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Proc. nº 786/2014
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 10 de Dezembro de 2015

Assunto:
- Estatuto privativo do pessoal da AMCM
- Fundo de previdência do pessoal

SUMÁRIO:
- Não existe fonte quer legal quer contratual para reconhecer o direito da Autora da contagem do tempo de serviço prestado junto da DSCT, antes do seu ingresso ao quadro de pessoal do IEM.
- O novo Estatuto Privativo do Pessoal da AMCM não altera a prática já sido adoptada e reconhece apenas, para todos os efeitos, o tempo de serviço prestado ao IEM como tempo de serviço prestado à AMCM, sem prejuízo de que o tempo de serviço prestado a serviço público ou organismo da Administração de Macau se considera ainda, para efeitos de atribuição do prémio de antiguidade, quando não haja interrupção de funções.
- A actualização do Estatuto da AMCM introduzida pelo Decreto-Lei n.º 14/96/M também não alterou a regulamentação respeita a estatuto de pessoal, para se reconhecer o tempo de serviço prestado a outros organismos públicos da Administração de Macau.
- Inexiste fundamento legal para a Autora revindicar o que ela nunca gozou, nem a Autora pode recorrer ao gozo deste direito da contagem do tempo de serviço a título da igualdade de tratamento, como os quatros casos que foram concedidos excepcionalmente.
- A Autoridade Monetária de Macau, como o seu antecessor o IEM, adopta-se a um regime especial com o próprio estatuto privativo do pessoal e fundo de previdência do pessoal que, mesmo se encontram disposições estatutárias semelhantes, em nada se justifica remeter ao regime geral dos trabalhadores da Administração Pública, sendo assim irrelevante a natureza jurídica da relação de trabalho que a AMCM ou seu antecessor tenha contraído com a Autora, mesmo que seja um contrato de direito público, não existe razão legítima e legal para estender o escopo de regime geral dos trabalhadores da função pública para se aplicarem aos trabalhadores contratados pela AMCM.
O Relator,












Proc. nº 786/2014
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 10 de Dezembro de 2015
Recorrente: A (Autora)
Entidade Recorrida: Autoridade Monetária de Macau (Ré)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 30/06/2014, o Tribunal Administrativo da RAEM julgou improcedente a acção interposto pela Autora A e, em consequência, absolveu a Ré dos pedidos.
Dessa decisão, vem a Autora interpor o presente recurso jurisdicional, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
1. A Recorrente ingressou no quadro da Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações de Macau em 11 de Abril de 1979;
2. Antes tinha prestado serviço na Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações de Macau no período que medeia entre 11 de Abril de 1979 e 31 de Março de 1982, tendo efetuado os descontos legais no vencimento devidos para efeitos de aposentação entre 1 de Julho de 1980 e 31 de Março de 1982;
3. Quando ainda pertencia ao quadro da Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações de Macau, a Recorrente foi autorizada a efectuar, fraccionadamente, o desconto correspondente ao período entre 11 de Abril de 1979 e 30 de Junho de 1980, ficando ainda por regularizar quatro prestações;
4. A Recorrente transitou da Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações para o então Instituto Emissor de Macau sem qualquer interrupção no exercício de funções;
5. Em 13 de Julho de 1998, a Recorrente requereu ao Fundo de Pensões de Macau a amortização das quatro prestações em falta do débito para a compensação de aposentação, referente ao período de 11 de Abril de 1979 a 30 de Junho de 1980, tendo sido autorizado o seu pagamento por despacho do então Presidente do Conselho de Administração do Fundo de Pensões de Macau, datado de 19 de Agosto de 1998;
6. Em diversas ocasiões a Recorrente solicitou junto do Conselho de Administração da AMCM que, para efeitos de aposentação, lhe fosse considerado o tempo de serviço prestado na Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações de Macau, o que sempre lhe foi negado;
7. Não satisfeita com a posição daquele Conselho de Administração, a ora Recorrente intentou acção para reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos, pedindo que lhe fosse contabilizado, para efeitos de aposentação, o tempo de serviço prestado na então Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações de Macau no período que medeia entre o dia 11 de Abril de 1979 e o dia 31 de Março de 1982;
