava vir a ser titular indirectamente num futuro próximo.
  Este é um facto alegado pela requerida e que preenche a aludida previsão normativa.
  Aliás, na sentença final, proferida após oposição (fls 311 v.) referem-se exactamente quais os factos que vieram a ser considerados e que foram alegados no requerimento de oposição.
  Acresce que foram indicadas outras provas, testemunhal e documental, para além da apresentada num primeiro momento, o que não deixa igualmente de preencher a previsão do citado artigo 333º, n.º1, b).
  4.3. Invoca ainda o recorrente em termos de jurisprudência comparada acórdão do Supremo Tribunal de Justiça para fundamentar a sua tese.
  Por vezes pode ser precipitado o recurso ao mero conteúdo do sumário de um acórdão para se apreender o seu real sentido.
  No ac. do STJ, processo 00A382 de 6/6/2000, que não o proc. 1425/99 (sendo esse o n.º do Tribunal da Relação), escreveu-se
  “Examinadas as provas produzidas, o arresto é decretado, sem audiência da parte contrária, desde que se mostrem preenchidos os requisitos legais - artigo 408, n. 1. Para a fixação da matéria de facto, o juiz, finda a produção da prova, declara quais os factos que julga provados e não provados - artigo 304, n. 5, aplicável aos procedimentos cautelares por força do disposto no artigo 384, n. 3.
  Fixada a matéria de facto e proferida decisão a aplicar o direito aos factos, decretando-se ou não o peticionado arresto, encerra-se a primeira parte deste procedimento cautelar.
  Sendo decretado o arresto, como foi o caso dos autos, o requerido, notificado da decisão, pode deduzir oposição - artigo 388, n. 1, alínea b).
  Deduzida esta oposição, abre-se efectivamente o contraditório, contraditório esse que não põe em causa a anterior fixação da matéria de facto, pois que a oposição tem por finalidade a apresentação de outros factos que não foram anteriormente tidos em conta, dado que o requerido ainda não havia sido ouvido, de modo a afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução.
  Com esta segunda fase da providência cautelar não se põe em causa a fixação da matéria de facto anteriormente consignada nos autos, a qual, conjugada com os novos factos, há-de levar à decisão de manter ou não o arresto anteriormente decretado.
  Assim, nada impede que seja um outro juiz a decidir a nova matéria de facto, desde que fosse ele a assistir à produção da nova prova.
  Por isso, não se mostra violado o disposto no n. 1 do artigo 654º, pois a fixação da matéria de facto em cada uma das fases do processo de arresto foi feita por cada um dos juízes que presidiu à respectiva produção de prova.”
  O que estava aí em causa primacialmente era saber se o julgamento final da providência podia ou não ser diferente do que julgara num primeiro momento o arresto.
  O que aí se significa com a expressão “ não se põe em causa a fixação da matéria de facto anteriormente consignada nos autos” é que ela não possa ser alterada, o que se extrai logo nas palavras seguintes a tal expressão, mas sim, que essa matéria conjugada com a globalidade dos novos factos, onde se podem incluir também os factos contrários, bem como da análise das novas provas se se deve manter ou não a primeira decisão. Ou seja, o que se diz, ainda que da forma não mais feliz é que os factos fixados num determinado contexto processual permanecem os mesmos, mas depois das provas e dos factos que os desmintam podem ser alterados, pois só assim se poderá alterar o que foi anteriormente decidido.
  Tudo isto de forma a apurar se o juiz da oposição podia ou não ser diferente do que julgara a providência sem a aposição, para se concluir que sim e que, no fundo, os factos que foram primeiramente indiciariamente dados como provados não têm que ser mexidos pelo segundo juiz, limitando-se este, nesta fase, a pronunciar-se sobre os novos factos e provas que, como é óbvio podem abalar o juízo anteriormente elaborado.
  (…)
  4.5. Este entendimento decorre igualmente da Jurisprudência do TUI2, enquanto aí se afirmou:
  “Neste sentido vai a Jurisprudência do Tribunal de Última Instância, firmada no Acórdão proferido no dia 30 de Maio de 2008, no âmbito do processo n.º 22/2007, no qual se pode ler:
  " É certo que a fase de oposição à providência cautelar decretada destina-se apenas para a parte requerida a alegar factos principais ou instrumentais ou fazer uso de meios de prova não considerados pelo tribunal, o que não implica que o tribunal que julga a oposição só pode apreciar as provas produzidas no julgamento desta para proferir uma decisão de manutenção, redução ou revogação da providência anteriormente decretada.
  Independentemente da possibilidade de a parte requerente exercer o contraditório relativo à oposição1 e da prescrição do art.º 331.º, n.º 1 do CPC, aplicável ao julgamento da oposição por força do art.º 333.º, n.º 1, al. b) do mesmo Código, de que serão produzidas apenas as provas requeridas ou oficiosamente determinadas pelo juiz, o tribunal que julga a oposição pode reapreciar as provas produzidas na audiência que decretou a providência cautelar e deve assim proceder sempre que se mostre necessário.
  A decisão que decreta a providência cautelar com dispensa da audição de requerido tem natureza provisória, especialmente a parte de matéria de facto, dependente do sentido da decisão a tomar sobre a oposição apresentada por requerido. O julgamento da oposição confere “a possibilidade de revisão da convicção anteriormente formada, através de novos meios de prova ou de novos factos com que o tribunal não pôde contar.”
   “No final cumprirá ao juiz proferir a decisão da matéria de facto, acompanhada da apreciação crítica das provas produzidas, eventualmente, contrapondo-as àquelas em que se tenha baseado a primitiva decisão.”
