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Processo nº 181/2015
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 14 de Maio de 2015

ASSUNTO:
- Testemunha
- Parques do estacionamento
- Parte comum do edifício
- Uso exclusivo

SUMÁRIO:
- Apesar dos condóminos poderem ter um interesse igual ao da Autora na acção de revindicação da parte comum do prédio, tal facto não os impede a depor como testemunha, na medida em que não foi requerida ou provocada a sua intervenção.
- Não tendo intervindo como parte, não estão impedidos de depor como testemunha.
- A al. d) do citado nº 1 do artº 37º da Lei nº 25/96/M (lei vigente à data dos factos) exige que da “Memória Descritiva das Fracções Autónomas” deve constar a especificação das fracções autónomas em conformidade com o artº 5º da mesma Lei.
- Não tendo os 6 parques de estacionamento sido descritos como partes comuns do edifício nem como partes integrantes de qualquer fracção autónoma, deve operar a presunção legal prevista tanto na al. d) do nº 2 do artº 10º da Lei nº 25/96/M, como na al. d) do nº 2 do artº 1421º do CCivil de 1966 (lei vigente à data dos factos), ou seja, quando não constituam fracções autónomas, presumem-se ser partes comuns do edifício.
- Só existe o direito de uso exclusivo das partes comuns quando esse direito consta expressamente do respectivo título constitutivo.
O Relator,
Ho Wai Neng

Processo nº 181/2015
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 14 de Maio de 2015
Recorrentes: A e B (Réus)
Recorridos: C (Autora)
D (Intervenção Principal Espontânea)
E (Intervenção Principal Espontânea)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por despacho de 13/03/2014, foi decidido admitir que os proprietários e condóminos depusessem como testemunhas.
Dessa decisão vêm recorrer os Réus, ora Recorrentes, A e B, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
A. No dia 10 de Março de 2013, no decurso da audiência de discussão e julgamento, a testemunha F confirmou ser proprietário de uma fracção sita no prédio "Edifício XX";
B. O que motivou que os, ora, recorrentes se opusessem a que os proprietários e em consequência condóminos depusessem como testemunhas, nos termos do Art. 518.º do C.P.C;
C. Parecia ser este, também o entendimento da A. quando. a fls. 284, declarou nada ter a opor à intervenção deduzidas por dois outros proprietários, D e E.
D. Intervenções requeridas, precisamente, com o fundamento de "... dado que o Requerente tem um interesse igual ao da Autora ...".
E. Acontece, que o despacho sob censura, de 13 de Março de 2014, não acolheu o entendimento dos, ora, Recorrentes, acabando por admitir os depoimentos prestados e que venham a ser prestados por condóminos;
F. Salvo o devido respeito, andou mal o Tribunal a quo.
G. A A. não é proprietária de nenhuma fracção do prédio descrito sob o n.º XXXX3-XX na conservatória do Registo Predial;
H. Nenhum dos "Associados" da A., nem os impetrantes da intervenção nem a testemunha são proprietários de nenhuma fracção do prédio descrito sob o n.º XXXX3-XX na conservatória do Registo Predial.
I. Nenhum dos proprietários das fracções do prédio descrito sob o n.º XXXX3-XX na conservatória do Registo Predial se reuniu em Assembleia geral para mandatar a A., ou outra pessoa qualquer para reivindicar o que quer que seja;
J. Pelo que todos eles têm um interesse igual ao da A. e não apenas um interesse directo na acção corno se refere no despacho sob censura.
K. Se é igual para requererem a sua intervenção,
L. Igual é para os impedir de testemunharem.
M. O Tribunal a quo violou o Arts. 518.º do C.P.C.
*
Por sentença de 03/09/2014, julgou-se parcialmente procedente a acção e em consequência:
- condenou os Réus, ora Recorrentes, a reconhecer os condóminos do prédio a que se reportam os autos como co-titulares do direito resultante da concessão por arrendamento incluindo a propriedade de construção dos 6 parques de estacionamento que ficam ao nível da rua e com acesso directo para esta e a restituírem os mesmos àqueles, e
- absolveu os Recorrentes do pedido indemnizatório formulado pela C.
Dessa decisão vêm recorrer os Recorrentes, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
A. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida no passado dia 03.09.2014, pela qual os Réus foram condenados: "a reconhecer os condóminos do prédio a que se reportam os autos como co-titulares do direito resultante da concessão por arrendamento incluindo a propnedade de construção dos 6 parques de estacionamento que ficam ao nível da rua e com acesso directo para esta e a restituírem os mesmos àqueles."
B. Com tal decisão não se podem os Recorrentes conformar, por entenderem que o Tribunal a quo não enquadrou e valorou devida e correctamente a prova que consta dos autos, padecendo do mesmo passo a sentença recorrida de erros de julgamento quanto à matéria de facto provada.
C. Acresce que, atenta a conclusão a que se chegou na sentença recorrida, entendem os Recorrentes que a prova constante dos autos é insuficiente para sustentar a decisão e que, no caso, se impõe o recurso ao instituto da renovação da prova, nos termos previstos nos arts. 629.°, n.ºs 3 e 4 do C.P.C..
D. Objecto dos presentes autos são seis parques de estacionamento que, desde 2005, sempre foram utilizados e afectos à fracção NR/C, hoje da titularidade dos ora Recorrentes.
E. Dos documentos 2 e 3 da contestação (certidões das Finanças), bem como das certidões de fls. 260 e de fl. 470 dos autos: a Certidão da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes n.º XX4/DURDEP/2005 e à declaração da Fundação Oriente de 09 de Setembro de 2005 e todos esses documentos resulta que, desde 2005, data em a fracção NR/C foi adquirida pela 1ª Ré G, quer na Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (doravante, "DSSOPT"), quer na Direcção dos Serviços de Finanças, estão registados como pertencentes à fracção NR/C 68 parques de estacionamento: 26 parques para carros + 36 parques para motas + 6 parques exteriores.
F. Nada no processo de licenciamento se alterou no sentido de diminuir o número de parques registados na fracção NR/C: não houve qualquer alteração na memória descritiva, não houve qualquer alteração na ficha técnica, não se verificou a apresentação de uma nova planta, ou seja, nada que justifique a redução do número de parques registados na fracção (para estacionamento) NR/C.
G. A memória descritiva que serviu de título constitutivo da propriedade horizontal do Edifício XX já foi elaborada de acordo com a Lei n.º 25/96/M (Regime Jurídico da Propriedade Horizontal), diploma que passou a regulamentar o a constituição em propriedade horizontal do Edifício XX em apreço nos presentes autos.
H. Ora, quer o 2.°, n.º 1, al. e) Decreto-Lei n.º 31/85/M, de 13 de Abril, quer pelo art. 37.°, n.º 1, al. e) Lei n.º 25/96/M (Regime Jurídico da Propriedade Horizontal), ainda em vigor, obrigam à descrição das áreas comuns.
I. Analisado o título constitutivo da propriedade horizontal do Edifício XX - a memória descritiva (cfr. doc. 4 da petição inicial - fls. 29 e ss. dos autos; doc. 8 da petição inicial - fl. 58 e ss. dos autos, bem como fls. 358 e ss. dos autos) logo resulta que os seis parques de estacionamento exteriores objecto da presente acção não vêm descritos como partes comuns.
J. Donde, a primeira conclusão que importa registar é a seguinte: os seis parques de estacionamento objecto dos presentes autos não vêm descritos no título constitutivo da propriedade horizontal do Edifício XX como partes comuns.
K. Acresce que, nos termos dos arts. 2.°, n.º 2 e 8.°, n.º 2 da Lei n.º 25/96/M (Regime Jurídico da Propriedade Horizontal), o diploma que regulamentou a constituição da propriedade horizontal do Edifício XX, e também nos termos dos actuais arts. 1315.°, n.º 2 e 1322.°, n.º 2 do Código Civil, a regra da contiguidade das fracções não têm aplicação no que diz respeito a parques de estacionamento.
