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Proc. nº 433/2015/A
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 03 de Dezembro de 2015
Descritores:
-Suspensão de eficácia
-Concessão de terrenos
-Declaração de caducidade de concessão de terreno

SUMÁRIO:

I. Declarada por acto administrativo a caducidade de um contrato de concessão de um terreno da RAEM, a sua eventual execução não implica, necessária e imediatamente, o aproveitamento do terreno por parte da concedente, nem as despesas e os custos que a requerente tenha assumido no âmbito da concessão se podem considerar de difícil reparação, uma vez que, quantificados, podem ser ressarcidos em caso de eventual recurso contencioso bem sucedido.

II. Por falta de verificação do requisito previsto no nº1, al. a), do art. 121º, do CPA - prejuízo de difícil reparação para a requerente - a providência cautelar tem que ser indeferida.



Proc. nº 433/2015/A

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I – Relatório
A - Companhia de Construção e Fomento Predial Limitada, com sede em Macau, na Estrada de XX, nº XX, matriculada na Conservatória dos Registos Comercial e de Bens Móveis com o nº XX07 SO, ora representada pelo seu administrador, B, (adiante designada apenas por “sociedade requerente”),
Veio pedir a suspensão de eficácia do acto administrativo ----
da autoria do Ex.mo Chefe do Executivo, datado de 23/03/2015 «Concordo» exarado sobre Parecer do Ex.mo Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 17/03/2015, concernente à declaração de caducidade da concessão provisória, por arrendamento, do terreno com a área de 2196 m2, situado na ilha da Taipa, na Rua XX, lote XX, dos aterros do Pac On pelo incumprimento do aproveitamento do terreno no prazo fixado.
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Para tanto, a requerente invocou os requisitos constantes do art. 121º, nº1, als. a), b) e c), do CPAC.
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Contestou a autoridade requerida, sustentando o indeferimento da pretensão, em termos que damos por integralmente reproduzidos.
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O digno Magistrado do MP opinou do seguinte modo:
«Vem “A - Companhia de Construção e Fomento Predial, Lda” requerer a suspensão de eficácia do despacho do Chefe do Executivo de 23/3/15 que, pelo incumprimento do aproveitamento do terreno no prazo fixado, declarou a caducidade da concessão provisória, por arrendamento, do terreno com a área de 2.196 m2, sito na ilha da Taipa, na R. XX, lote XX, dos aterros do Pac On.
Duas notas prévias:
- Serve o sublinhado para se acentuar resultar, quanto a nós, evidente o conteúdo positivo do acto em questão, já que implica notória alteração de situação pré existente, modificação essa a decorrer, imediata e necessariamente da execução daquele acto suspendendo, tomando-se evidente que da eventual procedência da suspensão de eficácia resultará para a requerente efeito útil, evitando prejuízos para a sua esfera jurídica, havendo, pois, que admitir o presente meio processual.
- Num outro prisma, sendo certo que na suspensão de eficácia não poderão ser apreciados os vícios imputados ao acto administrativo, tendo de se partir da presunção da legalidade de tal acto e respectivos pressupostos de facto, temos que parte do alegado pela requerente a tal nível no presente meio processual, designadamente na argumentação alusiva ao preenchimento do requisito contemplado na al c) do nº 1 do artº 121º, CPAC se apresenta como inócuo, ou, pelo menos, dispensável, nomeadamente as considerações atinentes à contestação do “abandono” do terreno e do fundamento da declaração de caducidade da concessão respectiva, já que os “indícios da ilegalidade do recurso” a que alude o normativo se hão-de reportar a manifestas carências (normalmente de ordem formal) que demonstrem ser patente, notório ou evidente, que, segura e inequivocamente o recurso contencioso não possa ter êxito, não cabendo, assim, aqui, a discussão da matéria substancial, a ter lugar naquele recurso.
Posto isto, tanto quanto se alcança da redacção introduzida no art. 121.º do CPAC, os requisitos contemplados nas diversas alíneas do seu n” 1 para a suspensão de eficácia dos actos administrativos são cumulativos, bastando a inexistência de um deles para que a providência possa ser denegada.
Tais requisitos são, um positivo (existência de prejuízo de difícil reparação que a execução do acto possa, previsivelmente, causar) e dois negativos (inexistência de grave lesão do interesse público e não resultarem do processo fortes indícios de ilegalidade do mesmo).
