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 Processo n.º 575/2015
 (Recurso Cível)
 
 Relator: João Gil de Oliveira
 Data : 3/Março/2016
 

ASSUNTOS:
- Elementos essenciais do contrato; âmbito da forma legal;
prova testemunhal
- Representação sem poderes; ratificação
- Pacto comissório
    
    SUMÁRIO :
    1. Se o Autor não comprova que o promitente vendedor que assume a promessa de venda de um imóvel agiu nesse contrato em representação de uma sociedade, da qual nem era sócio, gerente ou director, nada constando do contrato promessa nesse sentido, agindo o promitente vendedor pessoalmente e sem nenhuma indicação representativa, não pode o A. pretender a resolução do contrato demandando a pretensa C.ª promitente vendedora e aquelas a quem esta veio a transmitir o referido imóvel.
    2. A identificação de uma parte no contrato, mais propriamente quem promete vender e a qualidade de que assume essa obrigação, se, em nome próprio ou em representação de outrem, configura um elemento essencial do contrato que não deixa de estar abrangido pelas razões de forma legal, no caso, a forma escrita, cuja observância se impõe no negócio celebrado, pelo que não esse elemento não é passível de prova testemunhal contra aquilo que ficou exarado no próprio documento. Diferente será a comprovação da celebração de um negócio em nome próprio e tentar demonstrar fora do documento o beneficiário do interesse nesse negocio, questão que passa a ser a da demonstração de uma representação sem poderes.
    3. O apuramento do real sentido da vontade declarada é passível de prova testemunhal. Imagine-se numa simulação não invocável pelos próprios simuladores. Não está vedada a prova testemunhal para apuramento do real sentido da vontade negocial das partes. Só que aí a prova visa apurar qual a vontade real do declarante e declaratário e, comprovando-se a divergência, o resultado será a nulidade do negócio simulado; já o aproveitamento do negócio dissimulado fica dependente do aproveitamento das razões de forma que se imponham para o negócio verdadeiramente realizado. Não já assim em que se pretenda comprovar um elemento essencial de um dado negócio, não para o destruir, mas sim para o validar com um dado sentido, o que, para além do disposto nos art.ºs 212.º e 213.º, colide ainda com o disposto nos artigos 388.º, n.º 1 e 357.º, n.º 1 do CC..
    4. Se o A. defende na petição que determinada sociedade foi a promitente vendedora e que ela estava representada por determinada pessoa singular que nem é parte na acção, não pode vir em recurso emendar a mão e sustentar uma outra tese, a de que aquele indivíduo agiu sem poderes em representação daquela.
    5. Cai assim por terra a argumentação que se pretende no sentido de se ter um negócio por ratificado, mesmo ao abrigo do inovador n.º 2 do artigo 261.º se não comprovam as circunstâncias objectivas e ponderosas em que pudesse assentar a confiança do terceiro de boa fé na legitimidade do representante, para mais se não se comprova qualquer factos demonstrativo dessa instilação de confiança por porta da sociedade pretensamente representada e convocada a uma ratificação ficcionada.
    6. A outorga de uma procuração irrevogável e para negócio consigo mesmo, para venda ou promessa de venda, que um devedor faz em relação ao credor hipotecário, sobre o imóvel hipotecado, pode camuflar ou não um verdadeiro pacto comissório que a lei proíbe. Sem outros elementos, que afastem a situação usurária do negócio, ou seja de inferioridade e de prejuízo para o devedor, não se tem por seguro que se esteja, sem mais, perante um negócio usurário e a nulidade decorrente do artigo 690.º.º É que o que se proíbe, face ao disposto neste artigo, é a cláusula que permita essa alienação no caso de o devedor não cumprir.
    
              O Relator,
              João A. G. Gil de Oliveira




Processo n.º 575/2015
(Recurso Civil)
Data : 3/Março/2016

Recorrente : - A

Recorridas : - B Limited
- C, Lda.
      - D, Lda.


    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I – RELATÓRIO
    
    1. A, mais bem identificado nos autos, intentou uma acção contra
    1ª Ré – B, Ltd. (B有限公司), sociedade commercial com sede em Hong Kong, em xxxxxxxxxxxxxxxxxxx, Kowloon;
    2 ª Ré – D, Lda (D有限公司), sociedade commercial com sede em Macau na xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx;
    3 ª Ré - C, Lda. (C有限公司), sociedade comercial com sede em Macau na xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx;
    com os fundamentos constantes da petição inicial de fls. 27 a 38,
concluiu pedindo que fosse julgada procedente a acção e consequentemente fosse:
a. O contrato promessa declarado resolvido e a 1ª Ré condenada a pagar ao Autor a quontia de HKD186.670.000,00, acrescida dos juros de mora legais contados desde a data de citação da mesma;
b. Declarada a nulidade, por simulação, das transmissões do direito de concessão sobre o imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº XXXXX a fls 184v do Livro B36, tituladas pelas escrituras de 30 de Outubro de 2003 e 8 de Janeiro de 2004 e ordenado o cancelamento dos respectivos registos; ou, subsidiariamente no que respeita à transmissão formalizada em último lugar,
c. Declarada a nulidade de transmissão do direito referido no parágrafo anterior titulada pela escritura de 8 de Janeiro de 2004 na sequência da declaração de nulidade da transmissão titulada pela escritura de 30 de Outubro de 2003 conforme requerido em b) supra; ou, subsidiariamente quanto aos pedidos em b) e c), e
d. Decretada procedente a impugnação pauliana das transmissões do direito em causa e, consequentemente, ser ordenada a restituição deste à 1ª Ré, autorizando-se a execução do mesmo no património da 3ª Ré.

A acção acabou por ser julgada, tendo-se julgado improcedente a acção e, em consequência, absolvido a 1ª Ré, B, Ltd, 2ª Ré, D, Lda, e 3ª Ré, C, Lda, dos pedidos formulados pelo Autor, A .