L. Donde, não se aplicando a regra da contiguidade aos parques de estacionamento, a segunda conclusão que se impõe registar é a seguinte: os seis parques de estacionamento exteriores objecto dos presentes autos não são, por lei, partes comuns, nada impedindo, corno acontece no caso em apreço, que sejam parte integrante da fracção NR/C da titularidade dos ora Recorrentes.
M. Feito este enquadramento, são duas as questões que, na perspectiva dos Recorrentes, urge dilucidar pela via do presente recurso: 1.ª - Se a área adquirida pelos Recorrentes de 974,271 m2 compreende a área dos 6 parques descobertos; 2. -, Se, independentemente da resposta anterior, se os 6 parques descobertos sempre foram afectos ao uso exclusivo do condómino titular da fracção NR/C no caso, os ora Recorrentes.
N. Nos termos do art. 599.°, n.º 1, al. a) do C.P.C, analisada a prova produzida em sede de audiência de julgamento e devidamente documentada, a par dos documentos juntos aos autos, é possível concluir que foram indevidamente considerados provados os quesitos 3.º e 5.º da base instrutória (transcritos nas alegações).
O. Quanto ao quesito n.º 3, não vislumbram os Recorrentes qualquer elemento de prova, documental ou testemunhal ou tão-pouco resultante da prova por inspecção, que ateste a resposta do Tribunal a quo no sentido de que "a fracção NR/C é composta apenas por 26 parques de estacionamento para carros, dos quais 7 descobertos e 36 parques de estacionamento para motos" .
P. De todos os elementos constantes dos autos, nada resulta que a fracção NR/C tenha apenas 26 parques de estacionamento para carros, dos quais 7 descobertos.
Q. Do auto de inspecção ao local nada resulta sobre o número de parques de estacionamento, cobertos ou não cobertos, mas tão só a constatação que a marcação dos lugares não corresponde à planta, sendo que nem se percebe se as medições efectuadas dizem respeito a parques situados no interior ou no exterior da fracção NR/C
R. Na fundamentação da resposta à matéria de facto, o Tribunal a quo diz que a resposta ao quesito 3.° (e também ao quesito 5.°) resulta da memória descritiva a que se reportam os autos - conferir fls. 35, 70 e 371 -, considerando o Tribunal a quo que a área total de 974,271 m2 da fracção não incluem os seis parques de estacionamento que estão do lado de fora do edifício.
S. Ora, da memória descritiva (cfr. fls. 35, 70 e 371) apenas resulta a área total da fracção NR/C de 974,271 m2, dos quais correspondem a 785,722 m2 de área coberta e 188,549 m2 de área descoberta. Nada se diz sobre o número de parques de estacionamento e se incluem ou não os 6 parques de estacionamento que se encontram do lado de fora do edifício. Tal conclusão do Tribunal a quo não pode encontrar fundamento na memória descritiva, porque efectivamente da mesma nada resulta sobre a localização dos parques de estacionamento que compõem a fracção NR/C.
T. Acresce que, quanto ao facto de serem descobertos, ainda que dentro da fracção NR/C exista uma área descoberta, nada resulta dos autos, nem tão-pouco encontra explicação na sentença recorrida, quanto ao facto dessa área (descoberta) ter 188,549 m2.
U. Nada dos autos resulta nesse sentido, pelo que, no mínimo, para o Tribunal responder adequadamente ao quesito n.º 3 da base instrutória, teria que ter ordenado uma medição ao local.
V. Acresce ainda que, a justificação do Tribunal a quo no sentido de que a fracção NR/C apenas terá acesso pela Travessa dos Currais (fls. 450 dos autos ), nada infirma no sentido de que os 6 parques exteriores sejam parte integrante da fracção NR/C.
W. Com efeito, tendo presente o disposto nos arts. 2.°, n.º 2 e 3 e 8.°, n.º 2 da Lei n.º 25/96/M (Regime Jurídico da Propriedade Horizontal), hoje transpostos para os artigos 1315.°, n.º 2 e 1322.°, n.º 2 do Código Civil, logo resulta que a regra da contiguidade não se aplica aos parques de estacionamento. Donde, nada implica que os 6 parques exteriores façam efectivamente parte da fracção NR/C da titularidade dos Recorrentes.
X. Por outro lado, fazendo menção à prova devidamente documentada nos autos, cujas passagens mais significativas foram transcritas nas alegações, nenhuma das testemunhas inquiridas a tais quesitos 3.° e 5.° pôde confirmar tais respostas do Tribunal a quo.
Y. Nesse sentido, vejam-se as declarações da testemunha H, ouvida na sessão de julgamento de 13.03.2014, Sub-Directora da DSSOPT, (gravação 1%@NPL@W06611270).WAW), às 15h54.17 – min. 21.36 a 39.34; da testemunha I, ouvido na sessão de julgamento de 13.03.2014, engenheiro do Dep. Licenciamento da DSSOPT, (gravação 1%@NPL@W06611270).WAW), às 15h54.17 – min. 45.15 a 1h06; da testemunha J, ouvido na sessão de julgamento de 13.03.2014, Assessor da DSSOPT, (gravação 1%@NPL@W06611270).WAW, às 15h54.17 – min. 1h07 a 1h38.35; da testemunha K, Arquitecto, ouvido na sessão de julgamento de 27.03.2014, (gravação (1%S)FX%G06611270).WAW, - min. 18.20 a 27.22; testemunha L, funcionária do DSF, ouvida na sessão de julgamento de 27.03.2014, (gravação (1%S)FX%G06611270).WAW, - min. 28.00 a 44.53, bem como da testemunha M, funcionário do DSF, ouvido na sessão de julgamento de 27.03.2014 (gravação (1%S)FX%G06611270).WAW, - min. 45.00 a 58.30.
Z. A par de tudo acima dito, a contrariar directamente a resposta do Tribunal a quo, quer ao quesito 3.°, mas sobretudo ao quesito 5.° acima transcrito, importa ainda considerar a prova documental.
AA. Com efeito, analisada a sentença recorrida e, necessariamente, o Acórdão que procedeu à resposta à matéria de facto, logo se retira que o Tribunal a quo não se pronunciou, nem tirou quaisquer consequências, sobre as certidões juntas aos autos, cuja consideração impõe diferente resposta aos quesitos 3.° e 5.° da base instrutória.
BB. Referem-se os Recorrentes às certidões das Finanças juntas como documentos 2 e 3 da contestação, bem como às certidões de fls. 260 e de fl. 470 dos autos: a Certidão da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes n.º XX4/DURDEP/2005 e à declaração da Fundação Oriente de 09 de Setembro de 2005.
CC. Dos referidos documentos logo se retira que, desde 2005, os seis parques de estacionamento estão afectos à utilização exclusiva da fracção NR/C.
DD. Mais, em bom rigor, a afectação de tais 6 parques exteriores à fracção NR/C resulta da Ficha Técnica (cfr. fls. 57 e 75 dos autos), ficha essa que, no caso, faz indubitavelmente parte do processo de constituição da propriedade horizontal do Edifício XX.
EE. Nos termos de tal Ficha Técnica, onde só vem referenciada a área coberta da fracção para estacionamento NR/C de 785.722 m2, foram desde sempre incluídos os 6 parques descobertos para perfazer a área descoberta de 188.549 m2 (para compor a área total de 974.271 m2 da fracção NR/C).
FF. Sendo ainda certo que, de tal Ficha Técnica, nada resulta no sentido de os 6 parques de estacionamento descobertos integrarem a área comum.
GG. Pelo que, atento o acima exposto, bem como a prova documental constante dos autos, o Tribunal a quo deveria ter considerado que os 6 parques de estacionamento se encontram afectos à fracção NR/C.
HH. Pelas razões expostas, requerem os Recorrentes a V. Ex.ªs que seja determinada a alteração dos referidos pontos da matéria de facto em conformidade, razão pela qual:
- Em resposta ao Quesito 3.°, deverá ser dado como PROVADO que a fracção NR/C é composta por 26 parques de estacionamento para carros, 36 parques de estacionamento para motos e 6 parques exteriores. E,
- Em resposta ao Quesito 5.º, deverá ser dado como PROVADO que os 6 parques de estacionamento referidos na resposta dada ao item 4.° estão afectos à fracção NR/C.
