--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). --------------------------
--- Data: 19/11/2015 --------------------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Juiz José Maria Dias Azedo ---------------------------------------------------------------------------
--- 簡要裁判 (按照經第9/2013號法律修改的<<刑事訴訟法典>>第407條第6款規定) -----------
--- 日期:19/11/2015 ------------------------------------------------------------------------------------------------
--- 裁判書製作法官:司徒民正法官 ----------------------------------------------------------------------------
Processo nº 957/2015
(Autos de recurso penal)
(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)
Relatório
1. A e B, assistentes com os restantes sinais dos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Mmo Juiz do T.J.B. que absolveu o arguido C da imputada prática como autor e em concurso real de 2 crimes de “injúria”, p. e p. pelo art. 175°, n.° 1 do C.P.M., motivando para, a final, produzir as conclusões seguintes:
“1. A decisão recorrida enferma do vício previsto na alínea c) do n.° 2 do artigo 400.° do Código de Processo Penal, que conduziu à absolvição do Arguido.
2. A declaração do Arguido e o depoimento da testemunha D são opostas às declarações dos Assistentes e os depoimentos das testemunhas E e F.
3. No entanto, salvo o devido respeito, os Assistentes entendem que a versão da factualidade contada pelo Arguido e pela sua namorada, D, não é verosímil.
4. Na audiência de julgamento, o Arguido afirmou que durante a discussão entre a 1.ª Assistente e o Arguido, o filho mais novo da Assistente começou a proferir palavrões contra o Arguido; enquanto a sua namorada, ora testemunha, afirmou que não parou de repreender o seu namorado, ora Arguido, com palavrões, mas não se conseguiu relembrar concretamente quais foram estes palavrões.
5. Sucede que durante as inquirições no Corpo de Polícia de Segurança Pública e no Ministério Público (fls. 16, 32, 77 e 78 dos autos), nenhum deles se queixou disto ou em momento algum indicaram ou referiram que teriam sido os ora Assistentes a provocar a discussão e rixa que se seguiu.
6. Estes são agentes do C.P.S.P., nunca se poderiam ter esquecido de relatar todos os factos que causaram a briga, mas “esqueceram-se” quando foram levados para a respectiva inquirição, logo a seguir à ocorrência.
7. Pelo contrário, a 1.ª Assistente e o seu filho mais novo, E afirmaram logo de início nos autos de inquirição no C.P.S.P. (fls. 17 e 19 dos autos) que o Arguido afirmou “你無春” (Tu não tens tomates) contra o Assistente B.
8. O que coloca em séria dúvida a credibilidade da versão da factualidade contada pelo Arguido e pela sua namorada, única testemunha que contraria a versão dos factos como indicados pelos Assistentes e suas testemunhas.
9. No caso concreto, o Arguido, em nenhum momento, afirmou que os Assistentes ralharam com palavrões, versão esta que foi apresentada apenas na audiência do julgamento, diferente da versão inicial e que nunca foi relatada no início do processo.
10. À luz do princípio da verdade material dos factos, consagrado no artigo 321.°, n.° 1 do C.P.P., o Tribunal a quo deve ser o primeiro a pretender escrutinar a factual idade oferecida pelos Assistentes, que tem interesse processual no processo.
11. E o Tribunal não pode alegar em defesa da decisão sub judice a liberdade de apreciação da prova, nos termos do artigo 114.° do CPP, uma vez que esta, apesar de livre, funda-se sempre nas regras da experiência comum e realiza-se de acordo com critérios lógicos e objectivos.
12. ln casu, o Arguido vem acusado pela prática de dois crimes de injúria p. e p. pelo artigo 175.°, n.° 1 do Código Penal.
13. Da perspectiva do “bom pai de família” ou do “homem médio”, as injúrias proferidas – As expressões “死臭閪” (cona mal cheirosa), “屌你老母” (Foda a tua mãe) e “你無春” (tu não tens tomates) pelo Arguido são, por si só, capazes de ofender a honra dos Assistentes.
14. Como se refere no acórdão n.° 713/2011, do Tribunal de Segunda Instância, de 17 de Maio de 2012, “O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.”.