8. Por sentença de 30 de Junho de 2014, foi o pedido julgado improcedente por falta de fundamento legal que sustente a pretensão da A., ora Recorrente, constando ainda da decisão que a Autoridade Monetária de Macau dispõe de um regime especial com estatuto privativo do pessoal e fundo de previdência do pessoal, não se justificando a remissão para o regime geral dos Trabalhadores da Administração Pública, adiantando ainda ser completamente irrelevante a natureza jurídica da relação de trabalho com a AMCM com a ora Recorrente, mesmo que seja um contrato de direito público, pelo que não existe razão legítima e legal para estender o escopo do regime geral dos trabalhadores da função pública para se aplicarem aos trabalhadores contratados pela AMCM;
9. Por não estar de acordo com esta conclusão, a Recorrente interpôs o presente recurso;
10. A natureza jurídica da AMCM e a anterior pertença da Recorrente ao respectivo quadro justificam a sua anterior qualidade de funcionária pública;
11. A AMCM é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, com a natureza de serviço público personalizado (cf. artigo 1.° dos Estatutos da AMCM, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 14/96/M, de 11 de Março);
12. Os sujeitos que exercem funções nos institutos públicos têm, por regra, o estatuto de funcionários públicos (vide Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. I, 2.ª ed., 1996, p. 354);
13. Só assim não será quando alguma norma remeta para o âmbito das relações de direito privado, o que não acontece no caso do Estatuto da AMCM e respectivo Estatuto do Pessoal;
14. Nos termos do n.º 1 do artigo 33.° do Estatuto da AMCM, o respectivo pessoal está sujeito, no que respeita ao seu recrutamento, contratação e previdência, ao estatuto privativo do pessoal e à lei reguladora das relações de trabalho na RAEM;
15. Quer o Estatuto da AMCM, quer o respectivo Estatuto Privativo do Pessoal, teriam de incluir uma norma que fizesse uma remissão expressa para o regime de direito laboral privado;
16. A referência à lei reguladora das relações de trabalho na RAEM tanto pode ser feita ao Estatuto dos Trabalhadores como à Lei das relações laborais de direito privado agora disciplinada pela Lei n.º 7/2008;
17. Do Estatuto Privativo do Pessoal da AMCM decorre um regime em tudo semelhante ao Estatuto dos Trabalhadores da Função Pública de Macau, bem afastado do regime das relações laborais de direito privado em vigor na RAEM (Lei n.º 7/2008);
18. Não é admissível que o quadro dos profissionais de um serviço público personalizado como é a AMCM seja preenchido na sua totalidade por trabalhadores ligados por um mero vínculo de direito civil;
19. Os trabalhadores do quadro da AMCM, providos através de um contrato de trabalho e que desempenham funções permanentes com carácter de profissionalidade, têm de ser necessariamente qualificados como funcionários públicos, ainda que pertencentes ao quadro privativo de um Instituto Público, pelo que têm com a AMCM uma relação jurídica de emprego público;
20. Neste sentido já se pronunciou o Tribunal de Segunda Instância, em acórdão de 9 de Junho de 2006, no âmbito do processo n.º 98/2005, afirmando, em resumo, que a relação de emprego dos funcionários do quadro da AMCM é de natureza pública, situando-se no âmbito das relações jurídico-administrativas, o mesmo é dizer tratarem-se de funcionários públicos;
21. Outra não pode ser a conclusão que não a de que a Recorrente não cessou o exercício de funções públicas no momento em que transitou para o quadro do então Insituto Emissor de Macau, hoje AMCM;
22. A relação jurídica em que se traduzia a relação de emprego público da Recorrente manteve-se quando ingressou no Instituto Emissor, operando-se apenas uma alteração qualitativa no seu conteúdo, designadamente dos direitos e poderes a nível funcional;
23. Em consequência, a referência à "lei reguladora das relações de trabalho na RAEM" feita no n.º 1 do artigo 33.° do Estatuto da AMCM só pode ser entendida como feita ao Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau;
24. O artigo 1.º desse Estatuto é muito claro ao estabelecer que o mesmo se aplica "ao pessoal dos serviços públicos da Administração de Macau, incluindo os serviços e fundos autónomos";
25. Por serviços autónomos entende-se as pessoas colectivas de direito público, na qual se inclui a AMCM;
26. Não havendo dúvidas quanto à aplicação subsidiária do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau ao pessoal da AMCM, resulta evidente que a Recorrente não perdeu a qualidade de funcionário público quando passou a exercer funções, primeiro, no Instituto Emissor e, depois, na AMCM, tal como estabelece o n.º 7 do artigo 259.° daquele Estatuto;
27. Assim, pese embora tenha passado a estar enquadrada por um estatuto privativo, os anos de serviço anteriormente prestados pela Recorrente na Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações têm de ser contabilizados para efeitos de aposentação, nos termos do disposto nos artigos 259.°, n.º 7 e 260.°, n.º 1, do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau, em conjugação com o artigo 33.°, n.º 1, do Estatuto da AMCM.
