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Processo nº 41/2015
(Autos de recurso civil)

Data: 28/Maio/2015

Assunto: Princípio da cooperação (artigo 8º, nº 2 CPC)
Arguição de nulidades processuais
Reforma quanto a custas e multa (artigo 572º, alínea b))

SUMÁRIO
- Considerando que a recorrente se limitou a indicar uma norma jurídica com base na qual se formulou o pedido de partilha provisória da herança, mas sem alegar os pressupostos de facto que consubstanciam a sua invocação, deveria o Tribunal a quo ter convidado a mesma para esclarecer os seus fundamentos, sob pena de ofender o princípio da cooperação previsto no nº 2 do artigo 8º do CPC.
- O recurso ordinário não é um meio idóneo para conhecer das eventuais nulidades processuais, uma vez que essas nulidades devem ser arguidas perante o tribunal onde aquelas alegadamente ocorreram.
- Os incidentes são ocorrências ou questões extraordinárias ou acidentais que surjam na relação processual e que dêem origem à formação de um procedimento distinto do processo da acção.
- Pretendendo a recorrente impugnar a decisão que lhe aplicou uma taxa de justiça pelo seu valor máximo, pode e deve seguir o meio previsto na alínea b) do artigo 572º do Código de Processo Civil, uma vez que, atento o valor da sucumbência, não é susceptível de recurso ordinário.


O Relator,

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Tong Hio Fong

Processo nº 41/2015
(Autos de recurso civil)

Data: 28/Maio/2015

Recorrente:
- A (cabeça-de-casal do processo de inventário)