II. As alterações à matéria de facto nos termos acima expostos são fundamentais e impõem necessariamente uma alteração no sentido da decisão recorrida, devendo impor a sua revogação.
JJ. Não obstante e sem prescindir, tal como já resulta do acima exposto em sede de impugnação da resposta aos quesitos 3.° e 5.° da base instrutória, entendem os Recorrentes que, da resposta a tal matéria, resultou um facto novo, não invocado pelas partes e que, em bom rigor, não encontra qualquer expressão prova produzida nos autos.
KK. Com efeito, o Tribunal a quo respondeu à matéria de facto no sentido de que toda a área descoberta da fracção NR/C se encontrar no interior da própria fracção.
LL. Ora, ainda que dentro da fracção NR/C exista uma área descoberta, nada resulta dos autos, nem tão pouco encontra explicação na sentença recorrida, quanto ao facto dessa área (descoberta) ter 188,549 m2. Nada dos autos resulta nesse sentido, pelo que, no mínimo, para o Tribunal responder adequadamente ao quesito n.° 3 da base instrutória, teria que ter ordenado uma medição ao local.
MM. Curial é aferir a área descoberta de toda a fracção NR/C e não apenas dos 6 parques exteriores, que, muito provavelmente, terão área muito inferior a 188,549 m2.
NN. Pelo exposto, entendem os Recorrentes que a prova constante dos autos é insuficiente para sustentar a decisão recorrida e que, no caso, se impõe o recurso ao instituto da renovação da prova, nos termos previstos nos arts. 629.°, n.ºs 3 e 4 do C.P.C, ordenando-se uma medição ao local a fim de confirmar a área abrangida pela fracção NR/C
OO. Do teor dos docs. 2 e 3 da contestação (certidões das Finanças), bem como das certidões de fls. 260 e de fl. 470 dos autos: a Certidão da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes n.º XX4/DURDEP/2005 e à declaração da Fundação Oriente de 09 de Setembro de 2005, resulta que, desde 2005, data em a fracção NR/C foi adquirida pela la Ré G, quer na DSSOPT, quer na Direcção dos Serviços de Finanças, estão registados como pertencentes à fracção NR/C 68 parques de estacionamento: 26 parques para carros + 36 parques para motas + 6 parques exteriores.
PP. Aliás, da certidão da DSSOPT resulta de forma muito clara que os 6 parques de estacionamento, ainda que sejam partes comuns - hipótese que os Recorrentes apenas cautelarmente admitem, sem conceder -, sempre foram afectos à utilização exclusiva da fracção NR/C.
QQ. Donde, e por último, pela análise de tais documentos, bem como da Ficha Técnica de fls. 57 e 75 dos autos, entendem os Recorrentes que se impõe a conclusão e a decisão no sentido de que os 6 parques de estacionamento estão afectos à utilização exclusiva da fracção NR/C.
RR. Pelas razões expostas, entendem os Recorrentes que a sentença recorrida viola o disposto nos arts. 2.°, n.º 2, 8.°, n.º 2 (hoje transpostos para os artigos 1315.°, n.º 2 e 1322.°, n.º 2 do Código Civil) e 37.°, n.º 1, al. e) Lei n.º 25/96/M (Regime Jurídico da Propriedade Horizontal), bem como o disposto no art. 1229.° (Conteúdo do Direito de Propriedade) do Código Civil.
*
A Autora, ora Recorrida, respondeu à motivação do recurso dos Recorrentes, nos termos constantes a fls. 586 a 609 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
*
Foram colhidos os vistos legais.
*
II – Factos
Vêm provados os seguintes factos pelo Tribunal a quo:
a) O Edifício XX foi construído sobre um terreno descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º XXXX3, sito na freguesia de Nossa Senhora de Fátima e objecto de Concessão por Arrendamento à Fundação Oriente – cfr. Despacho n.º 115/SATOP/95 publicado no Boletim Oficial n.º 38 de 20 de Setembro de 1995, junto a fls. 16 a 19, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
b) Nos termos da cláusula quarta do aludido Despacho ficou estabelecido que o aproveitamento desse terreno consistia na construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, constituído por três torres geminadas com 11 pisos cada uma, sendo o edifício afectado às seguintes finalidades de utilização:
a) Habitação : 15.580,00 m2;
b) Comércio : 666,00 m2;
c) Estacionamento : 724,00 m2;
d) Áreas comuns : 3.654,00 m2;
e) Equipamento social ; 2.141,00 m2;
c) Da memória Descritiva da Fracções Autónomas do Edifício XX, resulta que essas áreas foram distribuídas por quatro blocos (assim denominados, Bloco I, II, III e IV), sendo que o Bloco IV foi afectado a utilização comercial, Equipamento Social e Estacionamento;
d) O rés-do-chão do Edifício XX corresponde ao Bloco IV e nele foram individualizadas 14 fracções autónomas (AR/C a NR/C), tal como resulta do respectivo registo predial AP n.º 28 de 15.07.1999, inscrição n.º 19994F;
e) A fracção NR/C tem área de 974.271m2 (785,722 m2 de área coberta e 188.549 de área descoberta) e é destinada a estacionamento;
f) G adquiriu por escritura de 14 de Maio de 2005 a fracção NR/C, aquisição essa que foi registada na Conservatória do Registo Predial sob a inscrição nº 11XXXXG, em conformidade com o teor do documento junto a fls. 40 a 51 que aqui se dá por integralmente reproduzido;
g) C, através de advogado mandatado para o efeito, dirigiu no passado mês de Janeiro de 2012 uma interpelação à G exigindo a restituição dos seis (6) parques de estacionamento situados na área descoberta do Edifício XX;
h) G veio através de advogado responder a esta interpelação;
i) No passado dia 11 de Abril de 2012 foram colocadas tabuletas na entrada do parque de estacionamento anunciando a venda dos parques de estacionamento do Edifício XX;
j) No dia 29 de Dezembro de 2010 realizou-se uma assembleia-geral de condomínio, tendo sido lavrada a acta constante dos autos a fls. 83, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
k) Para a reunião da assembleia-geral do condomínio do Edifício XX, realizada a 29 de Dezembro de 2010, foram convocados todos os condóminos do Bloco IV desse edifício;
l) Na assembleia-geral do condomínio do Edifício XX de 29 de Dezembro de 2010 estiveram presentes 51 pessoas entre elas G original sendo proprietária ao tempo de uma fracção no Bloco IV;
m) C presta os serviços de administração do condomínio do Bloco IV;
n) A fracção NR/C é composta apenas por 26 parques de estacionamento para carros, dos quais 7 descobertos e 36 parques de estacionamento para motos;
o) G usa seis parques de estacionamento que ficam ao nível da rua e com acesso directo para esta;
p) Os parques de estacionamento referidos na resposta dada ao item o) não estão afectos a qualquer fracção;
q) Um dos 6 (seis) parques encontra-se arrendado à Associação de Apoio aos Deficientes Mentais de Macau pela renda mensal de Mil e Trezentas Patacas (MOP$1.300,00);
r) Daqueles 6 parques de estacionamento referidos na resposta dada aos itens o) e p) alguns estão arrendados por MOP$1.300,00.
*
III – Fundamentação:
1. Do recurso interlocutório:
Entendem os Recorrentes que o Tribunal a quo andou mal em admitir os condóminos a deporem como testemunha, violando assim o artº 518º do CPCM.
Adiantamos desde já que não lhes assiste razão.
O legislador apenas não admite a depor como testemunha os que na causa possam depor como partes – artº 518º do CPCM.
Assim, apesar dos condóminos poderem ter um interesse igual ao da Autora na acção de revindicação da parte comum do prédio, tal facto não os impede a depor como testemunha, na medida em que não foi requerida ou provocada a sua intervenção.