    2. A, Autor nos autos à margem identificados, inconformado com tal decisão, vem apresentar as suas ALEGAÇÕES, concluindo:
A - Vem o presente recurso interposto da sentença proferida no passado dia 21.01.2015, pela qual o Tribunal a quo, após reabertura da audiência de julgamento para (continuação) da prestação do depoimento da testemunha E, nos termos determinados pelo Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, confirmado pelo Tribunal de Última Instância, renovou a sentença no sentido de absolver os Réus dos pedidos deduzidos na acção.
    B - Com tal decisão não se pode o Recorrente conformar, por entender que a sentença recorrida padece de graves erros de julgamento quanto à matéria de facto, não tendo o Tribunal a quo tirado as devidas consequências de documentos fundamentais juntos aos autos, bem como do facto incontestado e inultrapassável de F ser o único interlocutor da1ª Ré B, quer antes, quer depois de Abril de 1992.
    C - A única diferença que se verificou nos presentes autos em termos processuais foi que, na sequência da reabertura do julgamento para continuação da inquirição da testemunha E, nos termos ordenados pelo Acórdão de Segunda Instancia, o Tribunal a quo procurou agora fundamentar a resposta à matéria de facto, em termos que anteriormente eram inexistentes.
    D - Não obstante, no modesto entendimento do Recorrente, tal fundamentação da matéria de facto contraria a prova produzida nos autos, além de não se coadunar com as regras ditadas pela experiência e senso comum, razão pela qual o Recorrente não se pode conformar com a resposta à matéria de facto e passará à respectiva impugnação.
    E - A propósito da fundamentação à matéria de facto que consta agora de fls. 1420 verso a 1423, adiante-se desde já que o Tribunal a quo menosprezou o facto pacífico - foi afirmado por todas as testemunhas ouvidas nos presentes autos - de o lote de terreno objecto dos presentes autos ser da propriedade da 1ª Ré, B. Contrariamente ao que consta da fundamentação à resposta à matéria de facto, independentemente da consulta ou não do registo predial, todas as testemunhas afirmaram ter conhecimento de que tal imóvel pertencia à 1ª Ré.
    F - Depois o Tribunal a quo, também na fundamentação sobre o Acórdão com resposta à matéria de facto, ao fazer consignar que o negócio não teria sido ratificado pela 1ª Ré, parece tratar F como se fosse um estranho a tal sociedade, quando é uma evidência que, quer antes de Janeiro de 1992 (data da celebração do contrato promessa objecto dos autos), quer posteriormente a Abril de 1992 (data da inscrição no registo comercial de F como sócio e administrador da 1ª Ré) F sempre apareceu como o único interlocutor e representante da 1ª Ré. O Tribunal a quo, estranhamente, não tira quaisquer consequências de tal facto, sabendo que o mesmo tem consequências inultrapassáveis, mais que não seja pela via da ratificação do negócio por parte da 1ª Ré.
    G - Entende o Recorrente que o Tribunal a quo optou por analisar os factos que foram submetidos à sua apreciação e julgamento de uma forma simplista, desconsiderou queF e a B (a 1ª Ré) estão intrinsecamente ligados, havendo uma total confusão entre as duas pessoas (singular e colectiva), não tendo, ao mesmo tempo, valorado a realidade e a prática negocial então vigente em Macau, nomeadamente, em 1992, ano da celebração do negócio em apreço nos autos.
    H - Entendendo, em qualquer caso, o Recorrente que, no mínimo, perante a prova produzida em julgamento, o Tribunal a quo deveria ter declarado a resolução do contrato promessa, bem como declarado verificados os pressupostos da impugnação pauliana e declarado a nulidade da transmissão por violação do pacto comissório, tudo nos termos que se passa a expor.
    I - Nos termos do art. 599.°, n.º 1, al. a) do C.P.C., o Recorrente considera que, analisadas as provas carreadas aos autos pelas partes e produzidas em sede de audiência de julgamento, devidamente documentada, é possível concluir que foram incorrectamente julgados os quesitos 1.°, 2.°, 3.°, 4.°, 5.°, 6.°, 7.°, 8.°, 8.º-A, 12.°, 17.°, 19.°, 21.°, 23.°, 24.°, 25.°, 26.°, 28.°, 29.°, 32.°, 41.° e 43.° da base instrutória, nos termos acima transcritos nas alegações.
    J - Nos termos do art. 599.°, n.º 1, al. b) e n.º 2 do C.P.C., a prova que contraria tais factos resulta nomeadamente das declarações prestadas pelas testemunhas do Autor (E, G, H, I) acima transcritas nas alegações, bem como dos diversos documentos que abaixo se discriminam.
    K - Quanto ao quesito n.° 1, relativo à celebração e existência do contrato promessa de 08.01.1992, considerando a amplitude do quesito, o qual se refere essencialmente à celebração e ao objecto do contrato promessa, entende o Recorrente que tal quesito só podia ter sido dado como provado. O contrato-promessa encontra-se junto aos autos como doc. 1 junto com a petição inicial (cfr. fls. 14 a 17) e a sua celebração com a 1ª Ré foi confirmada por todas as testemunhas.
    L - Não obstante, sem prescindir do que imediatamente a seguir se dirá quanto à integral prova de tal quesito, entende o Recorrente que, em coerência com a resposta dada ao quesito n.º 9 da base instrutória, o quesito n.º 1 sempre teria de ser dado como provado, ainda que o Tribunal considerasse que não foi celebrado com a 1ª Ré, mas sim comF.
    M - Quanto aos quesitos 1.º a 8.º-A da base instrutória, referentes à celebração e apuramento da vontade das partes quanto à celebração do contrato-promessa que está na génese dos presentes autos (cfr. doc. 1 junto com a petição inicial) tais factos deveriam ter sido considerados provados.
    N) Contrariamente ao que o Tribunal a quo fez constar em sede de fundamentação da resposta à matéria de facto, que a intenção do Autor era celebrar o contrato promessa de compra e venda do imóvel com quem se afigurava o seu legítimo representante e proprietário (conferir factos assentes a) e b)) - razão pela qual, aliás, pagou imediatamente a primeira prestação a título de sinal no valor de MOP$97.335.000,00 (conferir resposta do Tribunal a quo ao quesito n.º 9 da base instrutória) -, resulta até das regras básicas da experiência e do senso comum.
    O) Qual o sentido do Autor entregar tal avultado valor aFse o mesmo fosse um estranho à B, sabendo que o que o Autor pretendia era adquirir o imóvel da propriedade desta?
    P - A resposta do Tribunal a quo, nomeadamente, aos quesitos 3.° e 4.° da base instrutória é verdadeiramente incompreensível, não tendo qualquer correspondência com a realidade, nem com o que foi expressamente referido pelas testemunhas em sede de julgamento.
    Q - Entendendo o Recorrente que, independentemente do que foi referido pelas testemunhas, os quesitos 3.° e 4.° da base instrutória sempre deveriam ter sido dado como PROVADOS, até porque se tratam de factos notórios (cfr. o art. 433° do c.P.c.) ou susceptíveis de prova por presunção (cfr os artigos 342° e 344°, ambos do Código Civil).
    R - Das respostas do Tribunal aos quesitos 5.°, 41.° e 43.° da base instrutória parece resultar que o Tribunal a quo valorou unicamente as datas das inscrições no registo comercial de Hong Kong relativos à aquisição de 99% das quotas por F e da sua nomeação para o cargo de administrador da B, nos termos que resultam dos documentos juntos como Docs. 11 e 12 da Contestação da 2ª Ré. É sabido que, em relação aos actos em referência - aquisição da qualidade de sócio e nomeação de administrador da sociedade -, o registo não é constitutivo de direitos, visando apenas conferir publicidade a tais actos.
    S - Nada impede - como não impediu -, que F (F) se apresentasse e já actuasse aos olhos de todos como legítimo representante da B, a 1ª Ré, mesmo antes de tal facto se encontrar inscrito no registo.
    T - Isso mesmo foi confirmado por todas as testemunhas e resulta, ainda, dos documentos juntos aos autos, nomeadamente: 1) dos cheques juntos aos autos como docs. 4, 5 e 6 da contestação da 2.ª Ré, que perfazem um total de HKD$62.000.000,00, foram passados por esta, em 14.03.1992, 18.03.1992 e 02.04.1992, respectivamente, a favor de F e, portanto, em datas em que anteriores ao registo da inscrição da sua qualidade de sócio e administrador da B, a 1ª Ré; 2) a livrança junta aos autos como doc. 3 da contestação da 2ª Ré (conferir também resposta ao quesito 37.º da base instrutória, em que o Tribunal considerou que a livrança foi subscrita pela 1ª Ré) foi subscrita por F, em representação da 1ª Ré, em 02.04.1992 e, portanto, numa data anterior ao registo da inscrição da sua qualidade de administrador da B, a 1ª Ré e, fundamental, 3) O Contrato de Desenvolvimento e Cooperação relativo ao lote de terreno em apreço nos presentes autos, junto a fls. 794 a 796 dos autos, foi assinado pela 2ª Ré e por F, em representação da 1ª Ré, em 18.03.1992, portanto, numa data anterior ao registo da inscrição da sua qualidade de sócio e administrador da B, a 1ª Ré (facto claramente reconhecido e aceite pela própria 2ª Ré).
    U - Dos referidos documentos resulta inequivocamente que antes da data de inscrição no registo comercial da aquisição de acções correspondentes a 99% do respectivo capital, bem como da inscrição da nomeação como administrador, F já se intitulava e agia aos olhos de toda a gente como “dono” e legítimo representante da 1ª Ré.
    V - Facto igualmente aceite e reconhecido por todos, inclusivamente pela 2ª Ré, a qual, antes das datas inscritas no registo comercial, já passava cheques à ordem de F (ao abrigo do contrato de cooperação de fls. 794 a 796), já aceitava livranças assinadas por F, tendo sido com F que assinou o próprio contrato de desenvolvimento e cooperação, ao abrigo do qual emprestou dinheiro à 1ª Ré (fls. 794 a 796). Ou seja, no caso, verifica-se que há uma total confusão entre a pessoa de F e a B, a 1ª Ré.
    W - Pelo exposto, perante a prova produzida em audiência e acima referida, bem como da análise dos documentos juntos aos autos, º Tribunal a quo só podia ter dado como provados os quesitos 1.º a 8.º-A da base instrutória, requerendo-se assim a Vossas Excelências que seja modificada a matéria de facto no sentido de tais factos passarem a ser dados como PROVADOS.
    X - Quanto ao quesito 12.º da base instrutória, relativo à interpelação do Autor à Ré e dado como não provado pelo Tribunal a quo, a respectiva prova resulta da prova testemunhal de E, G, H, donde tal quesito só poderia ter sido dado como provado.
    Y - Quanto ao quesito 17.º da base instrutória, a resposta do Tribunal a quo ao dar o referido quesito como não provado é verdadeiramente incompreensível: tratando-se de um conclusão necessária e que resulta por inerência da prova das transmissões do imóvel para a esfera jurídica da 2.° e da 3ª Rés, o quesito 17.º da base instrutória teria necessariamente de ser dado como PROVADO.
    Z - Quanto ao quesito 19.º da base instrutória, entende o Recorrente que, perante o circunstancialismo que envolveu tal aquisição por parte da 2ª Ré, tal facto deveria ter sido dado como Provado, uma vez que dúvidas não podem existir de que a 2ª Ré adquiriu o imóvel em apreço nos presentes autos (declarando a respectiva aquisição pelo valor de MOP$52.118.000,00), fazendo negócio consigo mesmo, tendo a escritura pública de 30.10.2003 sido outorgada com base na procuração irrevogável de 02.04.1992/ sendo certo que a 1ª Ré "não foi perdida, nem achada" neste negócio, não foi consultada a propósito do momento da respectiva transmissão e, muito menos, sobre o respectivo valor.
    AA - Quanto ao quesito 21.º da base instrutória, entende o Recorrente que se trata de uma conclusão a retirar, nomeadamente, da prova/resposta do Tribunal a quo à matéria de facto constante dos quesitos 14.°, 34.° e 51.° da base instrutória, porquanto a 2ª Ré fez seu o imóvel (dação em cumprimento - artigos 828.° a 831.° do Código Civil) pelo valor de MOP$52.118.000,00 (cfr. as respostas aos quesitos 14.° e 51.° da base instrutória).
    BB - Tendo o Tribunal a quo dado como provado a confissão de dívida da 1ª à 2ª Ré, no valor de HKD$243.000.000,00, tal significa que, não só a 1ª Ré não recebeu qualquer valor como ainda ficou em dívida para com a 2ª Ré, no valor aproximado de HKD$190.882.000,00 (sobre o qual, eventualmente, a 2ª Ré ainda exigiria juros à taxa convencionada - cfr. a resposta ao quesito 35.° da base instrutória).
    CC - Pelo exposto, tendo em conta os documentos juntos aos autos, bem como a resposta do Tribunal a quo aos quesitos 14.°, 34.°, 35.° e 51.° da base instrutória, entende o Recorrente que o quesito 21.º da base instrutória deverá ser dado como PROVADO, porquanto, não só a 1ª Ré não recebeu qualquer preço pela transmissão do imóvel, como - em bom rigor - ainda terá permanecido em dívida para com a 2.° Ré.
    DD - Quanto aos quesitos 23.º, 26.º e 32.º da base instrutória, entende o Recorrente que tais factos resultaram claramente demonstrados em sede de audiência de julgamento, quer com base nas declarações de H e G, quer com base no documento de fls. 797 e ss. dos autos - Contrato-Promessa de compra e venda de Terreno e respectivo prédio celebrado entre a sociedade D (a 2ª Ré) e a J Limitada (sociedade que tem os mesmos sócios familiares que a 3ª Ré - ver resposta aos quesitos 52.° e 55.° da base instrutória).
    EE - Desse contrato, resulta, nomeadamente, da cláusula 3ª, que: "(...) Entregam-se o direito de administração e o direito de uso à Parte B, que também conhece bem todo o direito de propriedade do terreno e do respectivo prédio e o estado actual do terreno (...) Com a concordância da Parte A, a Parte B, em nome da Parte A, apresenta acção no Tribunal para tratar de todas as formalidades legais e formalidades relevantes a fim de que a Parte A possa vender o terreno e respectivo prédio de forma estável e favorável e com sucesso à parte B e a parte A possa assinar com a parte B a escritura de compra e venda."
    FF - Esse contrato de fls. 797 e ss. dos autos menciona expressamente na parte final ("Anexos") que foi junto o duplicado do Contrato de Desenvolvimento e Cooperação celebrado entre F (a 1ª Ré) e a 2ª Ré em 18 de Março de 1992 (cfr., novamente, o teor de fls. 794 a 796 dos autos) do qual, por seu turno, entre outros, resulta que: "Todas as unidades de construção com o uso para comércio e residência e lugares de estacionamento construídos no lote foram vendidos. Por isso, a Parte A concorda basear-se nisto para cooperar com a Parte B."
    GG - Pelo exposto, entende o Recorrente que, da análise dos referidos documentos, dúvidas não podem existir que, quer a 2ª Ré, quer a 3ª Ré tinham perfeito conhecimento da situação do imóvel em apreço nos presentes autos, pelo que necessária e inelutavelmente a sua conduta iria causar prejuízos a todos aqueles que previamente celebraram contratos para aquisição das fracções, onde se inclui o Recorrente.
    HH - Impondo-se, consequentemente, também uma correcção na resposta ao quesito 27.º da base instrutória, de forma a incluir a 3ª Ré ("Provado que a 2ª Ré e a 3ª Ré sabiam da existência de promessas de venda ..."), o que, desde já e para os devidos efeitos legais, o Recorrente igualmente requer a V. Ex.ªs.
    II - Assim, tendo em conta os depoimentos das testemunhas, bem como o teor dos documentos de fls. 797 e ss. e de fls. 794 a 796 dos autos, entende o Recorrente que os quesitos 23.º, 26.º e 32.º da base instrutória só poderiam ter sido dados todos como PROVADOS.
    JJ - Quanto ao quesito 24.º da base instrutória, a resposta do Tribunal a quo ao dar o referido quesito como não provado é, uma vez mais, verdadeiramente incompreensível, pois se a 1ª Ré perdeu a titularidade do imóvel em virtude das transmissões referidas nos quesitos 14.º e 15.º da base instrutória, naturalmente, deixou de ser possível o cumprimento o contrato promessa celebrado com o Autor e ora Recorrente, o qual, por sua vez, deixou igualmente de poder requerer a execução específica do contrato. Tratando-se de um conclusão necessária e que resulta por inerência da prova das transmissões do imóvel para a esfera jurídica da 2.ª e da 3.ª Rés, o quesito 24.º da base instrutória teria necessariamente que ser dado como PROVADO.
    KK - Quanto ao quesito 25.º da base instrutória, entende o aqui Recorrente que só pode ter ficado a dever-se a lapso do Tribunal a quo ter considerado tal facto como não provado, tal como resulta das respostas positivas aos quesitos 30.º e 31.º da base instrutória. Tratando-se de um conclusão necessária e que resulta dos factos que o próprio Tribunal a quo considerou provados em resposta aos quesitos 30.º e 31.º da base instrutória, entende o ora Recorrente que o quesito 25.º da base instrutória teria necessariamente que ser dado como PROVADO.
