Processo nº 499/2015
(Recurso Contencioso ― Reclamação para a conferência)
Data: 26/Novembro/2015
Reclamante:
- Companhia A
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
Companhia A, recorrente nos autos acima cotados, inconformada com o despacho do relator de 11 de Setembro de 2015, que indeferiu a junção do articulado superveniente, vem pedir que a questão seja submetida à conferência, por entender que o tal articulado deveria ser admitido, com a consequente prossecução dos autos.
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Devidamente notificada, respondeu a entidade recorrida Sua Ex.ª o Chefe do Executivo, pugnando pela improcedência da reclamação.
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O Digno Magistrado do Ministério Público deu o seguinte douto parecer:
“Do douto despacho de fls. 264 que ordenou o desentranhamento dos Articulados Supervenientes de fls. 194 a 207 dos autos e a consequente devolução, a recorrente apresentou a Reclamação para a conferência mediante a peça de fls. 268 a 270 dos autos.
Quid juris?
Interpretando o preceito no n.º 1 do art. 425º do CPC em harmonia com o princípio da economia processual, extraímos que só é admissível novo articulado nos casos em que não há lugar a articulado posterior ou aqui não pode ser alegado algum facto superveniente.
No seio do recurso contencioso, importa referência acentuada de que quando quaisquer das três partes – recorrente, entidade recorrida ou contra-nteressado – requerer, na petição inicial ou na contestação consoante o caso a que souber, meios de prova, subscrevemos a sensata tese de o art.º 64º do CPAC impor ao juiz o dever de ordenar a notificação nos termos e para os efeitos aí previstos. (José Cândido de Pinho: Manual de Formação de Direito Processual Administrativo Contencioso, Centro de Formação Jurídica e Judiciária, p. 156)
Assim, poderia haver três hipóteses:
- Havendo lugar a despacho de ordenar a apontada notificação, a parte que tenha requerido meios de prova pode usar da faculdade de alterar o requerimento de prova e, ao mesmo tempo, de alegar factos supervenientes para justificar tal alteração. (art. 64º do CPAC)
- Ainda que haja lugar a tal despacho, quem não tenha requerido meios de prova não possa, de jure constituto, usar desta faculdade (autor e ob. citados, p. 157). Então, afigura-se-nos que a parte à qual não aproveite tal faculdade pode alegar factos supervenientes de acordo com a determinação no n.º 3 do art. 68º do CPAC.
- Nos casos de nenhuma das partes requererem meios de prova e assim não haver lugar àquela notificação, os factos supervenientes podem ser alegados nas alegações facultativas (art. 68º, n.º 3 do CPAC), por qualquer das partes a quem aproveitam tais factos.
- E, na nossa modesta opinião, o articulado novo só é necessário e justificado quando se verificarem quaisquer factos supervenientes na fase posterior às alegações facultativas, podendo a parte que aleguem factos supervenientes solicitar, ao abrigo do art. 67º do CPAC, ao juiz/relator a realização de diligências de prova.
No caso sub iudice, acontece que a recorrente requereu, na petição inicial, a inquirição de testemunhas, e os Articulados Supervenientes de fls. 194 a 207 foram dados nestes autos antes da contestação da entidade recorrida. O que implica a prematuridade.
Deste modo, e ressalvado o respeito pela opinião diferente, parece-nos que é impecável o douto despacho reclamado e a Reclamação não merece provimento.
Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência da Reclamação em apreço.”
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II) FUNDAMENTAÇÃO
Nos presentes autos, verifica-se o seguinte:
O reclamante interpôs em 22.5.2015 para este TSI recurso contencioso do despacho de Sua Ex.ª o Chefe do Executivo que declarou a caducidade do contrato de concessão de um terreno.
Em 26.6.2015, foi ordenada a citação da entidade recorrida.
Em 7.7.2015, a reclamante apresentou articulado superveniente, alegando ter conhecimento da existência de processos semelhantes ao do seu recurso que mereceram decisões diferentes por parte da mesma entidade, no sentido da não declarar a caducidade dos respectivos contratos de concessão.