  Assim, depois da produção das provas apresentadas por requerido, se considerar provados factos contrários aos fixados na primeira audiência, o tribunal que julga a oposição, a fim de aferir a justeza da decisão que decretou a providência cautelar e para decidir a sua manutenção, redução ou revogação, deve proceder à apreciação crítica e conjunta de todas as provas produzidas neste e no anterior julgamento, de modo a verificar a necessidade de alterar os factos provados na primeira audiência e fixar definitivamente a matéria de facto provada, para proferir a sentença final só com base nesta parte de factos provados, especialmente quando nos dois julgamentos intervêm tribunais de composição diferente.
  Isto é, no julgamento da oposição, se ficarem provados factos contraditórios aos provados na audiência que decretou a providência, o tribunal deve proceder ao exame crítico dos elementos probatórios das duas audiências, de modo a reformular o acervo de factos provados e não provados. Só com esta matéria de facto definitivamente fixada o tribunal pode apreciar definitivamente sobre o pedido de providência cautelar.
  Na parte da fundamentação de facto da sentença final deve referir expressamente esta operação para mostrar com clareza a formação da convicção do tribunal, nos termos do art.º 556.º, n.º 2 do CPC.
  Nesta circunstância, a matéria de facto provada a fixar após o julgamento da oposição é o que resulta da referida apreciação conjunta de todas as provas produzidas, e não meramente das provas produzidas na audiência de julgamento da oposição." .
  Em face do exposto não assiste razão ao recorrente quanto à sua pretensão de inalterabilidade da matéria de facto».
Concordamos com este entendimento e fazemo-lo nosso.
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3.2 - Conclusões 5 a 33ª
Pretende o recorrente acometer a decisão recorrida na parte em que deu por provada certa materialidade (nomeadamente aos factos 8, 9, 16 e 27 da sentença e os das alíneas E e I).
Está em causa a ideia colhida pela 1ª instância de que a “D” não interveio em nome e representação da recorrida “C SA”, mas sim em nome próprio.
Também sobre esta matéria, não temos razão para alterar o entendimento já vertido no acórdão proferido em 12/02/2015, no Proc. nº 591/2014, a que acima fizemos referência, pelo que nos limitamos a extrair dele a respectiva fundamentação, para aqui a fazermos nossa (com a devida adaptação, face à diferente inserção dos factos elencados nas sentenças em confronto):
  «(…) 7.1. Entende o recorrente que a sentença recorrida não deveria ter dado como provado que a D agiu em nome e por conta própria, pois que esta teria agido em nome e por conta da ora recorrida na celebração do Contrato-Promessa.
  7.2. O Mmo Juiz explica que deixou de fazer constar no art. 8º do requerimento da providência que a D, quando celebrou o contrato-promessa com a sociedade E em representação da requerida (foi esta exactamente a expressão utilizada pelo ora recorrente) no art. 8º do seu requerimento, porque aquando da primeira decisão ainda não havia o doc. n.º1 entretanto apresentado com o requerimento de oposição.
  7.3. Com efeito, resulta dos considerandos do Contrato-Promessa que:
  "(…) Em 23 de Julho de 1993 a Outorgante A prometeu comprar por forma de celebração de contrato todas as acções da Sociedade de Investimento Imobiliário C, S.A.. A Sociedade de Investimento Imobiliário C, S. A. é concessionário do 6.º lote do Distrito A do Plano de Desenvolvimento da Grande Praia. Este lote foi descrito sob n.º… a fls... do Livro… na Conservatória do Registo Predial e utilizado para construir um edifício comercial e de escritórios (doravante designado simplesmente por "tal edifício"), com a área de construção de 33.323 m2 e a área do parque de estacionamento de 8.141m2. Ora a Outorgante A promete alienar para a Outorgante B todos os direitos e interesses das fracções autónomas de tal edifício (incluindo 47 fracções autónomas para uso comercial no Requeridas-do-chão e nos 1.9, 2A 3.9 e 4.9; 136 fracções autónomas para uso de escritórios nos 5.º a 21.º andares). (…)" (vide fls. 294 a 295v., dos autos).
  Nos termos do contrato, há, na verdade, como o recorrente afirma, uma razão para a intervenção da D, qual seja, a de que supostamente havia prometido comprar todas as acções da requerida.
  7.4. Ainda, porque a requerida é ali identificada como concessionária do terreno para a construção do edifício comercial e de escritórios, seria da conjugação destes dois elementos fácticos, na tese da recorrente, que a D prometeu, em nome da requerida, alienar todos os direitos e interesses das fracções autónomas daquele prédio, não porque estes lhe pertençam ou viessem a pertencer no futuro, mas antes porque alegadamente estava a agir na qualidade de futura sócia única da requerida, procurando comprometer a requerida com base nessa futura relação de domínio.
  Esta tese não tem consistência na pretensa letra do contrato.
  Tem razão a recorrida ao dizer que o recorrente alegou apenas que a D agiu em representação da recorrida, não tendo alegado também que agiu por conta da recorrida (o qual levaria à ponderação da aplicação do instituto da gestão de negócios), pelo que não pode agora vir alegar que a D agiu por conta da recorrida, como faz nos artigos 35.º, 37.º, 56.°, entre outros.
  O que resulta dos elementos que se nos desvendam – e outros houve, onde não podemos ir, é que é no pressuposto que a D prometeu vender, e a E prometeu comprar, através do Contrato-Promessa, um bem que, pese embora não fosse sua pertença, a D esperava poder vir a estar na sua disponibilidade.
