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Processo nº 936/2015 Data: 19.11.2015
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “furto”.
Atenuação especial.
Suspensão da execução da pena.



SUMÁRIO

1. A atenuação especial da pena só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.

2. O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.

E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.

3. O instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade.

O relator,

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Processo nº 936/2015
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A e B, (1ª e 2ª) arguidas com os restantes sinais dos autos, responderam no T.J.B., vindo a ser condenadas como co-autoras da prática de 1 crime de “furto qualificado”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 1, al. a) e e) e n.° 2, al. e) do C.P.M., na pena (individual) de 2 anos e 6 meses de prisão; (cfr., fls. 209 a 215 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformadas com o assim decidido vem as arguidas recorrer.
Em sede das suas motivações de recurso, e, a final, em sede de conclusões, colocam duas questões: em suma, pretendem a “redução” e “suspensão da execução” da pena; (cfr., fls. 230 a 231-v e 233 a 238).

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Respondendo, diz o Ministério Público que os recursos não merecem provimento; (cfr., fls. 240 a 241-v).

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Neste T.S.I. emitiu o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“As recorrentes, de nacionalidade vietnamita, encontram-se condenadas, cada, na pena de prisão de 2 anos e 6 meses, pela prática de crime de furto qualificado (subtracção de jóias do interior de um cofre), no montante de MOP 30.000, almejando, através do presente recurso, que tais penas sejam especialmente anuladas e suspensas na sua execução.
Sendo certo que as circunstâncias “abonatórias” adiantadas pelas recorrentes não deixaram de ser consideradas no acórdão sob escrutínio e não pondo em questão o valor das mesmas, o certo é que não divisamos, do circunstancialismo específico do caso, matéria donde, verdadeiramente, se possa concluir pela diminuição, de forma acentuada, da ilicitude do facto, da culpa dos agentes ou da necessidade da pena e, daí que, pese embora a reparação parcial dos danos causados, se nos afigure não ser caso da atenuação especial da pena pretendida, nos termos da al c) do n° 2 do art° 66°, C.P..
De todo o modo, atentas essas mesmas circunstâncias – o facto de as recorrentes serem primárias, terem confessado, denotando contrição e terem procedido à aludida reparação parcial dos danos, cremos não se tornar muito arriscada a formulação de juízo de prognose favorável no sentido de que a simples censura dos factos e a ameaça de prisão poderão realizar, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, razão por que nos não repugnaria a suspensão da execução das penas em questão”; (cfr., fls. 253 a 254).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 210-v a 211, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem as arguidas recorrer do Acórdão que as condenou como co-autoras da prática de 1 crime de “furto qualificado”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 1, al. a) e e) e n.° 2, al. e) do C.P.M., na pena individual de 2 anos e 6 meses de prisão.

Pedem a “redução” e “suspensão da execução” da pena.

Vejamos.

–– Para a pretendida “redução” da pena invocam as arguidas o art. 201° do C.P.M. onde se prescreve que:

“1. Quando a coisa furtada ou ilegitimamente apropriada for restituída, ou o agente reparar o prejuízo causado, sem dano ilegítimo de terceiro, até ao início da audiência de julgamento em 1.ª instância, a pena é especialmente atenuada.
2. Se a restituição ou reparação for parcial, a pena pode ser especialmente atenuada”.

E, alegando que depositaram um total MOP$12.020,00 para indemnização do ofendido, consideram que se lhes devia atenuar especialmente a pena.

Pois bem, desde já há que ter em conta que o prejuízo causado ao ofendido dos autos ascende a um total de MOP$30.000,00.

E, assim, quid iuris?

Provado estando tal “depósito”, e sendo que a (1ª) arguida contribuiu (apenas) com MOP$4.000,00 e a (2ª) B, com MOP$8.020,00, afigura-se-nos inadequado accionar o dispositivo do art. 201° do C.P.M. para efeitos de atenuação especial da pena, que, aliás, foi fixada a 6 meses do seu mínimo legal, e a 7 anos e 6 meses do seu máximo, não se podendo assim considerar inflacionada.

Aliás, como temos considerado, a atenuação especial “só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I. de 14.04.2011, Proc. n°130/2011 e de 29.01.2015, Proc. n° 22/2015).

Não parecendo ser o caso, já que, in casu, em causa está um “furto” de quantias e objectos (jóias) guardados num cofre, sendo o dolo directo e muito elevado, há que julgar improcedente o recurso na parte em questão.

–– Quanto à pretendida “suspensão da execução da pena”, vejamos.

Nos termos do art. 48° do C.P.M.:

“1. O tribunal pode suspender a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. Os deveres, as regras de conduta e o regime de prova podem ser impostos cumulativamente.
4. A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5. O período de suspensão é fixado entre 1 e 5 anos a contar do trânsito em julgado da decisão”.

Em relação a tal preceito legal tem este T.S.I. entendido que “O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades de prevenção do crime.”; (cfr., v.g., Ac. de 01.03.2011, Proc. n° 837/2011, do ora relator, e, mais recentemente, de 14.05.2015, Proc. n.° 387/2015).

E, como igualmente temos considerado, o instituto da suspensão da execução da pena baseia-se numa relação de confiança entre o Tribunal e o condenado. Aquele convence-se, em juízo de prognose favorável, que o arguido, sentindo a condenação, é capaz de passar a conduzir a sua vida de modo lícito e adequado, acreditando ainda que o mesmo posto perante a censura do facto e a ameaça da pena, é capaz de se afastar da criminalidade; (cfr., v.g., o Ac. de 21.11.2013, Proc. n.° 649/2013 e mais recentemente, de 12.11.2015, Proc. n.° 714/2015).

E, aqui chegados, considerando que as arguidas eram primárias, que confessaram os factos, mostrando-se arrependidas em relação aos mesmos, que as jóias foram recuperadas pela polícia, e assim, diminuto o efectivo prejuízo do ofendido, e que as arguidas se encontram presas desde 10.02.2015, (estando privadas da liberdade há mais de 9 meses), cremos que viável é a pretendida suspensão da execução do restante período da tal pena de 2 anos e 6 meses de prisão, fixando-se o período desta em 3 anos.

Decisão

4. Em face do exposto, concede-se parcial provimento aos recursos, ficando as arguidas com a execução da restante parte da pena suspensa por 3 anos.

Pelo seu decaimento pagarão as recorrentes a taxa de justiça individual de 2 UCs.

Honorários aos Exmos. Defensores no montante de MOP$1.800,00.

Passem-se os competentes mandados de soltura.

Para os efeitos tidos por convenientes, comunique a P.S.P., remetendo cópia do presente acórdão.

Macau, aos 19 de Novembro de 2015
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José Maria Dias Azedo
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Chan Kuong Seng
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Tam Hio Wa
Proc. 936/2015 Pág. 12

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