Aceitamos a verificação “in casu” dos dois requisitos negativos, já que se não divisam indícios (e muito menos, fortes) de ilegalidade na interposição do recurso, não se mostrando patente, notório ou evidente que, segura e inequivocamente, o recurso contencioso não possa ter êxito, sendo que, por outro lado, compreendendo-se a necessidade de garantir efectivo e eficaz aproveitamento do terreno em questão numa terra com tanta carência deles como é Macau, não se vislumbra, porém, que, tendo-se o mesmo conservado sem qualquer aproveitamento durante vários anos, o interesse público se veja gravemente afectado pela manutenção da situação até decisão do recurso contencioso.
Quanto ao requisito positivo, tem vindo a constituir jurisprudência constante o facto de, no incidente de suspensão de eficácia do acto administrativo, incumbir ao requerente o ónus de alegar factos concretos susceptíveis de formarem a convicção de que a execução do acto causará provavelmente prejuízo de difícil reparação, insistindo permanentemente tal jurisprudência no ónus de concretização dos prejuízos tido como prováveis, insistindo-se também que tais prejuízos deverão ser consequência adequada, directa e imediata da execução do acto.
No caso, argumenta a requerente que, como consequência do acto terá que cessar, no local a desocupar, as actividades relacionadas com armazenagem de equipamentos, materiais e objectos diversos, nomeadamente de construção civil, reparação de maquinarias, ferros e sucatas destinadas a reciclagem e variados materiais usados, tendo, por outro lado que procurar sito idóneo para transferir tais equipamentos e materiais, sabendo, como se sabe, a escassez de espaços e terrenos em Macau.
No que tange à cessação das actividades supostamente levadas a cabo no terreno, e mesmo partindo do princípio que as mesmas, de alguma forma, se coadunariam com a finalidade para que foi obtida a concessão, (o que se não afigura líquido), poder-se-ia tratar de alegação a considerar, não fosse o caso de o acto suspendendo se ter fundado na falta de aproveitamento do terreno em causa, o que, desde logo, como bem se sustenta em recentíssimo acórdão deste tribunal de 5/11/15, proc. 434/2015/A, em situação algo similar, determina que caia por terra todo o tipo de argumentação produzida na matéria.
Ao que acresce que, na falta de demonstração detalhada relativa à “saúde” económica e financeira da empresa e ao peso que as actividades em causa deterão na mesma, o quadro de prejuízos apresentado se revela meramente hipotético, conjuntural, correspondendo a alegação respectiva a meras conclusões genéricas e conclusivas, sem substrato válido de apoio probatório, quer quanto à inevitabilidade da sua ocorrência, quer, a existirem, serem consequência directa e necessária da execução do acto, já que, além do mais se não mostra esclarecido e comprovado sobre se à visada seria possível adquirir ou usufruir de outro espaço alternativo para a continuação da actividade empresarial supostamente existente, para além de que, tal como configurados, se não vê que os alegados prejuízos se não mostrem como quantificáveis.
Donde, não descortinarmos, no caso, a ocorrência do pressuposto em causa, o que, em última análise, deverá conduzir ao indeferimento do peticionado.»
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os Factos
1 – A Requerente é uma sociedade comercial por quotas, que tem por objecto principal a dedicação a actividades de construção covil e fomento predial.
2 – Nos termos do respectivo foi à aqui requerente concedido o lote XX, dos aterros do Pac On, na ilha da Taipa, com a área de 2196 m2.
3 – O prazo do arrendamento era de 25 anos contado da data de publicação no BO, terminando em 21/07/2023 (cláusula 2ª) e o prazo de aproveitamento era de 48 meses contados da data de publicação do contrato no BO, destinado à construção de um edifício para instalação de unidades industriais e armazéns afectos uso próprio.
4 - O Secretário para os Transportes e Obras Públicas emitiu o seguinte parecer no âmbito do Processo Administrativo nº 66/2013:
Parecer
Proc. n.º 66/2013 - Respeitante à proposta de declaração de caducidade da concessão provisória, por arrendamento e com dispensa de concurso público, do terreno com a área de 2 196m2, situado na ilha da Taipa, na Rua XX, lote XX, dos aterros do Pac On, a favor da “A - Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada”, pelo não cumprimento de disposições do contrato, nomeadamente a de aproveitamento do terreno nos prazos fixados, cujo contrato de concessão foi titulado pelo Despacho n.º 70/SATOP/98.
