Processo n.º 950/2015 Data do acórdão: 2015-11-19 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– condução em estado de embriaguez
– prevenção geral
S U M Á R I O
São elevadas as exigências de prevenção geral do delito penal de condução em estado de embriaguez, por ser consabidamente potenciador de acidente de viação, com ofensa grave à integridade física ou mesmo à vida humanas.
O relator,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 950/2015
(Autos de recurso penal)
Arguido recorrente: B (B)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por sentença proferida em 21 de Setembro de 2015 a fls. 31 a 32v do Processo Sumário n.° CR4-15-0170-PSM do 4.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB) (com o respectivo texto disponível a partir de 29 de Setembro de 2015), o arguido B, aí já melhor identificado, ficou condenado, pela prática em 21 de Setembro de 2015, em autoria material, de um crime consumado de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 90.º, n.º 1, da Lei n.º 3/2007, de 7 de Maio (isto é, Lei do Trânsito Rodoviário, doravante abreviada como LTR), na pena de quatro meses de prisão, suspensa na execução por dois anos, sob condição de prestação, dentro de trinta dias contados do trânsito em julgado da decisão, de dez mil patacas de contribuição a favor da Região Administrativa Especial de Macau, para além de ficar punido com inibição efectiva de condução automóvel, pelo período de um ano e seis meses.
Inconformado, veio o arguido recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), imputando ao Tribunal sentenciador a errada interpretação e aplicação da norma do n.º 1 do art.º 109.º da LTR, alegando, na sua essência, que trabalhando ele como agente de relações públicas em salas VIP de casino, precisa de conduzir veículo no exercício das suas funções, pelo que estando assente na sentença recorrida que confessou ele integralmente e sem reservas a matéria da acusação, com rendimento mensal entre trinta mil e setenta mil patacas, e os pais a seu cargo, merece ele a suspensão da execução da inibição de condução, já que a execução imediata dessa sanção pelo período de dezoito meses o vai inexoravelmente atirar para o desemprego, afectando assim necessariamente a sua capacidade de ganho e consequentemente a possibilidade de suportar financeiramente os seus pais (cfr. com mais detalhes, a motivação do recurso apresentada a fls. 40 a 46 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu (a fls. 49 a 52 dos autos) o Ministério Público, no sentido de confirmação do julgado.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 61 a 62), pugnando também pela manutenção da decisão recorrida.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Segundo a sentença ora recorrida:
– o ora recorrente chegou a ser condenado em 11 de Novembro de 2009 no Processo n.º CR3-09-0364-PSM do TJB, pela prática de um crime p. e p. pelo art.º 92.º, n.º 1, da LTR (i.e., crime de condução durante o período de inibição de condução, punível pela moldura penal do crime de desobediência qualificada), em noventa dias de multa, com cassação da carta de condução, tendo a multa sido já paga em 16 de Dezembro de 2009;
– e também condenado em 13 de Maio de 2011 no Processo n.º CR2-10-0020-PCS do TJB, pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 90.º, n.º 1, da LTR, em três meses de prisão, substituída por multa, com inibição de condução por um ano, tendo a multa sido já paga em 5 de Agosto de 2011.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, é de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Nesses parâmetros, vê-se que o recorrente acabou por sindicar unicamente do mérito da decisão de não suspensão da execução da pena de inibição de condução.
De acordo com o art.o 90.o, n.o 1, da LTR, o crime de condução em estado de embriaguez é punível inclusivamente com inibição de condução.
Assim, no que a esta sanção diz respeito, entende o presente Tribunal de recurso que no caso não se pode realmente mandar suspender a sua execução sob a égide do art.º 109.º, n.º 1, da LTR, porquanto:
– nesta vez, já é a segunda vez em que o recorrente ficou condenado pela prática do crime de condução em estado de embriaguez, pelo que desde já na perspectiva de prevenção especial falando, é difícil formar um juízo de prognose favorável para efeitos a relevar do critério material vertido no art.º 48.º, n.º 1, do Código Penal (por não ser de acreditar que a ameaça da execução da pena acessória de inibição de condução já o consiga prevenir da prática, no futuro, de similares actos de condução em estado de embriaguez);
– a sua confissão integral e sem reservas dos factos nesta vez não tem valor relevante para abonar a ora pretensão de suspensão da inibição de condução, porque ele foi apanhado em flagrante delito e por isso julgado no ora subjacente processo sumário;
– e são, por outro lado, elevadas as exigências de prevenção geral do delito penal de condução em estado de embriaguez, por ser consabidamente potenciador de acidente de viação, com ofensa grave à integridade física ou mesmo à vida humanas.
É, pois, de naufragar o recurso, ainda que o recorrente tenha encargos familiares e precise de conduzir no seu trabalho actual.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar não provido o recurso.
Custas do recurso pelo arguido, com três UC de taxa de justiça.
O presente acórdão é irrecorrível nos termos do art.º 390.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal.
Comunique ao Processo n.º CR3-15-0543-PCS do Tribunal Judicial de Base (com referência ao ofício de fl. 65).
Comunique ao Corpo de Polícia de Segurança Pública (com referência ao ofício de fl. 66).
Macau, 19 de Novembro de 2015.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)
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