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A Ré respondeu à motivação do recurso da Autora nos termos constantes a fls. 540 a 574 dos autos, cujo teor aqui se dá integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do mesmo
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O Ministério Público é de parecer pela improcedência do presente recurso jurisdicional, a saber:
   “Nestes autos, a douta sentença da MMª Juiz a quo julgou improcedentes as excepções da falta do interesse de agir e da impropriedade do meio processual escolhido, e, de igual sorte, a acção intentada pela recorrente, absolvendo o Réu do pedido consubstanciado em ser declarado o direito de a A. ver contabilizado para efeitos de aposentação o tempo de serviço prestado no período entre 11/04/1979 e 31/03/1982.
   Devido ao caso julgado que adquirem as decisões respeitantes às excepções, por não serem impugnadas, examinaremos apenas as críticas da recorrente em relação à mesma sentença na parte relativa ao mérito da acção de reconhecimento de direito e interesses legalmente protegidos.
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    Em termos sintéticos, a MMª Juiz a quo julgou improcedente a dita acção com dois brilhantes fundamentos: em primeiro lugar, não existe fundamento legal para a requerente, ora recorrente, reivindicar o que ela nunca gozou, nem ela pode recorrer ao gozo deste direito da contagem do tempo de serviço a título de igualdade de tratamento; e em segundo, os regimes especiais do estatuto privativo do pessoal e do fundo de previdência do pessoal dotados à AMCM e ao seu antecessor IEM não justifica remeter ao regime geral de trabalhadores da Administração Pública, sendo assim irrelevante a natureza jurídica da relação de trabalho que à AMCM e ao seu antecessor tenha contraído com a requerente.
   Ora, nas alegações do recurso em apreço, a recorrente manifestou a desconcordância com o segundo fundamento da MMª Juiz a quo, «por considerar ser precisamente a natureza da relação jurídica de trabalho que a Requerente mantinha com a AMCM que justifica a aplicação subsidiária do regime jurídico da função pública e, em consequência, permitir que seja contabilizado, para efeitos de aposentação, o tempo de serviço prestado na então Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações de Macau, …».
   O que torna patente que a única questão colocada pela recorrente consiste em apurar se é ou não aplicável à sua situação o regime geral concernente ao tempo de serviço para efeitos de aposentação, designadamente o prescrito no n.º1 do art.260º do ETAPM?
   Ressalvado respeito pela opinião diferente, afigura-se-nos que não assiste razão à recorrente, em virtude de que ao intentar a acção de reconhecimento de direitos e interesses legalmente protegidos no TA, a ora recorrente não dispunha do direito por si pedido, direito consubstanciado em contar, para efeitos de aposentação, o tempo de serviço prestado na então Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações, no período compreendido de 11/04/1979 a 31/03/1982.
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    Sabe-se que a “aplicação subsidiária” da legislação geral à matéria regulada pela legislação especial só há lugar, quando esta não estabelece regulamentação ou regime próprios, deixando assim lacuna ou omissão a integrar por aquela. Devido à regra de a legislação especial ser prioritária a geral, é sempre excluída “aplicação subsidiária” da geral desde que a especial preveja regulamentação ou regime próprios.
   No caso vertente, sucede que mediante contrato de trabalho datado de 05/05/1982, a recorrente foi recrutada pelo então Instituto de Emissor de Macau com efeito a partir de 01/04/1982, cessando assim a sua relação jurídica com DSCT.