1. Pelo Despacho n.º 70/SATOP/98, publicado no Boletim Oficial de Macau n.º 29, II Série, de 22 de Julho, foi autorizada a concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, do terreno com a área de 2196m2, sito na ilha da Taipa, na Rua XX, lote XX, dos aterros do Pac On, a favor da “A - Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada”, destinado à construção de um edifício para instalação de unidades industriais e armazéns, afectos a uso próprio.
2. Conforme o estipulado na cláusula segunda do contrato de concessão, o prazo de arrendamento é de 25 anos, contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial de Macau, ou seja, o prazo de arrendamento terminará no dia 21 de Julho de 2023.
3. Nos termos das disposições do n.º 1 da cláusula quinta do contrato de concessão supramencionado, o prazo global de aproveitamento do terreno é de 48 meses, contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial de Macau do referido despacho, ou seja, terminará no dia 21 de Julho de 2002 e resulta dos n.º 2 e n.º 3 da mesma cláusula, que sem prejuízo do cumprimento do prazo global de aproveitamento do terreno, a concessionária deveria concluir a construção do primeiro piso, correspondente à primeira fase, 18 meses após a publicação do respectivo despacho, devendo ainda apresentar os projectos e início da obra de acordo com os prazos estipulados.
4. Além disso, a concessionária deveria elaborar e apresentar o anteprojecto de obra (projecto de arquitectura) no prazo de 60 dias, contados a partir da data da publicação no Boletim Oficial de Macau do despacho referido. A elaboração e apresentação do projecto de obra (projecto de fundações, estruturas, águas, esgotos, electricidade e instalações especiais) no prazo de 90 dias, contados a partir da data da notificação da aprovação do anteprojecto de obra. E o início da obra no prazo de 45 dias, contados a partir da data da notificação da aprovação do projecto de obra.
5. Da leitura das informações da Folha de Acompanhamento Financeiro, resulta que a concessionária já pagou integralmente o montante do prémio no valor de $1 906 455,00 patacas conforme previsto no contrato.
6. Em 28 de Novembro de 2006, a concessionária apresentou à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) um requerimento, referindo que de acordo com o contrato, o prazo de aproveitamento do terreno já tinha terminado, e uma vez que tinha havido alterações significativas na indústria e económica, o terreno em causa já não servia por isso para a finalidade industrial, solicitava desse modo autorização para alteração da finalidade do terreno, anexando para o efeito o respectivo estudo prévio de arquitectura.
7. O DSODEP da DSSOPT através de ofício de 31 de Maio de 2011 solicitou à concessionária a apresentação dos motivos razoáveis que justificassem o atraso no aproveitamento do terreno, assim como a apresentação de todas as informações aplicáveis às suas justificações.
8. Em 1 de Julho de 2011, B, representando a concessionária, apresentou à DSSOPT uma certidão de registo predial, uma certidão do registo comercial, um calendário de execução de obras, três certidões de capacidade financeira emitidas por bancos, entre outros documentos, e deu as justificações sobre o não aproveitamento do terreno conforme previsto.
9. Para analisar todo o processo de concessão do terreno em causa, o DSODEP através de CSI solicitou ao DPUDEP e ao DURDEP o fornecimento dos procedimentos detalhados de apreciação e aprovação bem como de informações pormenorizadas sobre as análises feitas respeitantes ao processo.
10. A chefe do DSODEP propôs ainda o envio do processo ao Departamento Jurídico (DJUDEP) para auscultar o parecer jurídico, tendo o director da DSSOPT manifestado a sua concordância.
11. Por outro lado, o Grupo de Trabalhos Jurídicos (GTJ) criado por despacho do Chefe do Executivo concordou com a análise e o parecer emitidos pelo DJUDEP através da informação n.º 32/GTJ/2012, de 21 de Agosto e propôs que para além do desencadeamento do procedimento de declaração da caducidade da concessão do terreno em causa, fosse ainda realizada a audiência da concessionária e posteriormente se enviasse o processo à Comissão de Terras para análise e parecer e prosseguimento das tramitações ulteriores.