Objecto do recurso:
- Despacho que indeferiu o pedido de partilha provisória

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
A, cabeça-de-casal do processo de inventário que corre termos no Tribunal Judicial de Base, inconformada com o despacho que indeferiu o pedido de partilha provisória por si formulado, dela interpôs o presente recurso ordinário, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
A. Os demais interessados não foram ouvidos, o que necessariamente influiu ou pode ter influído na análise e decisão do requerido a fls. 2488. Tal omissão integra uma nulidade secundária (atípica ou inominada), subsumível à previsão do mencionado art.º 147º, n.º 1, parte final, do CPC.
B. É, pois, é de anular todo o processado subsequente ao requerimento de fls. 2488 (cfr. art.ºs 147º, 149º, n.º 1, 151º, n.º 1, e 152º, n.º 3 do CPC), a fim de ser feita a notificação, então omitida, para que os demais interessados possam, querendo, pronunciar-se nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 3º, n.º 3 do CPC.
C. Por outro lado, ao indeferir o requerido com base no fundamento de que: O requerimento que antecede não fundamenta a sua pretensão no quadro do disposto no artigo 970º, n.º 3 do CPC, sem antes ter convidado a aqui recorrente a esclarecer os fundamentos de facto e/ou de direito do seu requerimento; o Tribunal recorrido violou o dever de cooperação previsto no artigo 8º, n.º 2 do CPC.
D. Tal omissão, por claramente ter influído no exame e decisão do requerido, integra uma nulidade secundária (atípica ou inominada), subsumível à previsão do mencionado art.º 147º, n.º 1, parte final, do CPC.
E. É, pois, é de anular todo o processado subsequente ao requerimento de fls. 2488 (cfr. os art.ºs 147º, 149º, n.º 1, 151º, n.º 1 e 152º, n.º 3 do CPC), a fim de que possa ser cumprido o dever funcional omitido pelo tribunal.
F. A fundamentação do requerido radica no facto de se verificarem os requisitos do disposto no artigo 970/3 do CPC, pelo que não podia o requerimento de fls. 2488 ter sido indeferido como se não se encontrasse fundamentado.
G. Acresce que qualquer requerimento com vista à partilha provisória formulado ao abrigo do artigo 970/3 do CPC, por melhor fundamentado que se apresentasse, seria sempre e necessariamente indeferido, bem como tributado em custas por o Tribunal recorrido considerar que a partilha provisória se trata de um expediente para contornar o resultado ou efeitos jurídicos do acórdão de fls. 559-578v do apenso B que suspendeu o inventário até ao desfecho da causa prejudicial.
H. Além da falta de fundamentação, o requerimento de fls. 2488 foi indeferido e tributado em 10 unidades de conta por se tratar de uma forma manifesta de contornar-ultrapassar o resultado-efeitos jurídicos do acórdão de fls. 584 do apenso B.
I. O requerimento de fls. 2488 corresponde ao exercício do direito cometido por lei às partes principais de requerer o prosseguimento do inventário (suspenso) com vista à partilha provisória nos termos do disposto no artigo 970º, n.º 3 do CPC, pelo que nunca poderia ter sido decidido como se fosse uma forma de contornar o resultado do acórdão de fls. 584 do apenso B.
J. Por outro lado, verificam-se todos os requisitos previstos para que o Tribunal autorizasse o prosseguimento do inventário (suspenso) com vista à partilha, sujeita a posterior alteração, em conformidade com o que vier a ser decidido na causa prejudicial.
K. Desde logo, porque ocorre demora anormal no julgamento da causa prejudicial dado que a acção foi intentada em 4 de Março de 2013.
L. Depois, porque a viabilidade da causa prejudicial se afigura reduzida conforme demonstrado pelos interessados na Réplica de fls. 374-384 do processo principal.
M. Por outro lado, à data da propositura da referida acção de simples apreciação negativa já tinham já decorrido mais de nove anos sobre a data do início do presente inventário em 22/07/2005.
N. Daí, face ao adiantado estado do presente inventário – o qual aguarda apenas a prolação da sentença homologatória da partilha – justificar-se plenamente a pretendida partilha provisória requerida pela ora Recorrente numa perspectiva de celeridade e boa administração da justiça.
O. Finalmente, porque os inconvenientes no diferimento da partilha superam os que derivam da sua realização como provisória.
P. Isto por duas razões: primeiro, porque enquanto o inventário se encontra na fase final, o mesmo não sucede com a causa prejudicial; segundo, porque o diferimento sine die da partilha impõe aos interessados a eternização da actual situação de impossibilidade de dispor do que lhes coube, enquanto a sua realização como provisória lhes impõe apenas a observância das cautelas previstas no artigo 1022º do CPC.
Q. Por último, deverá sempre ser revogada a decisão que fixou as custas do “incidente” em 10 unidades de conta por o requerido a fls. 2488 não se tratar de questão legalmente designada ou configurada como incidente, nem de uma ocorrência estranha ao desenvolvimento normal da lide que devesse ser tributada segundo os princípios que regem a condenação em custas (artigo 15º do Regime das Custas nos Tribunais), mas apenas de um simples requerimento formulado ao abrigo de lei expressa, i.e., o artigo 970º, n.º 2 do CPC.
R. Não, pode, portanto, manter-se nenhuma parte da decisão recorrida.
