打印全文
Processo n.º 420/2015
(Recurso cível)

Data: 3/Dezembro/2015


   ASSUNTOS:
- Acção de alimentos a filho maior; tramitação por apenso


SUMÁRIO:
    O pedido de alimentos a filho maior correr seus termos por apenso a Acção onde os alimentos a filho menor foram fixados anteriormente.

O Relator,
João A.G. Gil de Oliveira


Processo n.º 420/2015
(Recurso Civil)
Data : 3/Dezembro/2015

Recorrentes : - A

Recorrido : - B


    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I – RELATÓRIO
    1. A (A), ora requerente, vem interpor recurso ordinário contra a decisão que indeferiu o pedido formulado pela mesma, por a Mma Juíza ter entendido não ser admissível o pedido de alimentos a filho maior correr seus termos por apenso a Acção onde os alimentos a filho menor foram fixados anteriormente.
    Para tanto, alega:

    I. In casu, a requerente pediu a condenação do seu pai no pagamento mensal da quantia de MOP3.000,00 como alimentos desde a dedução deste requerimento até a conclusão dos estudos da mesma.
    II. O Tribunal a quo indeferiu o aludido pedido, por ter considerado que a continuação do conhecimento do presente caso por apenso é desadequada à formalidade.
    III. Entendeu a requerente que a forma do seu requerimento é adequada à formalidade.
    IV. O presente requerimento fundamenta-se na sentença proferida no processo n.º CV3-02-0015-MPS-B, na qual a requerente pediu o aumento do valor mensal dos alimentos e, por seu turno, o Juiz a quo manteve o valor mensal em MOP2.000,00.
    V. Tal como foi mencionado no despacho proferido pelo Juiz a quo em fls. 139, este caso deve correr nos termos do Decreto-Lei n.º 65/99/M.
    VI. Não obstante a requerente tenha completado a maioridade, neste caso é aplicável o processo especial previsto no art.º 1250º do Código de Processo Civil,
    VII. E não se prejudica que o presente caso corra por apenso.
    VIII. Visto que, nos termos do art.º 1250º, n.º 2 do Código de Processo Civil, já existe a decisão sobre alimentos relativos à menoridade da requerente, não impedindo o processamento do presente caso.
    IX. Mais, nos termos do art.º 1250º, n.º 1 do Código de Processo Civil, de qualquer modo, neste caso segue-se o regime previsto para os menores, não havendo nenhuma mudança estrutural extraordinária.
    X. Assim sendo, a requerente considera que neste caso não se verifica erro na forma.
    