    LL - Quanto aos quesitos 28.º e 29.º da base instrutória, não entende o Recorrente e não se pode conformar com o facto de o Tribunal a quo ter considerado tais factos como não provados. A este propósito, todas as testemunhas reconheceram ou, no caso das testemunhas das 2.ª e 3.ª Rés, ficaram muito comprometidas quando confrontadas com a transmissão do imóvel em apreço nos autos pelo valor de HKD$50.430.000,00 (cfr. a resposta ao quesito 56.º da base instrutória).
    MM - Ora, os relatórios de avaliação do imóvel, elaborados pela "K Lda.", relativos aos anos de 2001 e 2002, juntos pela I." Ré no início da sessão de julgamento de 08.06.2012, por si só, são aptos a comprovar os quesitos 28.º e 29.º da base instrutória, ou seja, que os presos declarados nas transmissões efectuadas pela 2.ª e 3.ª Rés são substancialmente inferiores ao valor de mercado do imóvel em Outubro de 2003 e Janeiro de 2004.
    NN - Dos mesmos resulta claramente que o valor de mercado do imóvel ascendia ao valor de HKD$500,000,000.00, no ano de 2001, e de HKD$550,000,000.00, no que diz respeito ao ano de 2002.
    OO - Sendo ainda que ambos relatórios mencionam o valor do imóvel após construção, donde se previa um valor de venda de HKD$855,002,325.00 (e lucros na ordem de HKD$153,383,729.40 até HKD$251,391,288.81), no que se refere ao ano de 2001, e um valor de venda de HKD$940,502,557.50 (e lucros na ordem de HKD$167,086,341.50 a HKD$274,628,592.60), no que se refere ao ano de 2002.
    PP - Depois, quanto aos relatórios da "K Lda.", juntos pela 1ª Ré em 08.06.2012 e ao confronto com o relatório, datado de 30.07.2002, elaborado pela mesma Companhia e que atribuiu ao imóvel o valor de MOP$60.000.000,00 junto aos autos pela 3ª Ré, atenta a discrepância de valores, foi ordenada a inquirição dos respectivos autores dos relatórios.
    QQ - Na sessão de julgamento de 21.06.2012, foi ouvido L, da "K Lda.", o qual explicou que o Autor do relatório de avaliação do imóvel de 30.07.2002 foi elaborado pelo seu pai, o qual já se encontra falecido, tendo o mesmo confirmado o relatório de avaliação de 12.10.2001 que atribuiu ao terreno naquele imóvel o valor de HKD$500.000.000,00.
    RR - Quanto à fundamentação do Acórdão proferido pelo Tribunal a quo com a resposta à matéria de facto no que diz respeito ao valor do imóvel objecto dos presentes autos, atentas as evidentes discrepâncias entre os valores dos 4 relatórios de avaliação do imóvel juntos aos autos (sabendo que o relatório da Sociedade N junto como Doc. 26 do requerimento de prova da 2ª Ré contém ele próprio reservas quanto ao seu conteúdo: "averbamento: o conteúdo do presente relatório é só para referência do comitente, não se responsabilizando perante terceiros. A presente companhia não concordou, por escrito, com todo o conteúdo do relatório ou partes dele .... ", perante o que foi referido por todas as testemunhas, é incompreensível que o Tribunal tenha considerado que as transmissões do referido imóvel pelos valores de MOP$52.118.000,00 (venda à 2ª Ré por escritura pública de 30 de Outubro de 2003 fazendo negócio consigo mesma) e de MOP$63.000.000,00 (conferir alínea D) dos factos assentes) se coadunem com o valor de mercado do referido imóvel no final do ano de 2003 e início de 2004.
    SS - Como não pode o Recorrente aceitar que o Tribunal a quo utilize para fundamentar a sua convicção os anúncios de jornais de fls. 1009 a 1024, uma vez que a venda se fracções autónomas nos anos de 2001 e 2002 publicitadas não terem nada a ver com a dimensão e a amplitude do lote objecto dos presentes autos, com área aproximada de 3.000 m2, onde se destinavam a ser construídas não uma, nem duas, fracções autónomas, mas sim dois prédios, com 18/20 andares, com dois andares para estacionamento e centenas de fracções autónomas (para comércio e habitação).
    TT - Pelo exposto, atentas as declarações prestadas pelas testemunhas, às discrepâncias que resultam dos relatórios periciais e à confirmação por L do teor do relatório de 12.10.2001 que atribuiu ao imóvel o valor de HKD$500.000.000,00, entende o Recorrente que os quesitos 28.º e 29.º da base instrutória só poderiam ter sido dados como PROVADOS.
    UU - Por último, quanto aos quesitos 41.º e 43.º da base instrutória , entende o Recorrente que o Tribunal a quo não podia dar como provadas as datas em que F adquiriu a quota de 99% na B, nem a data em que aceitou a nomeação para o cargo de administrador, porquanto em relação aos actos em referência - aquisição da qualidade de sócio e nomeação para o cargo de administrador da sociedade -, o registo não é constitutivo de direitos, visando apenas conferir publicidade a tais actos. Nada impede - como não impediu - F de se apresentar e de actuar já aos olhos de todos como “dono” e legítimo representante da B Investment Company Limited, a 1ª Ré, mesmo antes de tais factos se encontrarem inscritos no registo.
    VV - Pelo exposto, entende o Recorrente que tais factos devem continuar a ser dados como provados, eliminando-se, no entanto, as datas de aquisição da qualidade de sócio e de nomeação para o cargo de administrador, respectivamente.
    WW - Analisada e impugnada a matéria de facto, dada como não provada e provada, nos termos definidos pelo art. 599.°, requer o Recorrente a V. Ex. as que seja ordenada a sua modificação em conformidade, sendo que as alterações à matéria de facto nos termos acima expostos são fundamentais e impõem necessariamente uma alteração no sentido da decisão recorrida, devendo impor a sua revogação.
    XX - Atenta a modificação da matéria de facto, nos termos e pelos fundamentos acima expostos, entende o Recorrente que, no mínimo, se impõe a declaração de resolução do contrato-promessa e consequentemente a devolução em dobro do valor entregue pelo Autor, ora Recorrente, a título de sinal; uma revisão dos pressupostos da impugnação pauliana e, por último, a declaração de nulidade por violação do pacto comissório.
    YY - O contrato-promessa celebrado entre o Recorrente e ala Ré é oponível a esta última, B Investement Company, Ltd., B有限公司, pelo que, tendo a mesma sociedade incumprido a promessa, deverá restituir o sinal em dobro, nos termos, designadamente, do previsto na Segunda Parte do número 2 do artigo 436º do Código Civil (CC) de Macau.
    ZZ - Não obstante, ainda que o Tribunal ad quem decida não modificar a matéria de facto e/ou não alterar o sentido de algum ou alguns dos quesitos, o que por mera hipótese de patrocínio se pondera, sem conceder, não deverá deixar de ser decretada a resolução do contrato-promessa entre o Recorrente e a 1ª Ré.
    AAA - O Recorrente ao negociar com F (F) actuou confiando que este último era o representante legal da 1ª Ré, ora Recorrida.
    BBB - O incumprimento contratual do contrato-promessa deve, pois, ser imputado àquela (1ª) Ré e não a F (F), como erradamente considerou o Tribunal a quo, pois foi com base nessa aparência que o Autor A, aqui ora Recorrente, pagou a título de sinal, o montante de HKD$ 97.335.000,00 (resposta ao quesito 9.° da base instrutória).
    CCC - Não sendo possível a execução específica (pelo facto de ala Ré ter já transmitido o imóvel à 2ª Ré e esta a uma sociedade que depois alienou o imóvel à 3ª Ré), resta ao Autor A, receber o dobro do sinal prestado em 8 de Janeiro de 1992, consequência da resolução do contrato (vide, também, os artigos 426° a 430° todos do CC).
    DDD - Ficou provado, por outro lado, que o ora representante da 1ª Ré teria sido nomeado administrador e sócio maioritário em 2 de Abril de 1992 (resposta do Tribunal Colectivo ao quesito 5° da base instrutória). Acontece que o Autor confiou (boa fé subjectiva e objectiva) que F, F, era já representante legal e/ou administrador e/ou procurador da 1ª Ré, aquando da celebração do contrato-promessa.
    EEE - Nos termos do art. 261.°, n.º 2 (representação sem poderes) do Código Civil, ainda que F (F) tivesse celebrado com o Autor o contrato-promessa do imóvel referido em A) dos factos assentes antes de ser administrador e sócio maioritário da 1ª Ré, atenta a prova documental junta aos autos acima mencionada, a 1ª R. "conscientemente contribuiu para fundar a confiança do terceiro", ora o Autor e aqui Recorrente, "na legitimidade do representante", o F, F, enquanto representante da 1ª Ré, donde o negócio celebrado por F sempre deverá sr declarado válido, eficaz e oponível à 1ª Ré.
    FFF - Com efeito, consta de prova documental cuja veracidade nunca foi posta em causa, que F, F, previamente à data em que a sua nomeação como sócio e administrador foi levada a registo, já assinava documentos em representação e vinculação da 1ª Ré (acordo de cooperação com a 2ª Ré, subscrevia livranças, foram passados pela 2ª Ré cheques em seu nome quanto a empréstimos da responsabilidade da 1ª Ré) .
    GGG - Pelo que, em relação à representada, a 1ª Ré, O contrato-promessa celebrado na pessoa de F (F), deverá ser declarado eficaz e oponível sem necessidade de ratificação.
    HHH - Estando o aqui Recorrente de boa fé (ética e psicológica, ou objectiva e subjectiva) e sendo claro que, quer antes, quer depois de Abril de 1992, F, F, sempre actuou e foi considerado por todos como legítimo representante da 1ª Ré, O contrato-promessa e o negócio jurídico celebrado entre este último (representando a 1ª Ré) e o Autor é válido, eficaz e o incumprimento da promessa deve ser imputado na esfera jurídica da sociedade B有限公司, ora P Recorrida.
    III - Termos em que se requer que o negócio jurídico celebrado em 8 de Janeiro de 1992 entre o Autor e F, F, administrador e representante da 1ª Ré, seja oponível a esta Ré, sendo a mesma condenada no pagamento do sinal em dobro, por incumprimento culposo do contrato promessa.
    JJJ - Mas ainda que assim não se entenda - hipótese que uma vez mais apenas cautelarmente e por dever de patrocínio se pondera, sem conceder - tendo em conta que a partir de Abril de 1992, F (F) passa a estar registado como sócio de 99% do capital social da 1ª Ré e administrador da mesma, então dúvidas não existem que a partir de então houve uma clara ratificação do negócio por parte da B, ala Ré, na medida em que passa a haver uma total confusão entre a mesma e o seu representante legal e sócio F (F).
    KKK - Acresce que, ao contrário do consta na Sentença, entende o Recorrente que, nos termos e para os efeitos do previsto nos artigos 605.°, 607.°, 609.° e 612.° do CC, se encontram verificados os pressupostos da Impugnação Pauliana, a saber:
    - o crédito do Autor é anterior aos negócios e transmissões realizadas entre as 1ª, 2ª e 3ª Rés;
    - verificação e prática de actos lesivos e impossibilidade para o Autor (credor) de obter a satisfação integral do seu crédito, bem como o agravamento dessa impossibilidade (o imóvel era e é o único bem da 1ª Ré) e foi transmitido à 2ª Ré (por negócio consigo mesma e sem intervenção da 1ª Ré) e posteriormente à 3ª Ré por valores muito inferiores aos valores de mercado.
    LLL - Ora, em 30 de Outubro de 2003, mediante escritura com celebração de negócio consigo mesma, a 2ª Ré, em representação da 1ª Ré, adquiriu o imóvel objecto dos presentes autos por 10 (dez) vezes menos o valor da avaliação feita um ano antes: “transmitindo o imóvel a si mesma pelo preço de MOP$ 52.118.000,00.”
    MMM - A mesma má fé por parte do devedor e do terceiro ("consilium fraudis") também se verificou nas vendas sucessivas do imóvel, de HKD$ 50.430.000,00 da 2ª Ré para a adquirente J Limitada (respostas aos quesitos 53° a 55° da base instrutória) e na alienação feita por esta última sociedade em escritura outorgada em 8 de Janeiro de 2004, conforme a alínea D) dos factos assentes.
    NNN - Todas estas alienações foram feitas por um valor muitíssimo inferior ao preço de mercado, sem sequer entrarmos na questão do valor que o imóvel poderia e teria após a sua construção e edificação, a qual, nunca chegou a acontecer - o devedor, a ora PRé, “nunca chegou a iniciar a construção do prédio.” (cfr. resposta ao quesito 13.º).
    OOO - Existe consciência do prejuízo, na medida em que as 2ª e 3ª Rés sabiam da existência de um contrato-promessa celebrado entre o Autor e a1ª Ré (cfr. docs. de fls. 797 e ss e de fls. 794 a 796) . Sabiam, pois, aquelas, que seria impossível a execução específica por parte do Autor e que, alienado o único imóvel de que era proprietária, a 1ª Ré nunca poderia cumprir o contrato-promessa celebrado com o Autor.
    PPP - Tem, pois, o Autor direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, podendo executar o património do obrigado à restituição - aplicando-se, com as devidas adaptações, o previsto no artigo 612°, bem como o número 2 do artigo 613°, ambos do CC, bem como ser autorizado a execução no património da 3ª Ré, em cujo nome se encontra inscrito o imóvel.
    QQQ - Por último, sem prescindir da análise de tudo quanto acima se alegou, deverá ainda ser reapreciada a questão da nulidade do contrato por violação do pacto comissório, nos termos e para os efeitos do artigo 690.° do CC).
    RRR - De facto, ala Ré constituiu uma hipoteca a favor da 2ª Ré para o reembolso do empréstimo por aquela a favor desta no valor de HKD$ 243.000.000,00 - alínea C) dos factos assentes, tendo a 2ª Ré, no uso de uma procuração irrevogável, feito seu o imóvel em 30 de Outubro de 2003, pelo valor de MOP$ 52.118,000,00 - resposta ao quesito 51° da base instrutória.
    SSS - Sem qualquer prévia consulta da 1ª Ré, a 2ª Ré fez sua a coisa onerada com direito de hipoteca.
    TTT - À data de celebração das duas escrituras públicas (30 de Outubro de 2003 e 8 de Janeiro de 2004) e pelos valores das três transacções (sucessivamente de MOP$52.118.000,00, HKD$50.430.000,00 e MOP$63.000.000,00), o imóvel foi transmitido por valores sempre muito inferiores ao valor real de mercado (em 2001, o imóvel - alínea A) dos factos assentes - já valia HKD$500.000.000,00!).
    UUU - A dilação no pagamento facultado pela 2ª Ré à 1ª Ré para pagamento do empréstimo foi obtido claramente de uma forma usurária, aproveitando uma situação de dependência, ligeireza, enfraquecimento e de fraqueza da 1ª Ré para com a 2ª Ré, tendo esta obtido o registo de uma hipoteca em seu favor sobre o imóvel e feito do imóvel coisa sua, um bem onerado, no montante de MOP$52.118.000,00, resultando num benefício claramente injustificado e excessivo em favor da 2ª Ré, em detrimento do Autor (e mesmo da 1ª Ré).
    VVV - Tal valor é claramente inferior ao valor de mercado do imóvel, foi inferior ao sinal passado e pago pelo Autor à 1ª Ré e muitíssimo inferior ao valor que o Recorrente se propunha entregar à 1ª Ré em cumprimento do negócio.
    WWW - O negócio é, pois, nulo, nos termos do art. 690.º do Código Civil.
    XXX - E nem se diga, como na douta Sentença recorrida, que se deve contabilizar o juro por 9 (nove anos), entre 1994 e 2003, considerando, hipoteticamente, que a dívida da 1ª Ré para a 2ª Ré ascenderia a HKD$ 243.000.000,00 (dívida constante de escritura a fls. 65 a 68 dos autos - resposta ao quesito 34° da base instrutória), ascendendo o montante total a HKD$ 560.612.317,81, incluindo os juros, porquanto o que releva é o valor da alienação de MOP$52.118.000,00, valor inferior ao valor por que a 1ª Ré, querendo, o poderia vender.
    ZZZ - Com efeito, contrariamente ao que se consigna na sentença recorrida, a venda por tal valor de MOP$52.118.000,00 é claramente prejudicial e lesiva dos interesses da 1ª Ré, na medida em que, seguindo o raciocínio exposto na sentença, a mesma continuaria sempre em dívida para com a 2ª Ré. Ou seja, tal venda nem desonerou ala Ré.
    AAAA - Sabendo para mais que a 2ª Ré fez seu o imóvel onerado com base na procuração irrevogável outorgada pela 1ª Ré em 2 de Abril de 1992, instrumento que permitiu à 2ª Ré ter os mais amplos poderes sobre o imóvel, nomeadamente para dispor do dito imóvel, bem como de poderes para a prática de negócio consigo mesmo, conforme teor de fls. 69 a 73 - respostas aos quesitos 14°, 36° e 51°, todos da base instrutória.
    BBBB - Estes amplos poderes que permitiram à 2ª Ré a alienação a si mesma do imóvel já onerado com uma hipoteca (no caso da 1ª Ré não cumprir a "dívida para com a 2ª Ré"), configuram uma violação do pacto comissório. Nesse sentido, veja-se, exemplificativamente, o Ac. do Tribunal da Relação do Porto, datado de 7-6-2004, in Colectânea de Jurisprudência, 2004, bem como o Acórdão do STJ de 21 de Dezembro de 2005.
    CCCC - Pelas razões expostas e melhor desenvolvidas nas alegações, entende o Recorrente que a sentença recorrida viola o disposto no art. 261.°, n.º 2, bem como o disposto nos artigos 605.°, 607.°, n.º 2, 612.°, 613.º e 690.° todos do Código Civil.
    Termos em que, e com o douto suprimento de V. Ex.ªs, deverá o recurso interposto ser declarado procedente e, em consequência, ordenada a revogação da sentença recorrida.
  