   Ora, nessa altura em que estava em vigor o D.L. n.º1/80/M, o n.º2 do seu art.31º deste diploma determinava: Ao pessoal que à data da entrada para o Instituto já seja beneficiário de outros regimes é permitido optar pela manutenção dos mesmos. Por seu turno, o n.º2 do art.60º do D.L. n.º63/82/M prescrevia: O pessoal que, à data da entrada para o IEM, seja beneficiário de outro regime de segurança social, cuja regulamentação permita a sua manutenção, não obstante a cessação ou interrupção da actividade profissional por ele abrangida, poderá optar por esse regime, sendo deduzido na respectiva remuneração o encargo do beneficiário.
   Para a requerente, tais disposições legais significam que ela podia ou optar por manter o regime de aposentação no Fundo de Pensões de Macau, com a integral conservação do tempo de serviço antes prestado na DSCT, ou optar por integrar no regime de segurança próprio do pessoal do IEM, com perder aquele período de tempo de serviço.
   Atendendo à ratio legis, colhemos com tranquilidade que o regime de previdência próprio do pessoal do IEM e a «opção» sucessivamente prevista nos D.L. n.º1/80/M e D.L. n.º63/82/M não consente mas proíbe a aplicação subsidiária do regime geral de aposentação e sobrevivência para os trabalhadores da Administração Pública.
   Desta «opção» decorre que ao pedir a inscrição no Fundo de Previdência dos Trabalhadores do IEM em 23/9/1982, a recorrente renunciou voluntariamente o aludido tempo de serviço de 11/4/1979 a 31/3/1982. E subscrevemos a sensata conclusão da MMª Juiz a quo, no sentido de que nenhuma norma legal lhe reconheceu o direito à contagem do mesmo tempo de serviço para efeitos de aposentação.
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Importa sublinhar que de todo em todo lado da Réplica (fls.398 a 414 dos autos), a recorrente não impugna os factos alegados nos arts.59º e 55º da contestação, pelo contrário, os arts.58º, 65º e 77º da Réplica implicam, de modo inequívoco, a confissão daqueles factos alegados nos arts.59º e 55º da contestação. O que significa indubitavelmente que em 30/07/2012 a recorrente ter recepcionado a Certidão n.º030/2012 (doc. de fls.24 dos autos).
   À luz do disposto no art.110º do CPA, temos por certo que sendo embora incorporada na dita Certidão, a decisão de «O tempo de serviço prestado na Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações de Macau, no período de 11 de Abril de 1979 a 31 de Março de 1982, não releva para efeitos de aposentação, por falta de norma legal habilitante que o permita» constitui, por definição legal, acto administrativo.
   Nunca sendo contenciosamente impugnada nem padecendo-se de vício conducente à nulidade, tal decisão consolidou-se na ordem jurídica a partir de terminar o prazo o recurso contencioso, formando assim caso resolvido. Daí flui necessariamente que a recorrente não detinha o direito por si peticionado ao intentar a acção de reconhecimento do TA.
   Como nota final, convém-nos esclarecer que a valorização aqui dos factos alegados nos arts.59º e 55º da contestação não põe em crise o caso julgado adquirido pela douta sentença recorrida quando à improcedência da excepção da «impropriedade do meio processual».
   Pois bem, a «impropriedade do meio processual» correspondente à figura prevista no art.12º do CPAC tem como pressuposto imprescindível a existência válida do direito de recurso contencioso, a caducidade deste direito por decurso do prazo determina que não faça sentido a apontada «impropriedade do meio processual».
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    Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso jurisdicional.”.
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Factos
Foi assente a seguinte factualidade pelo Tribunal a quo:
1. A Autora era ex-ajudante de tráfego de segunda classe do quadro da então Direcção dos Serviços de Correios e Telecomunicações de Macau (DSCT), no período entre 11/04/1979 e 31/03/1982, tendo sido efectuado os descontos para a compensação de aposentação (cfr. fls. 13 a 15 dos autos).
2. Por contrato de trabalho celebrado em 05/05/1982, foi a Autora recrutada por então Instituto Emissor de Macau (IEM) com início em 01/04/1982, para exercer as funções de dactilógrafa de 2.ª (Nível 5) (cfr. fls. 12 e verso dos autos).