S. Mesmo que assim não se entenda – o que apenas se equaciona por mera hipótese de raciocínio – nunca se justificaria a tributação pelo máximo de um simples requerimento, que não deu azo a outro processado que não a decisão recorrida de fls. 2489, e que não teve qualquer intuito dilatório (pelo contrário) por se inscrever um processo suspenso por tempo indeterminado.
Conclui, pedindo a anulação ou revogação do despacho recorrido, com as consequências legais.
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Devidamente notificados, responderam os interessados Lau Siu Chi e Lau Sio Kuong, formulando as seguintes conclusões alegatórias, pugnando pela negação de provimento ao recurso:
1. O presente recurso jurisdicional incide sobre o douto despacho do Tribunal a quo que indeferiu o pedido de partilha provisória da herança apresentado pela recorrente.
2. A recorrente optou por ocultar concretamente o requisito que legitimava a sua actuação processual, condição necessária e pressuposta do requerimento que apresentou.
3. Não basta, obviamente, aludir a uma norma genericamente; é necessário demonstrar o preenchimento dos requisitos de aplicação da mesma – os pressupostos de facto que consubstanciam a sua invocação.
4. O Tribunal não tem sempre de ouvir as contrapartes para que se possa pronunciar sobre um requerimento.
5. A recorrente vem apelar a direitos de terceiros que não foram prejudicados pela decisão, que não sofreram qualquer ofensa aos sues direitos processualmente consagrados por uma decisão que teve o condão de manter inalterada a sua esfera jurídica, protegendo de antemão os seus interesses.
6. O Tribunal poderia eventualmente convidar as demais partes a pronunciarem-se sobre o requerimento apresentado se este tivesse a mínima chance de obter provimento, não nos termos em que foi apresentado, pois não incumbe àquelas suprir as faltas da recorrente.
7. Nem as partes nem o Tribunal estão obrigados a substituir-se à recorrente no ónus de esgrimir argumentos de facto ou de direito para que as suas pretensões colham.
8. As nulidades processuais, de resto, argúem-se perante o Tribunal onde ocorrem e não em sede de recurso.
9. O recurso não serve nem é o meio próprio para conhecer da infracção às regras do processo quando a parte interessada não arguiu a nulidade perante o Tribunal onde aquela ocorreu.
10. Não tendo sido suscitada a alegada nulidade processual no Tribunal a quo, não é este seguramente o momento nem o meio oportuno para conhecer da mesma.
11. Faz sentido que o Tribunal oiça as partes quando haja que obter algum esclarecimento premente, não quando alguma delas pretenda alcançar um efeito jurídico sem fundamentar minimamente a sua pretensão.
12. O Tribunal deve indeferir uma pretensão quando é manifesta a sua improcedência.
13. A norma jurídica a que alude a recorrente prevê um conjunto de três requisitos que se devem mostrar preenchidos (alternativa ou conjuntamente) para que os seus efeitos possam ser despoletados.
14. A recorrente não se esforçou minimamente nem por identificar, muito menos por demonstrar, o preenchimento de qualquer um deles.
15. Apenas agora, em sede de recurso, quando já não é tempestivo fazê-lo, vem a recorrente invocar os fundamentos/pressupostos de facto para que possa ser decretada a partilha provisória.
16. Nem ocorre demora anormal no julgamento da causa prejudicial nem tampouco se afigura reduzida a viabilidade da causa prejudicial, muito pelo contrário.
17. Os demais inconvenientes da suspensão do inventário, a que alude a recorrente, podem ser obviados por uma partilha que abranja todos os bens relacionados, exceptuado aquele cuja indeterminação da situação jurídica ditou o decretamento da suspensão.
18. É importante frisar que os recorridos nunca se opuseram à partilha provisória dos bens da herança, como reiteradamente fizeram consignar nestes autos, contanto se exclua a verba n.º 49 relacionada no inventário.
19. Censuravelmente, porém, o propósito da recorrente com este requerimento foi efectivamente contornar os efeitos da suspensão do inventário.
20. A recorrente silenciou propositadamente a condição que sabe ser essencial para que os recorridos possam alguma vez aceitar a partilha provisória e para que os pressupostos que determinaram a suspensão dos autos não sejam frontalmente desconsiderados.
21. Finalmente, o preceito do art.º 970º, n.º 3 do Código de Processo Civil pressupõe que as partes principais do inventário estejam de acordo quanto à partilha provisória dos bens.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
Provada está a seguinte matéria de facto relevante para a decisão da causa:
Por despacho de 19.3.2013 do TJB, foi ordenada a suspensão do processo de inventário autuado e registado sob o nº CV3-05-0056-CIV até ser proferida decisão transitada em julgado num outro processo (CV3-13-0018-CAO) onde se discute a existência de direitos relativos à concessão por arrendamento sobre um determinado lote de terreno que na relação de bens do processo de inventário foi descrito com o nº 49.
Inconformada com a decisão, dela interpôs a cabeça-de-casal ora recorrente recurso ao TSI, ao qual foi negado provimento por Acórdão de 22.5.2014.
A 15.7.2014, a recorrente formulou o seguinte pedido:
“A, cabeça de casal nos autos à margem referenciados vem, na sequência do trânsito em julgado do acórdão de 22/05/2014 e por se verificarem os requisitos do disposto no artigo 970/3 do CPC, requerer ao Tribunal que autorize o prosseguimento do inventário com vista à partilha provisória da herança, sem prejuízo das cautelas previstas no artigo 1022 relativamente à entrega aos interessados dos bens que lhes couberem.”