   3. D, Limitada (D有限公司), 2ª Ré nos autos acima referidos e neles identificada, tendo sido notificada, pelo Tribunal, da motivação do recurso apresentada pelo Autor A, vem apresentar, ao abrigo do disposto no artigo 613.º, n.º 2 do CPC, a seguinte Resposta, dizendo, a final:
  
I. O recorrente sustenta que o Tribunal a quo tem erro de julgamento na matéria de facto, nomeadamente em não ter como provado que F celebrou, representando a 1ª Ré, o respectivo contrato-promessa de compra e venda, e que a respectiva parcela de terreno valia 500 milhões e 550 milhões de dólares de Hong Kong no ano 2001 e 2002.
II. A pretensão do recorrente não tem razão.
III. Na decisão de facto constante de fls. 1415 a 1423 dos autos, o Tribunal a quo levou 6 folhas para a fundamentação da decisão, indicando as razões pelas quais não teve como provado que F celebrou, representando a 1ª Ré, o respectivo contrato-promessa de compra e venda, e que a respectiva parcela de terreno valia 500 milhões e 550 milhões de dólares de Hong Kong no ano 2001 e 2002. (o respectivo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido)
IV. Na decisão de direito constante de fls. 1425 a 1434 dos autos, o Tribunal a quo também fundamentou o seu julgamento de improcedência do recurso. (o respectivo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido)
Quanto ao contrato-promessa de compra e venda
V. Do respectivo contrato-promessa de compra e venda que consta de fls. 14 a 17 dos autos resulta que o vendedor é F e o comprador A, ou seja, o recorrente.
VI. A identidade do vendedor foi expressamente descrita como “F”, não havendo qualquer indício de “F” praticar tal acto em representação da 1ª Ré.
VII. A celebração entre as partes do mencionado contrato-promessa de compra e venda foi testemunhada por advogado.
VIII. Da cláusula 14 do respectivo contrato de compra e venda resulta que tal contrato substituiu o contrato celebrado entre as partes no dia 31 de Outubro de 1991. Por outras palavras, o respectivo contrato não era o primeiro/novo contrato, mas o segundo/renovado.
IX. De acordo com fls. 18 dos autos, o licenciamento de obra foi deferido em 8 de Novembro de 1995, com número 453/95. Trata-se de compra e venda de fracções autónomas de edifícios em construção, matéria essa que não era legalmente regulada na altura.
X. Um facto que não pode ser excluído é que a 1ª Ré podia vender a unidade residencial incompleta a F e este, por seu turno, vendeu-a a A, ou a 1ª Ré a vendeu a outrem (A, B ou C) e depois este a vendeu a F, de forma que este pudesse a vender a A. Por isso, segundo a lógica e a experiência, não podemos tomar como certo que o vendedor do respectivo contrato F era o primeiro titular, e assim ter como provado que ele representava a 1ª Ré.
XI. No espaço reservado para assinatura de vendedor, apenas se encontra a assinatura de F, não havendo menção de representação da 1ª Ré nem selo deste.
XII. F passou a ser accionista da 1ª Ré apenas em 2 de Abril de 1992, e só foi nomeado administrador pela 1ª Ré em 8 de Abril do mesmo ano. Pelo que o respectivo negócio jurídico não foi praticado por F na qualidade de accionista ou administrador da 1ª Ré.
XIII. Por outro lado, também é importante que a escritura de reconhecimento da dívida e hipoteca constante de fls. 65 a 68 dos autos foi celebrada em 2 de Abril de 1992, altura em que a 1ª Ré tinha um representante legal M, mas não F.
XIV. De acordo com fls. 69 a 73 dos autos, a escritura sobre o poder especial foi celebrada em 2 de Abril de 1992, e o representante legal da 1ª Ré também era M, mas não F.
XV. A 1ª Ré nunca designou F, através de quaisquer actas de assembleia de accionistas, quer verbais quer escritas, para representá-la na prática do respectivo negócio jurídico.
XVI. A 1ª Ré nunca delegou especialmente poderes em F, através de qualquer procuração com intervenção notarial, para que este a representasse para praticar o respectivo negócio jurídico.
XVII. Acresce que, a 1ª Ré nunca ratificou o referido acto de F como praticado em representação daquela.
XVIII. Tal como se referiu anteriormente, é sem dúvida que F podia praticar e na verdade praticou tal negócio jurídico em seu próprio nome.
XIX. Não há qualquer prova, factual ou jurídico, que possa apoiar que, em 8 de Janeiro de 1992 ou, mais cedo, em 31 de Dezembro de 1991, F praticou tal negócio jurídico em representação da 1ª Ré.
XX. Comparado o contrato acima referido com o constante de fls. 579 a 581 dos autos, pode-se saber que o mesmo escritório de advogados serviu como testemunha da celebração entre as partes. F praticou o respectivo negócio jurídico em representação da 1 Ré, que foi descrita como a parte vendedora; e usou o carimbo da mesma para apostar carimbo, assinar e receber dinheiro em nome da 1ª Ré.
XXI. Da carta constante de fls. 646 dos autos resulta que, na prática do acto em causa, F escreveu claramente que agiu em representação da 1ª Ré, usou o carimbo desta para apostar carimbo e assinar em nome da 1ª Ré.
XXII. Apesar de se encontrar “representante legal” no contrato constante de fls. 794 a 796 dos autos, não há fundamentos de facto e de direito, havendo apenas “declaração” de F próprio.
XXIII. Nos autos também há algumas facturas que foram assinadas por F, mas não existe qualquer prova que possa apoiar que o mesmo recebia tais quantias em representação da 1ª Ré.
XXIV. As mencionadas quantias não foram o preço de compra e venda pago pelo recorrente, e a recepção dessas quantias não significa que o indivíduo acima referido representava a 1ª Ré neste negócio de compra e venda, uma vez que cada negócio jurídico é concreto e independente.

Quanto ao valor do terreno
XXV. Durante 2002 e 2003, “SARS” causou a recessão económica, resultando em baixo preço dos imóveis.
XXVI. O Regulamento do Imposto do Selo aprovado pela Lei n.º 17/88/M de 27 de Junho regula que a promessa de compra e venda de bens imóveis é sujeita ao pagamento do Imposto do Selo ao Governo. O artigo 93.º da Lei cria a Comissão de Avaliação de Imóveis que é composta por um elemento, que preside, a indicar pelo director dos Serviços de Finanças; um vogal a indicar pelo director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes; um vogal a indicar pelo presidente do Instituto de Habitação; um representante do sector imobiliário; um profissional de reconhecido mérito ligado ao sector da construção civil.
XXVII. Daí que os cinco pessoais da Comissão de Avaliação de Imóveis vêm da Direcção dos Serviços de Finanças, da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, do Instituto de Habitação, do sector imobiliário e do sector da construção civil, áreas muito relacionadas com imóveis e o seu valor. Pelo que a avaliação do respectivo imóvel feita pela Comissão de Avaliação de Imóveis é profissional, objectiva e justa e não deve ser questionada.
XXVIII. Entendemos que o valor de 63 milhões de patacas do respectivo terreno avaliado pelo documento de avaliação constante de fls. 154 dos autos deve ser reconhecido e apoiado.
XXIX. Também é relativamente objectiva a avaliação feita pelo termo de avaliação de 30 de Agosto de 2002 da Companhia N que consta de fls. 432 a 435 dos autos.
XXX. A avaliação feita pela K no termo de avaliação de 30 de Julho de 2002 que consta de fls. 436 a 439 dos autos também não é muito diferente.
XXXI. Do Macau 2002 - Livro do Ano da Direcção dos Serviços de Estatística e Censos da RAEM que consta de fls. 991 a 992 dos autos resulta que o valor dos prédios residenciais completas nos NAPE (quer dizer o preço de compra e venda, incluindo o preço do terreno, as despesas com construção, os lucros, etc.) era de apenas 7.563 patacas por metro quadrado, ou seja, cerca de 750 patacas por pé quadrado.
XXXII. De acordo com as publicidades da venda de imóveis encontradas no jornal Macau Daily de Outubro de 2002 que consta de fls. 1009 a 1024 dos autos, o valor das lojas situadas no rés-do-chão era de 1.600 e tal patacas por pé quadrado, o valor dos estabelecimentos comerciais era de 750 patacas por pé quadrado, o valor das habitações era de 500 patacas por pé quadrado; e o valor médio dum lugar de estacionamento era de 65.000 patacas. (vide fls. 1007 a 1008 dos autos).
XXXIII. O recorrente sustentou os termos da avaliação feitos pela K em 12 de Outubro de 2001 e 12 de Outubro de 2002 que consta de fls. 962 a 969 dos autos, entendendo que o preço do mero terreno era de 500 milhões e 550 milhões, ambos de dólares de Hong Kong, pelo que são manifestamente desrazoáveis os preços de compra e venda das recorridas, as avaliações feitas pela Direcção dos Serviços de Finanças e pela Companhia N, os preços descritos no Livro do Ano do Governo da RAEM, bem como os preços nas publicidades de imóveis nos jornais.
XXXIV. Segundo os mencionados termos da avaliação, o preço das lojas situadas no rés-do-chão era de 7.000 a 7.700 patacas por pé quadrado, o preço dos estabelecimentos comerciais era de 2.600 a 2.860 patacas por pé quadrado, o preço das habitações era de 2.700 a 2.970 patacas por pé quadrado; e o preço dum lugar de estacionamento era de 250.000 a 275.000 patacas, sendo estes preços de dez vezes os preços de mercado, não objectivos e não correspondentes à realidade.
XXXV. A testemunha E é o procurador especial do recorrente (fls. 21 a 24 dos autos), e a testemunha H tem caso semelhante ao das Rés (vide fls. 980v e sentença a fls. 1266 a 1300 dos autos).
XXXVI. O Tribunal pode analisar de forma livre os depoimentos de testemunhas e fazer juízo livremente, não concordamos com o recorrente no sentido de o Tribunal dever dar como provado o facto por ele sustentado de acordo com os depoimentos das testemunhas que ele ofereceu.
XXXVII. A convicção do Tribunal não é questionável.
XXXVIII. O respectivo imóvel é a propriedade da 1ª Ré. No caso em apreço não há qualquer prova que possa servir para que nós reconheçamos que F tem qualquer direito de uso, fruição ou disposição em relação ao imóvel em causa.
XXXIX. Pelo que ele só começou a ter tais direitos e deveres no dia em que se tornou accionista, e só podia fazer a gestão administrativa em representação da 1ª Ré a partir do dia em que foi nomeado administrador.
XL. A prática por F de qualquer acto em representação da 1ª Ré tem como pressuposto a posse da qualidade de accionista e de administrador.
XLI. Pelo que não podemos concordar com o que o recorrente disse que o registo da qualidade de accionista e de administrador não constituiu direito.
XLII. A 2ª recorrida não concorda com a invocação do recorrente em relação à representação sem poderes prevista no artigo 261.º, n.º 2 do Código Civil. Ao contrário, o acto promessa de venda praticado por F não constitui representação sem poderes, mas incorre em ilegitimidade para a realização da venda, ou seja, a situação prevista no artigo 882.º do Código Civil.
XLIII. O disposto no artigo 690.º do Código Civil invocado pelo recorrente também não se aplica ao presente caso, uma vez que neste caso se trata de transferência do direito real resultante da delegação de poderes pela 1ª Ré na 2ª Ré para negócio consigo mesmo.
XLIV. Face ao exposto, peço que seja julgado totalmente improcedente o recurso, rejeitado o pedido do recorrente e, em consequência, mantida totalmente a sentença recorrida.

    4. "C, Limitada", 3ª Ré, veio apresentar as suas Contra-Alegações, o que faz, em síntese conclusiva:
   I - O Recorrente alega nas suas doutas alegações que a sentença recorrida padece de erros graves quanto à matéria de facto ...
   II - O Recorrente afirma que foram incorrectamente julgados os quesitos 1º a 8° A, 12°, 17°, 19°, 21°, 23° a 26°, 28°, 29°, 32°, 41° e 43°, da base instrutória.
   Sem razão.
   III - A sentença proferida pelo tribunal não merece qualquer censura.
   IV - Deve-se assim, manter-se a improcedência da acção proposta pelo Recorrente.
   V - Não se verifica qualquer erro determinante das nulidades previstas no artigo 571º do C.P.C.
   VI - A sentença só é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão e se, os fundamentos estiverem em oposição com a decisão.
   VII - As causas de nulidade da sentença constantes do artigo 571º do C.P.C. são taxativas, e dessa taxatividade resulta que "não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário"
   VIII - A sentença só é nula por omissão de fundamentação de facto quando não especifique, de todo, os factos que considera provados.
   IX - No caso em análise, salvo melhor opinião em contrário, o recorrente não alega que existe contradição entre os fundamentos (de facto e de direito) da sentença e a decisão.
   X - O que alega é que existe contradição entre a fundamentação da decisão sobre a matéria de facto e a mesma decisão.
   XI - Ora, da análise das alegações do recorrente resulta, desde logo, que o apelante sustenta a sua pretenção, apenas, no depoimento das testemunhas por si arroladas, ignorando o depoimento das restantes testemunhas não lhes fazendo qualquer referência seja para por em causa os referidos depoimentos, seja para por em causa a sua razão de ciência ou imparcialidade.
   XII - O que, logo à partida “inquina” e debilita a apreciação da prova que pelo apelante é feita, quando é certo que o Tribunal recorrido teve em atenção os referidos depoimentos como resulta da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto operada.
   XIII - De qualquer forma, analizados os documentos juntos aos autos, ouvidos todos os depoimentos e lida a fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, conclui-se que nenhuma razão subsiste ao apelante.
   XIV - O apelante nas suas alegações, alega discordância relativamente ao juízo valorativo feito pelo tribunal, aludindo à prova testemunhal e documental, indicando que o tribunal não valorou como devia, a prova testemunhal produzida na audiência de discussão e julgamento.
   XV - O arbítrio do Julgador, a quo, principalmente porque beneficia da prerrogativa da imediação da prova, podendo auscultar com maior acuidade e transparência a credibilidade, isenção e imparcialidade dos concretos depoimentos de cada testemunha e das respectivas posturas, não carece de qualquer reparo, nomeadamente, na parte da matéria de facto indicada pelo Recorrente como passível de reapreciação em sentido distinto daquele que veio a ser doutamente decidido.
   XVI - Impendendo sobre o Recorrente, a prova dos factos constitutivos dos direitos por si alegados.
   XVII - Não o fez.
   XVIII - É obvio que não se poderia dar como provado o que não resultou da prova produzida.
   XIX - Consequentemente, a sentença proferida pelo Tribunal a quo não merece qualquer censura, não padecendo dos erros e vícios invocados pelo recorrente.
   XX - Deve assim, manter-se a improcedência da acção proposta pelo Recorrente.
   XXI - Não se verifica qualquer erro na apreciação da prova.
   XXII - Não sendo por isso cabível a reapreciação da matéria reportada nos quesitos quesitos l° a 8° A, 12°, 17°, 19°, 21°, 23° a 26°, 28° , 29° , 32° , 41° e 43°, da base instrutória.
   XXIII - A impugnação feita pelo Recorrente, no que respeita a tais factos se reconduz na sua totalidade ao domínio próprio da livre apreciação da prova legalmente conferida ao julgador.
   XXIV - O Recorrente da decisão sobre a matéria de facto se limita a afirmar que a decisão devia ser diversa com base no depoimento de certas testemunhas.
   XXV - Sem se pronunciar e operar a sua análise com os outros meios de prova produzidos e considerados na decisão, designadamente, os depoimentos das restantes testemunhas ouvidas.
   XXVI - Pelo que, a sua pretensão recursiva não pode ser atendida devendo ser liminarmente rejeitada, o que, desde já, se invoca e requer.
   XXVII - O Tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica, e da experiência se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado.
   XXVIII - Deve-se entender que estão satisfeitas as exigências legais de fundamentação, quando é indicada a razão de ciência das testemunhas, referidos os motivos por que mereceram a credibilidade do Tribunal, e feita a articulação dos depoimentos prestados com os outros meios de prova.
   XXIX - Tudo isso foi feito pelo Tribunal a quo.
   XXX - Verifica-se assim que o Tribunal apelou a todos os meios de prova produzidos, expôs o teor dos depoimentos, e esclarecendo a sua relação com as partes, bem como com a sua razão de ciência, operou uma análise crítica dos depoimentos prestados.
   XXXI - Perante esta discriminação da prova testemunhal e da comparação com os outros elementos de prova, a documental e a pericial, pode perfeitamente afirmar-se de objectiva, lógica e racional, a formação da convicção do Tribunal.
   XXXII - Não pode, assim, de todo em todo, considerar-se haver erros graves quanto à matéria de facto... ou afirmar-se que foram incorrectamente julgados os artigos 1° a 8° A, 12º, 17º, 19°, 21°, 23° a 26º, 28°, 29°, 32°, 41° e 43°, da base instrutória.
   Pelo que, requer-se se negue provimento ao recurso interposto e se confirme, integralmente, a sentença recorrida.
    