Não tendo intervindo como parte, não estão impedidos de depor como testemunha.
Pelo exposto, o recurso não deixará de se julgar não provido.
2. Do recurso final:
2.1 Da impugnação da decisão da matéria de facto:
Vêm os Recorrentes impugnar a decisão da matéria de facto constante dos quesitos 3º e 5º da Base Instrutória.
Os quesitos 3º e 5º têm a seguinte redacção:

“A fracção NR/C é composta apenas por 26 parques de estacionamento para carros e 36 parques de estacionamento para motos, todos cobertos?”

“Os ditos 6 parques descobertos estão afectos à utilização de todos os condóminos do Edifício XX, Bloco I a IV?”
O Tribunal a quo respondeu pela forma seguinte:
Quesito 3º: provado que “a fracção NR/C é composta apenas por 26 parques de estacionamento para carros, dos quais 7 descobertos e 36 parques de estacionamento para motos.”
Quesito 5º: provado que “os parques de estacionamento referidos na resposta dada ao item 4º não estão afectos a qualquer fracção.”
Na óptica dos Recorrentes, a resposta aos quesitos em referência deveria ser:
Quesito 3º: provado que “a fracção NR/C é composta por 26 parques de estacionamento para carros, 36 parques de estacionamento para motos e 6 parques exteriores”.
Quesito 5º: provado que “os 6 parques de estacionamento referidos na resposta dada ao item 4.° estão afectos à fracção NR/C”.
Para sustentar a sua posição, indicaram os seguintes elementos probatórios:
“Quanto ao quesito n.º 3, como todo o respeito, não vislumbram os Recorrentes qualquer elemento de prova, documental ou testemunhal ou tão-pouco resultante da prova por inspecção, que ateste a resposta do Tribunal a quo no sentido de que "a fracção NR/C é composta apenas por 26 parques de estacionamento para carros, dos quais 7 descobertos e 36 parques de estacionamento para motos".
De todos os elementos constantes dos autos, nada resulta que a fracção NR/C tenha apenas 26 parques de estacionamento para carros, dos quais 7 descobertos.
Repare-se, desde logo, que do Auto de Inspecção ao Local (fls. 463) resultou o seguinte:
"À hora designada no respectivo despacho, procedeu-se à inspecção ao local e verificou-se que a marcação dos lugares do parque de estacionamento não correspondem à planta junta aos autos. Após medição dos mesmos, de A-B corresponde a 17,40m e de C-D a 10,30 m."
Nada mais.
Isto é, do auto de inspecção ao local nada resulta sobre o número de parques de estacionamento, cobertos ou não cobertos, mas tão só a constatação que a marcação dos lugares não corresponde à planta, sendo que nem se percebe se as medições efectuadas dizem respeito a parques situados no interior ou no exterior da fracção.
Não obstante, na fundamentação da resposta à matéria de facto, o Tribunal a quo diz que a resposta ao quesito 3.° (e também ao quesito 5.°) resulta da memória descritiva a que se reportam os autos - conferir fls. 35, 70 e 371 -, considerando o Tribunal a quo que a área total de 974,271 m2 da fracção não incluem os seis parques de estacionamento que estão do lado de fora do edifício.
Ora, salvo o devido respeito, da memória descritiva (cfr. fls. 35, 70 e 371) apenas resulta a área total da fracção NR/C de 974,271 m2) dos quais correspondem a 785,722 m2 de área coberta e 188,549 m2 de área descoberta. Nada se diz sobre o número de parques de estacionamento e se incluem ou não os 6 parques de estacionamento que se encontram do lado de fora do edifício.
Ou seja, tal conclusão do Tribunal a quo não pode encontrar fundamento na memória descritiva, porque efectivamente da mesma nada resulta sobre a localização dos parques de estacionamento que compõem a fracção NR/C.
Acresce que, quanto ao facto de serem descobertos! ainda que dentro da fracção NR/C exista uma área descoberta, nada resulta dos autos, nem tão-pouco encontra explicação na sentença recorrida, quanto ao facto dessa área (descoberta) ter 188,549 m2.
Nada dos autos resulta nesse sentido, pelo que, no mínimo, para o Tribunal responder adequadamente ao quesito n.º 3 da base instrutória, teria que ter ordenado uma medição ao local.
Acresce ainda que, a justificação do Tribunal a quo no sentido de que a fracção NR/C apenas terá acesso pela Travessa dos Currais (fls. 450 dos autos), nada infirma no sentido de que os 6 parques exteriores sejam parte integrante da fracção NR/C.
Com efeito, tal como acima dito, tendo presente o disposto nos arts. 2.°, n.º 2 e 3 e 8.°, n.º 2 da Lei n.º 25/96/M (Regime Jurídico da Propriedade Horizontal), hoje transpostos para os artigos 1315.°, n.º 2 e 1322.°, n.º 2 do Código Civil, logo resulta que a regra da contiguidade não se aplica aos parques de estacionamento.
Donde, nos termos da lei, nada implica que os 6 parques exteriores façam efectivamente parte da fracção NR/C da titularidade dos Recorrentes.
Por outro lado, fazendo menção à prova devidamente documentada nos autos, nenhuma das testemunhas inquiridas a tais quesitos 3.° e 5.° pôde confirmar tais respostas do Tribunal a quo.
Nesse sentido, vejam-se as declarações da testemunha H, ouvida na sessão de julgamento de 13.03.2014, Sub-Directora da DSSOPT, (gravação 1%@NPL@W06611270).WAW), às 15h54.17 – min. 21.36 a 39.34; da testemunha I, ouvido na sessão de julgamento de 13.03.2014, engenheiro do Dep. Licenciamento da DSSOPT, (gravação 1%@NPL@W06611270).WAW), às 15h54.17 – min. 45.15 a 1h06; da testemunha J, ouvido na sessão de julgamento de 13.03.2014, Assessor da DSSOPT, (gravação 1 %@NPL@W06611270).WAW, às 15h54.17 – min. 1h07 a 1h38.35; da testemunha K, Arquitecto, ouvido na sessão de julgamento de 27.03.2014, (gravação (1%S)FX%G06611270).WAW, - min. 18.20 a 27.22; testemunha L, funcionária do DSF, ouvida na sessão de julgamento de 27.03.2014, (gravação (1%S)FX%G06611270).WAW, - min. 28.00 a 44.53, bem como da testemunha M, funcionário do DSF, ouvido na sessão de julgamento de 27.03.2014 (gravação (1%S)FX%G06611270).WAW, - min. 45.00 a 58.30.
A testemunha H, ouvida na sessão de julgamento de 13.03.2014, Sub-Directora da DSSOPT, quesitos 3 e 5 (gravação 1%@NPL@W06611270).WAW, às 15h54.17 – min. 21.36 a 39.34, referiu o seguinte:
(...)
Testemunha (T): Relativamente a este Edifício há uma fracção autónoma que se destina a parques de estacionamento denominado N/RC.
Advogado da Autora (A): Essa fracção que existe, quantos lugares de estacionamento é que tem para veículos automóveis?
T: Trata-se de uma fracção com 974 m2, (...) tem duas áreas uma coberta e outra descoberta (...) Na MD (memória descritiva) não foi indicado o número de parques de estacionamento, razão pela qual há um outro documento denominado ficha técnica.
Quanto à ficha técnica temos que, em Março de 1998, foi revelado o n.º de parques de estacionamento: 26 carros e 36 motas. Pertence a uma só fracção.
Também acrescentaram 6 parques descobertos.
Juiz (J): Então tem 32: 26+6?
T: Está certo.
(...)
Quero concluir que A MD fala em 974m2 não está conforme com a ficha técnica que só indica 700 e tal.., Há discrepância entre os dois documentos.
(...)
Quem prepara os dois documentos é o arquitecto.
(...)
