Processo nº 799/2015
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. A (A), com os restantes sinais dos autos e ora preso no Estabelecimento Prisional de Macau (E.P.M.), vem recorrer da decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, motivando para, a final, concluir, imputando à decisão recorrida o vício de violação do disposto no artº 56º do C.P.M.; (cfr., fls. 204 a 209-v que como as que adiante se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os legais efeitos).
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Em resposta, pugna o Exm° Magistrado do Ministério Público no sentido da improcedência do recurso; (cfr., fls. 211 a 211-v).
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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Na Motivação do recurso (fls.205 a 209v. dos autos), o recorrente pediu a revogação do douto despacho recorrido e a concessão da liberdade condicional, assacando-lhe o vício de violar o disposto no art.56° do CPM, por entender que ele reunir todos os pressupostos.
Antes de mais, subscrevemos as criteriosas explanações do Exmo. Colega na douta Resposta (cfl. fls.211 e verso).
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No dia de hoje, constitui jurisprudência firme que a concessão da liberdade condicional depende do preenchimento cumulativo de todos os pressupostos, quer formais quer substanciais, consignados no art.56° do CPM, bastando a não verificação de qualquer um para se negar o pedido da liberdade condicional (a título exemplificativo, Acórdão do TSI no Processo n.°195/2003).
Importa recordar que a liberdade condicional não é uma medida de clemência ou de recompensa por mera boa conduta prisional, e serve na política do C.P.M. um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o recluso possa equilibradamente recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão. (Acórdão do TSI no Processo n.°50/2002)
Daí decorre que se, não obstante um comportamento prisional adequado, pelo passado do recluso e perspectivas de reintegração se não se formula um juízo de prognose favorável a uma regeneração e se teme pelas razões de prevenção geral. (Acórdãos do TSI nos Processos n.°225/2010)
Ainda se inculca reiteradamente que cada situação deve ser observada em concreto e caso a caso, num circunstancialismo de modo, tempo e lugar próprios, analisando de forma crítica a personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo se vai reinserir na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo ainda constituir matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social. (Acs. do TSI nos Processos n.°225/2010 e n.°404/2011)
Envolvendo conceitos indeterminados de prognose, as alíneas a) e b) do n.°1 do referido art.56° dota aos julgadores certa margem de livre apreciação na interpretação e na valorização, pelo que a convicção de não verificação dos pressupostos subjectivos só poderia ser neutralizado se houvesse uma exemplar e excelente evolução activa da personalidade do recluso durante a execução da prisão, e não um mero comportamento passivo cumpridor das regras básicas de conduta prisional. (Acórdãos do TSI nos Processos n.°9/2002)
No caso sub judice, o MM° Juiz a quo refere de forma prudente: 在特別預防方面,服刑人A是首次入獄,但並非初犯。服刑人服刑期間其行為總評價為“一般”,其於2015年2月27日的搜查行動中涉嫌有違禁物品,有關案件仍在調查中。其沒有參與獄中的學習活動,其於2014年10月開始參與獄中的貨倉職訓,但因涉違規而暫被中止職訓。
另一方面,其仍未完全繳交相關判刑卷宗的訴訟費用。
考慮到服刑人並非初犯,以及其在獄中的表現,尤其考慮到其在緩刑期內再犯事及服刑期間涉嫌持有違禁品,本法庭認為服刑人重犯的可能性高,對於服刑人的人格是否得到充分的改善及趨向正面亦存在疑問,對於服刑人是否能以對社會負責任的方式重返社會及不再犯罪仍信心不足。
À nível da prevenção geral, é pois cristal a preocupação do MM° Juiz a quo ao afirmar: 此外,考慮到涉及駕駛罪行的相關問題對於社會治安及公共安全構成嚴重的負面影響,相關的犯罪對於居民的人身及財產安全構成威脅,且考慮到近日醉駕、毒駕、禁駕期間駕駛的犯罪時有發生,更不乏緩刑期內再犯的個案,對此,本法庭認為,服刑人的行為對法制構成負面沖擊,嚴重危害社會治安及公眾安寧,顯示出要預防此類犯罪的急切性,為此,相關的負面影響在假釋時仍必須衡量,以判斷服刑人提早釋放會否對公眾在心理上無法承受。
Tudo isto aconselha que não obstante se militarem, nos autos, umas circunstâncias favoráveis ao recorrente, mas, na esteia das persuasivas jurisprudências supra citadas, aderimos, sem reserva, à posição do MM° Juiz a quo, no sentido de ele ainda não reunir, por ora, os pressupostos consagrados do n.°1 do art.56° do CPM.
Com efeito, como bem observou o MM° Juiz a quo, a colocação do recorrente em liberdade nesta altura não é compatível com a reintegração dele na sociedade nem com a paz social. O que nos dá a prever, a jusante, que não se verifica, na presente altura, o pressuposto consagrado no n.°1 do art.56° do CPM”; (cfr., fls. 220 a 221).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da manifesta improcedência do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Flui dos autos a factualidade seguinte (com relevo para a decisão a proferir):
– A, ora recorrente, encontra-se a cumprir uma pena única de 3 anos e 5 meses de prisão, resultado do cúmulo jurídico das penas aplicadas em 4 processos, tal como se explicita na decisão recorrida;
– o mesmo recorrente, deu entrada no E.P.M. em 19.04.2013, e em 25.07.2015, cumpriu dois terços da referida pena, vindo a expiar totalmente a mesma pena em 15.09.2016;
– se lhe vier a ser concedida a liberdade condicional, tenciona voltar a viver com a sua família em Macau.
