Processo n.º 746/2015 Data do acórdão: 2015-8-28 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– abandono de sinistrado
– vítima de acidente de viação
– homicídio doloso cometido por omissão
– crime considerado cometido com violência
– art.º 193.º, n.º 2, do Código de Processo Penal
– prisão preventiva
– art.o 193.o, n.o 1, do Código de Processo Penal
– art.o 188.o do Código de Processo Penal
S U M Á R I O
Ficando o arguido condenado em primeira instância, nomeadamente, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de abandono de sinistrado (vítima de acidente de viação a que tinha dado causa), in casu, punível com a pena aplicável ao crime de homicídio doloso (cometido por omissão) prevista no art.º 128.º do Código Penal, pena aplicável essa que é de dez a vinte anos de prisão, e sendo esse concreto delito de abandono de sinistrado considerado cometido com violência, por ser acompanhado, naturalmente, de uma agressão à vida da pessoa sinistrada abandonada (cfr. a definição no n.º 2 do art.º 193.º do Código de Processo Penal), há que impor efectivamente ao arguido a prisão preventiva a vigorar na pendência do seu recurso interposto do acórdão condenatório, nos termos cogentemente ditados pelo art.o 193.o, n.o 1, do Código de Processo Penal, sem necessidade de indagação da existência de qualquer dos perigos concretos referidos no art.o 188.o deste Código, posto que essa disposição do art.o 193.o já tem em conta a evidente necessidade, adequação e proporcionalidade da aplicação da prisão preventiva ao delito em causa.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 746/2015
(Autos de recurso penal)
Recorrente arguido: A
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o despacho ditado pelo M.mo Juiz Presidente do Tribunal Colectivo do Processo Comum Colectivo n.º CR2-14-0135-PCC (com enxerto cível de indemnização) do 2.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, na sessão da leitura pública da correspondente decisão final condenatória, por força do qual lhe foi imposta a medida coactiva de prisão preventiva a vigorar na pendência desse processo penal, veio o arguido A, já melhor identificado nos autos, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para pedir a revogação daquele despacho judicial, com conseguente aplicação tão-só de medidas coactivas não privativas da liberdade, tais como a caução, a apresentação periódica e a proibição de ausência de Macau, tendo para o efeito alegado, designadamente, na sua motivação (apresentada a fls. 590 a 593 dos presentes autos correspondentes), que da sua postura de ter vindo a colaborar na investigação do caso, em conjugação com o facto de ser ele um residente de Macau, aqui nascido, com a família e todos os amigos também aqui residentes, não se vislumbra qualquer perigo concreto de fuga, nem de qualquer outro dos perigos referidos no art.º 188.º do Código de Processo Penal (CPP), pelo que são suficientes e adequadas à sua situação as medidas coactivas não privativas da sua liberdade.
Ao recurso responderam a Digna Delegada do Procurador (a fls. 625 a 626) e a assistente (a fl. 613), igualmente no sentido de manutenção da decisão recorrida.
Subidos os autos, o Ministério Público, em sede de vista, opinou (a fls. 661 a 664) pelo não provimento do recurso.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos legais, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Fluem do exame dos autos os seguintes elementos pertinentes:
– por decisão final do Tribunal Colectivo do ora subjacente Processo Comum Colectivo n.º CR2-14-0135-PCC, o arguido ora recorrente ficou condenado, inclusivamente, como autor material, na forma consumada, de um crime de abandono de sinistrado, p. e p. pelo art.º 88.º, n.º 2, da vigente Lei n.º 3/2007, de 7 de Maio (Lei do Trânsito Rodoviário, doravante abreviada como LTR), com referência ao art.º 128.º do Código Penal (CP), na pena de doze anos de prisão (cfr. maxime o teor do acórdão constante de fls. 545 a 553 dos autos);
– na sessão da leitura pública dessa decisão final condenatória, o M.mo Juiz Presidente do Tribunal Colectivo aplicou ao arguido a prisão preventiva a vigorar na pendência do processo, com fundamento inclusivamente na verificação do perigo concreto de fuga (cfr. o teor da acta lavrada a fls. 554 a 554v dos autos).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
Dos elementos acima coligidos do exame dos autos, sabe-se o arguido ficou condenado, nomeadamente, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de abandono de sinistrado (vítima de acidente de viação a que tinha dado causa), in casu, punível com a pena aplicável ao crime de homicídio doloso (cometido por omissão) prevista no art.º 128.º do CP, pena aplicável essa que é de dez a vinte anos de prisão, ou seja, com limite máximo superior a oito anos.
Esse delito de abandono de sinistrado pelo qual ficou o recorrente condenado, como é punível com a pena aplicável ao homicídio doloso cometido por omissão, é considerado cometido com violência, por ser acompanhado, naturalmente, de uma agressão à vida da pessoa sinistrada abandonada (cfr. a definição do crime cometido com violência, no n.º 2 do art.º 193.º do CPP).
Daí que há que impor efectivamente ao arguido a prisão preventiva, nos termos cogentemente ditados pelo art.o 193.o, n.o 1, do CPP, sem mais indagação, por desnecessária, não sendo mister indagar sobretudo da eventual existência, ou não, de qualquer dos perigos concretos referidos no art.o 188.o do CPP, sendo líquido que a disposição do art.o 193.o já tem em conta a evidente necessidade, adequação e proporcionalidade da aplicação da prisão preventiva ao delito em causa.
Naufraga, pois, o recurso do arguido, com manutenção do recorrido despacho aplicador da prisão preventiva, ainda que com fundamentação algo diversa da aí invocada pelo M.mo Juiz Presidente do Tribunal Colectivo sentenciador.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas do recurso pelo recorrente, com três UC de taxa de justiça.
Macau, 28 de Agosto de 2015.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Chiang I Man
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Chan Kam Tim
(Segundo Juiz-Adjunto)
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