12. Nestas circunstâncias, o DSODEP através do ofício n.º 825/6264.02/DSODEP/2012, de 21 de Novembro, notificou a concessionária do sentido da decisão e que a mesma podia apresentar a respectiva audiência escrita no prazo de 10 dias, contados a partir da recepção da notificação, de acordo com o estipulado no artigo 93.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (CPA).
13. Relativamente à audiência escrita acima referida, a concessionária apresentou ao Gabinete do Chefe do Executivo (GCE) em 4 de Dezembro de 2012 uma resposta, a qual não alterou o sentido da decisão.
14. Reunida em sessão de 5 de Junho de 2014, a Comissão de Terras, analisado o processo e tendo em consideração os pareceres constantes nas informações n.ºs 328/DSODEP/2011, de 28 de Novembro de 2011, 75/DJUDEP/2011, de 27 de Dezembro de 2011, 32/GTJ/2012, de 21 de Agosto de 2012, 291/DSODEP/2012, de 18 de Outubro de 2012, 30/DSODEP/2013, de 5 de Fevereiro de 2013, 53/DJUDEP/2013, de 22 de Agosto de 2013 e 317/DSODEP/2013, de 15 de Novembro de 2013 e tendo em conta os despachos emitidos na informação n.º 291/DSODEP/2012 pelo SOPT em 9 de Novembro de 2012 e pelo Chefe do Executivo em 13 de Novembro de 2012, considera que se deve declarar a caducidade da concessão, por arrendamento, a favor da “A - Companhia de Construção e Fomento Predial, Limitada”, do terreno com a área 2 196m2, situado na ilha da Taipa, na Rua XX, lote XX, nos aterros de Pac On, cujo contrato da concessão foi titulado pelo Despacho n. º 70/SATOP/98, nos termos da alínea a) do n.º 1 da cláusula décima quinta do respectivo contrato de concessão e da alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras). A Comissão concorda ainda que a totalidade do prémio (no valor global de $2 031 636,00 patacas) já liquidado pela concessionária reverterá para a posse da RAEM ao abrigo do disposto no artigo 13.º do Regulamento Administrativo n.º 16/2004. Em simultâneo, de acordo com o estipulado no n.º 3 da cláusula décima quinta do referido contrato da concessão e do n.º 1 do artigo 168.º da Lei n.º 10/2013 (nova Lei de terras), a caducidade da concessão determina a reversão do terreno para a posse da RAEM com todas a benfeitorias aí introduzidas, sem direito a qualquer indemnização por parte da concessionária.
Consultado o processo supra mencionado e concordando com o que vem proposto pelas razões indicadas naquele, solicito a Sua Excelência o Chefe do Executivo que declare a caducidade da concessão do referido terreno.
Aos 17 de Março de 2015.
O Secretário para os Transportes e Obras Públicas,
Raimundo Arrais do Rosário
5 - O Chefe do Executivo, em 23/03/2015, proferiu o seguinte despacho:
«Concordo».
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IV – O Direito
1 - O objecto da presente providência é o acto administrativo da autoria do Ex.mo Chefe do Executivo de 23 de Março de 2015, exarado sobre o parecer do Ex.mo Secretário para os Transportes e Obras Públicas de 17 de Março de 2015, segundo o qual foi declarada a caducidade da concessão aludida supra, ao abrigo da alínea a) do nº 1 da cláusula décima quinta do contrato de concessão titulado pelo Despacho nº 70/SATOP/98, publicado no Boletim Oficial de Macau nº 29, II Série, de 22 de Julho de 1998, e nos termos da alínea 1) do nº 1 do artigo 166º, por força do artigo 215º, ambos da Lei nº 10/2013 (Lei de terras).
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2 - O art. 121º do CPAC dispõe:
“1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.”
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3 – Dos requisitos do nº1, do art. 121º do CPAC.
Tem sido entendido que os requisitos da providência previstos no art. 121º do CPAC são de verificação necessariamente cumulativa1, pelo que a falta de um deles importará o indeferimento da pretensão.
A regra geral citada apenas cederá, por excepção, nos casos em que em concreto concorra alguma das excepções previstas nos nºs 2 a 4 do art. 121º do CPAC.