Sobre esse pedido recaiu o seguinte despacho:
“O requerimento que antecede não fundamenta a sua pretensão no quadro do disposto no artº 970º, nº 3 do C.P.C.
“Atira” a uma pretensão na expectativa de ser atendida.
Acresce que é também forma manifesta de contornar o resultado do acórdão que transitou apenas há um mês e oito dias, de ultrapassar os seus efeitos jurídicos – cfr. fls. 584 do apenso B.
Desta arte, com o devido respeito, impõe-se o indeferimento do requerido prosseguimento dos autos.
Custas do incidente com taxa de justiça fixada em 10 UC.
Notifique.”
*
Esta é a decisão recorrida.
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Das nulidades processuais
Invoca a recorrente que o Tribunal a quo cometeu nulidades processuais, na medida em que este, antes de dar a decisão (de indeferimento), não ordenou a notificação dos restantes interessados para se pronunciarem sobre o requerimento, bem assim, não convidou a recorrente para vir esclarecer os fundamentos de facto e/ou de direito do seu requerimento, violando deste modo o dever de cooperação previsto no artigo 8º, nº 2 do CPC.
Vejamos.
Em primeiro lugar, no tocante à questão de audição prévia, em regra, as partes interessadas devem ser ouvidas antes de ser dada qualquer decisão judicial. No fundo, trata-se de uma manifestação do princípio do contraditório.
Mas o que está em causa no vertente caso é que a recorrente vem apelar a direitos dos demais interessados que não foram prejudicados pela decisão.
De facto, não obstante que os demais interessados no inventário não foram previamente notificados para se pronunciarem sobre o requerimento formulado pela recorrente, mas a decisão proferida pelo Tribunal a quo é-lhes favorável, pelo que é manifestamente necessária a tal notificação.
Defendem José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, em anotação ao artigo 3º do Código de Processo Civil de Portugal: “pode não ter lugar o convite para discutir uma questão de direito quando a questão seja decidida favoravelmente à parte não ouvida, o que sempre implicaria irrelevância da omissão…”1
Em segundo lugar, a respeito da suposta violação do dever de cooperação previsto no artigo 8º, nº 2 do CPC, com fundamento em não ter sido convidada a recorrente para esclarecer os fundamentos de facto e/ou de direito do seu requerimento, talvez assista alguma razão à recorrente.
Como se dispõe no nº 2 do artigo 8º do Código de Processo Civil, “o juiz pode, em qualquer altura do processo, ouvir as partes, seus representantes ou mandatários judiciais, convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes e dando conhecimento à outra parte dos resultados da diligência”.
Como observam José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, na obra citada, “Estes esclarecimentos não se confundem, mesmo quando respeitam à matéria de facto, com as informações a que se refere o art. 417º, respeitante também ao princípio da cooperação, mas em sede de instrução do processo. Não se trata ali de diligências probatórias (informações sobre a verificação dos factos da causa), mas de esclarecimentos sobre a alegação dos factos, bem como sobre os fundamentos de direito do pedido e das excepções, ainda que dos primeiros possa resultar prova por confissão”.2
Em boa verdade, trata-se de um poder-dever do tribunal, desdobrando-se, entre outras manifestações, no dever de se esclarecer junto das partes quanto às dúvidas que tenha sobre os seus pedidos ou alegações, de modo a evitar que a sua decisão seja proferida com falta ou insuficiência de informações.
In casu, a recorrente vem requerer ao Tribunal a quo o prosseguimento do inventário com vista à partilha provisória da herança, nos termos previstos no disposto no artigo 970º, nº 3 do CPC.
Em nossa opinião, trata-se de um pedido novo, uma vez que a tal questão não foi suscitada nem apreciada no recurso interposto da decisão que deferiu a suspensão do inventário.
Mais precisamente, são dois pedidos diferentes: um tem a ver com o pedido de suspensão do inventário previsto nos nºs 1 e 2 do artigo 970º do CPC (que já foi objecto de recurso), outro diz respeito à partilha provisória da herança prevista no nº 3 do mesmo artigo.
Sendo assim, considerando que a recorrente se limitou a indicar uma norma jurídica com base na qual se formulou o pedido de partilha provisória da herança, mas sem alegar os pressupostos de facto que consubstanciam a sua invocação, deveria o Tribunal a quo ter convidado a mesma para esclarecer os seus fundamentos, sob pena de ofender o princípio da cooperação.
Mas uma coisa é certa, mesmo que a recorrente tenha razão nesse aspecto, o recurso agora interposto não é um meio idóneo para conhecer das eventuais nulidades processuais.
Preceitua-se no nº 1 do artigo 151º do Código de Processo Civil, “…o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência”.
Isso significa que, no fundo, as nulidades processuais devem ser arguidas dentro do prazo legal e perante o tribunal onde aquelas alegadamente ocorreram.
Veja-se o que se disse no Acórdão deste TSI, no Processo 365/2011:
“Não pode portanto a ora recorrente reagir contra o despacho ora recorrido directamente por via de recurso.
Pelo contrário, tem de provocar primeiro uma decisão no tribunal a quo onde foi cometida a pretensa ilegalidade processual para depois, no caso de o tribunal não lhe der razão, recorrer dessa decisão.