  Com efeito, tendo a D a expectativa de se tornar a accionista única da Recorrida, na tal relação de futuro domínio total, como referido pelo próprio Recorrente, não é censurável de forma alguma a conclusão de que a D é a outorgante no Contrato Promessa, agindo no seu próprio interesse, aí indicada como parte outorgante, sem que dele conste qualquer referência à sua qualidade de representante da recorrida, tendo sido a D quem recebeu o sinal, tendo ficado provado que esse dinheiro nunca entrou nas contas da recorrida (art. 7º,a).
  Foi, ainda, na expectativa de vir a dominar totalmente a Recorrida, que a D se obrigou, no Contrato Promessa, a interceder junto da concessionária, a ora Recorrida, para que esta procedesse à celebração da escritura de compra e venda - cfr. cláusula 7.ª desse mesmo contrato.
  O que resulta desse contrato é a obrigação, não de a requerida vender, mas sim de a D interceder junto da recorrida para que esta emitisse uma declaração para efeitos de crédito junto de instituições financeiras, para que procedesse ao registo da propriedade horizontal e para que celebrasse a escritura pública - cfr. teor integral das cláusulas 6.° e 7.° do Contrato Promessa e cujo teor foi considerado provado na sentença recorrida sob os n.ºs 22 I), 23 m) e 25.° n).
  7.5. Importa não esquecer que nos encontramos perante uma prova que nesta fase se assume como indiciária, como já afirmámos, e o que importa é se há elementos probatórios que nos convençam de erro na análise feita pelo julgador na 1ª Instância.
  Daí que a tese da intervenção negocial por interposta pessoa implique já uma elaboração jurídica que tem de estar assente em factos que não se mostram provados. O que o recorrente faz é discorrer sobre uma possível interpretação dos factos, que, no caso, se mostra mais arredada daquilo que os elementos disponíveis indiciam.
  Para reforçar a ideia de que a D estaria a agir em representação da recorrida, o recorrente insiste na relevância de duas declarações por este juntas aos autos na audiência de 22 de Abril de 2014, nas quais a D teria, alegadamente, confirmado que agia em representação da recorrida.
  Sobre isto, o que se nos oferece dizer é que as declarações de H que nunca foi administrador da D (vide Doc. n.º 3 com o requerimento Inicial) e, como tal, não tinha poderes para vincular aquela, não devem deixar de ser contextualizados com o seu depoimento em audiência e, por isso, uma vez mais, estamos impedidos de valorar o teor dessas declarações, não esquecendo o que o Mmo Juiz diz a este respeito (vd. transcrição acima feita) e a anotação do envolvimento e grande interesse da testemunha em relação ao litígio.
  7.6 Quanto à interpretação que o recorrente faz da falta de intervenção da D no contrato de cessão de posição contratual celebrado entre a E e a Agência Comercial I Limitada (Doc. n.º 6), acompanha-se o entendimento vertido pelo Mmo Juiz e que não se mostra desmentido pelas provas e que aqui se transcreve para facilidade de compreensão:
  “Também a análise conjunta da prova produzida impõe agora juízo probatório diferente relativamente ao facto de o documento n.º 5 junto com o requerimento inicial constituir uma ratificação por parte da requerida relativamente ao contrato promessa celebrado entre a D e a E. Em primeiro lugar, apresenta-se com foros de verosimilhança a versão apresentada pela requerida (a D pretendia adquirir todo o capital social da requerida e prometeu vender o imóvel propriedade da requerida, que iria ser indirectamente da própria D, caso aquela aquisição do capital se concretizasse, sendo útil a declaração da requerida constante do doc. n.º 5 para fins de financiamentos bancários) e tal versão vem confirmada nos considerandos do contrato promessa junto como documento n.º 1 com o requerimento de oposição e não é afastada pelos documentos de fls. 269 e 273, da autoria de D (e não da requerida) e assinados pela testemunha H. Ora, não tendo o tribunal podido contar com estes novos elementos de prova quando proferiu a sentença impugnada pela oposição, avaliou o documento n.º 5 como ratificação, o que fazia sentido se o contrato promessa tivesse sido celebrado em nome da requerida por alguém sem poderes de representação. Porém, agora de posse do documento n° 1 junto com o requerimento de oposição, onde a sociedade D declara em seu próprio nome, o juízo probatório antes feito não pode subsistir quanto à interpretação do documento n.º 5 como ratificação, assim como não se pode concluir que deva ser interpretado como assunção, pela requerida, da obrigação de vender criada pelo contrato-promessa, sendo certo que é matéria de facto a interpretação dos contratos.”
  7.7. O alegado doc. n.º 5 não significa que fosse necessariamente uma ratificação do contrato e diz a recorrida que servia apenas para reconhecer a legitimidade do cessionário que adquirisse a sua posição directamente da E.
  O sentido útil que se pode retirar desse documento, à primeira vista sem sentido, é que, no fundo, a partir do momento em que a requerida promete ceder a totalidade das acções e permitindo que a cessionária prometesse vender a terceiros as fracções que viria a deter, vai confirmar exactamente aquela promessa e legitimidade da promitente vendedora. Por outras palavras, reconheço a validade deste contrato na exacta medida em que prometi ceder as fracções à D, não deixando de estar aí implícito um reconhecimento de promessa de bem futuro e condicionado ao cumprimento do negócio prometido de efectiva transferência das acções.
  Tanto assim que as demais cessões não seriam reconhecidas pela recorrida.