Eu também tenho dúvidas como calcular esses 180 e tal... "
A testemunha I, ouvido na sessão de julgamento de 13.03.2014, engenheiro do Dep. Licenciamento da DSSOPT, ouvido aos quesitos 3.º e 5.º (gravação 1%@NPL@W06611270).WAW), às 15h54.17- min. 45.15 a 1h06, referiu o seguinte:
(...)
Advogado da Autora (A): Conhece o Edifício XX?
Testemunha (T): Sei mais ou menos onde se encontra localizado.
(...)
Antes de vir cá, cheguei a consultar esse desenho (planta) e o não descoberto tem 26 lugares, mais 36 para motas.
A: Essa parte que está descoberta poderá ter 180 e tal m2, nessa planta que está à escala?
T: nesse caso em concreto, não é assim tão claro qual é área dos 180 e tal. (...) Se me perguntar, não consigo responder.
(...)
A: A única forma de confirmar essa área seria medindo-a?
T: Sim, posso dizer que sim.
(...)
Juiz (J): Quem é que faz a memória descritiva?
T: Normalmente é o arquitecto.
1h1min.
Advogado dos Réus (A): Confronto com a ficha técnica - doc. 9 da petição inicial) Nessa ficha técnica tem um item áreas comuns. Nessas áreas comuns menciona algum estacionamento?
T: (...) nessa ficha técnica não dá para perceber se as áreas comuns incluem os parques.
Das declarações da testemunha J, ouvido na sessão de julgamento de 13.03.2014, Assessor da DSSOPT, (gravação 1%@NPL@W06611270).WAW, às 15h54.17 – min. 1h07 a 1h38.35 resultou ter sido o mesmo o responsável pela emissão da certidão de fls. 260 dos autos.
Referiu tal testemunha que: "Na altura houve um pedido de clarificação sobre os vários parques que estariam incluídos na fracção NR/C.
Foi consultado o processo de licenciamento e as telas finais englobam a ficha técnica e a memória descritiva.
(...)
Na altura concluíram que, de acordo com o seu entendimento da lei em vigor, os 6 parques exteriores não pertenciam à fracção por não serem contíguos à fracção."
Juiz (J): Por essa ordem de ideias, esses 6 parques de estacionamento não deveriam referir parte comum? As áreas comuns não deveriam ser identificadas? Uma vez que não um título constitutivo formal, o que temos é uma memória descritiva.
Testemunha (T): Sim, sim, sim. Agora, talvez porque não há nenhuma designação a razão por que foi remetida para áreas comuns é precisamente por causa disso.
J: Por exclusão de partes... E Não seria mais certo uma medição de áreas ... ? Fizeram essa medição?
T: Não. (...) confiaram nas medições que foram feitas. Não voltaram ao local e voltaram a medir.
(...)
T: Há uma incompatibilidade entre o que está descrito na ficha técnica e na MDFA (memória descritiva).
(...)
Para confirmar as áreas comuns e se incluem os 6 parques de estacionamento só fazendo uma remedição, uma nova medição."
Das declarações da testemunha K, Arquitecto, ouvido na sessão de julgamento de 27.03.2014, (gravação (1%S)FX%G06611270).WAW, - min. 18.20 a 27.22, apenas resultou ter sido o mesmo o autor das medições que resultam da planta de fls. 289 dos autos.
Não obstante, tal testemunha referiu expressamente conhecer o prédio por ser amigo do arquitecto autor do projecto, mas que fez as medições apostas planta de fls. 289 dos autos, a pedido do advogado da Autora, medições que fez apenas tendo por base a planta, pois não foi ao local.
Por último das declarações da testemunha L, funcionária do DSF, ouvida na sessão de julgamento de 27.03.2014, (gravação (1%S)FX%G06611270).WAW, min. 28.00 a 44.53, bem como da testemunha M, funcionário do DSF, ouvido na sessão de julgamento de 27.03.2014 (gravação (1%S)FX%G06611270).WAW, - min. 45.00 a 58.30 nada resultou no sentido de fundamentar as respostas aos quesitos 3.° e 5.° da base instrutória.
Com efeito, o que sumariamente resulta das declarações de tais testemunhas é que a Direcção dos Serviços de Finanças, no que diz respeito a atestar o número de parques ou fracções, se limita a emitir certidões ou a fazer rectificações com base nos documentos (certidões) que nesse sentido são emitidos pela DSSOPT.
A par de tudo quanto agora se disse para impugnar a resposta ao quesito 3.°, a contrariar directamente a resposta do Tribunal a quo, quer ao quesito 3.°, mas sobretudo ao quesito 5.° acima transcrito, importa ainda considerar a prova documental.
Com efeito, analisada a sentença recorrida e, necessariamente, o Acórdão que procedeu à resposta à matéria de facto, logo se retira que o Tribunal a quo não se pronunciou, nem tirou quaisquer consequências, sobre as certidões juntas aos autos, cuja consideração impõe diferente resposta aos quesitos 3.° e 5.° da base instrutória.
Referem-se os Recorrentes às certidões das Finanças juntas como documentos 2 e 3 da contestação, bem como às certidões de fls. 260 e de fl. 470 dos autos: a Certidão da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes n.º XX4/DURDEP/2005 e à declaração da Fundação Oriente de 09 de Setembro de 2005.
Dos referidos documentos logo se retira que, desde 2005, os seis parques de estacionamento estão afectos à utilização exclusiva da fracção NR/C.
Com efeito, da certidão de fls. 260 resulta (embora os Recorrentes não aceitem a qualificação dos 6 parques exteriores como comuns), resulta que:
"1) Em conformidade com o requerimento de G, registado sob o n.º de entrada 12100 de 15 de Julho de 2005, em que pede certidão referente à numeração do parque de estacionamento da fracção NR/C sita na Travessa do Canal das Hortas, nº 70, Ou Mun Tai Há, que:
2) Fracção NR/C contém 26 parques-estacionamento de veículo ligeiro, 36 parques de estacionamento de motorciclo, estão contabilizados ainda 6 parques-estacionamento descobertas sita no mesmo prédio referente à Fase II (Torre C e Torre D) pertencentes à área comum do prédio.
3) Por ser verdade e assim constar do processo de licenciamento com o nº 173/91/L a que me reporto, mandei passar a certidão ..."
Por seu turno, a declaração da Fundação Oriente de 09 de Setembro de 2005 vem atestar o seguinte:
"Em seguimento da certidão da Direcção dos Serviços de Obras Públicas e Transportes referente ao ofício número XX4/DURDEP/2005, venho por este meio informar V. Exa. que o parque de estacionamento de 6 lugares da 2ª Fase sitam na Torre C Torre D, pertence à proprietária G.
Mais, em bom rigor, a afectação de tais 6 parques exteriores à fracção NR/C resulta da Ficha Técnica (cfr. fls. 57 e 75 dos autos), ficha essa que, indubitavelmente, faz parte do processo de constituição da propriedade horizontal do Edifício XX.
Nos termos de tal Ficha Técnica (onde só vem referenciada a área coberta) da fracção para estacionamento NR/C de 785.722 m2), desde sempre foram incluídos os 6 parques descobertos para perfazer a área descoberta de 188.549 m2 (e, por essa via, a área total de 97.271 m2 da fracção NR/C).
Sendo ainda certo que, de tal Ficha Técnica, nada resulta no sentido de os 6 parques de estacionamento descobertos fazerem parte da área comum.”
Além disso, entenderam que a regra de continuidade não se aplica ao caso, “em virtude de ao momento da constituição da propriedade horizontal ser aplicável o Regime Jurídico da Propriedade Horizontal constante do Decreto-Lei 25/96/M (o "R.J.P.H.") não é aplicável, ao Edifício XX, a regra da contiguidade na definição das fracções autónomas - face às redacções do artigo 2.° n.º 2 do R.J.P.H. e do actual artigo 1315.° n.º 2 do Código Civil. Ora, o n.º 2 do artigo 2.º do R.J.P.H. e actual artigo 1315.° n.º 2 do Código Civil determinam apenas que um parque de estacionamento pode constituir fracção autónoma, se suficientemente delimitado, mesmo que não esteja delimitado por uma parede que os separe entre si.”