Por despacho do relator de 11.9.2015, foi indeferida a junção do referido articulado superveniente.
Inconformada, a reclamante reclamou em 22.9.2015 para a conferência, pedindo que se profira Acórdão que admita o articulado superveniente.
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Cumpre decidir.
A questão que está em causa é saber se é admissível a apresentação de articulado superveniente no processo administrativo contencioso.
Salvo o devido respeito, entendemos que o articulado superveniente apresentado pela reclamante não é admissível nos presentes autos, pelo menos nesta fase processual.
Embora seja verdade que nos termos do artigo 425º do Código de Processo Civil se prevê a admissibilidade de articulados supervenientes, e que o artigo 1º do CPAC manda aplicar subsidiariamente e com as necessárias adaptações, a lei processual civil, mas em nossa opinião, a aplicação subsidiária não significa que a legislação subsidiária se aplica incondicionalmente, antes só se deve operar a integração da legislação subsidiária na legislação principal, na medida em que se destina a preencher as lacunas da lei principal.
Em boa verdade, a tramitação processual civil é bastante diferente do processo administrativo contencioso, sobretudo no tocante à fase dos articulados.
No concernente à questão de apresentação de articulado superveniente, entendemos não haver “lacunas” no processo contencioso que permite recorrer à lei processual civil.
De facto, no processo administrativo contencioso, a lei prevê a admissibilidade de “articulado superveniente”, mas sob outro prisma.
Senão vejamos.
Dispõe o artigo 64º do CPAC que “não se verificando a hipótese prevista no artigo anterior, é ordenada a notificação do recorrente, da entidade recorrida e dos contra-interessados para, no prazo de 5 dias, usarem da faculdade de alterar o requerimento de prova sempre que a alteração seja justificada pelo conhecimento superveniente de factos ou documentos relevantes”.
Por outro lado, preceitua-se no nº 3 do artigo 68º do CPAC que “nas alegações (digamos facultativas), o recorrente pode alegar novos fundamentos do seu pedido, cujo conhecimento tenha sido superveniente, ou restringi-los expressamente”.
Da conjugação dessas duas normas pode dar lugar a duas situações:
A primeira é aquela em que, tendo o recorrente apresentado meios de prova na petição inicial, chegando a fase de instrução e produção de prova, é-lhe notificado para ser dada a possibilidade de alterar o seu requerimento de prova e, ao mesmo tempo, se assim o entender, alegar factos supervenientes (artigo 64º CPAC).
Enquanto na outra situação, pode o recorrente não ter apresentado meios de prova na petição inicial, e chegando a fase de instrução e produção de prova, embora não lhe seja aplicável o disposto no artigo 64º do CPAC, mas não estará o mesmo inibido de alegar factos supervenientes nas próprias alegações facultativas (68º CPAC).
No fundo, essa norma permite que o recorrente alegue novos fundamentos, tanto de facto como de direito (visto que a lei não distingue), cujo conhecimento tenha sido superveniente, ou seja, entre o momento da interposição do recurso até ao da apresentação das alegações facultativas.
Sendo assim, salvo o devido respeito por melhor opinião, julgamos que os articulados supervenientes só serão necessários quando os factos supervenientes se verificarem após a fase das alegações facultativas.
Aqui chegados, somos a entender que, por o processo administrativo contencioso prever momentos próprios para a alegação de novos fundamentos (mormente de factos) do pedido cujo conhecimento por parte do recorrente seja superveniente, não se pode sufragar a tese defendida pela reclamante no sentido da aplicação subsidiária do CPC no tocante à apresentação de articulado superveniente.
Destarte, julga-se improcedente a reclamação.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente a reclamação, confirmando a decisão reclamada.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 2 U.C.
Notifique.
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RAEM, 26 de Novembro de 2015
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
João A.G. Gil de Oliveira
Fui Presente
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Mai Man Ieng
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