  7.8. Entende ainda o Recorrente que o facto provado sob o n.º 18 i) - no qual se lê "Ambas as partes contratantes "D" e E, sabiam que a promitente vendedora no contrato promessa não era titular dos direitos sobre as fracções a construir e objecto do Contrato Promessa" - é conclusivo e, como tal, não deveria ser incluído na matéria de facto provada.
  Ter conhecimento de um facto é ele mesmo um facto e não se avançam elementos probatórios que o levem a desmentir, nem sequer se indica qual o suporte documental ou outro donde se retire estar errada uma ilação que com muita probabilidade se pode retirar da globalidade dos factos: a D porque não podia desconhecer que o seu contrato era de promessa de aquisição de acções; a E porquanto, muito provavelmente, não podia ignorar que quem lhe estava a vender as fracções não era titular dos direitos das mesmas, uma vez que foi explicado no próprio contrato qual a exacta posição jurídica da promitente vendedora sobre as fracções objecto do negócio.
  Razões por que se sufraga o julgamento de facto produzido a propósito dos artigos n.ºs 8.°, 11.° e), 17.°, 18.º i) e 31).»
*
3.3 - Conclusões 34 a 38
O que está questionado, nesta parte, é a modificação do juízo da 1ª instância acerca da matéria contida na 1ª sentença sob o ponto 30 da factualidade provada, a propósito do facto “A Companhia de Investimento J Limitada estava bem ciente da existência do contrato-promessa celebrado pela ora requerida em 23 de Julho de 1996 e das sucessivas cessões da posição contratual”.
Também esta questão foi tratada no acórdão a que temos vindo a lançar mão. Senão, veja-se:
  «(…) Não se deixa, contudo, de observar que faz sentido o raciocínio do Tribunal em confronto com a matéria que acabou por fixar, para mais, considerando que a recorrida não foi parte contratante, nem teve qualquer intervenção no aludido contrato-promessa de 23 de Julho de 1996, nunca poderia permanecer como provado que,
  Ademais, note-se, que este facto se afigura como inócuo, pois que o que importa é saber se há fundamento em termos de fumus boni iuris quanto à possibilidade de vir a ser exercido o direito de execução específica do aludido contrato-promessa pelo recorrente, que já não de garantir contra o real incumpridor o ressarcimento do seu prejuízo».
De resto, não é verdadeiro que não pudesse o tribunal “a quo” alterar o seu juízo sobre esta factualidade. É que, tal como decorre da exposição constante da “Convicção do Tribunal” (fls. 412), a modificação não só decorreu da reanálise e reponderação dos elementos anteriormente existentes nos autos, como ainda da prova testemunhal obtida em sede de oposição, bem como dos documentos solicitados pelo próprio tribunal e apresentados pela “D” e, especialmente, o contrato-promessa celebrado entre as sociedades comerciais “D e “E”.
E no que respeita ao facto nº30, disse: “Relativamente ao nº30 da mesma sentença, não se mantém provado porque a convicção do Tribunal teve por base a comparação e análise dos compostos dos administradores, mostrados nas certidões do registo comercial da Requerida, da D e da Sociedade J».
No conjunto, cremos ter sido uma fundamentação exaustiva e sem falhas de raciocínio, que não vemos como poder rechaçar.
*
3.4 - Conclusões 39 a 48
É sobre o valor do documento nº5 que esta matéria versa.
Disse a sentença recorrida:
«Quanto ao facto anteriormente considerado provado na sentença proferida, de que a Requerida ratificou o contrato-promessa celebrado entre a D e a E (nº 10), apenas agora o Tribunal forma o juízo probatório diferente de que o doc. nº 5 junto com o requerimento inicial não é considerado como ratificação, uma vez que a versão alegada pela Requerida e pela testemunha H – aquela declaração da Requerida constante e do doc. nº 5 apenas servia para fins de financiamentos bancários para a D, a E e ao terceiro a quem seria cedida a posição do promitente comprador pela E – têm bastante probabilidade por corresponder ao conteúdo do contrato-promessa junto com o requerimento da oposição como doc. nº1, no qual a D declarou em seu próprio nome, e não ser afastada pelo documento de fls. 343 a 344 assinado pela testemunha H em nome da D, mas não da Requerida”
E sobre esta mesma matéria, disse o acórdão que temos vindo a citar:
  «7.7. O alegado Doc. n.º 5 não significa que fosse necessariamente uma ratificação do contrato e diz a recorrida que servia apenas para reconhecer a legitimidade do cessionário que adquirisse a sua posição directamente da E.
  O sentido útil que se pode retirar desse documento, à primeira vista sem sentido, é que, no fundo, a partir do momento em que a requerida promete ceder a totalidade das acções e permitindo que a cessionária prometesse vender a terceiros as fracções que viria a deter, vai confirmar exactamente aquela promessa e legitimidade da promitente vendedora. Por outras palavras, reconheço a validade deste contrato na exacta medida em que prometi ceder as fracções à D, não deixando de estar aí implícito um reconhecimento de promessa de bem futuro e condicionado ao cumprimento do negócio prometido de efectiva transferência das acções.
  Tanto assim que as demais cessões não seriam reconhecidas pela recorrida».
E mais adiante:
  «É muito bem possível a interpretação que vai no sentido de que com a declaração constante do Doc. n.º 5 a recorrida se limite a reconhecer a validade do Contrato Promessa celebrado entre a D e a E e a reconhecer a validade do contrato, ou dos contratos, de cessão de posição celebrados entre a E e terceiros.
  Com esta declaração, a recorrida está apenas a confirmar a legitimidade da E ou de quem dela adquirir a sua posição contratual para os efeitos determinados na cláusula 6.ª do Contrato Promessa.