    5. Foram colhidos os vistos legais.
    II - FACTOS
    Vêm provados os seguintes factos:

    “Da Matéria de Facto Assente:
- O terreno sito na Avenida do xxxxxx, Lote xxx encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº XXXXX a folha 184v do Livro B36 (alínea A) dos factos assentes).
- Por inscrição sob o nº 8XXXX da C.R.P., era registada a favor da 1ª Ré o direito de concessão por arrendamento do prédio mencionado em alínea A) (alínea B) dos factos assentes).
- Por registo de 10 de Abril de 1992, a 1ª Ré constituiu hipoteca a favor da 2ª Ré, sob o prédio referido em A) dos factos assentes para garantir o reembolso do empréstimo no montante de HKD$243,000,000 (alínea C) dos factos assentes).
- Por escritura de 8 de Janeiro de 2004, a J, Limitada, munida da procuração passada pela 2ª Ré de 19 de Dezembro de 2003, em sua representação, declarou vender à 3ª Ré, que esta declarou adquirir o prédio referido em A) dos factos assentes pelo preço de MOP$63.000.000,00 (alínea D) dos factos assentes).
*
    Da Base Instrutória:
- O Fdesde 2 de Abril de 1992 é o sócio maioritário da 1ª Ré na quol é detentora de 99% do respectivo capital social (resposta ao quesito da 5º da base instrutória).
- Em 8 de Janeiro de 1992, data de celebração do contrato junto a fls. 14 a 16, o Autor entregou a primeira prestação do preço, no montante de HKD$97.335.000,00, ao F (resposta ao quesito da 9º da base instrutória).
- Por despacho de 8 de Novembro de 1995, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes aprovou o projecto para a construção do prédio referido em A) dos factos assentes, tendo, consequentemente, a respectiva licença de obras sido emitida em 9 de Novembro de 1995 (resposta ao quesito da 10º da base instrutória).
- A construção do prédio nunca chegou a iniciar-se (resposta ao quesito da 11º da base instrutória).
- A 1ª Ré nunca chegou a iniciar a construção prédio (resposta ao quesito da 13º da base instrutória).
- Em 30 de Outubro de 2003, a 1ª Ré celebrou com a 2ª Ré uma escritura pública de compra e venda através da quol a primeira declarou vender à segunda e esta declarou comprar o prédio referido em A) dos factos assentes (resposta ao quesito da 14º da base instrutória).
- E, posteriormente, em 8 de Janeiro de 2004, a 2ª Ré, por sua vez, celebrou com a 3ª Ré uma escritura pública de compra e venda através da quol a primeira declarou vender à segunda e esta declarou comprar o mesmo prédio (resposta ao quesito da 15º da base instrutória).
- A intenção do Autor é revender as fracções prometidas, foi sempre sua preocupação que as escrituras de compra e venda pudessem ser celebradas em data relativamente próxima daquela em que foi assinada a promessa (resposta ao quesito da 16º da base instrutória).
- O Autor perdeu o interesse no contrato junto a fls. 14 a 16 (resposta ao quesito da 18º da base instrutória).
- A 2ª Ré sabia da existência de promessas de venda das fracções autónomas a construir no prédio referido em A) dos factos assentes (resposta ao quesito da 27º da base instrutória).
- O direito referido em B) dos factos assentes é o único bem de que a 1ª Ré dispunha (resposta ao quesito da 30º da base instrutória).
- A 1ª Ré não é titular de quaisquer outros bens susceptíveis de penhora (resposta ao quesito da 31º da base instrutória).
- Por escritura de 2 de Abril de 1992 celebrada entre a 1ª e a 2ª Rés, aquela confessou-se devedora da desta da quontia de HKD$243.000.000,00 cujo teor constante no documento a fls. 65 a 68, que aqui se dá por integralmente reproduzido (resposta ao quesito da 34º da base instrutória).
- Foi estipulado que, verificando-se qualquer atraso no pagamento das quantias relativamente nos prazos aí fixados, as quantias em dívida venceriam juros à taxa anual de 14,4%, não podendo o atraso exceder seis meses relativamente aos prazos estipulados, sob pena de a totalidade do crédito se considerar imediatamente vencido, para todos os efeitos legais (resposta ao quesito da 35º da base instrutória).
- Nesse mesmo dia, a 1ª Ré passou uma procuração à 2ª Ré, procuração esta emitida também no interesse desta, conferindo-lhe os mais amplos poderes sobre o imóvel referido em A) dos factos assentes, nomeadamente, poderes para dispor do dito imóvel, bem como poderes para a prática de negócio consigo mesmo, cujo teor consta no documento a fls. 69 a 73, que aqui se dá por integralmente reproduzido (resposta ao quesito da 36º da base instrutória).
- A 1ª Ré, no 2 de Abril de 1992, subscreveu uma livrança no valor de HKD$243.000.000,00 a favor da 2ª Ré (resposta ao quesito da 37º da base instrutória).
- A quontia de HKD$243.000.000,00, incluía o montante de HKD$162.000.000,00 correspondente ao capital emprestado e o de HKD$81.000.000,000 correspondente aos juros (resposta ao quesito da 38º da base instrutória).
- O montante de HKD$162.000.000,00 foi entregue pela 2ª Ré ao representante legal da 1ª Ré, ou a quem este indicou, em 7 tranches, a saber: o montante de HKD$16.200.000,00 em 14/3/92; o montante de HKD$16.200.000,00 em 18/3/92; o montante de HKD$29.600.000,00 em 2/4/92; o montante de HKD$31.990.000,00 em 2/4/92; o montante de HKD$60.000.000,00 em 2/4/92; o montante de HKD$10.000,00 em 2/4/92; e o montante de HKD$8.000.000,00 em 2/4/92 (resposta ao quesito da 39º da base instrutória).
- A “O Ltd.” era sócio e detentora de 99% do capital da 1ª Ré (resposta ao quesito da 40º da base instrutória).
- No dia 2 de Abril de 1992, o F, adquiriu a quota da sócia “O Ltd.” (resposta ao quesito da 41º da base instrutória).
- No dia 8 de Abril de 1992, o F aceitou a sua nomeação para o cargo de director da 1ª Ré (resposta ao quesito da 43º da base instrutória).
- A 1ª Ré não devolveu o empréstimo referido na resposta ao quesito 34º à 2ª no prazo fixado (resposta ao quesito da 44º da base instrutória).
- Por carta de 17/9/94, a 1ª Ré, alegando que se encontrava em situação económica deficitária e não conseguiu pagar a dívida contraída à 2ª Ré, dentro do prazos fixado, pediu à 2ª Ré a prorrogação do prazo de pagamento por mais 75 dias (resposta ao quesito da 45º da base instrutória).
- Comprometendo-se, uma vez consentida a prorrogação dos 75 dias, em indemnizar a 2ª Ré, no montante de HKD$13.500.000,00, face aos prejuízos e transtornos causados à 2ª Ré (resposta ao quesito da 46º da base instrutória).
- A 1ª Ré prometeu pagar à 2ª Ré a totalidade do empréstimo em duas tranches e nos prazos seguintes (resposta ao quesito da 47º da base instrutória):
* até 29/10/94, pagaria o montante de HKD$30.000.000,00; e
* até 2/12/94, pagaria o montante de HKD$226.500.000,00.
- Caso a 1ª Ré não realizasse o pagamento dos referidos montantes no novo prazo fixado, a 2ª Ré ficava como plena liberdade de dispor do imóvel, bem como do edifício que nele iria ser implantado (resposta ao quesito da 48º da base instrutória).
- Por carta de 21 de Setembro de 1994, a 2ª Ré aceitou as condições oferecidas pela 1ª Ré (resposta ao quesito da 49º da base instrutória).
- A 1ª Ré não saldou a dívida para com a 2ª Ré (resposta ao quesito da 50º da base instrutória).
- A escritura pública referida na resposta ao quesito 14º foi outorgada pela 2ª Ré que no uso dos poderes passados da procuração mencionado na resposta ao quesito 36º, transmitiu a si própria o prédio referido em A) dos factos assentes pelo preço de MOP$52.118.000,00 (resposta ao quesito da 51º da base instrutória).
- Em 27 de Dezembro de 2002, a 2ª Ré, na quolidade de mandatária e munida de uma procuração referida na resposta ao quesito 36° firmou um acordo com a J Limitada, nos termos do qual aquela prometeu, em nome da 1ª R., vender e a última, ou quem esta indicar, e esta prometeu adquirir, o terreno mencionado em A) dos factos assentes, pelo preço de HKD$50.600.000,00, conforme o teor do documento de fls. 127 a 131 que aqui se dá por integralmente reproduzido (resposta ao quesito da 52º da base instrutória).
- A J Limitada pagou à 2ª Ré a quontia de HKD$50.430.000,00 (resposta ao quesito da 53º da base instrutória).
- Por escritura de 19 de Dezembro de 2003, a 2ª Ré passou uma procuração à favor da J Limitada, na quol foram conferidos a este todos os poderes constante no documento a fls. 147 a 149 que aqui se dá por integralmente reproduzido (resposta ao quesito da 54º da base instrutória).
- A 3ª Ré é constituída pelo familiares dos sócios da J Limitada (resposta ao quesito da 55º da base instrutória).
- A quontia de HKD$50.430.000,00 foi paga pela J Limitada que indicou a 3ª Ré para figurar como compradora na escritura pública de compra e venda referida em D) dos factos assentes (resposta ao quesito da 56º da base instrutória).”
    
    III – FUNDAMENTOS
    1. O objecto do presente recurso passa pela análise das seguintes questões:
    - Erro de julgamento de facto
    - Resolução do contrato e pagamento do sinal em dobro
    - Impugnação pauliana
    - Representação sem podres e ratificação do negócio
    -Pacto comissório


2. Erro de julgamento de facto
    Vem o presente recurso interposto da sentença proferida no dia 21.01.2015, pela qual o Tribunal a quo, após reabertura da audiência de julgamento para (continuação) da prestação do depoimento da testemunha E, nos termos determinados pelo acórdão do Tribunal de Segunda Instância, confirmado pelo Tribunal de Última Instância, renovou a sentença no sentido de absolver os réus dos pedidos deduzidos na acção.
    A primeira linha de discordância por banda da recorrente prende-se com o julgamento dos factos que considera incorrectamente julgados - art. 599.º, n.º 1, al. a) do C.P.C.
    Terão sido, em seu entender, analisadas as provas carreadas aos autos pelas partes e produzidas em sede de audiência de julgamento, devidamente documentada, incorrectamente julgados os quesitos 1.°, 2.°, 3.°, 4.°, 5.°, 6.º, 7.º, 8.º, 8.º-A, 12.°, 17.°, 19.°, 21.°, 23.°, 24.°, 25.°, 26.°, 28.°, 29.°, 32.°, 41.° e 43.° da base instrutória, nos termos que aqui se transcrevem:
    
    Quesito 1.° - Em 08 de Janeiro de 1992, o Autor celebrou com a 1ª Ré um contrato, nos termos do qual aquele prometeu comprar e a última prometeu vender ao primeiro 195 fracções autónomas para escritório, a totalidade das fracções autónomas para comércio do R/C e todas as fracções autónomas destinadas a centro comercial dos 1.ºs e 2.º andares do bloco dianteiro denominado P商業中心, bem como a totalidade das 336 fracções autónomas para habitação do bloco traseiro denominado P花園, ambos do prédio a construir no terreno mencionado em A) dos factos assentes, pelo preço de HKD$648,900,000.00, conforme o teor do doe a fls. 14 a 17, que aqui se dá por integralmente reproduzido - Não Provado;
    
    Quesito 2.º - Apesar de no contrato referido no art. 1.° constar como promitente-vendedorF, o mesmo foi celebrado entre o Autor e a 1.º Ré - Não Provado;
    Quesito 3.º - A vontade do Autor não era a de celebrar o contrato comFmas sim com a 1.ª Ré - Não Provado;
    Quesito 4.º - Por só a 1ª Ré ser a concessionária do terreno referido em A) dos factos assentes, no qual se encontra projectada a construção do prédio cujas fracções autónomas foram objecto da compra e venda prometida - Não Provado;
    Quesito 5.º - Provado queF desde 2 de Abril de 1992 é o sócio maioritário e administrador da 1ª Ré na qual é detentora de 99% do respectivo capital social;
    Quesito 6.º - A intervenção deFna outorga do contrato referido no art. 1.° deve-se exclusivamente a esse facto - Não Provado;
    Quesito 7.º -F interveio no contrato referido na qualidade de representante da 1ª Ré - Não Provado;
    Quesito 8.º - A vontade real deF não era a de celebrar o contrato em causa em nome próprio, ma sim na qualidade de sócio maioritário da 1ª Ré - Não Provado;
    Quesito 8.º-A - Os factos constantes dos artigos 3.° a 8.° eram do conhecimento do autor e da 1ª Ré - Não Provado;
    Quesito 12.° - O Autor interpelou a Ré por inúmeras vezes para que cumprisse o prometido - Não Provado;
    Quesito 17.º - Os actos referidos nos arts. 14.° e 15.° comprometeram a possibilidade de a 1ª Ré iniciar as obras de construção a médio prazo - Não Provado;
    Quesito 19.º - Apesar da celebração do contrato referido no art. 14.°, nem a 1ª Ré teve a intenção de alienar o direito, nem a 2ª Ré pretendeu adquiri-lo - Não Provado;
    Quesito 21.º - A 1ª Ré não recebeu da 2ª Ré qualquer preço para pagamento da transmissão e a 2ª Ré não entregou à 1ª Ré qualquer quantia com esse fim - Não Provado;
    Quesito 23.º - As 1ª, 2ª e 3ª Rés praticaram os actos aludidos nos artigos 14º e 15º com o intuito de enganar o Autor - Não Provado;
    Quesito 24.º- Com esses actos impossibilitou o cumprimento da promessa pela 1ª Ré celebrada - Não Provado;
    Quesito 25.º - Diminuindo os bens da 1ª Ré - Não Provado;
    Quesito 26.º - As 1ª, 2ª e 3ª Rés há muito que mantêm negócios conjuntos - Não Provado;
    Quesito 28.º - Os preços declarados em ambas as transmissões mencionadas nos artigos 14.º e 15.º são substancialmente inferiores ao valor de mercado do imóvel em Outubro de 2003 e Janeiro de 2004 - Não Provado;
    Quesito 29.º - O valor de mercado dos imóveis atingia, então, a quantia de, pelo menos, MOP$300.000.000,00 - Não Provado;
    Quesito 32.º - As Rés tinham consciência do prejuízo que os seus actos causaram ao Autor - Não Provado;
    Quesito 41.º - Provado que no dia 2 de Abril de 1992, o F adquiriu a quota da sócia "O Ltd."
Quesito 43.º - Provado que no dia 08 de Abril de 1992, oFaceitou a nomeação para o cargo de director da 1ª Ré.
    