3. Por despacho datado de 02/07/1983, o então Senhor Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica determinou que o tempo de serviço a que se refere no n.º 1 do art.º 2.º do D.L. n.º 62/82/M, de 30 de Outubro, não engloba os períodos em que o pessoal da extinta Inspecção do Comércio Bancário (ICB) haja exercido actividade profissional em organismos públicos do então Território, anteriormente ao ingresso naquela Inspecção, com excepção do pessoal da ICB que, tenha sido integrado nos quadros do IEM, opte pelo respectivo regime de reforma, neste caso será considerado o tempo de serviço antes prestado a outros organismos públicos desde que tenham sido efectuados os correspondentes descontos para a aposentação (cfr. fls. 352 e verso dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
4. Por despacho datado de 29/10/1983, o então Senhor Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica concordou com a proposta da Administração do IEM, nela se consta o seguinte: “Em fins de 1982 e inícios de 1983 foram apresentados ao Conselho de Administração deste Instituto, 3 requerimentos solicitando a contagem do tempo de serviço prestado em diversos serviços públicos para todos os efeitos decorrentes da antiguidade no IEM. Reapreciados estes requerimentos à luz de situações similares criadas em consequência de despachos de anterior administração do IEM, dos pareceres elaborados pelo Gabinete de Assessoria Jurídica e da orientação seguida no processo de transferência do pessoal da extinta Inspecção de Comércio Bancário o Conselho deliberou indeferir os pedidos apresentados pelos funcionários sem qualquer posição formal da anterior administração e submeter à homologação superior a extensão aos 4 elementos restantes do tempo de serviço prestado ao Estado em condições e para efeitos idênticos à doutrina aplicada ao pessoal da ex-ICB, cessando a partir de Setembro de 1983 quaisquer outras regalias ali não contempladas.” (cfr. fls. 350 e 351 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
5. Em 23/09/1982, a Autora solicitou a inscrição no Fundo de Previdência dos Trabalhadores do IEM (cfr. fls. 353 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
6. Em 28/02/1994, a Autora solicitou junto da Autoridade Monetária e Cambial de Macau a consideração do seu tempo de serviço prestado à DSCT, para efeitos de aposentação (cfr. fls. 16 dos autos).
7. Pelo parecer n.º 034/94-GAJ elaborado em 24/09/1994, foi determinado que o tempo de serviço prestado pela Autora à DSCT não releva para efeitos de aposentação na AMCM, com a menção de “Comunicar à trabalhadora” no despacho nele incorporado (cfr. fls. 455 a 458 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
8. Em 10/02/2012, a Autora solicitou junto da Ré a consideração do seu tempo de serviço prestada à DSCT e a emissão de uma certidão donde consta o número de anos considerados para efeitos de aposentação (cfr. fls. 17 e 463 a 464v dos autos).
9. Pela informação n.º 013/2012-DFR(SGR) elaborado em 21/02/2012, foi autorizada a emissão da certidão solicitada pela Autora com a respectiva declaração passada em 05/03/2012 pelo Senhor Director da Autoridade Monetária de Macau (cfr. fls. 465 a 468 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
10. Em 06/03/2012, a Autora solicitou junto da Ré para lhe ser esclarecida em relação à declaração que foi entregue donde se constatou que a Autora teria completado 30 anos de serviço em 01/04/2012 (cfr. fls. 18 e 23 dos autos).
11. Pelo parecer n.º 025/2012-GAJ elaborado em 22/03/2012, foi determinado o seguinte: “Emita-se uma certidão comtemplando a questão levantada e que na declaração entregue à trabalhadora, de facto, não menciona. Com essa certidão entregue-se à Autora cópia deste parecer.” (cfr. fls. 470 a 472v dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
12. Pela certidão passada em 16/07/2012, a pedido da Autora para contagem do tempo de serviço para efeitos de aposentação, o Senhor Administrador da Autoridade Monetária de Macau certificou que a Autora iniciou funções no IEM em 01/04/1982, completando naquela data trinta anos, três meses e dezasseis dias de trabalho para efeitos de aposentação. Mais certificou que o tempo de serviço prestado à DSCT pela Autora, no período de 11/04/1979 a 31/03/1982, não relevou para efeitos de aposentação, por falta de norma legal habilitante que o permita (cfr. fls. 24 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
13. Em 15/01/2013, a Autora apresentou junto da Ré o pedido da aposentação (cfr. fls. 354 dos autos).
14. Pela deliberação tomada em 07/02/2013, a Ré autorizou a rescisão do contrato de trabalho da Autora, com efeitos a partir de 01/05/2013 (cfr. fls. 415 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
15. Pela deliberação tomada em 26/04/2013, a Ré autorizou o pagamento à Autora da pensão de aposentação mensal, com base do tempo de serviço prestado, para efeitos de aposentação, a partir de 01/04/1982 (cfr. fls. 416 a 419 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente transcrito).