  É verosímil, tal com diz a recorrida que “ a declaração (Doc. n.º 5 junto com o requerimento inicial), não mais é do que um documento que visava dotar a E - promitente compradora no Contrato Promessa de um instrumento que, na cedência da sua posição contratual a terceiros, porque o contrato tinha como objecto um bem alheio como bem futuro, facilitasse o inicio do processo negocial no sentido da angariação de fundos junto das instituições bancárias que financiassem a aquisição dos imóveis.
  Desta declaração, não se retira que a Recorrida tenha aceite e se tenha submetido às obrigações decorrentes do Contrato Promessa.”
  9.4. Para além de que ratificação não implica necessariamente representação. Se alguém tem necessidade de ratificar um acto é porque o terceiro que o praticou não tinha poderes para o fazer em seu nome e daí resulta tão-somente uma aceitação dos efeitos produzidos pelo acto na sua esfera jurídica. Tal como afirmado na sentença recorrida:
   "Nem a ratificação bastaria para transferir as obrigações criadas por via contratual da esfera jurídica da "D" para a da requerida. Uma vez que não se provou que a "D" actuou em nome da requerida, seria necessário, pelo menos, o acordo da "D", acordo esse que não está alegado nem provado."
Concordamos com os fundamentos da sentença recorrida e com aqueles que foram vazados no aresto deste tribunal, para os quais remetemos.
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3.5 - Conclusões 49 a 53
Pretende o recorrente realçar a circunstância de o Sr. F ter estado envolvido nos documentos em discussão, nomeadamente ter participado no contrato-promessa de 23 de Julho de 1996, em representação da “D”, na qualidade de sócio-administrador desta sociedade, e ter outorgado também, a declaração emitida em 2/12/1996, alegadamente em representação da Requerida, de ratificação do contrato-promessa, também na qualidade de administrador da Requerida.
Trata-se de um raciocínio que vem na linha de toda a argumentação que o recorrente expende no recurso acerca da posição em que a “D” teria intervindo.
Todavia, nem sequer o facto de o Sr. F ser administrador comum das sociedades em causa evidencia que a sua intervenção nos documentos tivesse em vista uma representação formal da Requerida. Onde está a prova de que a Requerida deliberou a intervenção daquele em seu nome e com o fim de a representar e vincular? Nada disso resulta expressamente em termos inequívocos dos aludidos instrumentos contratuais, nem de quaisquer outros. Neste sentido, a fundamentação da sentença impugnada não sofre de atropelos às regras da prova. Não esqueçamos que a prova nesta sede cautelar se deve ter por indiciária ou perfunctória, sem prejuízo da prova cabal e completa que deve ser feita no processo principal.
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3.6 - Conclusões 54 a 59
Está aqui em discussão a matéria factual constante do ponto da alínea O) dos factos provados constantes do requerimento da oposição, segundo a qual “Na 1ª cessão de Posição – a cessão entre a E e a I – a Requerida não teve qualquer intervenção, não foi identificada como promitente vendedora, nem foi afirmado que esta tenha prometido vender à cedente as fracções do edifício a construir”.
Defende o recorrente que esta factualidade, baseada nos pontos 35 e 36 do requerimento da oposição, foi mal adquirida em sede probatória, dado que os documentos em que se baseou (6 e 7 juntos com o requerimento inicial) o não permitiam.
Acha o recorrente que tais documentos, por terem sido já apreciados pelo tribunal, aquando da 1ª sentença proferida (de procedência da providência), não podiam de novo ser valorados em sentido diferente.
Por outro lado, acrescenta, tal facto choca com o conteúdo do documento em causa, já que dele resulta (cláusulas 8ª e 10ª) que a Requerida era parte interessada naquele contrato-promessa celebrado entre “D” e “E, Lda”.
Sobre isto mesmo, voltemos ao Ac. do TSI que temos vindo a citar:
«Entende o recorrente que este facto, relativo à falta de intervenção da recorrida nos contratos de cessão de posição contratual, à sua não identificação como promitente compradora nele e à inexistência de qualquer afirmação de que a recorrida tenha prometido vender as fracções, não deveriam ter sido dados como provados por se terem baseado em documentos existentes nos autos antes de apresentada a oposição à providência e por não ser isso que resulta do teor dos mesmos.
Após a segunda audiência de julgamento, foi dado como indiciariamente provado que "Na 1.ª Cessão de Posição, a Requerida não teve qualquer intervenção, não foi identificada como promitente-vendedora, nem foi afirmado que esta tenha prometido vender à cedente as fracções do edifício a construir." […].
Mais uma vez, o Tribunal diz ter-se baseado essencialmente no doc. n.º 6 junto com o requerimento inicial e pretende o recorrente esquecer tudo o resto que consta da motivação.
Pelo que não poderia, na tese do recorrente, o Mm.º Tribunal a quo ter recorrido a um documento que já havia sido apreciado para daí retirar um novo facto, mormente um diferente entendimento quando ao conteúdo do mesmo, designadamente quanto ao facto da requerida ser ou não ali referida como promitente-vendedora.
Mas, não obstante, diz que aquele facto choca frontalmente com o conteúdo do documento em causa.
Propõe até que, quanto muito, devia ter que: "Na 1.ª Cessão de Posição, a Requerida não teve qualquer intervenção." devendo ser eliminado o trecho "(…) não foi identificada como promitente vendedora, nem foi afirmado que esta tenha prometido vender à cedente as fracções do edifício a construir.".
Sobre esta matéria já se tomou posição no sentido da não limitação do julgador à fixação da matéria de facto aquando do primeiro julgamento sem oposição à providência.