2.2. Em abono da sua tese, quanto aos quesitos 1.º a 8.º- A da base instrutória sustenta a recorrente:
Quanto aos quesitos 1.º a 8.º-A da base instrutória, referentes à celebração e apuramento da vontade das partes quanto à celebração do contrato-promessa que está na génese dos presentes autos (cfr. doc. 1 junto com a petição inicial) tais factos deveriam ter sido considerados provados, com base depoimentos das testemunhas, bem como com base em prova documental junta aos autos, nos termos que se passa a discriminar.
Com efeito,
A testemunha E ouvido na sessão de julgamento de 08.06.2012 e posteriormente em 28.11.2014, às 15h58 (gravação 14TNQIG05011270), minuto 00.00 a 22.15, para além do que já mencionara na sessão de 08.06.2012, disse ainda o seguinte:
( ... )
Advogada do Autor (A): “(...) Quando o Autor prometeu comprar qual era a intenção?
Testemunha (T): Na altura eu estava presente. Eu acompanhei o Autor no escritório do advogado ( ... )
Ouviu dizer pelo advogado e por F que ele estava em representação da B. O representante era F. Foi dito pelo advogado.

Juiz (1): como é que sabe, se o advogado fala português?
Eu não sei quem fez a tradução, mas foi dito isso.
(...)
Dois meses antes iniciaram as negociações com F, qual queria vender o terreno, ele disse que estava em representação da B.
Não sabe porque é que isso não consta do contrato. Ele salientou sempre essa questão que era representante da B. Sempre negociou em nome da B, sempre ouvi isso.

Gravação 14T)JGIG05011270), minuto 00.00 a 16.16:
Advogada do Autor (A): “os Senhores conheceram outro representante da B para além de F?
Testemunha (T): Não.
A: Quem aparecia a negociar em nome da B era sempre o F?
T: Sim
A: A confiou que F era o legítimo representante da B?
T: Sim
A: não tem dúvidas disso?
T: Não
( ... ) sempre negociaram com F.
A testemunha G ouvido na sessão de julgamento de 08.06.2012 (OE3SSB6!105011270), às 10.14.29, minuto 41.50 a 1h12.56, disse o seguinte:
( ... )
Advogada do Autor (A): “(...) O que é que sabe sobre essa aquisição do terreno?
Testemunha (T): Eu sei que ele em 1992, em Janeiro, adquiriu um terreno chamado Lote 133 e que o prédio estava para construir e que também adquiriu com a Companhia B.
(...)
A: - Era do conhecimento comum que esse contrato foi celebrado com a B?
T: Sim, sim:"
A: - A B era a proprietária do Lote de terreno? ~
T: Sim.”
A: Sabe quem é que interveio/representava a Companhia B nessa altura?
T: Na altura era um indivíduo chamado F.
(…)
Na altura era um grande negócio.
A: O contrato foi feito no pressuposto de que era celebrado com a proprietária do imóvel?
T: Sim
A: Desde 1992 foram ocorrendo vários contactos sempre com a mesma pessoa?
T: Sim.
A testemunha H, ouvido na sessão de julgamento de 08.06.2012, (OE3V@CC10S011270), às l1.45, minuto 00.00 a 41.40 referiu o seguinte:
Min.05.00:
Advogada do Autor (A): "Tem conhecimento se o Autor celebrou algum contrato relativo a um imóvel da propriedade da B? O que é que pode dizer ao Tribunal sobre esse contrato?
Testemunha (T): A em 1992 adquiriu com a Companhia B o Lote 133
A: - Desde que conhece a B quem era o representante?
T: F (...) pôs à venda o Lote 133 da B ( Companhia de Hong Kong)
(...)
Em 1991, o terreno foi posto à venda por F.
A: Apesar de constar o nome de F não há dúvida nenhuma de que a vontade em que ele aí está a intervir é como representante da B? Como é que explica que apareça no contrato o nome de F se o imóvel é da B? Qual a razão?
T: Isso é um costume do nosso sector. Naquela altura, só se identificava o patrão e não a Companhia. Por exemplo, Casino Q, todos nós sabemos que na realidade tem vários donos, mas nós só reconhecemos o Dr. R. E no terreno é da mesma forma, nós reconhecemos é F. Nós sabemos que ele representa a B.
A: No final de 1991/1992 era uma prática que os contratos fossem assinados com o representante e não em nome da própria sociedade. É assim?
T: Sim. Nestes negócios, no início da década de noventa, nós não tínhamos bem conhecimento jurídico. Como o português era a língua oficial e nós não conhecemos essa língua, precisamos de, através de advogados ... Nos costumes chineses só se confia na pessoa.”
A testemunha I, ouvida na sessão de julgamento de 08.06.2012, (OE3{CW9W05011270), às 15.15, minuto 00.00 a 28.30, também a propósito do contrato, referiu o seguinte:
Advogado da 1ª Ré (A): " ... a Senhora trabalhava na área da construção, sabe o que o A teve a ver com esse terreno?
Testemunha (T): Sim, ele chegou a mencionar que tinha adquirido habitações em construção à B.
(...)
A: - Quem é que representa B?
T: F (…)
A: Ele também lhe falou desse contrato?
T: Ele disse que tinha vendido umas fracções em construção a A.
(…)
Quando ele celebrou esse contrato já a B era detentora do imóvel e também era titular da maioria das quotas.
A: E o registo?
T: O registo ele nunca me falou.
A: Quer dizer, ele só depois de pagar tudo à B é que pôde celebrar o contrato com a D?
T: Claro. Se ele não tivesse essa qualidade ele não podia celebrar.
(...)
Advogado da 2ª Ré (A): ( ... )
"O F celebrou em nome próprio. Você sabe disso?
T: Não, ele era sócio e administrador da B ...
A: Não, em Janeiro não. Foi só a partir de Abril. Sabe qual a data do registo?
T: Não. Do registo não tenho conhecimento. Só sei dos factos.”

Ou seja, a propósito da existência e objecto do contrato promessa objecto dos presentes autos, todas as testemunhas confirmaram o teor do quesito n.º 1 da base instrutória e a sua celebração entre o Autor e a 1ª Ré, na qualidade de proprietária do imóvel.
Antes de mais, que a intenção do Autor era celebrar o contrato promessa de compra e venda do imóvel com quem se afigurava o seu legítimo proprietário (conferir factos assentes a) e b)) - razão pela qual, aliás, o Autor pagou imediatamente a primeira prestação a título de sinal no valor de MOP$97.335.000,00 (conferir resposta do Tribunal a quo ao quesito n.º 9 da base instrutória) -, é incontornável e resulta até das regras básicas da experiência e do senso comum.
Pelo que a resposta do Tribunal a quo, nomeadamente, aos quesitos 3.° e 4.° da base instrutória é verdadeiramente incompreensível, não tendo qualquer correspondência com a realidade, nem com o que foi expressamente referido pelas testemunhas em sede de julgamento.
Entendendo o Recorrente que, independentemente do que foi referido pelas testemunhas, os quesitos 3.° e 4.° da base instrutória sempre deveriam ter sido dado como PROVADAS, até porque se tratam de factos notórios (cfr. o art. 433° do C.P.C.) ou susceptíveis de prova por presunção (cfr. os artigos 342° e 344°, ambos do Código Civil).
Quanto aos restantes quesitos ora em análise, das respostas do Tribunal aos quesitos 5.°, 41.º e 43.º da base instrutória parece resultar que o Tribunal a quo valorou unicamente as datas das inscrições no registo comercial de Hong Kong relativos à aquisição de 99% das quotas por F e da sua nomeação para o cargo de administrador da B, nos termos que resultam dos documentos juntos como Docs. 11 e 12 da Contestação da 2ª Ré.
Ora, é sabido que, em relação aos actos em referência - aquisição da qualidade de sócio e nomeação de administrador da sociedade -, o registo não é constitutivo de direitos, visando apenas conferir publicidade a tais actos.
Nada impede - como não impediu -, que F se apresentasse e já actuasse aos olhos de todos como legítimo representante da B, a 1ª Ré, mesmo antes de tal facto se encontrar inscrito no registo.
Isso mesmo foi confirmado por todas as testemunhas, nos termos que acima se procurou demonstrar.
E resulta, ainda, de uma série de documentos juntos aos autos.
Com efeito, repare-se que:
• Os cheques juntos aos autos como docs. 4, 5 e 6 da contestação da 2ª Ré, que perfazem um total de HKD$62.000.000,00, foram passados por esta, em 14.03.1992, 18.03.1992 e 02.04.1992, respectivamente, a favor de F e, portanto, em datas em que anteriores ao registo da inscrição da sua qualidade de sócio e administrador da B, a 1ª Ré;
• A livrança junta aos autos como doc. 3 da contestação da 2ª Ré (conferir também resposta ao quesito 37.º da base instrutória, em que o Tribunal considerou que a livrança foi subscrita pela 1ª Ré) foi subscrita por F, em representação da 1ª Ré, em 02.04.1992 e, portanto, numa data anterior ao registo da inscrição da sua qualidade de administrador da B, a 1ª Ré;
E, fundamental:
• O Contrato de Desenvolvimento e Cooperação relativo ao lote de terreno em apreço nos presentes autos, junto a fls. 794 a 796 dos autos, foi assinado pela 2ª Ré e por F, em representação da 1ª Ré, em 18.03.1992, portanto, numa data anterior ao registo da inscrição da sua qualidade de sócio e administrador da B, a 1ª Ré (facto claramente reconhecido e aceite pela própria 2ª Ré).
Mais, do referido Contrato de Desenvolvimento e Cooperação celebrado entre F (a 1ª Ré) e a 2ª Ré em 18 de Março de 1992 , resulta expressamente o seguinte:
"1. F da Parte A que é o representante da Hong Kong B Ltd. declara ser o proprietário do lote.
(cfr. novamente fls. 794 a 796 dos autos).
Ou seja, dos referidos documentos resulta inequivocamente que antes da data de inscrição no registo comercial da aquisição de acções correspondentes a 99% do respectivo capital, bem como da inscrição da nomeação como administrador, F já se intitulava e agia aos olhos de toda a gente como "dono" e legítimo representante da 1ª Ré.
Facto igualmente aceite e reconhecido por todos, inclusivamente pela 2ª Ré, a qual, antes das datas inscritas no registo comercial, já passava cheques à ordem de F (ao abrigo do contrato de cooperação de fls. 794 a 796), já aceitava livranças assinadas por F, tendo sido com F que assinou o próprio contrato de desenvolvimento e cooperação, ao abrigo do qual emprestou dinheiro à 1ª Ré (fls. 794 a 796).
Ou seja, no caso, verifica-se que há uma total confusão entre a pessoa de F e a B, a 1ª Ré.
Pelo que, considerando o depoimento das testemunhas, bem como dos documentos agora mencionados, entende o Recorrente que os quesitos 1.° a 8.º-A da base instrutória só poderiam ter sido dados como PROVADOS.
Pelo exposto, perante a prova produzida em audiência e acima referida, bem como da análise dos documentos juntos aos autos, o Tribunal a quo só podia ter dado como provados os quesitos 1.º a 8.º-A da base instrutória.