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III – Fundamentação:
   O Tribunal a quo julgou improcedente a acção pelas seguintes razões:
   “...
   Ficam todas as questões prejudiciais resolvidas, vamos, desde já, apreciar o mérito da causa.
   No requerimento inicial, suscitou a requerente outros três funcionários do IEM foram considerados a contagem do tempo de serviço prestado noutros organismos públicos para efeitos de aposentação e se encontra no mesmo circunstancialismo, antes pelo contrário, tem sempre negado o pedido como a Administração tem sufragado a tese nos pareceres elaborados, designadamente, de que a relação de trabalho que ela tem com a AMCM tem a natureza jurídica de emprego privado, e no seu entender, esta é um instituto público personalizado e assim os sujeitos que exercem funções nos institutos públicos têm o estatuto de funcionários públicos, não obstante ter existido o estatuto privativo de pessoal e o fundo de previdência.
   No respeitante ao reconhecimento do direito de contagem de serviço daqueles três funcionários, contestou a entidade requerida a concessão do direito aos ora três funcionários que não tinham trabalhado na ICB, através dos despachos do Administrador do IEM datado de 09/07/1981, foi feita sem base legal ou estatuária e a prática pautou-se a partir de Setembro de 1983, com o despacho do então Senhor Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica.
   Compulsados os autos, a requerente era ex-ajudante de tráfego de segunda classe do quadro da DSCT, no período entre 11/04/1979 e 31/03/1982, e por contrato de trabalho celebrado em 05/05/1982, foi a requerente recrutada por IEM com início em 01/04/1982, para exercer as funções de dactilógrafa de 2.ª (Nível 5).
   Dúvida não existe que a requerente nunca pertenceu ao quadro do pessoal da então ICB.
   Fica consagrado no n.º 4.º do seu contrato de trabalho o seguinte:
   “O segundo outorgante aceite como parte integrante deste contrato, o ESTATUTO PRIVATIVO DO PESSOAL DO INSTITUTO.”
   Naquela altura vigoravam os Estatutos do Instituto Emissor de Macau, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 1/80/M, de 12 de Janeiro, neles preceituou o seguinte:
“Artigo 29.º
   1. O pessoal do Instituto é contratado ou assalariado e fica sujeito ao regime de contrato individual de trabalho.
   2. Os funcionários do Estado, dos institutos públicos e das autarquias locais podem, a título excepcional, ser autorizados a exercer funções no Instituto em regime de comissão de serviço.
   3. O exercício da comissão referida no número anterior não prejudicará o funcionário nos direitos e regalias relativas ao lugar de que é proprietário, designadamente no que se refere ao acesso na sua carreira.
Artigo 30.º
   1. O pessoal do Instituto terá um estatuto próprio, aprovado pelo Governador.
   2. O pessoal do Instituto só poderá exercer funções profissionais remuneradas fora do Instituto, mediante autorização expressa do Governador.
Artigo 31.º
   1. O pessoal do Instituto terá o regime de previdência social previsto no estatuto a que se refere o artigo anterior.
   2. Ao pessoal que à data da entrada para o Instituto já seja beneficiário de outros regimes é permitido optar pela manutenção dos mesmos.”
    Não se encontrava nestes Estatutos nenhuma estipulação para regular a contagem ou reconhecimento do tempo de serviço prestado junto de outros organismos públicos, quer para efeitos de antiguidade quer de aposentação.
   A situação mantinha-se com a introdução do novo Estatuto Privativo do Pessoal do IEM, aprovado por Despacho do então Senhor Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica, de 26/07/1982, com efeitos a partir de 01/08/1982 (cfr. fls 113 a 133 dos autos).