As partes pensam que, por pisarem e repisarem argumentos, à exaustão, convencem; antes pelo contrário, cansam. Quando um argumento é forte ele impõe-se por si e não precisa de adornamentos.
Não se vê como pode o recorrente contrariar a constatação, face ao referido Doc. 6 para se compreender que a recorrida não teve qualquer intervenção neles, não foi identificada como promitente compradora, nem ali foi afirmado que esta tinha prometido vender aos cedentes as fracções do edifício a construir.
Pretender afirmar o contrário viola as evidências e retirar das cláusulas 8.ª e 10.ª do Doc. n.º 6 a assunção de responsabilidades por uma parte que não está no contrato não faz qualquer sentido. O que aí se evidencia é que a promitente vendedora garante, melhor, diz ter de garantir que a requerida regista e que trata dos processos de celebração do contrato. Daí a retirar que esta assumiu uma obrigação de o fazer vai uma grande distância.
Nada a censurar à comprovação deste facto».
Com o devido respeito, fazemos nossa a fundamentação transcrita sobre o assunto. Acrescentamos apenas que se um dos contratantes afirma que um terceiro irá apresentar futuramente um determinado comportamento em razão daquele contrato não significa que o esteja a fazer em seu nome e em sua representação e que, portanto, das cláusulas 8ª e 10ª resulte que a requerida tenha ficado vinculada ao teor delas.
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3.7 - Conclusões 60 a 70
O recorrente põe em causa a matéria das alíneas q) e s) dos factos dados por provados na sentença recorrida, com o seguinte teor:
q. Na 3.a Cessão de Posição - a cessão entre a K e A -, não se refere que a Requerida seja a promitente vendedora ou que tenha reconhecido a K, ou o terceiro a quem esta tenha cedido a sua posição, como promitente-comprador (48.º da peça).
s. Nesta 3.a Cessão de Posição, a Requerida não teve qualquer intervenção, não foi ali identificada como promitente vendedora, nem foi afirmado que esta tenha prometido vender à cedente K as fracções do edifício a construir (53.º da peça).
Em sua opinião, não podia o tribunal “a quo” ter considerado que a requerida era um elemento estranho ao negócio.
Ora, para além do que já atrás se disse e ora se renova, parece evidente que o recorrente não tem razão, tal como sobre o mesmo assunto o acórdão proferido pelo TSI, em 12/02/2015, no Proc. nº 591/2014 asseverou, nos termos que a seguir se transcrevem:
  «…Ora deste documento, contrariamente ao pretendido, ainda se retira a confirmação claríssima de que a requerida nada tem que ver com esse contrato, na medida em que as partes reconhecem que esta não é parte no contrato – de outra forma não utilizariam a expressão “outorgante B” e o “proprietário da fracção”, a ora requerida -, os outorgantes A e B acordam que a data da escritura será marcada pelo outorgante B e pelo proprietário da fracção (cláusula 5ª).
  E na cláusula 6ª esse negócio alheio à requerida continua a confirmar-se, enquanto o ali se diz. “O outorgante B tem perfeito conhecimento de que a fracção autónoma de alienação fica num edifício em construção. Não tem nada a ver com o outorgante A se o outorgante B consegue concluir os processos de cessão de propriedade com o proprietário originário Sociedade de Investimento Imobiliário C, S. A., no futuro.”
  Só não vê quem não quer ver. Daqui se retira de uma forma cristalina que não é a requerida que assume qualquer responsabilidade nesse contrato.
  A outorgante B faz um contrato legítimo, de coisa futura e compromete-se a providenciar por obter da requerida a fracção prometida vender.
  O problema é que, como é prática em Macau, os negócios também são viciantes e as pessoas e empresas, na ânsia do ganho fácil e rápido, não se coíbem em celebrar negócios de alto risco. Todos sabemos por quantas mãos passa uma fracção, desde o momento em que está apenas no projecto, por vezes, mesmo sem isso, até ao momento de ser concluída, se é que o vem a ser.
  Mais nada temos a dizer.
  Posto isto, somos a sufragar o julgamento de facto produzido sob os n.ºs 48.º r) e 53.° t), factos alegados pela recorrida em sede de oposição».
Tem inteira razão o trecho transcrito, razão pela qual aqui o fazemos nosso, com a devida vénia. Com efeito, dos documentos 10 e 11 não resulta que a requerida tivesse que ver directa ou expressamente com os contratos em apreço. Não interveio neles, efectivamente, nem a referência que neles é feita ao proprietário das referidas fracções nas cláusulas 5ª e 6ª (ora requerida/recorrida), a podem directamente vincular. Aliás, que o negócio apenas se realiza entre as partes contratantes mostra-o muito bem a alusão que é incluída na cláusula 6ª, na parte em que se menciona que “Ambos os outorgantes declaram que a transmissão dos direitos e interesses da qualidade de promitente-comprador é efectuada de forma voluntária e com base no princípio da imparcialidade, e o 2º outorgante sabe bem que a fracção em causa se situa num edifício em construção e se consegue ou não concluir a transmissão da propriedade com o proprietário “Sociedade de Investimento Imobiliário C, SA” não tem nada a ver com o 1º outorgante…” (fls. 21, 27 e 28 do apenso “Traduções”).
Portanto, não há dúvida que a proprietária (requerida/recorrida) não participou naqueles actos, nem deles resulta que futuramente irá intervir como promitente vendedora. Nem sequer as declarações que são mencionadas no mesmo instrumento contratual (com referência aos anexos 1 e 2), imputando à requerida o reconhecimento da existência do contrato-promessa entre “D” e a “E, Lda”, constituem um modo de validar essa promessa ou de dela retirar eficácia plena.