Não o tendo feito assim, não é de conhecer directamente da pretensa nulidade em sede do presente recurso.”
Aqui chegados, uma vez que a recorrente não logrou arguir junto do Tribunal a quo as supostas nulidades processuais, não pode agora interpor recurso da decisão recorrida para este TSI, com fundamento na existência daquelas situações de nulidade.
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Da admissibilidade do requerimento
Entende a recorrente que o requerimento por si formulado deveria ser atendido por se encontrarem preenchidos os requisitos previstos do artigo 970º, nº 3 do CPC.
De facto, pode ser autorizado o prosseguimento do inventário com vista à partilha provisória nas seguintes situações:
- Quando ocorra demora anormal na propositura ou julgamento da causa prejudicial;
- Quando a viabilidade desta se afigure reduzida; ou
- Quando os inconvenientes no diferimento da partilha superem os que derivam da sua realização como provisória.
Como acima se referiu, a recorrente limitou-se a indicar uma norma jurídica com base na qual se formulou o pedido de partilha provisória da herança, mas sem alegar os pressupostos de facto que consubstanciam a sua invocação, só o fez em sede de recurso, daí que não logrando identificar nem demonstrar o preenchimento de qualquer um deles, o recurso não deixa de improceder nesta parte.
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Da condenação quanto à taxa de justiça em 10 U.C.
À recorrente foi aplicada uma taxa de justiça de 10 U.C. devida pelo incidente.
Defende a recorrente que não se trata de um incidente nem de uma ocorrência estranha ao desenvolvimento normal da lide que devesse ser tributada segundo os princípios que regem a condenação em custas, mas de um simples requerimento formulado ao abrigo de lei expressa. E mesmo que assim não se entenda, acha que não se justificaria a tributação pelo máximo.
Para Eurico Lopes Cardoso, são incidentes aqueles que “pressupõem a existência duma causa principal, carecem de autonomia processual e têm fins limitados(…), sendo inumeráveis as questões que podem surgir no decurso das causas e cuja discussão tem carácter incidental. A grande maioria constitui objecto de incidentes inominados; outras são assunto de incidentes perfeitamente definidos e até assim intitulados”3.
Segundo José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, “os incidentes são procedimentos anómalos, isto é, sequências de actos que exorbitam da tramitação normal do processo e têm, por isso, carácter eventual, visando a resolução de determinadas questões que, embora sempre de algum modo relacionadas com o objecto do processo, não fazem parte do encadeado lógico necessário à resolução do pleito tal como ele é inicialmente desenhado pelas partes”.4
De um modo geral, incidentes são ocorrências ou questões extraordinárias ou acidentais que surjam na relação processual e que dêem origem à formação de um procedimento distinto do processo da acção.
A nosso ver, não temos dúvidas de que o requerimento formulado pela recorrente consiste num verdadeiro incidente de instância, pelo facto de ser uma questão incidental levantada pela recorrente no decurso do processo principal e que apresente, em relação ao objecto da acção, carácter acessório.
E não obstante se vislumbrar alguma dúvida se haveria necessidade de ser aplicada à recorrente uma taxa de justiça pelo seu valor máximo, entretanto entendemos que o meio utilizado pela recorrente para impugnar a tal decisão não é o mais correcto.
Salvo o devido respeito por melhor opinião, a recorrente pode e deve seguir o meio previsto na alínea b) do artigo 572º do Código de Processo Civil, uma vez que, atento o valor da sucumbência, não é susceptível de recurso ordinário.
Observa Viriato de Lima, “a reforma quanto a custas e multa visa a alteração da sentença quanto a qualquer destas matérias, por se entender que a mesma é injusta(…), trata-se de verdadeiro erro de julgamento quanto a custas ou multa. Trata-se de uma possibilidade excepcional de impugnar uma (parte) decisão, perante o próprio tribunal que a proferiu, pois, em regra, em caso de discordância da parte, a lei só admite o recurso”5.
Nestes termos, somos a entender que o recurso não é um meio idóneo nem legal para reagir contra uma decisão de condenação em custas.
No mesmo sentido, cita-se o Acórdão deste TSI, no Processo 884/2012:
“O meio reacção idóneo para reagir contra a decisão quanto a custas não é o recurso ordinário, mas sim o previsto no artº 572º/-b) do CPC, à luz do qual pode qualquer das partes requerer no tribunal que proferiu a sentença a sua reforma quanto a custas e multa.”
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em não conhecer das questões suscitadas pela recorrente A quanto às nulidades processuais e à condenação em custas, e negar provimento ao recurso no tocante à restante matéria.
Custas pela recorrente.
Registe e notifique.
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RAEM, a 28 de Maio de 2015
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
1 José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º, 3ª edição, página 10
2 Obra citada, página 26
3 Eurico Lopes-Cardosa, Manual dos Incidentes da Instância em Processo Civil, 1996, página 14
4 José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º, página 169
5 Viriato Manuel Pinheiro de Lima, Manual de Direito Processual Civil, CFJJ, 2005, página 549
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