Do direito
3. Insurge-se o ora recorrente contra a decisão que lhe negou a concessão de liberdade condicional, afirmando, em síntese, que se devia considerar que reunidos estão todos os pressupostos do artº 56º do C.P.M. para que tal libertação antecipada lhe fosse concedida.
Vejamos.
— Preceitua o citado artº 56º do C.P.M. (que regula os “Pressupostos e duração” da liberdade condicional) que:
“1. O tribunal coloca o condenado a pena de prisão em liberdade condicional quando se encontrarem cumpridos dois terços da pena e no mínimo 6 meses, se:
a) For fundamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes; e
b) A libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social.
2. A liberdade condicional tem duração igual ao tempo de prisão que falte cumprir, mas nunca superior a 5 anos.
3. A aplicação da liberdade condicional depende do consentimento do condenado”; (sub. nosso).
Constituem, assim, “pressupostos objectivos” ou “formais”, a condenação em pena de prisão superior a seis (6) meses e o cumprimento de dois terços da pena, num mínimo de (também) seis (6) meses; (cfr. nº 1).
“In casu”, atenta a pena única que ao recorrente foi fixada, e visto que se encontra ininterruptamente preso desde 19.04.2013, expiados estão já dois terços de tal pena, pelo que preenchidos estão os ditos pressupostos formais.
Todavia, e como é sabido, tal “circunstancialismo” não basta, já que não sendo a liberdade condicional uma medida de concessão automática, impõe-se para a sua concessão, a verificação cumulativa de outros pressupostos de natureza “material”: os previstos nas alíneas a) e b) do nº 1 do referido artº 56º.
Com efeito, importa ter em conta que a liberdade condicional não é uma “medida de clemência”, constituindo uma medida que faz parte do normal desenvolver da execução da pena de prisão, manifestando-se como uma forma de individualização da pena no fito de ressocialização, pois que serve um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa, equilibradamente, recobrar o sentido de orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão; (cfr., v.g., J. L. Morais Rocha e A. C. Sá Gomes in “Entre a Reclusão e a Liberdade – Estudos Penitenciários”, Vol. I, em concreto, “Algumas notas sobre o direito penitenciário”, IV cap., pág. 41 e segs.).
Na esteira do repetidamente decidido nesta Instância, a liberdade condicional “é de conceder caso a caso, dependendo da análise da personalidade do recluso e de um juízo de prognose fortemente indiciador de que o mesmo vai reinserir-se na sociedade e ter uma vida em sintonia com as regras de convivência normal, devendo também constituir óbviamente matéria de ponderação, a defesa da ordem jurídica e da paz social”; (cfr., v.g., os recentes Acs. deste T.S.I. de 11.04.2013, Proc. nº 177/2013, de 25.04.2013, Proc. nº 213/2013 e o de 20.06.2013, Proc. n.° 350/2013).
Assim, detenhamo-nos na apreciação de tais pressupostos de natureza material.
Ponderando na factualidade atrás retratada, poder-se-á dizer que é fundadamente de esperar, atentas as circunstâncias do caso, a vida anterior do agente, a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da prisão, que o condenado, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, mostrando-se a pretendida liberdade condicional compatível com a defesa da ordem jurídica e paz social?
Cremos que de sentido negativo deve ser a resposta, mostrando-se-nos de subscrever o teor do douto Parecer do Ilustre Procurador Adjunto, que aqui, por uma questão de economia processual, se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
De facto, (e independentemente do demais), viável não se mostra o necessário juízo de prognose favorável.
Com efeito, o ora recorrente tem vindo a responder pela prática de crimes desde 2011, possuindo um extenso (e notável) Registo Criminal, (cfr., fls. 149 a 166), tendo sido condenado pela prática dos crimes de “tráfico de pequenas quantidades”, “condução em estado de embriaguez”, “desobediência qualificada”, e “resistência e coacção”, tudo a revelar uma personalidade com tendência para a prática do crime, que insiste em delinquir que não aproveita as oportunidades que lhe forem concedidas e que se alheia de tudo o que não seja apenas o “seu interesse”.
Por sua vez, e atenta a tipologia dos crimes cometidos, importa também acautelar a sua repercussão na sociedade, o que equivale a dizer que não podem ser postergadas as exigências de tutela do ordenamento jurídico; (cfr., F. Dias in “Dto Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 528 e segs.), havendo igualmente que salvaguardar a confiança e as expectativas da comunidade no que toca à validade da norma violada através do “restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada”; (cfr., F. Dias in “Temas Básicos da Doutrina Penal”, pág. 106).
Assim, em face das expostas considerações, manifesto sendo que verificados não estão os pressupostos do art. 56°, n.° 1 do C.P.M., à vista está a solução.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 3 UCs, pagando também como sanção pela rejeição o equivalente a 3UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Macau, aos 30 de Setembro de 2015
José Maria Dias Azedo
Proc. 799/2015 Pág. 12
Proc. 799/2015 Pág. 11