Por isso, não podemos concordar que, com aquela declaração avulsa em documento anexo, a proprietária possa estar apta a reconhecer do ponto de vista legal a eficácia das sucessivas cessões de posição contratual. É que um aspecto não pode deixar de ser considerado, que é, precisamente, a circunstância de se estar perante três realidades jurídicas distintas: por um lado, o contrato de promessa de compra e venda de todo o capital social da requerida (promessa de compra e venda de todas as acções); por outro lado, o contrato de promessa de venda das fracções que a promitente compradora das acções fez a “E, Lda”; e, por último, as várias cessões de posição contratual celebradas a partir do segundo contrato de promessa.
Daquela declaração não se retira que a recorrida tenha aceitado – ou a elas se tenha submetido - as obrigações do referido contrato-promessa, tal como também foi dito no acórdão proferido no Proc. nº 591/2014, em moldes que mais uma vez aqui reiteramos.
Ora sendo assim, a forma como foi consignada a matéria de facto em apreço não merece qualquer censura.
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3.8 - Conclusões 70 e sgs.
Crê o recorrente que a recorrida não tem intenção de cumprir o contrato-promessa de 23/07/1996, donde ser fundado o receio de lesão do seu direito.
Entra-se agora na apreciação do direito. Mas, por razões de economia e celeridade, e até mesmo porque, como já se disse atrás, este TSI já tomou posição sobre o assunto - que é precisamente igual e com as mesmas partes (a única diferença reside na identificação das fracções em causa: nos presentes autos, tenta o recorrente acautelar a defesa dos direitos em relação às fracções C7 e D7, ao passo que no Proc. nº 591/2014 deste TSI, tentou o mesmo recorrente acautelar a defesa do direito sobre a fracção B7) - limitar-nos-emos a transcrever o que sobre o tema foi decidido então:
  «12.2. Na verdade, o que o recorrente invocou foi um direito a uma execução específica sobre uma determinada fracção contra a requerida, por ter adquirido a posição contratual do cedente que, numa cadeia de transmissões, de quem era o promitente comprador dessa fracção de que a requerida é titular.
  Ora, isto só era possível se a requerida tivesse vendido a fracção que está em causa e tal não se provou. O que se provou é que a sociedade D prometeu vender uma série de fracções – onde se inclui a dos autos -, apenas com base num contrato-promessa de aquisição da totalidade das acções da requerida.
  Desde logo importa não confundir acções com fracções. O que promete comprar são acções e o que vai prometer vender à E são as fracções da requerida.
  Tudo bem, se essa promessa pela D tivesse sido em representação da requerida. Não o foi e não podemos sair desta posição, introduzindo um outro qualquer negócio por conta de requerida ou de gestão de negócios.
  Só faria sentido, aliás, continuar a pugnar pela ratificação operada pelo já falado DOC. n.º 5 se tivesse havido representação, ainda que sem poderes, em face do disposto no artigo 261º, n.º 1 do CC.
  Representação negocial é o acto em que alguém, o representante, no exercício de um poder funcional, celebra um negócio jurídico destinado a produzir efeitos directamente em relação a outra pessoa, o representado.3
  Para isso é necessário que haja poderes representativos, o que, no caso, não resultam de forma nenhuma nos diferentes contratos analisados. Se estes poderes representativos não existirem, estaremos perante uma representação sem poderes, prevista no artigo 261º.
  Em qualquer das situações pretende-se que os efeitos do negócio recaiam na esfera jurídica do representado, o que não se afigura verificar-se.
  Em princípio todo o contrato arrasta direitos e obrigações que se repercutem na esfera jurídica das partes. O que a D pretende, na expectativa de adquirente das acções da requerida, é que seja a requerida a assumir as obrigações da venda das fracções que detém, mas já não a beneficiária das vantagens – veja-se que a requerida não recebeu qualquer pagamento pela venda das fracções, fosse a título de sinal, fosse a qualquer outro título.
  Nem é razoável acreditar, só porque a promitente adquirente das acções, que por sua vez começa a prometer vender as fracções da requerida, iniciando-se uma cadeia de cessão de uma posição contratual de promitente de compra de coisa alheia e futura, que vem a desembocar no requerente, só por isso, sem mais, que a requerida, sem saber se esse contrato chegaria ao fim, começava logo a abrir mão do seu património, neste caso, a favor do requerente.
  Com os elementos disponíveis, e há que não esquecer que eles são perfunctórios, não faz sentido.
  12.3. Não é verdade que o contrato-promessa e os contratos de cessão de posição contratual tratem a recorrida como parte outorgante ou contrária ao negócio.
  Não é verdade que daí resulte qualquer representação. Aliás, quanto ao facto de se alegar que o contrato-promessa prevê a possibilidade de vir a ser celebrado um contrato promessa directamente com a recorrente, isso exactamente o oposto do que afirma o recorrente, isto é, tal significa que a D não tinha quaisquer poderes de representação da recorrida, pois que, se tivesse, tal contrato-promessa considerar-se-ia celebrado com a própria recorrida, não havendo qualquer necessidade de celebrar outro contrato directamente com esta.
  Estando-se, pois, no âmbito que foi alegado, não se provando a representação, ainda que sem poderes, cai a possibilidade de ratificação - art. 261º, n.º 1 e 2.
  Não se preenche, pois, o requisito da aparência ou da probabilidade séria da existência do direito invocada pelo recorrente, pelo que não poderá a providência requerida ser decretada - art. 332º, n.º 1 do CPC.