Ou seja, “a norma em questão não aborda o conceito ou requisito legal de contiguidade, mas antes e apenas o requisito de que as fracções autónomas sejam isoladas ou distintas entre si (i.e. fisicamente separadas entre si). Como é bom de ver, este requisito não é apropriado para parques de estacionamento, que em regra têm entrada partilhada e não estão isolados entre si (em Macau, são muito raros os parques de estacionamento tipo "box") circunstância que não impede que se constituam fracções autónomas de "per si" (face à excepção prevista na lei). Nada disto tem a ver com contiguidade.
Sobre esta, estabelece o artigo 8.° n.º 2 do R.J.P.H. que "2. Para efeitos do disposto no número anterior (i.e. dispensa de autorização dos condóminos para junção de fracções), a contiguidade das fracções é dispensada quando se trate de fracções correspondentes a garagens e arrecadações." (parêntesis nosso). O que está aqui em causa nesta redacção é a dispensa de contiguidade mas apenas em casos de junção superveniente de uma garagem e arrecadação (ou de duas garagens) numa única fracção autónoma. Como se constata pela leitura do dispositivo legal prevista no número anterior, o âmbito desta excepção é restrito: respeita apenas aos casos de junção (superveniente) de garagens ou arrecadações numa única fracção. Ou seja, nada tem a ver com o caso dos presentes autos, onde se discute exclusivamente o conteúdo original do título de constituição de propriedade horizontal”.
A Recorrida, C, indicou os seguintes elementos probatórios para infirmar as conclusões dos Recorrentes:
“...17. Ora, ao contrário dos Recorrentes, que laboram num permanente (mas lucrativo) equívoco, o Tribunal a quo analisou com ponderação a documentação nos autos e concluiu com rigor que a mesma é cabal e definitiva - para provar que a fracção dos RR. é apenas constituída por 26 parques de estacionamento para automóveis e 36 parques para motociclos. Transcrevendo da decisão da matéria de facto:
p. 6: "A resposta dada ao item 3.º resulta da memória descritiva do prédio a que se reportam os autos (...)"
p. 6: "A ficha técnica do edifício gera alguma confusão, contudo, não é bastante para suscitar dúvidas sobre a conclusão anterior."
p. 8: "Finalmente a folhas 450 pelo então Leal Senado de Macau consta que à fracção N do Bloco IV, isto é, a fracção dos autos cabem os números de polícia 8 e 48 da Travessa dos Currais, nada se dizendo a outros acessos."
p. 9: "A resposta dada ao item 5.º resulta da fundamentação dada para a resposta do item 3.º em que dos documentos em casa (sic) não resulta que os ditos 6 lugares de estacionamento para carros que estejam afectos a fracção alguma."
Isto é, da leitura da decisão da matéria de facto (proferida a fls. 496 a 500), em particular a folhas 498 verso e 499 verso, chegamos à conclusão que a mesma, no que respeita às respostas dadas aos quesitos 3.° e 5.° (as únicas que os RR. impugnam) foi exclusivamente dada com base em documentos.
Vamos assim analisar todos os documentos nos autos, um por um, para enunciar o que se extrai de cada um desses documentos.
Memória Descritiva das Fracções Autónomas ("MDFA")
18. Reportando-nos à MDFA, parte da certidão de registo predial nos autos, verificamos que na mesma (ver fls. 371 dos autos) está especificada que a fracção dos RR. ("NR/C") tem 785.722m2 de área coberta e 188.549m2 de área descoberta, e a área total de 974.271m2.
19. Ou seja, temos a área total da fracção devidamente identificada, o que associado ao local a confirmar essa localização, delimitação e área e (iii) aos requisitos legais (gerais e abstractos) de qualquer fracção autónoma, permite identificar com rigor e conteúdo a localização, composição e delimitação da referida fracção autónoma NR/C (e concluir que a mesma não inclui os 6 Parques de Estacionamento).
20. Reportando-nos ainda à MDFA, verificamos que na sua página 15 (fls. 373 dos autos) não consta qualquer referência à utilização exclusiva dos Parques de Estacionamento, como encontramos (nessa mesma página) a referência a casos de utilização exclusiva (de partes comuns).
21. Não havendo referência a qualquer utilização exclusiva dos Parques de Estacionamento e sendo estes partes comuns, não existe dúvida sobre a natureza destes Parques de Estacionamento, isto é, partes comuns sem qualquer tipo de utilização exclusiva (e sem relação com a fracção NR/C).
Da Ficha Técnica
22. Outro documento fundamental para decisão feita pelo Tribunal em matéria de prova é precisamente a Ficha Técnica (a fls. 57), emitida pelo competente Arquitecto a 31 de Março de 1998 e aprovada pela DSSOPT.
23. Ora deste documento resulta claramente que a fracção autónoma NR/C é apenas constituída por 26 parques para automóveis e 36 para motociclos. Deste documento (preparado por arquitecto e assinada pelo Delegado da Fundação Oriente em Macau à época, o Dr. João Manuel Rosa Fernandes Amorim) consta a menção própria e inequívoca de que os parques supra constituem uma única fracção (a NR/C, como é óbvio) - através da aposição de uma chaveta, agregando números:
26 CARROS 1 Fracção
36 MOTOS
6 CARROS DESCOBERTOS
Da mesma Ficha Técnica constam também os 6 Parques de Estacionamento descobertos, mas com a menção expressa (através da exclusão da chaveta) de que não fazem parte da fracção autónoma (NR/C) - logo, e como supra explicado, constituem necessariamente partes comuns.
Da Certidão do IACM
24. Também no documento de fls. 450 (página 3 de atribuição de numeração policial feita pelo Leal Senado de Macau, actual IACM) se verifica que foram atribuídos os n.ºs 8 e 48 "às portas de acesso do parque de estacionamento do rés-do-chão do Bloco IV designado por N".
25. Ou seja, e como constatou o Tribunal na inspecção ao local realizada em 27 de Março de 2014 as portas de acesso à fracção NR/C tem os n.ºs 8 e 48, pelo que apenas o que está para além desta entrada (individual e separada) constitui a fracção NR/C. Estando os 6 Parques de Estacionamento aquém destas portas e tendo acesso distinto, os mesmos não fazem parte da fracção NR/C e constituem necessariamente (por exclusão de partes) partes comuns. Não se devendo obliterar que o requisito legal de "saída própria" é também aplicável a parques de estacionamento (vide artigo 1315.° n.º 2 do Código Civil), do mesmo modo se constata que, na planta oficial da fracção NR/C (adiante referida), está assinalado que é através destas portas que se efectua a circulação automóvel para o acesso (e saída) à fracção NR/C.
Certidão n.º XX4/DURDEP/2005
26. Na certidão n.º XX4/DURDEP/2005 da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes de 30 de Agosto de 2005 (a fls. 260 dos autos) certificase expressamente que: "Fracção NR/C contêm 26 parques-estacionamento de veículo ligeiro, 36 parques-estacionamento de motorciclo, estão contabilisadas (sic) ainda 6 parques-estacionamento descobertas sita no mesmo prédio referente à Fase II (Torre C e Torre D) pertencentes à área comun do prédio." (negrito e sublinhado nossos).
27. Também este documento, a fls. 260, confirma e apoia a sentença. Ou seja, e por mais uma vez, foi emitido documento autêntico pela DSSOPT em que se atesta que a composição da fracção NR/C não inclui os 6 Parques de Estacionamento descobertos. Como se poderia ser mais claro? Para que é que, sendo o documento de 2005, em 2015 ainda se discute a questão em juízo?
Da Planta da Fracção NR/C
28. Contudo, o documento que mais cabalmente identifica e delimita a fracção NR/C é precisamente a planta da mesma fracção NR/C - na verdade, a planta do rés-do-chão do Bloco IV. Ora, como resulta dos autos, essa mesma planta foi submetida à e aprovada pela DSSOPT, como parte do licenciamento do Edifício XX. E essa planta é, naturalmente, um dos pressupostos de aprovação da propriedade horizontal e da emissão do documento essencial do título constitutivo, a MDFA. Ora também dessa planta consta devidamente assinalada a fracção NR/C (vide exemplares tanto a planta à escala 1/100, a fls. 287, como o exemplar à escala 1/200, a fls. 289).