Ora, na situação dos autos, porém, não estamos seguramente perante a situação do nº 2, nem do nº3.
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3.1 – Ora bem. A posição deste tribunal é no sentido de que a suspensão de eficácia ora peticionada, a decretar-se, não determinaria grave lesão do interesse público (al. b), do nº1), e no de que, ao menos de modo evidente, não se nos afigura a existência de fortes indícios de ilegalidade na interposição do recurso contencioso (al. c), nº1).
3.1.1- Quanto à alínea b), em primeiro lugar, a afirmação abstracta e conclusiva feita nos arts. 40º a 42º da contestação de que esse prejuízo existe, sem concretização da razão subjacente, não permitiria ao tribunal efectuar um juízo concordante acerca do requisito. Não foi explicado em que consistiria esse prejuízo grave, e o tribunal não tem meios para suprir essa falta de alegação, uma vez que não estamos perante um facto notório (art. 250º, nº2, do CC e 434º do CPC).
Aliás, não se sabe qual o interesse público que virá a estar futuramente em causa, uma vez que se não sabe qual a finalidade que irá ser dada ao terreno em causa:
- Transformação do terreno em espaço verde (v.g, jardim público)?
- Construção de “habitação económica”, “habitação social”, ou “habitação pública a preços controlados”?
- Construção de um moderno e arrojado museu de arte moderna?
- Construção de um edifício público (v.g., para instalação de todos os tribunais)?
- Construção de um moderno silo-auto público de arrumação automática com grande capacidade para veículos ligeiros automóveis?
- Destinação industrial ou comercial?
- Transformação em rede viária?
Não se sabe! Ora, nem todos os interesses públicos subjacentes aos exemplos citados apresentam a mesma premência.
Em segundo lugar, não se crê que, por ter estado tantos anos sem utilização, o terreno não possa estar mais uns escassos meses na situação actual até que a providência fique definitivamente resolvida e, caso procedente, até que o tribunal decida o recurso contencioso, mesmo que isso demore algum tempo mais. É preciso não esquecer que segurança do comércio jurídico e estabilidade das relações jurídicas, a par da legalidade das decisões administrativas que as toquem, são também eles valores a ter em devida conta e com um papel essencial no quadro dos interesses públicos envolvidos.
Portanto, mostra-se demonstrado o requisito da alínea b).
-
3.1.2- E da mesma maneira mostra-se caracterizado o da alínea c).
Com efeito, e sabido que este requisito não está ligado à análise substantiva ou do mérito do recurso, mas sim às questões de índole processual que precisamente a possam impedir, então não se crê que haja neste momento sinais claros e ostensivos de que o recurso contencioso tenha sido ilegalmente interposto.
Equivale isto a dizer que também o requisito da alínea c) se acha aqui verificado.
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3.2 – Veremos agora se a requerente conseguiu demonstrar que a execução imediata do acto lhe causa prejuízos de difícil reparação.
Em nossa opinião, não.
A requerente esteve estes anos todos sem dar uso ao terreno, não o conformando com aquilo que teria que ser o aproveitamento e finalidade contratados (cláusula 3ª). Porque o não fez até ao momento? Se a necessidade do aproveitamento era assim tanta e se o uso era tão essencial à vida e sobrevivência da empresa, não se percebe como a empresa conseguiu passar todos estes anos sem concretizar a intenção subjacente ao contrato!
E isto dizemos, mesmo que este seja o único terreno de que disponha para edificar e até para guardar os materiais e equipamentos que nele ali tenha depositado presentemente. Mas perguntamos: deverá o tribunal ter em conta especial o transtorno que possa derivar da circunstância de a requerente ter que transferir os “materiais” e “objectos diversos”, “ferros” “sucatas” para outro sítio? Então, a concessão era para essa finalidade de depósito e armazenamento? Não, seguramente.
Então, esse transtorno não é senão um efeito secundário e menor que pode advir à esfera da requerente, mas que não constitui o núcleo dos danos que podiam derivar da impossibilidade de construção do edifício industrial a que a concessão tendia exclusivamente.