  12.3. Quanto à matéria do art. 145º e quanto ao justo receio de incumprimento por banda da requerida lesão grave e irreparável do direito do recorrente torna-se desnecessário analisar esse requisito, na exacta medida em que se conclui que o direito que reclama não lhe assiste.
  O que temos por configurado é que a D, em seu nome e interesse próprio, prometeu vender um bem alheio e futuro, cujo direito não estava na sua disponibilidade, mas que tinha a expectativa de vir a estar indirectamente, por aquisição da totalidade do capital social da titular desse bem, a requerida.
  Nos termos do artigo 202.º, n.º 2 do Código Civil “são coisas absolutamente futuras as que ainda não existem ao tempo da declaração negocial” e nos do n.º 3 “relativamente futuras as que, embora já tenham existência, não estão em poder do disponente, ou a que este não tem direito, ao tempo da declaração negocial.”
  Nos termos do artigo 882.º do CC, se a venda de bem alheios é nula, já não é assim com a promessa de um bem futuro ou alheio. O que se passa aqui é que o promitente vendedor compromete-se a obter aquele bem para que possa cumprir a promessa.
  Nos termos 883.º do CC a venda de bens alheios fica, porém, sujeita ao regime da venda de bens futuros, se as partes os considerarem nesta qualidade.
  As partes no contrato-promessa da fracção em causa consideraram que o direito a transmitir não era propriedade da promitente vendedora, mas que iria estar no futuro na sua disponibilidade, ainda que indirectamente pela aquisição da totalidade do capital social da recorrida, pelo que as partes consideraram esse direito como futuro - vide facto provado sob o n.º 18.º i).
  Deste modo, o Contrato-Promessa corresponde, assim, à promessa de venda de bem alheio como bem futuro, nos termos do artigo 883.º CC, seguindo assim o regime da venda de bens futuros.
  Determina o artigo 870.º do CC que, na venda de bens futuros, o vendedor fica obrigado a exercer as diligências necessárias para que o comprador adquira os bens vendidos, segundo o que for estipulado ou resultar das circunstâncias do contrato.
  A D comprometeu-se, efectivamente, conforme consta do facto provado sob o n.º 25 n), a promover junto da recorrida no sentido de esta proceder aos actos necessários à constituição da propriedade horizontal e à outorga das escrituras públicas de venda das fracções a construir, devendo ser dentro deste quadro que se deve ler o que o recorrente pretende por ratificação, foi conseguindo algumas facilidades e reconhecimento da posição contratual da primeira transmitente, mas compreende-se que deixe de colaborar, maxime, de vender, se o negócio originário se frustra, como poderá ser o caso de a D não ter adquirido o capital social da ora recorrida.
  Como se mostra evidente a execução específica não se compagina com a venda de bens alheios e ainda por cima futuros, donde, sem representação e sem ratificação - desprezando aqui a gestão de negócios que não vem invocada - afigura-se, ainda por aí, cair a pretensão do recorrente.
  12.4. Quanto à interpretação que um declaratário normal possa fazer de uma dada declaração - sempre o referido Doc. n.º 5 -, tendo em vista o disposto no art. 228º, n.º 1 do CC, já nos pronunciámos que a interpretação possível desse documento, dele não se retirando uma assunção de obrigações que a requerida ali tenha assumido, nomeadamente por via de uma qualquer promessa unilateral de venda.
  Qualquer direito que o recorrente possa ter, terá que exercê-lo contra quem é, efectivamente, parte no contrato em que aquele passou a ocupar a posição de promitente-comprador - ou seja, a D.
  12.5. Por fim, analisa-se um argumento trazido pela recorrida e que não é de menos importância. Mesmo que se considerasse que a D agiu em representação da recorrida e que esta ratificou o negócio, por via da declaração junta como Doc. n.º 5 com o requerimento inicial, a recorrida declarou que apenas reconheceria a validade do contrato de cessão de posição contratual que a E celebrasse com terceiros - isto é o que resulta do teor do documento e do facto provado sob o n.º 11 (vide Doc. n.º 5 com tradução a fls. 284).
  No caso, a ora recorrida não autorizou previamente toda e qualquer cessão, limitando expressamente esse consentimento à transmissão da posição contratual da E a terceiros, reconhecendo, apenas, a posição de promitente comprador de quem tivesse adquirido tal posição directamente da E.
  Como o recorrente não adquiriu a sua posição contratual directamente da E, a recorrida não se encontraria vinculada a reconhecer a alegada qualidade de promitente comprador, pelo que, também assim, não poderia a presente providência cautelar ser decretada.
  A cessão ao ora recorrente não foi autorizada pela requerida, pelo que nos termos do artigo 418º, n.º 1 do CC. Esta depende do consentimento do cedente, do cessionário e do cedido; faltando a autorização deste, a cessão é ineficaz em relação a ele.4
  Por todas estas razões o recurso não deixará de improceder».
Não vemos razão para divergir da fundamentação acabada de transcrever, pelo que, parecendo-nos que ela continua a reflectir a boa solução do caso, acolhemo-la mais uma vez.
***
IV – Decidindo
Nos termos expostos, acordam em negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
TSI, 30 de Abril de 2015
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
1 Nos autos que deram origem ao Recurso 591/2014 deste TSI e a que já fizemos acima referência, a primeira decisão da providência foi
2 - Ac. do TUI, Proc. n.º 22/2007, de 30/5/2008
3 - Galvão Telles, Man. dos Contratos em Geral,308.
4 - Ac. do STJ, de 5/11/1998, CJ, Acs STJ, 1998, 3º, 93
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