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--- Decisão Sumária nos termos do art.º 407º, n.º 6 do C.P.P.M. (Lei n.º 9/2013). ----------
--- Data: 02/12/2015 --------------------------------------------------------------------------------------
--- Relator: Dr. Dias Azedo.-----------------------------------------------------------------------------

Processo nº 1005/2015
(Autos de recurso penal)

(Decisão sumária – art. 407°, n.° 6, al. b) do C.P.P.M.)

Relatório

1. Por Acórdão proferido pelo Colectivo do T.J.B. decidiu-se condenar A, (2°) arguido com os sinais dos autos, como co-autor da prática de 1 crime de “usura para jogo”, p. e p. pelo art. 13°, n.° 1, da Lei n.° 8/96/M e art. 219°, n.° 1 do C.P.M., na pena de 9 meses de prisão e na pena acessória de proibição de entrada nas salas de jogo por 3 anos, e, em concurso real, pela prática, também como co-autor, de 1 crime de “sequestro”, p. e p. pelo art. 152°, n.° 1 do C.P.M., na pena de 1 ano e 3 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico, (e no que toca à “pena principal”), fixou-lhe o Tribunal a pena única de 1 ano e 6 meses de prisão, que suspendeu na sua execução por 2 anos; (cfr., fls. 474 a 482 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado, o arguido recorreu.
Motivou para imputar á sentença recorrida o vício de “erro notório na apreciação da prova”; (cfr., fls. 490 a 494).

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Respondendo, considera o Ministério Público que o recurso não merece provimento, sendo de se confirmar, na íntegra, a decisão recorrida; (cfr., fls. 507 a 508).

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Neste T.S.I., e em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto douto Parecer pugnando também pela improcedência do recurso.

Tem o Parecer o teor seguinte:

“Bastará a mera leitura das alegações do recorrente para facilmente se aquilatar que o mesmo confina o seu inconformismo à apreciação e integração da prova efectuada pelos julgadores “a quo”, pretendendo que, através da mesma se não haveria haveria que ter concluído, relativamente a diversos aspectos factuais, no sentido em que aqueles o fizeram, topando-se bem que, com a sua alegação pretende o visado manifestar a sua discordância com a matéria de facto dada assente pelo tribunal, melhor dizendo, da interpretação que este faz dessa matéria, limitando-se, em boa verdade, tão só a expressar a sua opinião “pessoalíssima” acerca da apreciação e valoração da prova, quando, manifestamente, não se vê que do teor do texto da decisão em crise, por si só, ou conjugada com as regras da experiência comum, resulte patente, evidente, ostensivo que os julgadores erraram ao apreciar como apreciaram, sendo certo que estes não se eximiram a expressar, concreta e específicamente a sua valoração da prova produzida e dos motivos que os levaram às conclusões que formularam, não se divisando que tenham sido dados como provados factos incompatíveis entre si, ou que se tenham retirado de tais factos conclusões lógicamente inaceitáveis, não competindo a este Tribunal censurar os julgadores por terem formado a sua convicção neste ou naquele sentido, quando na decisão recorrida, confirmado pelo senso comum, nada contraria as conclusões alcançadas.
Sendo evidente que a livre convicção se haverá que fundar em provas sendo com base nelas que terá de decidir, pois “quod non est in acta non est in mundo”, constituindo, por outro lado, um meio da descoberta da verdade e não uma afirmação infundamentada da verdade (Cavaleiro Ferreira, “Curso de Processo Penal”, II, 27), encontramo-nos perante um sistema que obriga a uma correcta fundamentação fáctica das decisões que conheçam a final do objecto do processo, de modo a permitir-se um efectivo controlo da sua motivação, não se podendo, pois, tratar de julgamento de mera convicção íntima ou por puro arbítrio, mas por livre convencimento, lógico e motivado.
Ora, conforme é fácil descortinar na sentença em causa, os julgadores tiveram a preocupação de expressar, reportando-se, inc1usivé, específicamente aos diversos tipos de prova carreados para os autos, quais os motivos, quais os fundamentos em que alicerçaram a sua convicção, a qual, embora pessoal, é objectivável e motivável, capaz de se impor.
Analisada, a decisão recorrida na sua globalidade, constata-se, pois ser a mesma lógica e coerente, não tendo o Tribunal decidido em contrário ao que ficou provado ou não provado, contra as regras da experiência ou em desrespeito dos ditames sobre o valor da prova vinculada ou das “legis artis”, não passando a invocação do erro notório da apreciação da prova, de uma mera manifestação de discordância no quadro do julgamento da matéria de facto, questão do âmbito do princípio da livre apreciação da prova, insindicável em reexame de direito.
Por outra banda, atenta a dosimetria penal abstrata dos ilícitos imputados, o circunstancialismo que rodeou os factos e a premente necessidade de prevenção do tipo de crimes em causa, afigura-se-nos que, no estrito respeito dos dispositivos legais aplicáveis, designadamente dos art°s 40° e 65°, CP, a pena concretamente aplicada se apresenta como justa e adequada, a não merecer reparo.
Donde, aderindo, de forma geral, às brilhantes considerações expendidas pelo Exmo Colega junto do tribunal “a quo” e sem necessidade de maiores considerações ou alongamentos, entender-se não merecer provimento o presente recurso”; (cfr., fls. 527 a 529).