29. Ora, uma leitura atenta (e imparcial) da planta em questão (a fls. 287) permite retirar as seguintes conclusões, a saber:
- que a fracção NR/C está claramente assinalada na referida planta pelas letras "NR/C";
- que nessa mesma planta, de acordo com a boa prática, todos os parques de estacionamento (26 para automóvel e 36 para motociclos) estão devidamente numerados;
- que os Parques de Estacionamento descobertos (6) não estão numerados (precisamente porque não fazem parte da fracção NR/C e porque constituem parte comum);
- que a fracção NR/C tem acesso independente do acesso das fracções;
- sendo a fracção NR/C claramente distinta de outras fracções e partes comuns constantes do mesmo piso (rés-do-chão), dos quais se encontra separada por paredes de alvenaria (claramente assinaladas na planta);
- que a área da fracção NR/C, tal como mensurável na planta, é de 974 m2;
- que a área descoberta da fracção NR/C é de 188.549m2 e a área coberta de 785.722m2 (também claramente assinalada na planta pelas linhas a tracejado);
30. Estamos assim perante prova documental cabal, coerente e consistente com todos os outros documentos nos autos. A planta foi desenhada pelos arquitectos responsáveis, sob instruções do dono do prédio (Fundação Oriente) e verificada e aprovada pela DSSOPT como parte do processo de licenciamento do Edifício. Que dúvidas podemos ter após a análise deste documento?
Certidão da DSF - 26 de Agosto de 2011
31. Face ao exposto, é natural que a Certidão n.º XXXX3/2011 da Direcção dos Serviços de Finanças de 26 de Agosto de 2011, a fls. 76 dos autos confirmasse novamente o entendimento expresso na douta sentença, referindo-se nesse documento que a fracção "é composta por vinte e seis (26) parques de estacionamento de veículo ligeiro e trinta e seis (36) parques de estacionamento de motociclos."
32. Não sendo da responsabilidade da A. (ora Recorrida) esclarecer porque razão a mesma Direcção dos Serviços de Finanças teria emitido no passado (Doc. 2 junto à Constestação - fls. 109 - emitido em 21 de Dezembro de 2010), não podemos deixar de constatar que, face a essa clara incongruência ou discrepância, os RR. nada fizeram para a esclarecer no julgamento (aproveitando para o efeito a presença em juízo dos funcionários do respectivo departamento). Certamente por lhes ser conveniente continuar a alimentar estas dúvidas e manter certas incongruências para as reciclar como argumentos. Sendo certo que tendo a certidão XXXX3/2011 datada de 26 de Agosto de 2011, a mesma prevalece e substitui a anterior, datada de 21 de Dezembro de 2010 (assim se corrigindo um erro óbvio).
33. O único documento divergente é o "documento" constante de fls. 470 dos autos, uma carta da Fundação Oriente, que é um documento particular, obtido por encomenda e desprovido de qualquer valor jurídico, que se refere a uma certidão que nem sequer está anexa (a certidão XX4/DURDEP/2005 acima referida), mas que tm conteúdo diferente e contraria o que vem escrito nessa carta.
34. Conclui-se assim que o recurso apresentado pelos RR. é desprovido de fundamento pois tenta anular factos que estão provados por documentos autênticos. Ora, como se sabe o que está expresso em documentos autênticos faz prova plena, a não ser que se suscite o incidente de falsidade dos mesmos.
35. O que todos estes documentos reflectem é: a fracção autónoma existe, tem determinada área, tem determinada localização, tem determinada numeração policial e composição (26 parques de estacionamento para automóveis e 36 para motociclos). O Tribunal analisou todos esses documentos e concluiu que os mesmos eram suficientes para se considerar que na fracção dos RR. não se incluem os Parques de Estacionamento exteriores.
Da Inspecção ao Local
36. Por outro lado e como foi supra referido, o Tribunal teve a oportunidade de realizar uma inspecção ao local (que teve lugar a 27 de Março de 2014 pelas 15 horas), prevista e regulada nos artigos 513.° e seguintes do Código de Processo Civil. Ora, nessa mesma diligência (que, como meio probatório, tem natureza distinta de prova documental e de prova testemunhal) o Tribunal teve ampla oportunidade de verificar a localização e delimitação da fracção NR/C e dos 6 Parques de Estacionamento descobertos.
37. Em particular, o Tribunal teve oportunidade de se certificar que dentro da L composição da fracção NR/C existe efectivamente uma área descoberta (com a área de aproximadamente 188 m2 - como resulta da MDFA), na qual se situam 7 parques de estacionamento. E que por uma questão de mera lógica, se "dentro de portas" já consta essa área descoberta, e esgotando a área total da fracção, com a área constante do título constitutivo de propriedade horizontal, não seria matematicamente possível reclamar uma outra área descoberta (os 6 Parques de Estacionamento) como também fazendo parte da fracção NR/C.
38. O Tribunal também concluiu nessa inspecção ao local (vide acta a fls. 163) que as áreas dessa área descoberta (A-B e C-D) correspondem precisamente às medidas assinaladas nas plantas nos autos (tanto a planta à escala 1/100, como o exemplar à escala 1/200, a fls. 287). Ou seja, e por outras palavras, o Tribunal confirmou (i) in loco e através desta medição por amostragem que a escala das referidas plantas está correcta (estando assim correctas todas as outras medidas na mesma assinaladas), e ainda (ii) que estas plantas (a fls. 287 e 289) descrevem com exactidão a localização, demarcação e composição da fracção (com excepção do facto, claramente assinalado a fls. 463, de que a distribuição dos parques de estacionamento não corresponde à formula assinalada nas plantas).
39. Concluimos assim que o Tribunal, através da diligência realizada, teve uma clara oportunidade para confirmar, directamente e ao vivo, que os factos atestados pela documentação da propriedade horizontal (e que vinham a ser discutidas em juízo há várias sessões) correspondiam à realidade de "tijolos e cimento" inspecionada no local.
40. Quanto às testemunhas, repetimos que as mesmas foram somente esclarecer como é que os documentos são emitidos, quem são os responsáveis pela sua emissão, onde foram arquivados, registados, etc.... As testemunhas foram elucidar o Tribunal do processo de registo de uma propriedade horizontal, que inclui naturalmente a delimitação de cada fracção autónoma e a delimitação das partes comuns. É do título constitutivo de propriedade horizontal que estes elementos constam, fixos no tempo, não sendo mutáveis - a propriedade horizontal permanece como constituída ab lnitio até ser eventualmente alterada, o que não acontece(u) no caso que nos ocupa.
Da Prova Testemunhal
41. Os AA. e Recorridos constatam que os Recorrrentes dispendem extensíssima considerações sobre o depoimento efectuado pelas testemunhas na audiência de discussão e julgamento (vide, em particular, as páginas 10 a 15 das respectivas alegações, em que os Recorrentes procuram desesperadamente encontrar lapsos e incongruências nos depoimentos das testemunhas H, I, J, K e L). Contudo, esta análise, que se compreende apenas enquanto estratégia para lançar a confusão, não faz qualquer sentido.
42. E não faz qualquer sentido porque, como acima se referiu, o Tribunal a quo não deu como provado os quesitos 3.° e 5.° em função destes depoimentos testemunhais. O Tribunal foi absolutamente claro ao explicar, na decisão de matéria de facto (acima citada), que estas respostas tiveram fundamento na documentação junta aos autos. Deste modo os Recorrentes deveriam ao invés, analisar os documentos citados pelo Tribunal a quo e demonstrar, ponto por ponto, porque motivo o respectivo conteúdo não prova os quesitos 3.° e 5.°. Mas não o fazem.