    Por conseguinte,
    
    Conclusão:
    I. A requerente considera que neste caso não se verifica erro na forma, uma vez que, quer nos termos do Decreto-Lei n.º 65/99/M quer nos termos do art.º 1250º do Código de Processo Civil, neste caso segue-se o regime previsto para os menores, não havendo nenhuma mudança estrutural extraordinária.
    II. Nestes termos, o Tribunal superior deve conceder provimento ao recurso interposto, revogando a decisão do Juiz a quo e ordenando o prosseguimento do processo, no sentido de apreciar os objectos do pedido.
    2. B (B), ora Réu do processo supramencionado, aí mais bem identificado, , contra-alega, dizendo em conclusão:
    1. No caso vertente trata-se do recurso interposto pela recorrente contra o despacho do Tribunal a quo que indeferiu o respectivo pedido. Tendo lido rigorosamente as alegações e conclusão expostas na petição de recurso, pode sintetizar-se em seguintes questões tratadas neste recurso: (1) Nos termos do art.º 1250º, n.º 2 do Código de Processo Civil, o caso dos alimentos a filhos maiores ainda pode correr neste processo por apenso; (2) Nos termos do art.º 1250º, n.º 1 do Código de Processo Civil, neste caso segue-se o regime previsto para os menores, não havendo nenhuma mudança estrutural extraordinária. Nesta conformidade, entende a recorrente que não existe erro formal no presente caso.
    2. Na modesta opinião do recorrido, o motivo de recurso apresentado pela recorrente é manifestamente improcedente.
    3. Antes de mais, a recorrente formulou o requerimento de alteração da prestação dos alimentos no processo n.º FM1-02-0004-MPS-B que é o apenso do processo de regulação do exercício do poder paternal n.º MPS-041-02-6, no qual, quanto aos alimentos, a sentença do aludido processo de regulação do exercício do poder paternal determinou meramente que o recorrido pagaria mensalmente a quantia de MOP2.000,00 à menor, ora recorrente, como alimentos, até esta atingir 18 anos de idade.
    4. Em suma, todas as pretensões formuladas pela recorrente no processo n.º FM1-02-0004-MPS-B são limitadas ao âmbito do conteúdo da sentença proferida no processo n.º MPS-041-02-6.
    5. Ora, a recorrente, após a sua maioridade, ainda formulou, nos termos dos artigos 1735º e 1844º do Código Civil, o pedido de alteração dos alimentos no processo n.º FM1-02-0004-MPS-B. Tanto o pedido de prestação dos alimentos como o de alteração dos alimentos relativos ao período de estudos excedem o conteúdo da sentença a quo proferida no processo de regulação do exercício do poder paternal. A recorrente defende que, nos termos do art.º 1250º, n.º 2 do Código de Processo Civil, o pedido de alteração dos alimentos ainda pode correr no referido processo por apenso, contudo, este motivo de recurso é manifestamente improcedente.
    6. Ademais, nos termos do art.º 1250º, n.º 1 do Código de Processo Civil, tanto o simples pedido de prestação dos alimentos quanto o de alteração dos alimentos a maiores relativos ao período de estudos devem ser tratados no processo de jurisdição voluntária relativo aos alimentos a filhos maiores, pelo que basta seguir, com as necessárias adaptações, o regime previsto para os menores.
    7. Por outras palavras, embora o caso de alimentos a filhos maiores e o de alimentos a filhos menores sejam tratados no processo de jurisdição voluntária, nos termos da lei, aos quais são aplicáveis as formas processuais diferentes.
    8. Ou seja, a recorrente ainda formulou no processo n.º FM1-02-0004-MPS-B em apenso o pedido de prestação dos alimentos relativos ao período de estudos ocorrido depois da sua maioridade, verificando-se assim vício de erro na forma de processo. Ora, a recorrente defende que não há neste caso nenhuma mudança estrutural extraordinária e, em consequência, não se verifica erro formal no respectivo pedido, contudo, este motivo é manifestamente improcedente.
    9. A par disso, conforme a correspondente nota jurídica, no caso vertente trata-se meramente do pedido de prestação dos alimentos formulado pela recorrente após a sua maioridade, com vista à conclusão dos estudos. Obviamente, neste caso não só se verifica o vício de erro na forma de processo, mas também a questão da incompetência do tribunal, devendo ser indeferido o pedido em causa.
    
     Pelo exposto, entende o recorrido que se deve nega provimento ao recurso interposto pela recorrente.
    
     3. Foram colhidos os vistos legais.
    
    II - Despacho recorrido
    É do seguinte teor:
    “Em 28 de Outubro de 2013, a requerente A (A) deduziu requerimento para este Juízo contra o seu pai B (B), solicitando o aumento da quantia dos alimentos para MOP3.000,00, com vista a sustentá-la até a conclusão dos estudos na Inglaterra (vide fls. 126 dos autos).
     Lidas e analisadas as informações constantes dos autos, este Juízo considera que deve ter atenção aos seguintes conteúdos:
     1) A requerente A (A) nasceu em 23 de Novembro de 1994, portanto, completou a maioridade em 23 de Novembro de 2012;
     2) No “Processo de regulação do exercício do poder paternal”, o acordo entre os pais foi homologado pelo Tribunal em 28 de Março de 2003: O requerido B (B), após ter arranjado emprego, prestará mensalmente alimentos à menor A (A), na quantia de MOP2.000,00, até esta atingir 18 anos de idade (vide fls. 16 e 16v. do “Processo de regulação do exercício do poder paternal” (FM1-02-0004-MPS));
     3) Embora, em 18 de Maio de 2009, a mãe da requerente C (C) tenha formulado, em nome da sua filha menor, o pedido de elevação da quantia dos alimentos (vide fls. 2 a 125 dos autos), que na altura a requerente A (A) ainda era menor e podia tratar das questões de alimentos ocorridas na sua menoridade através do “Processo de alteração dos alimentos” apenso ao “Processo de regulação do exercício do poder paternal”;
     4) “Presentemente, a requerente A (A) já completou a maioridade, assim sendo, nos termos dos artigos 1734º, 1735º e 1844º do Código Civil de Macau e art.º 1250º, n.º 2 do Código de Processo Civil de Macau, os objectos de fixação dos alimentos destinados aos filhos maiores durante os estudos ou de alteração da prestação dos alimentos já estão para além do conteúdo vinculado pela sentença a quo do “Processo de regulação do exercício do poder paternal”, por conseguinte, se a requerente A (A), após ter completado a maioridade, pretender pedir novamente ao requerido a prestação dos alimentos relativos ao período de estudos ocorrido depois da sua maioridade, deve a mesma formular tal pedido no processo especial de jurisdição voluntária relativo aos “Alimentos a filhos maiores”, vedado pelo art.º 1250º, n.º 1 do Código de Processo Civil de Macau, e não no presente “Processo de alteração dos alimentos” por apenso ao “Processo de regulação do exercício do poder paternal”.
     Nestes termos, verifica-se vício de forma processual no processo referido nos documentos constantes de fls. 126 a 189 dos autos, notificando-se a requerente para pronunciar-se sobre o assunto.”
    