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Em sede de exame preliminar constatou-se da manifesta improcedência do presente recurso, e, nesta conformidade, atento o estatuído no art. 407°, n.° 6, al. b) e 410°, n.° 1 do C.P.P.M., (redacção dada pela Lei n.° 9/2013, aplicável aos presentes autos nos termos do seu art. 6°, n.° 1 e 2, al. 2), passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 476-v a 478-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou nos termos atrás já explicitados.

E, (ainda que de forma “pouco explícita”), imputa à decisão recorrida o vício de “erro notório na apreciação da prova”.

Porém, nenhuma razão lhe assiste, sendo o recurso de rejeitar; (como, oportunamente, e em sede de exame preliminar, já se deixou consignado).

Aliás, e como resulta do douto Parecer do Ilustre Procurador Adjunto, que se nos mostra de sufragar e dar com reproduzido, evidenciadas estão as razões para tal decisão.

Seja como for, sempre se dirá o que segue.

Vejamos.

De forma firme e repetida tem este T.S.I. considerado que: “O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores”.
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., Ac. de 12.05.2011, Proc. n° 165/2011, e mais recentemente de 29.01.2015, Proc. n.° 13/2015 do ora relator).

Como também já tivemos oportunidade de afirmar:
“Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova; (cfr., v.g., Ac. de 22.05.2014, Proc. n.° 284/2014 e de 29.01.2015, Proc. n.° 13/2015).

E, nesta conformidade, (e como já se disse), manifestamente improcedente é o recurso, pois que evidente é que com o mesmo limita-se o recorrente a tentar impor a sua versão dos factos, invocando elementos probatórios sujeitos à “livre apreciação” do Tribunal, (cfr., art. 114° do C.P.P.M.), e assim, (totalmente) irrelevantes e ineficazes para a sua pretensão em ver alterada a decisão da matéria de facto.

Aliás, o Tribunal a quo, para além de não ter desrespeitado nenhuma regra sobre o valor da prova tarifada, regra de experiência ou legis artis, não se vislumbrando assim qualquer “erro”, (muito menos “notório”), teve o cuidado de expor (de forma clara e cabal), as razões que o levaram a decidir da forma que decidiu, explicitando o porquê da sua convicção quanto aos factos que deu como provados (e expostos no acórdão), o mesmo sucedendo quanto à não aceitação da versão do arguido, (que os nega).

Daí, inexistindo o (único) vício pelo recorrente imputado à decisão recorrida, e outros de conhecimento oficioso (também) não havendo, resta decidir em conformidade.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, decide-se rejeitar o recurso.

Pagará o recorrente 3 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 3 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor Oficioso no montante de MOP$1.800,00.

Registe e notifique.

Nada vindo de novo, e após trânsito, remetam-se os autos ao T.J.B. com as baixas e averbamentos necessários.

Macau, aos 02 de Dezembro de 2015
José Maria Dias Azedo
Proc. 1005/2015 Pág. 10

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