43. Em segundo lugar, esta estratégia não tem qualquer sentido porque os documentos em questão (todos os citados nas respostas aos quesitos 3.° e 5.°) são documentos autênticos, nos termos dos artigos 363.° e 364.° do Código Civil. E como documentos autênticos, têm força probatória plena: "Os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade, oficial público ou notário respectivo, assim como dos factos que neles são atestados com base na percepção da entidade documentadora (...)" (artigo 365.° n.º 1 do Código Civil). Decorrendo ainda que "A força probatória dos documentos autênticos só pode ser ilidida com base na sua falsidade." (artigo 366.° do Código Civil).
44. Por outras palavras: tendo o Tribunal a quo julgado provados os quesitos 3.° e 5.° com base em documentos autênticos (que identifica), não podem os Recorrentes vir invocar a prova testemunhal produzida para anular ou reverter esta prova documental. Ou invocam a falsidade dos referidos documentos autênticos (o que nunca foi feito) ou explicam, em juízo, porque motivos esses documentos autênticos não têm o conteúdo nem os efeitos que o Tribunal lhes atestou (o que também não fizeram).
45. Sem prejuízo, constatamos que a análise da prova testemunhal efectuada pelos Recorrentes foi claramente selectiva e preconceituosa. E isto porque vários dos depoimentos prestados foram absolutamente claros e precisos e os Recorrentes tiveram apenas o cuidado de ... os omitir.
Em particular, o depoimento da testemunha J que, a propósito da certidão XX4/DURDEP/2005 (por si assinada), explicou ao Tribunal claramente com base em que elementos emitiu a mesma:
"Declarações da testemunha J, Assessor da DSSOPT, ouvido na sessão de julgamento de 13.03.2014 [gravação (1%@NLP©W06611270).WAV)]:
"(passagem da audição da testemunha desde 1h09m17s da gravação até 1h10m10s)
"Testemunha: Na altura, quando foi feito o pedido de vistoria, foi entregue, digamos que, aquilo que nós, em termos de engenharia, chamamos de telas finais. As telas finais englobam para além das peças desenhadas, as peças escritas as várias declarações as memórias, ficha técnica, as MDFA. Na altura quando foi solicitado esta certidão foi consultado todo o processo. A ficha técnica, que salvo erro surgiu uma referência aos lugares de estacionamento mas de uma maneira separada. Salvo erro há, na ficha técnica pode-se ver que há uma menção feita pelo Arquitecto na altura."
(passagem da audição da testemunha desde 1h10m30s da gravação até1h11m01s)
"Testemunha: Ora consultando depois as peças desenhadas, pode ver aí, nas peças desenhadas aparecem (...) aparecem, digamos que, estes seis lugares ou que estão, digamos que, (imperceptível) descobertos, estão todas no exterior, e na altura nós entendemos, consultando, de acordo com a peça, que não pertenciam à chamada fracção NR/C."
(passagem da audição da testemunha desde 1h12m14s da gravação até 1h12m42s)
"Advogado da Autora: Então e diga-nos lá, porque razão é que não podem ser parte da fracção N do Rés do chão?
Testemunha: Primeiro, de acordo com a legislação que estava em vigor na altura que é a Lei 25/96, esses lugares de parque para já não estão identificados, nem com numeração nem com qualquer outra nomenclatura."
46. E também a testemunha K "Declarações da testemunha K, Arquitecto, ouvido na sessão de julgamento de 27.03.2014 [gravação (1%S)FX%G06611270). WAV]" através do seu depoimento, convenceu o Tribunal de um facto elementar: o de que, estando as plantas à escala [ambas as plantas a fls. 287 e a fls. 289, ainda que em diferentes escalas], qualquer pessoa poderia, usando um regra e lápis, medir a área fracção NRlC como assinalada na respectiva planta oficial - e assim determinar, com a clareza de um lápis, o que está ou não incluído dentro da respectiva (da fracção NR/C) área totai de 974m2 (exercido que se encontra exemplificado a fls. 289).
47. Podemos assim concluir, peremptoriamente, que a prova testemunhal produzida em juízo não inquina (nem o poderia fazer, dada a natureza dos documentos juntos) a prova documental em que o Tribunal fundou a sua convicção.”
Quid iuris?
Nos termos do nº 1 do artº 599º e do nº 1 do artº 629º, ambos do CPCM, este Tribunal de recurso pode alterar a matéria de facto fixada pelo tribunal de primeira instância quando:
i. Foi cumprido o ónus de impugnação específica da decisão de facto;
ii. Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artº 599º, a decisão com base neles proferida;
iii. Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; e
iv. Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
No caso em apreço, analisadas todas as provas existentes nos autos, não se nos afigura que o Tribunal a quo tenha cometido algum erro na decisão da matéria de facto em causa.
É certo que a lei (al. e) do nº 1 do artº 37º da Lei nº 25/96/M) exige que da “Memória Descritiva das Fracções Autónomas” deve constar, entre outras, a indicação das partes comuns que façam parte do edifício.
Contudo, não podemos esquecer que a al. d) do citado nº 1 do artº 37º da Lei nº 25/96/M (lei vigente à data dos factos) também exige que da mesma memória descritiva deve constar a especificação das fracções autónomas em conformidade com o artº 5º da mesma Lei.
Já sabemos que os 6 parques em discussão não vêm descritos como partes comuns do edifício nem como partes integrantes da fracção autónoma NR/C.
Ora, na falta da descrição específica, entendemos que deve operar a presunção legal prevista tanto na al. d) do nº 2 do artº 10º da Lei nº 25/96/M, como na al. d) do nº 2 do artº 1421º do CCivil de 1966 (lei vigente à data dos factos).
Dispõe a al. d) do nº 2 do artº 10º da Lei nº 25/96/M que os parques de estacionamento, quando não constituam fracções autónomas, presumem-se ser partes comuns do edifício. A al. d) do nº 2 do artº 1421º do CCivil de 1966 tem a redacção algo semelhante.
Em face da disposição legal vigente sobre a matéria, conjugado com os demais elementos probatórios existentes, nomeadamente:
- a certidão da DSSOPT que atesta que aqueles 6 parques constituem partes comuns do edifício;
- a planta da fracção autónoma NR/C que detalha a sua localização e delimitação;
- o resultado da inspecção ao local;
- a Ficha Técnica do arquitecto que exclui os 6 parques de estacionamento como parte integrante da fracção autónoma, etc, andou bem o Tribunal a quo em considerar que os 6 parques de estacionamento são partes comuns do edifício e que não estão afectos à fracção autónoma NR/C.
Improcede, portanto, o recurso nesta parte.
2.2 Da renovação da prova:
Vêm os Recorrentes requerer a renovação da prova no sentido de efectuar uma mediação ao local a fim de confirmar a área abrangida pela fracção autónoma NR/C.
Ora, tendo em conta o supra decidido quanto à impugnação da matéria de facto, deixa de ter qualquer utilidade a requerida diligência.
Nestes termos, é de indeferir o pedido.
2.3 Da questão do uso exclusivo:
Para os Recorrentes, ainda que os 6 parques em referência sejam partes comuns por mera hipótese, os mesmos estão afectos ao seu uso exclusivo.
Também não lhes assiste razão nesta parte.
Dispõe o nº 3 do artº 10º da Lei nº 25/96/M que “o título constitutivo pode afectar ao uso exclusivo de um condómino zonas das partes comuns previstas na al. b) do nº 1 e na al. d) do nº 2, devendo as mesmas delimitadas nos termos do nº 3 do artº 2º”.
Como se vê, só existe o direito de uso exclusivo das partes comuns quando esse direito consta expressamente do respectivo título constitutivo, que não é o caso, pois o título constitutivo da fracção autónoma NR/C não tem qualquer referência respeitante ao uso exclusivo desses 6 parques de estacionamento.
Nesta conformidade, é de julgar improcedente este argumento do recurso.
Tudo visto, resta decidir.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento aos recursos, mantendo-se as decisões recorridas.
*
Custas dos recursos pelos Recorrentes.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 14 de Maio de 2015.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong



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181/2015