    III - FUNDAMENTOS
    1. O objecto do presente recurso reconduz-se em saber se uma acção de fixação de alimentos a filho maior pode ser processada por apenso ao processo que fixou alimentos a filho menor.
    A Mma Juíza entendeu que a acção em que a filha maior vem solicitar uma alteração de alimentos anteriormente fixada, por prosseguimento de estudos, não podia ser processada por apenso e devia correr autonomamente.
    Para tanto expendeu seguinte fundamentação acima transcrita.
   
2. Atentemos nas seguintes normas pertinentes:
    O art. 1735º do C. Civil prescreve:
    “Se no momento em que atingir a maioridade ou for emancipado o filho não houver completado a sua instrução, mantém-se a obrigação a que se refere o artigo anterior na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete.”
    Por sua vez o art. 1250º do C. Proc. Civil estipula:
    “1. Quando surja a necessidade de se providenciar sobre alimentos a filhos maiores ou emancipados, nos termos do artigo 1735.º do Código Civil, segue-se, com as necessárias adaptações, o regime previsto para os menores.
    2. Tendo havido decisão sobre alimentos a menores ou estando a correr o respectivo processo, a maioridade ou a emancipação não impedem que o mesmo se conclua e que os incidentes de alteração ou de cessação dos alimentos corram por apenso.”
3. Estamos em crer que não há razão para que a acção ora proposta pela filha, agora maior, para prosseguimento de estudos não possa correr por apenso.
    Desde logo a letra do n.º 2deste último artigo inculca nesse sentido. Se tiver havido decisão (é o caso) ou estando a correr o respectivo processo…os incidentes de alteração correm por apenso.
    Claro que se poderá dizer que essa previsão respeita à fixação de alimentos de filhos menores.
    Mas a norma processual deve ser analisada conjuntamente com a norma substantiva e do art. 1735º do CC e daí resulta uma ligação estreita entre a continuação dos alimentos fixados na menoridade e aqueles que devem prosseguir na maioridade dos filhos. A letra da lei aponta nesse sentido, ao referir “mantém-se a obrigação a que se refere o número anterior…”
    A razão principal, contudo, afigura-se resideir na razão de ser da apensação dos processos.
    Por que se apensam os processos?
    Por facilidade, unidade de provas, simplificação e economia de meios e de provas. Com a fixação de alimentos a filhos maiores, em continuação do que foi anteriormente decidido, bem pode haver um conjunto de provas e de diligências anteriormente produzidas e que vão servir para a decisão a proferir no novo processo, quais seja as relativas à situação dos obrigados a alimentos. Estará em causa, primordialmente a indagação da necessidade de que m precisa de continuar a ser assistido nos seus estudos.
    Faz sentido, pois, que naquilo que puder ser aproveitado, não se repitam as diligências, privilegiando a celeridade e economia processuais.
    
    Razões por que somos a considerar a possibilidade de a presente acção correr por apenso àquela onde foram fixados anteriormente os alimentos, para além de que, perante eventual erro na forma de processo ou no meio intentado não se veria razão para não mandar seguir a acção autonomamente se se verificassem os respectivos requisitos formais.
    O recurso não deixará, pois, de merecer provimento.
    
    IV - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em conceder provimento ao recurso, e, em consequência, revogar a decisão proferida, devendo os autos seguir por apenso.
    Custas pelo recorrido.
Macau, 3 de Dezembro de 2015,
João A.G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho


420/2015 2/10