2.3. Atentemos na motivação da convicção formada pelo Colectivo de juízes na 1ª Instância:
    A convicção do Tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos, no depoimento das testemunhas ouvidas em audiência que depuseram sobre os quesitos da base instrutória, cujo teor se dá por reproduzido aqui para todos os efeitos legais, o que permitiu formar uma síntese quanto à veracidade dos apontados factos.
    Em especial, no que diz respeito ao contrato que o Autor alega ter celebrado com a 1ª Ré, apenas ficou apurado que F desde 2 de Abril de 1992 é o sócio maioritário da 1ª Ré e em 8 de Abril de 1992, o mesmo aceitou a nomeação para o cargo de director da 1ª Ré, conforme consta do documento junto a fls. 82 a 88.
    No que se refere aos demais factos alegados pelo Autor sobre esta matéria, foi junto o documento de fls. 14 a 16 donde consta que os outorgantes eram F e o Autor sem nenhuma outra indicação de especial qualidade em que praticavam o acto.
    As testemunhas da 2ª e 3ª Rés em nada contribuíram para esclarecer os citados factos.
    As testemunhas do Autor e da 1ª Ré declararam que tinham conhecimento de que o Autor adquirira à 1ª Ré os imóveis a construir no prédio indicado no documento acima referido.
    Dessas testemunhas, as duas da 1ª Ré afirmaram que o seu conhecimento apenas adviera do que lhe tinha sido contado, a 1ª do que lhe contaram F e o Autor e a 2ª do que lhe contara F que até lhe mostrara os documentos respectivos recentemente. Por força disso, o seu depoimento não pode ter muita relevância.
    As três testemunhas do Autor tiveram também conhecimento dos factos junto de F e do Autor tendo a 1ª testemunha do Autor acompanhado o processo de compra e assistido a assinatura do contrato constante do documento de fls. 14 a 16. Todas elas declararam que F vendeu os imóveis em representação da 1ª Ré porque F e o Autor assim o disseram, inclusivamente, segundo a 1ª testemunha do Autor, ao advogado que testemunhou a outorga do contrato e porque F era o sócio maioritário que representava a 1ª Ré sendo, nessa época, costume imputar os actos praticados pelo sócio maioritário à própria sociedade.
    Contudo, a 1ª testemunha, que esteve presente no acto de assinatura, ao ser confrontado com o facto de no documento de fls. 14 a 16 identificar F sem qualquer indicação de que este estava a representar a 1ª Ré, a mesma pura e simplesmente disse que este devia ter confiado no advogado, como acontecia com toda e qualquer pessoa. Além disso, perguntado se, antes da outorga do acordo titulado pelo documento de fls. 14 a 16, o Autor tinha averiguado em nome de quem estava registado o prédio onde iriam ser construídos os imóveis, o mesmo respondeu negativamente.
    Resumindo o acima exposto, está-se perante este cenário: o documento junto identifica F como vendedor sem indicação de que estava a representar a 1ª Ré; O documento está redigido em chinês, língua que o Autor e F presumivelmente dominam; apenas as testemunhas do Autor e da 1ª Ré declararam que F estava a representar a 1ª Ré; segundo algumas delas, isso porque lhe tinha sido dito, segundo outras, mesmo a que participou no acto e acompanhou a compra, porque achavam que, nos anos 90 do século passado, o sócio maioritário representava sempre a sociedade respectiva.
    Há, contudo, uma séria dúvida se F estava a representar a 1ª Ré porque o documento identifica claramente F em nome individual e tudo indica que o Autor nem sequer procurou saber a quem pertencia o prédio. Como é que se pode vir depois afirmar que a venda foi feita pela 1ª Ré sendo F mero representante? Nem o documento assim diz nem provavelmente o Autor sabia quem era o dono do prédio. Como é que uma pessoa que adquire algo no valor de HK$600.000.000,00 pagando uma primeira prestação no valor de HK$90.000.000,00 não insiste que do contrato conste a verdadeira qualidade em que o outro outorgante actua se realmente este estiver a representar uma outra entidade e não a actuar em nome próprio?
    Um dos argumentos invocados para afastar o entendimento de que F actuava na qualidade de representante da 1ª Ré é a de, na data da compra feita pelo Autor, F ainda não era representante legal da 1ª Ré como demonstra o documento de fls. 82 a 88.
    Para refutar esse argumento, foi salientado o facto de constar a fls. 704 a 706 dos autos um documento assinado, em 18 de Março de 1992, por F expressamente em representação da 1ª Ré, altura em que F ainda não era representante legal da 1ª Ré O que tornava verossímil que, no contrato titulado pelo documento junto a fls. 14 a 16, F actuava como representante da 1ª Ré.
    Concede-se que alguém pode actuar sem ter poderes de representação para tal. Aliás, esta figura está prevista no artigo 261º do CC.
    No entanto, o problema que se depara nos presentes autos é o da não indicação de que F estava a actuar em nome da 1ª Ré no contrato titulado pelo documento de fls. 14 a 16, ainda que F não tivesse poderes para o efeito. É que, se essa indicação tivesse sido feita, o problema seria o da ratificação do acto pela 1ª Ré, como acontece com o acordo titulado pelo documento junto a fls. 704 a 706. Pois, com a celebração da escritura pública referida na resposta ao quesito 34° o acto então praticado por F, em representação da 1° Ré foi tacitamente ratificado por esta.
    Afastada a celebração do contrato nos termos alegados pelo Autor, o tribunal não pode deixar de considerar não provados os factos relativos ao incumprimento do mesmo por parte da 1ª Ré.
    Relativamente à simulação das compras e vendas feitas entre a 1ª e 2ª Rés e entre a 2ª e 3ª Rés e à intenção das Rés (ou falta dela) quando os actos foram praticados, os mesmos foram dados como não provados porque os documentos juntos pelas 2ª e 3ª Rés, não impugnados pelas partes contrárias, demonstram claramente o processo que antecedeu a cada um destes actos bem como a sua realização nos termos indicados nas respostas aos quesitos 14° e 15° da base instrutória e a forma como os preços foram considerados pagos.
    A isso acresce que as próprias testemunhas do Autor e da 1ª Ré declararam ter conhecimento do envolvimento da 2ª Ré no projecto de desenvolvimento do prédio discutido nos autos, não conseguindo, porém, estas testemunhas esclarecer se a 2ª Ré participava no projecto ou era uma simples mutuante.
    Sobre essa dúvida que os demais documentos particulares não dissiparam totalmente, a escritura pública de fls. 65 a 68 é a prova mais relevante. Com efeito, a própria 1ª Ré confessou ser devedora da quantia em questão e constituiu uma hipoteca a favor da 2ª Ré para garantir o pagamento.
    Tendo em conta essas provas, o tribunal deu como provada a versão apresentada pelas 2ª e 3ª Rés e, por força disso, afastou a versão dos factos apresentada pelo Autor.
    Quanto ao valor do prédio à data das duas transacções, foram juntas quatro avaliações, duas das quais no valor de HK$49.238.000,00 e MOP$60.000.000,00, feitas respectivamente em 30 de Agosto de 2002 pela Companhia de Investimento e Fomento Predial N (Macau), S.A.R.L. e em 30 de Julho de 2002 pela K Lda., e as restantes duas de HK$500.000.000,00 e HK$550.000.000,00, feitas respectivamente em 12 de Outubro de 2001 e em 12 de Outubro de 2002, ambas pela K Lda.
    Um dos dois autores das últimas três avaliações compareceu para prestar esclarecimento sobre a discrepância existente entre os valores indicados. Inquirido sobre os valores constantes das avaliações de 12 de Outubro de 2001 e em 12 de Outubro de 2002, por si feitas, declarou que os valores parcelares encontrados correspondiam ao que achava ser correctos e que o prédio não podia valer MOP$60.000.000,00 porque, depois de desenvolvido o projecto, os imóveis construídos poderiam ser vendidos por cerca de HK$800.000.00,00 e o custo de construção seria de cerca de HK$200.000.000,00 e se o valor do prédio fosse apenas de MOP$60.000.000,00, o lucro ficaria irrazoavelmente alto. No entanto, não explicou como é que os valores parcelares indicados nas avaliações foram encontrados para concluir pelos valores totais apurados.
    Relativamente ao valor de MOP$60.000.000,00 indicado na avaliação de 30 de Julho de 2002, declarou não tinha conhecimento desta avaliação e reiterou que fez as avaliações de acordo com a sua opinião pessoal.
    Por haver duas avaliações com valores bastantes inferiores e por dos recortes jornais 1009 a 1024 constarem que em 2001 e 2002 os valores das fracções autónomas eram muito inferiores aos indicados nas avaliações de 12 de Outubro de 2001 e em 12 de Outubro de 2002 e por as declarações do autor destas avaliações não terem conseguido convencer o tribunal de que os valores neles indicados deviam prevalecer, o tribunal não considerou provado que o valor do prédio era o constante do quesito 29° da base instrutória.
    
    2.4. Perante esta exaustiva e meritosa fundamentação, não deixa de ser algo imponderada a afirmação produzida pela recorrente no sentido de que o julgamento não se coaduna com as regras básicas do senso comum, exagero que se leva a desconto pelo empenho do patrocínio, por um lado, pelo teor correcto e auto censório que resulta dos termos das suas alegações, por outro.
    É verdade que há toda uma actuação do F que vai no sentido, mesmo antes de ele figurar como representante da B no Registo Comercial de assumir os negócios desta sociedade, misturando a sua intervenção a título pessoal e a título de uma representação sem poderes.
    Mas daí a ter o não escrito por escrito, contra um texto claro inserto no documento, pretender ver nele o que ele não diz, pretender incluir nesse documento, sujeito a determinada forma, elementos essenciais que dele não constam, vai uma grande distância. E esses elementos não são inócuos, nem constituem elementos acessórios do negócio. Na verdade, pretende-se que o promitente vendedor seja outro, pretende-se que um dos contraente alifigure como representante de outrem, sem que ali se insira a mínima referência a essa qualidade.
Do respectivo contrato-promessa de compra e venda que consta de fls. 14 a 17 dos autos resulta que o vendedor é F e o comprador A, ou seja, o recorrente.
A identidade do vendedor foi expressamente descrita como “F”.
A celebração entre as partes do mencionado contrato-promessa de compra e venda foi patrocinada por advogado que não podia deixar de saber o que é fazer um contrato em nome próprio ou em nome de outrem. E se diz, como refere a testemunha, que o F agia como representante da Companhia, então porque o não fez exarar no documento? Não deixa de ser legítimo pensar que não se quis propositadamente assumir essa qualidade.
Da cláusula 14 do respectivo contrato de compra e venda que se pretende ter sido celebrado entre a 1.ª Ré e o A., resulta que tal contrato substituiu o contrato celebrado entre as partes no dia 31 de Outubro de 1991. Por outras palavras, o respectivo contrato não era o primeiro contrato, mas antes se renovava aquele, pelo que não havia razão para não se ter ponderado devidamente a qualidade em que se intevinha.
Na verdade, observa-se do doc. de fls 18 dos autos que o licenciamento de obra foi deferido em 8 de Novembro de 1995, pelo que aludida promessa incidiu sobre fracções autónomas de edifícios em construção, bem podendo acontecer que a 1ª Ré podia vender a unidade residencial incompleta a F e este, por seu turno, vendê-la a A, ou a 1ª Ré a vendê-la outrem que depois a venderia a F, de forma que este a pudesse vender a A. Nesta perspectiva, não será difícil compatibilizar o que está escrito no contrato com a real vontade das partes, no sentido de que este, de facto, agindo como representante da 1.ª Ré teria poder para, ele próprio vir a adquirir a coisa e assumir assim o compromisso de vender ao A. Isto é, a assunção da obrigação de F vender pessoalmente o prédio em construção, em terreno concessionado a uma empresa na qual ele assumia papel relevante de direcção dos negócios, bem podia passar por ser do seu interesse em ser ele a intermediar pessoalmente esse negócio.
É evidente que assim podia ser ou não; perante a clareza do texto do contrato, afigura-se-nos que teria de haver elementos fortes que comprovassem outra coisa, que evidenciassem que o vendedor não era aquele, mas sim outro, e essa prova, com todo o respeito pelo entendimento do recorrente, não se mostra concludente como pretende. No espaço reservado para assinatura de vendedor, apenas se encontra a assinatura de F, não havendo qualquer menção directa ou indirecta de representação da 1ª Ré nem selo deste. É certo, que, segundo a testemunha que presenciou a assinatura, o advogado disse que aquele representava a C.ª B. É isso suficiente que poela palavras ditas de quem não é parte no contrato , por um passo de mágica, logo se mudam os contratantes ou a qualidade dos intervenientes no contrato? Seguramente que não. Então, qual o sentido daquelas palavras? Bem podiam reforça a seriedade dos compromissos assumidos, em relação ao promitente vendedor, que não deixava de os poder assumir, em nome pessoal, dado até o domínio, a representatividade e os poderes perante quem realmente podia celebrar o negócio.
Dir-se-á que isso demonstra bem que, sendo a C.ª que era a detentora da concessão e do imóvel em construção era ela que tinha de vender; seria isso a comprovação de que não podia ser F a prometer vender o que não tinha. É verdade que, realmente, não tinha, mas tinha todas as condições para poder vir a ter. Mais, podia até ser de todo o interesse que não fosse a C.ª a fazer aquele negócio, fosse por razões de estrutura interna, fosse por razões de financiamento, fosse até por razões de manutenção dos pressupostos da concessão, fosse até por razões comerciais de concorrência, fosse até porque não queria mesmo vender ao A., antes a terceiros, procurando um melhor negócio e assim o seu “representante” serviria de testa de ferro.
Claro que estas suposições poderão ser especulativas, mas estamos num campo em que há que articular factos e encontrar hipóteses plausíveis para aquilo que se configura como incompatível entre si.

     2.5. Há ainda outras razões que nos levam a não acatar a pretensão do A.
    F passou a ser accionista da 1ª Ré apenas em 2 de Abril de 1992, e só foi nomeado administrador pela 1ª Ré em 8 de Abril do mesmo ano. Pelo que o respectivo negócio nunca podia ser praticado por F na qualidade de accionista ou administrador da 1ª Ré em termos juridicamente relevantes..
    Por outro lado, também é importante que a escritura de reconhecimento da dívida e hipoteca constante de fls. 65 a 68 dos autos foi celebrada em 2 de Abril de 1992, altura em que a 1ª Ré tinha um representante legal M, mas não F.
    Não se mostra que a 1ª Ré tenha designado F, através de quaisquer actas de assembleia de accionistas ou por qualquer outra forma, ainda que não solene, conferindo-lhe quaisquer poderes representativos de direito ou de facto., quer verbais quer escritas, para representá-la na prática do respectivo negócio jurídico.
    Não se deixa até de observar (cfr. fls. 579 a 581, 646 dos autos) que noutros momentos e também no escritório dos mesmos advogados surgem outros documentos em que se atesta expressamente a qualidade do mesmo F como representante da 1.ª Ré, donde se pode inferir que essa qualidade nas diferentes intervenções contratuais não constitui um mero detalhe sem relevância. Toda a gente sabe que uma coisa é a A vender a C, outra é B, representada por A, vender a C, para mais num negócio daquele valor, com tais dimensões e processado através de advogados.
    
