Processo n.º 811/2015 Data do acórdão: 2015-10-22 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– suspensão do prazo da prescrição da multa
– art.o 117.o, n.o 1, alínea a), do Código Penal
– processo de cobrança coerciva da multa
– arquivamento condicional do processo
– art.o 118.o, n.o 2, do Regime das Custas nos Tribunais
– art.o 118.o, n.o 3, do Código Penal
S U M Á R I O
1. A contagem do prazo de quatro anos de prescrição da pena de multa, previsto no art.o 114.o, n.o 1, alínea e), do Código Penal (CP), a começar desde a data do trânsito em julgado da sentença condenatória, fica, nos termos do art.o 117.o, n.o 1, alínea a), do CP, suspensa a partir do dia em que se decide judicialmente, à luz do art.o 118.o, n.o 2, do Regime das Custas nos Tribunais, pelo arquivamento condicional do processo destinado inclusivamente à cobrança coerciva da multa.
2. Isto porque a decisão desse arquivamento significa que a execução (coerciva) da multa (isto é, o acto de pagamento coercivo da multa – na sequência da falta de pagamento voluntário – através da liquidação de algum bem penhorável da pessoa executada) não pode legalmente iniciar-se, sendo certo que pelo n.o 3 do art.o 118.o do CP fica ressalvado o tempo dessa suspensão.
O primeiro juiz-adjunto,
Chan Kuong Seng
Processo n.º 811/2015
(Autos de recurso penal)
Recorrente: Ministério Público
Arguida: A Limitada
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformada com o despacho judicial proferido no Primeiro de Julho de 2015 a fls. 483v a 484 do Processo de Contravenção Laboral n.o LB1-11-0009-LCT do Tribunal Judicial de Base que decidiu pela ainda não prescrição da pena de multa então imposta nesses autos à aí já melhor identificada arguida A Limitada, veio a Digna Delegada do Procurador recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para pedir a revogação do tal despacho, com almejada consequente declaração da extinção da pena de multa, alegando, para o efeito, que o Tribunal a quo, ao entender, nuclearmente, que aquando da instauração e pendência do processo de cobrança coerciva da multa, ficaria interrupta a prescrição, violou o art.o 118.o, n.o 1, alínea a), do Código Penal (CP) (cfr. a motivação do recurso apresentada a fls. 487 a 492 dos presentes autos correspondentes).
Subidos os autos, emitiu o Digno Procurador-Adjunto parecer (a fls. 500 a 501), pugnando pelo provimento do recurso.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir nos termos constantes do presente acórdão definitivo, lavrado pelo primeiro juiz-adjunto nos termos do art.o 417.o, n.o 1, parte final, do Código de Processo Penal (CPP).
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, fluem os seguintes elementos com pertinência à solução do recurso:
1. Por sentença de 9 de Junho de 2011 (a fls. 405 a 414 dos autos), transitada em julgado em 20 de Junho de 2011 (cfr. a nota lançada a fl. 417), foi sobretudo imposta a multa total de cem mil patacas à arguida.
2. Em 15 de Setembro de 2011, o Ministério Público fez instaurar o correspondente processo de execução por custas, para cobrança coerciva, inclusivamente, do montante total da multa (cfr. o requerimento inicial da execução, a fls. 1 a 1v do respectivo apenso de execução n.º LB1-11-0009-LCT-A).
3. Processo esse que, por despacho judicial de 19 de Novembro de 2012 (a fl. 36 a 36v desse apenso), veio a ser arquivado condicionalmente a pedido do Ministério Público (formulado a fl. 34 do mesmo apenso), devido ao desconhecimento de bens penhoráveis da arguida.
4. Ulteriormente, no Primeiro de Julho de 2015, o M.mo Juiz actualmente titular dos presentes autos principais no Tribunal Judidial de Base julgou que, ao contrário da promoção do Ministério Público, a multa total então aplicada à arguida ainda não estava prescrita, por entender, nuclearmente, que aquando da instauração e pendência do processo de execução ficaria interrupta a contagem do prazo de quatro anos da prescrição da pena de multa (cfr. esse despacho exarado a fls. 483v a 484 dos autos).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, é de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
O Ministério Público ora recorrente pretende que seja declarada extinta a pena de multa por efeito da prescrição.
Entretanto, para o presente Tribunal ad quem, não pode proceder esse desejo do Digno Ente Recorrente, porquanto é de entender que a contagem do prazo de quatro anos de prescrição da pena de multa dos presentes autos, como tal previsto no art.o 114.o, n.o 1, alínea e), do CP, que já tinha começado desde o dia 20 de Junho de 2011 em que tinha transitado em julgado a respectiva sentença condenatória de 9 de Junho de 2011, já ficou, nos termos do art.o 117.o, n.o 1, alínea a), do CP, suspensa a partir de 19 de Novembro de 2012, com o judicialmente decidido arquivamento condicional do processo destinado inclusivamente à cobrança coerciva da mesma multa, isto tudo porque a decisão desse arquivamento, tomada materialmente à luz do art.o 118.o, n.o 2, do vigente Regime das Custas nos Tribunais, já significa que a execução (coerciva) da multa (isto é, o acto de pagamento coercivo da multa – na sequência da falta de pagamento voluntário – através da liquidação de algum bem penhorável do executado) não pode legalmente iniciar-se, de maneira que sendo ressalvado pelo n.o 3 do art.o 118.o do CP o tempo dessa suspensão, o prazo da prescrição da multa, à data do ora impugnado despacho judicial do Primeiro de Julho de 2015 (e mesmo hoje) está longe de estar completado.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar não provido o recurso do Ministério Público, mantendo a decisão judicial recorrida, ainda que por fundamentação algo diversa da sustentada pelo Tribunal a quo.
Sem custas pelo presente recurso, dada a isenção do Ministério Público.
Macau, 22 de Outubro de 2015.
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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)
_________________________
Tam Hio Wa
(Segunda Juíza-Adjunta)
_________________________ (Vencido, nos termos da minha declaração de
José Maria Dias Azedo voto anexa ao Ac. de 18.06.2015, Proc. n.° 381/2015).
(Relator do processo)
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