15. Os Assistentes são uma família normal, sem antecedentes criminais, sempre obediente à Lei, pelo que entendem, com o devido respeito, ser absolutamente inverosímil e ostensivamente contrária às regras de experiência comuns que os Assistentes tenham tomado a atitude descritas pelo Arguido e sua namorada, testemunha”; (cfr., fls. 229 a 235 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Respondendo, pugnam o Ministério Público e o arguido pela improcedência do recurso; (cfr., fls. 238 a 240-v e 241 a 246).
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Admitindo o recurso, vieram os autos a este T.S.I., onde, em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer pugnando também pela improcedência do recurso; (cfr., fls. 255 a 257).
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Em sede de exame preliminar constatou-se da manifesta improcedência do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), passa-se a decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados na sentença recorrida, a fls. 219-v a 221, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.
Do direito
3. Vem os assistentes recorrer da sentença proferida pelo T.J.B. que absolveu o arguido C da imputada prática de 2 crimes de “injúria”, p. e p. pelo art. 175°, n.° 1 do C.P.M..
E, como se deixou relatado, assacam (tão só) à decisão recorrida o vício de “erro notório na apreciação da prova”.
Porém, não se lhes pode reconhecer razão, sendo, dada a sua manifesta improcedência, de se rejeitar o recurso, muito não se mostrando necessário consignar, valendo-nos aqui das doutas considerações pelo Ilustre Procurador Adjunto explanadas no seu Parecer que dão cabal resposta ao recurso em questão e que se dão como reproduzidas para todos os efeitos legais.
Seja como for, não se deixa de consignar o que segue.
Como temos repetidamente entendido “O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores”.
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., Ac. de 12.05.2011, Proc. n° 165/2011, e mais recentemente de 23.04.2015, Proc. n.° 216/2015 do ora relator).
Como também já tivemos oportunidade de afirmar:
“Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova; (cfr., v.g., Ac. de 22.05.2014, Proc. n.° 284/2014 e de 23.04.2015, Proc. n.° 216/2015).
No caso dos autos, e em síntese, consideram os assistentes que a decisão recorrida está inquinada com o vício de “erro notório”, dado que o Tribunal a quo não acolheu a versão pelos mesmos apresentada, não a dando como provada, o que deu consequentemente origem à decisão de absolvição do arguido dos imputados crimes de “injúria” de que se dizem vítima.
Porém, e como é manifesto, não lhes assiste razão.
Não se vislumbra onde, como ou em que termos tenha o Tribunal a quo incorrido em “erro” por (apenas) não acolher a versão relatada pelos assistentes ora recorrentes, pois que ao decidir nesse sentido, não violou nenhuma regra sobre o valor das provas tarifadas, regra de experiência ou legis artis.
Na verdade, não se pode esquecer que no caso dos autos, por inexistência de material probatório com valor tarifado, formou o Tribunal a quo a sua convicção apreciando a prova em conformidade com o princípio da livre apreciação da prova, (cfr., art. 114° do C.P.P.M.), sendo de notar que constitui tarefa natural e normal do Tribunal decidir de entre duas (ou mais) “versões”, não sendo, obviamente, por não acolher uma delas que incorre no vício em questão.
Mal, (muito mal), estaríamos se assim fosse.
Há que ter em conta que a convicção do Tribunal não depende nem do “número” nem da “qualidade” das testemunhas, inexistindo critério pré-estabelecido que sugira sequer qualquer tipo de “preferência” de um determinado depoimento em relação a outro.
Funcionam sim as regras de experiência, da lógica e da normalidade das coisas que, seja como for, não nos parecem (ostensivamente) desrespeitadas na situação sub judice, justificando a consideração no sentido da verificação do assacado vício.
Por fim, e com todo o respeito, não se alcança o que se alega na “conclusão 15°”, já que em direito e processo penal adequadas – aceitáveis – não são “presunções de culpa”, (ainda por cima), baseadas em matéria em nada relacionada com a “objecto do processo em julgamento” e que nem sequer provada está.
Tudo visto, resta pois decidir em conformidade.
Decisão
4. Em face do exposto, decide-se rejeitar o recurso.
Pagarão os assistentes a taxa de justiça individual de 3 UCs, e como sanção pela rejeição, o correspondente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).
Honorários ao Exmo. Defensor Oficioso do arguido no montante de MOP$1.800,00.
Registe e notifique.
Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.
Macau, aos 19 de Novembro de 2015
José Maria Dias Azedo
Proc. 957/2015 Pág. 12
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