Por outro lado, a execução do acto fará “cessar as actividades” da requerente? Porquê? E que actividades são essas, as que ela já iniciou e mantém ou desenvolve ali e que sejam diferentes das da finalidade que esteve na base da concessão? Se os prejuízos decorrem da cessação dessas actividades, então é certo que não podem ser consideradas.
Mas, mesmo que se achasse que deviam ser tidos em conta, nem são sequer prejuízos de difícil reparação. A partir do momento em que os custos da remoção e transporte para outro local sejam avaliáveis, podem ser objecto de cálculo indemnizatório, com isso ficando reparada a esfera jurídico-económica da interessada e, desse modo, satisfeita a sua necessidade de tutela.
Remotamente admitindo, até, que a requerente quereria referir-se - e isso não resulta do alegado – aos danos próprios resultantes da impossibilidade de levar a efeito o objecto da concessão, o que ela fez não foi mais do que atirar para os autos afirmações sem suporte factual, meramente conclusivas, com alegações sobre um prejuízo meramente conjectural e futuro, que, além de não demonstrado, também não é de fácil intuição, nem de segura prognose por parte do tribunal.
Igualmente não pode proceder a alegação de que a eventual anulação do acto ou a sua declaração de nulidade não trará qualquer efeito prático se ele (acto) já entretanto tiver sido executado.
Mas, executado como? Como se executa o acto de declaração de caducidade? Essa execução não passa de uma reversão do terreno para a posse e titularidade do concedente; trata-se em princípio de uma execução de efeitos meramente jurídicos, pouco ou nada mais do que isso. Se alguma coisa for feita depois disso – nomeadamente a abertura de concurso para nova concessão – tal demorará certamente mais tempo do que o necessário para a decisão do recurso contencioso.
E mesmo que venham por hipótese a ser praticados sobre o terreno quaisquer outros actos administrativos de índole diferente dessa, daí não se segue inevitavelmente que a RAEM fique impedida de reverter a situação. Ou seja, nunca isso tornará o caso em situação de facto consumado.
Na verdade, que certeza pode a requerente oferecer de que tal virá a suceder? Nenhuma. O mais certo até é que a Administração, diligente, sensata e precavida, espere mais algum tempo, antes de praticar actos consequentes do acto de declaração de caducidade, e aguarde pela solução judicial definitiva a tomar no recurso contencioso.
Portanto, o efeito eventualmente favorável de um recurso coroado de êxito não se perderá fatalmente e haverá sempre a possibilidade de, em execução do julgado anulatório, ser reposta a situação actual hipotética que existiria se não fosse o acto praticado.
Também não procede inevitavelmente a afirmação de que em tal situação – a de não suspensão de eficácia – a sociedade requerente terá como certa a sua extinção e posterior liquidação. É um argumento de todo impossível de demonstrar, da mesma maneira que também não é notório que tal venha acontecer.
A execução do acto fará abrir mão de um terreno com aptidão construtiva de grande valor, face à sua localização? Não o negamos. Mas, insistimos, essa deveria ter sido, desde há muito, a preocupação da requerente: precisamente, a de evitar a prática de um acto como o aqui suspendendo.
Enfim, pelo que se disse e porque não estamos perante uma situação de irreversibilidade, de prejuízo não mensurável, não cremos que seja de difícil reparação o dano para a esfera da requerente que decorra da não imediata suspensão de eficácia do acto.
O que equivale a dizer, em suma, que não podemos dar por verificado o requisito do art. 121º, nº1, al. a), do CPC).
Neste sentido, ou muito próximo, já este TSI tomou posição em casos igual ou muito semelhantes (v.g., Ac. TSI, de 5/11/2015, Proc. nº 434/2015/A; e de 12/11/2015, Processos nºs 672/2015/A, 673/2015/A, 670/2015/A, 434/2015/A, 671/2015/A, 825/2015/A).
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V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em indeferir o pedido de suspensão de eficácia.
Custas pela requerente, com taxa de justiça em 8 UC.
TSI, 03 de Dezembro de 2015

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José Cândido de Pinho Vitor Manuel Carvalho Coelho
(Presente)
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Tong Hio Fong

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Lai Kin Hong

1 Neste sentido, entre outros, Acs. do TUI de 2/06/2010, Proc. nº 13/2010 ou de 13/05/2009, Proc. nº 2/2009, TSI de 10/03/2011, Proc. nº 41/2011/A.
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