   Por sua vez, com a entrada em vigor do novo Estatuto do IEM, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 63/82/M, de 30 de Outubro, onde preceituou o seguinte:
   “Art. 58.º O pessoal do quadro do IEM fica sujeito às normas do contrato de trabalho estabelecidas em estatuto próprio aprovado pelo Governador.
   Art. 59.º - 1. Pode exercer funções no IEM, em regime de comissão de serviço, o pessoal dos quadros dependentes dos órgãos de governo próprio do Território, sendo-lhe contado, para todos os efeitos legais, como efectivo serviço no seu quadro e categoria, o tempo de serviço prestado nessa situação.
   2. Pode ainda exercer funções no IEM o pessoal dos quadros dependentes dos órgãos de soberania da República que, nos termos do artigo 69.º do Estatuto Orgânico de Macau ou outros, for autorizado a prestar serviço no IEM.
   3. O pessoal referido nos números anteriores fica sujeito, enquanto exercer funções no IEM, ao regime estabelecido no estatuto a que se refere o artigo 58.º podendo optar pela remuneração anteriormente auferida no quadro de origem ou pela correspondente às funções que desempenha no IEM, que, em qualquer dos casos, suportará o respectivo encargo.
   Art. 60.º - 1. O pessoal do quadro do IEM terá o regime de segurança social estabelecido no estatuto a que se refere o artigo 58.º
   2. O pessoal que, à data da entrada para o IEM, seja beneficiário de outro regime de segurança social, cuja regulamentação permita a sua manutenção, não obstante a cessação ou interrupção da actividade profissional por ele abrangida, poderá optar por esse regime, sendo-lhe deduzido na respectiva remuneração o encargo do beneficiário.
   3. Nos casos previstos no número anterior, o IEM assume o encargo relativo à parte patronal das contribuições, se a ela houver lugar.”
   Daí se pode concluir não existe fonte quer legal quer contratual para reconhecer o direito da requerente da contagem do tempo de serviço prestado junto da DSCT, antes do seu ingresso ao quadro de pessoal do IEM.
   Por outro lado, as normas que destinam a regular a transição do pessoal da ICB, extinta pelo Decreto-Lei n.º 62/82/M, de 30 de Outubro, designadamente, os seus art.º 1.º, 2.º e 3.º, não podem ser servidas como fundamento ou base legal para a requerente obter o pretenso efeito, por ser ilegítimo e incompatível com a situação da requerente, bem como ficou já esclarecido, nos respectivos dois despachos proferidos pelo então Senhor Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica, de 02/07/1983 e 29/10/1983 respectivamente, que o tempo de serviço dos funcionários do IEM, não proveniente do quadro de pessoal da ICB e prestado aos outros organismos públicos, não tivesse sido considerado, sem qualquer posição formal da anterior administração, para todos os efeitos, salvo quatro trabalhadores entre quais, obviamente, não se contemplou a requerente.
   E o Decreto-Lei n.º 39/89/M, de 12 de Junho, que criou a AMCM, sucessora do IEM com pessoal nela integrado com dispensa de quaisquer formalidades e sem prejuízo de vencimento, antiguidade ou qualquer outro direito ou regalia, nos termos dos respectivos contratos (vide n.º 3 do art.º 3.º do mesmo D.L.), tem o seguinte no seu Estatuto anexado (com alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 27/90/M, de 18 de Junho):
“Artigo 30.º
(Estatuto do pessoal)
   1. Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 3.º do decreto-lei que aprova o presente estatuto, o pessoal da AMCM fica sujeito no que respeita ao seu recrutamento, selecção, contratação e regime de previdência ao Estatuto Privativo do Pessoal da AMCM, aprovado pelo Conselho de Administração e homologado pelo Governador e à lei reguladora das relações de trabalho no território de Macau.
   2. Poderão exercer funções na AMCM, em regime de comissão de serviço, requisição ou destacamento, funcionários ou agentes dos serviços públicos do território de Macau.
   3. Poderá igualmente exercer funções na AMCM, o pessoal dos quadros dependentes dos órgãos de soberania da República, recrutado nos termos do n.º 1 do artigo 69.º do Estatuto Orgânico de Macau, que poderá celebrar com a AMCM contratos individuais de trabalho ou de prestação de serviços.
   4. O pessoal nomeado para exercer funções na AMCM, nos termos dos n.os 2 e 3, mantém todos os direitos inerentes ao seu lugar de origem, nomeadamente os que se referem ao acesso nas respectivas carreiras, considerando-se, para todos os efeitos, como prestado no quadro próprio todo o tempo de serviço prestado na AMCM.”
   O novo Estatuto Privativo do Pessoal da AMCM, com efeito a partir de 01/02/1991 (cfr. fls. 134 a 184 dos autos), bem como a sua revisão introduzida com efeito a partir de 01/07/1993 (cfr. fls. 185 a 202 dos autos), não altera a prática já sido adoptada e reconhece apenas, para todos os efeitos, o tempo de serviço prestado ao IEM como tempo de serviço prestado à AMCM, sem prejuízo de que o tempo de serviço prestado a serviço público ou organismo da Administração de Macau se considera ainda, para efeitos de atribuição do prémio de antiguidade, quando não haja interrupção de funções (vide art.º 92.º e 58.º do Estatuto Privativo do Pessoal da AMCM, a fls. 180 e 166 a 166v dos autos).
   De outro lado, a actualização do Estatuto da AMCM introduzida pelo Decreto-Lei n.º 14/96/M, de 11 de Março, também não alterou a regulamentação respeita a estatuto de pessoal, para se reconhecer o tempo de serviço prestado a outros organismos públicos da Administração de Macau (vide art.º 33.º do referido Estatuto, em anexo ao D.L. n.º 14/96/M).
   In casu, constata-se que a recorrente tinha pedido a inscrição no Fundo de Previdência do Pessoal do IEM em 23/09/1982.
   Não se encontra normativo no Regulamento do Fundo de Previdência do Pessoal, quer na versão inicial aprovada na altura do IEM por Despacho do então Senhor Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica, de 17/09/1982 (cfr. fls. 305 a 317 dos autos), quer na versão aprovada na altura da AMCM por Despacho do então Senhor Secretário-Adjunto para os Assuntos Económicos e Presidente do Conselho Coordenador, de 04/07/1989 (cfr. fls. 318 a 332 dos autos) ou no novo Regulamento aprovado por Despacho do então Senhor Secretário-Adjunto para a Coordenação Económica, de 23/07/1996 (cfr. fls. 333 a 349 dos autos), que se destina conceder o direito do contagem de tempo de serviço prestado a outro organismo público, ao lado de que se reconhece o direito de receber pagamento à cessão de funções ou pensão a título de aposentação.
   Deste modo, inexiste fundamento legal para a requerente revindicar o que ela nunca gozou, nem a requerente pode recorrer ao gozo deste direito da contagem do tempo de serviço a título da igualdade de tratamento, como os quatros casos que foram concedidos excepcionalmente.
   Pela leitura do citado diploma, pode-se concluir a Autoridade Monetária de Macau, como o seu antecessor o IEM, adopta-se a um regime especial com o próprio estatuto privativo do pessoal e fundo de previdência do pessoal que, mesmo se encontram disposições estatutárias semelhantes, em nada se justifica remeter ao regime geral dos trabalhadores da Administração Pública, sendo assim irrelevante a natureza jurídica da relação de trabalho que a AMCM ou seu antecessor tenha contraído com a requerente, mesmo que seja um contrato de direito público, não existe razão legítima e legal para estender o escopo de regime geral dos trabalhadores da função pública para se aplicarem aos trabalhadores contratados pela AMCM.
   Nesta conformidade, improcede-se na íntegra o argumento da requerente.
***
   Por tudo o que fica expendido e justificado, o Tribunal julga improcedente a presente acção e consequentemente absolve a entidade requerida dos pedidos.
   Custas pela requerente.
   Registe e notifique...”.
Trata-se de uma decisão que aponta para a boa solução do caso.
Assim, ao abrigo do disposto do nº 5 do artº 631º do CPCM, é de negar provimento ao recurso, com os fundamentos constantes na decisão impugnada.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao presente recurso jurisdicional, confirmando a sentença recorrida.
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Custas pela Autora com 8UC taxa de justiça.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 10 de Dezembro de 2015.

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Ho Wai Neng Mai Man Ieng
(Fui presente)
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José Cândido de Pinho

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Tong Hio Fong



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786/2014