    
     Acresce que, a 1ª Ré, mesmo que se admitisse que terá havido uma representação sem poderes, possível ao abrigo do disposto no art.261.º, n.º 1 do CC, a 1.ª Ré nunca ratificou o referido acto de F de forma a tê-lo como praticado em seu nome e representação.
     Sobre este ponto, aliás, doutamente abordado pelo Tribunal de 1.ª Instância, como acima transcrito, não se deixará de referir, que é questão que não vem equacionada pelo recorrente. O que ele vem dizer é que foi a B que negociou representada por F, pelo que não podemos agora jogar com uma outra realidade que não foi admitida pela própria parte.
     Donde, nem sequer relevará a ponderação de um circunstancialismo tendente a ter por verificada a previsão do n.º 2 do art. 261º - circunstancialismo concreto e objectivo que justificasse a confiança de terceiro de boa fé na legitimidade do representante - , porquanto, ainda aí, se trataria de matéria não alegada, o A. não podia desconhecer que o dono do imóvel não era a pessoa com quem contratava, não estava inibido de aferir dessa legitimidade, não eram as palavras do advogado que o poderiam tranquilizar quanto à inaptidão ou ausência absoluta dos instrumentos representativos de um contrato que se requeria formal, não se prova que, de algum modo, a 1.ª Ré tenha dado essas indicações e esses sinais de forma a serem interpretados objectivamente no sentido da legitimidade daquela pessoa que se assumia como seu representante, em suma, porque não se comprovam os requisitos de uma qualquer ratificação presumida.
    
    
     Em suma, não há dúvida que F podia praticar e na verdade praticou tal negócio jurídico em seu próprio nome;
    Não há qualquer prova, factual ou jurídica, que possa apoiar a tese de que, em 8 de Janeiro de 1992 ou, mais cedo, em 31 de Dezembro de 1991, F praticou o referido negócio jurídico em representação da 1ª Ré.
    Mas também não nos impressiona o facto de se estar perante uma actuação e assunção como própria de coisa alheia, e que por isso seria de depreender que ele agia como representante da sociedade, pois ele bem podia fazer pessoalmente negócios, fosse porque sabia que tinha poder, em qualquer momento, para vincular a sociedade, fosse porque ele assumia os negócios de outrem em nome pessoal, fosse porque teria poder, pelo menos subjectivamente, para vir a adquirir os bens pertencentes à sociedade e, assim, negociá-los até como coisa futura. Situação, aliás, frequente entre nós, não sendo raro que alguém se compromete a vender X ou Y, sem que tal lhe pertença, apenas na expectativa de que tal se venha a concretizar.
    Ora, uma actuação desse teor vai gerar necessariamente situações conflituantes, duvidosas, de incerteza sobre quem assume as obrigações quando ele intervém, havendo que ser rigoroso na demonstração de que o sentido que se colhe de um documento, onde não há qualquer referência a uma intervenção representativa na referida promessa de venda. É, realmente, algo que não está lá.
    
    2.6. Sob pena de se subverterem até as regras da forma que se impõem para o negócio em causa.
    Mesmo que porventura se formasse uma convicção inelutável no sentido da tese do A., temos para nós que os elementos negociais que pretende demonstrar testemunhalmente sempre esbarrariam com as limitações de forma que dimanam dos artigos 212º e 213º do C. Civil.
Estaremos perante elementos essenciais do negócio ao identificar quem vende, quem é parte no negócio, se há ou não representação de uma parte.
Mesmo em relações a estipulações verbais acessórias o artigo 213.º do CC regula quais as estipulações que caiem no âmbito da forma , prevendo que estão sujeitas à forma prevista as estipulações a que a razão determinante da forma lhes seja aplicável, para o caso das estipulações posteriores, ou, no caso das estipulações verbais acessórias anteriores ao documento, ou contemporâneas dele, se prevê que são nulas, a não ser que uma razão determinante da forma lhes não seja aplicável e correspondam à vontade das partes.
Na verdade, serão estipulações essenciais as que correspondem “ às notas exigidas pelo tipo legal (elementos específicos ou que são insertos no negócio por norma imperativa”. 1
Serão estipulações acessórias as que não integrem o “cerne do negócio, nas palavras de Menezes Cordeiro2,como será o caso “v.g., na compra e venda, do montante do preço, do lugar e do tempo do pagamento - completem ou vão além do clausulado no documento, regulando aspectos nele não previstos e afastando, não raro, as correspondentes normas supletivas, sem nunca o contrariar 3. Segundo Vaz Serra “a distinção entre cláusulas essenciais e cláusulas acessórias do negócio jurídico, para efeito de determinar se estão, ou não, sujeitas à forma que a lei prescreve para a declaração negocial, parece dever ser estabelecida atendendo às razões desse requisito legal. Tais razões podem ser para precaver os declarantes contra a precipitação e ligeireza, dar maior segurança à conclusão do negócio e ao conteúdo negocial, facilitar a prova, dificultar o negócio, facilitar o controlo no interesse geral, garantir a sua reconhecibilidade por terceiro, dar às partes a oportunidade de obter conselho de peritos” (RLJ 113º, 147).
    Pode, assim formular-se aqui uma presunção de plenitude do negócio jurídico formal, no momento da sua celebração, segundo o qual se entende que as partes incluíram no acto tudo o que quiseram regular. Para além disso, em princípio, nada vale.4 Com isto não se quer dizer que o apuramento do real sentido da vontade declarada não seja passível de prova testemunhal. Imagine-se numa simulação ão invocável pelos próprios simuladores. Não está vedada a prova testemunhal para apuramento do real sentido da vontade negocial das partes. Só que aí, a prova visa apurar qual a vontade real do declarante e declaratário e, comprovando-se a divergência, o resultado será a nulidade do negócio simulado; já o aproveitamento do negócio dissimulado fica dependente do aproveitamento das razões de forma que se imponham para o negócio verdadeiramente realizado. Não é o presente caso. Pretende-se aqui comprovar um elemento essencial, para o validar nesse sentido, o que, para além do disposto nos art.ºs 213.º, colide ainda com o disposto nos artigos 388.º, n.º 1 e 357.º, n.º 1 do CC.
Daqui resulta que os elementos que se pretendem ver comprovados são elementos essenciais do negócio jurídico e não deixam de estar abrangidos pelas razões de forma, insusceptíveis de prova testemunhal, pois estariam sujeitos à forma escrita do contrato promessa.
Nem se diga que, se assim era, se mostrava dispensável a inquirição da testemunha, pois a seu depoimento extravasava a matéria que incidia sobre esses elementos essenciais do negócio, qual seja o da identificação da parte e sua representação no negócio formalizado.
Diferente será a comprovação da celebração de um negócio em nome próprio e tentar demonstrar fora do documento o beneficiário do interesse nesse negocio. Aí entraremos dentro da representação sem poderes, matéria que adiante se abordará.
Mas essa questão deve ser colocada qua tale ao Tribunal. Não pode a parte vir alegar na petição que houve uma representação regular e, depois, perante a não comprovação desta, já em sede de recurso, não pode vir emendar a mão e construir uma outra tese, no sentido de que afinal o promitente vendedor agiu sem poderes de representação mas no interessa da 1.ª Ré.

2.7. Quanto ao quesito 12.º da base instrutória
Trata-se de matéria relativa à interpelação do Autor à Ré e dada como não provado pelo Tribunal a quo. Defende a recorrente que a respectiva prova resulta da prova testemunhal:
A testemunha E ouvido na sessão de julgamento de 08.06.2012 e posteriormente em 28.11.2014, gravação 14T)JGIGOS011270), minuto 00.00 a 16.16:
Advogada do Autor (A): "As reuniões ocorreram onde?
Testemunha (T): Em Macau e em Zhuhai, nos restaurantes.
A: Qual era o objectivo?
T: Era para insistir na construção. (…) a única pessoa era F.
A: Pediram várias vezes para cumprir o contrato?
T: Sim
A testemunha G ouvido na sessão de julgamento de 08.06.2012 (OE3SSB6!105011270), às 10.14.29, minuto 41.50 a 1h12.56 e gravação OE3USS+5011270, às 11.27, minuto 00.00 a 03.00, disse o seguinte:
"Advogada do Autor (A): Depois da celebração do contrato, houve reuniões?
Testemunha (T): Sim
A: Essas reuniões tinham que finalidade? Já depois de 1992..
T: Para insistir, quando é que iria construir, como é que vai tratar esse projecto, porque ainda não foram realizadas quaisquer obras ...
E na parte final do seu depoimento, a perguntas da Mma. Juiz: 01h09
Juiz (J): Bom, você há pouco disse que depois da celebração do contrato chegou a conferenciar/reuniu com F. Mas acerca de quê?
T: Para saber quando se podia começar a construção, em que altura se podia começar, pois já se estava a arrastar há muito tempo.
J: Estava a insistir? Na construção?
T: Sim.
J: O contacto foi sempre com F?
T: Sim. Havia encontros marcados e eu também estava lá presente.
J: E esses encontros eram onde: na companhia ou onde?
T: As reuniões aconteceram na China, uma vez em Guangdong outra em Zhuhai..
As conversações foram sempre no sentido de saber quando se iniciava a construção ( ... ) tudo verbalmente.
(…)
As conversações eram sempre na China, todas as vezes (…)
J: Porque é que o Senhor participava nas reuniões?
T: Porque o Senhor Lei me pedia.
    J: Participou em todas as reuniões?
    T: Participei em 2 ou 3.
    Também a testemunha H, ouvido na sessão de julgamento de 08.06.2012, (OE3V@CC105011270), às 11.45, minuto 00.00 a 41.40 referiu o seguinte:
    (...)
    Testemunha (T): Assisti a reuniões.
    (...) Era um projecto enorme. No NAPE, o terreno é enorme, tem 30 e tal mil pés. Todos prestavam atenção a este projecto.
    Min.18.00
    Advogada do Autor (A): "Quanto aos esforços do Autor para que a B cumprisse o acordado, esteve presente em reuniões com F para que se iniciasse a construção.
    T: Sim, eu também estava.
    
    Pelo exposto, perante a consideração dos referidos depoimentos, entende o Recorrente que o quesito 12.º da base instrutória deverá ser dado como PROVADO.
    
    Como está bem de ver, a partir do momento que não se comprova que o contrato promessa foi celebrado com a a 1.ª Ré, perde sentido o deslindamento de grande parte da restante matéria.
    Para além de que este entrecho não se mostra decisivo no sentido interpelativo da Ré; na verdade, uma coisa é insistir com o avanço das obras, outra a exigência do cumprimento do contrato, outra a de saber quem estava obrigada para com o promitente comprador.
    
    2.8. Quanto ao quesito 17.º da base instrutória – “os actos referidos nos artigos 14.º e 15.º comprometeram a possibilidade de a 1ª Ré iniciar as obras de construção a médio prazo" – sustenta a A. que a resposta do Tribunal a quo ao dar o referido quesito como não provado é verdadeiramente incompreensível.
    Pese embora as testemunhas tenham confirmado tal facto, nomeadamente as testemunhas G e H, trata-se, na verdade, de um quesito que encerra uma conclusão de direito.
    Com efeito, se a 1ª Ré perdeu a titularidade do imóvel em virtude das transmissões referidas nos quesitos 14.° e 15.° da base instrutória, naturalmente, passou a encontrar-se impossibilitada de iniciar quaisquer obras, a curto, médio ou longo prazo.
    Tratando-se de um conclusão necessária e que resulta por inerência da prova das transmissões do imóvel para a esfera jurídica da 2.° e da 3ª Rés, o quesito 17.º da base instrutória teria necessariamente de ser dado como PROVADO.
    Sobre isto, o que podemos dizer é que se trata de matéria de certa forma irrelevante, pois o que estava em causa era a continuação da construção e o que ocorreu foi a transmissão do direito da concessão. É bem possível que essa transmissão afectasse essa construção, mas também é possível que os contratos celebrados com a 2ª e 3ª Ré não afectassse a construção que seria desenvolvida pela 1ª Ré. Um non liquet sobre a matéria é, pois, bem possível.
    
    2.9. Quanto ao quesito 19.º da base instrutória - "apesar da celebração do contrato referido no art. 14.°, nem a 1ª Ré teve a intenção de alienar o direito, nem a 2ª Ré pretendeu adquiri-lo" - entende o Recorrente que, perante o circunstancialismo que envolveu tal aquisição por parte da 2ª Ré, tal facto deveria ter sido dado como Provado.
    Com efeito dúvidas não podem existir que a 2ª Ré adquiriu o imóvel em apreço nos presentes autos (declarando a respectiva aquisição pelo valor de MOP$52.118.000,00), fazendo negócio consigo mesmo, tendo a escritura pública de 30.10.2003 sido outorgada com base na procuração irrevogável de 02.04.1992.
    É o que resulta dos documentos juntos como docs. 2 (procuração irrevogável) e 18 (escritura pública de 30.10.2003) juntos com a contestação da 2ª Ré, bem como da resposta aos quesitos 14.º e 36.º e 51.º da base instrutória dados como provados.
    Ou seja, pela consideração da prova documental junta aos autos, resulta que, no caso, a 2ª Ré procedeu à transmissão do imóvel a seu favor, fazendo negócio consigo mesma.
    A consideração e este propósito efectuada pelo Tribunal a quo, em sede de fundamentação sobre a resposta à matéria de facto, ao consignar que a 1ª Ré teria ratificado tal transmissão não faz qualquer sentido.
    É que a 1ª Ré "não foi perdida, nem achada" neste negócio, não foi consultada a propósito do momento da respectiva transmissão e, muito menos, sobre o respectivo valor.
    Nesse sentido, veja-se o depoimento da testemunha H sessão de julgamento de 08.06.2012, (OE3V@CC105011270), às 11.45, minuto 00.00 a 41.40 - tendo referido, nomeadamente, o seguinte:
    Min. 38.00 e seguintes:
    (…)
    Testemunha (T): "Depois contactei o F e ele disse que não tinha sido informado e que não sabia nada sobre esta venda".
    Pelo exposto, perante o circunstancialismo que envolveu a realização deste negócio, entende o Recorrente que o quesito 19.º da base instrutória deverá ser dado como PROVADO.
    
    Esta passagem oferece-nos duas ordens de considerações:
    Em primeiro lugar, se se tratava de negócio simulado, como se pretende, então, não faz sentido a argumentação usada no ponto anterior em que se pretende retirar da consequência dessa venda uma impossibilidade de prosseguimento das obras.
    Depois, o que se pode retirar é que afinal o F ou não seria o tal “senhor todo poderoso” na 1.ª Ré, a ponto de não saber dessa venda, documentalmente comprovada, ou então teria todo o interesse em dizer que não sabia, até porque sabia bem que se tinha comprometido a fazer outro negócio com o A..
    De todo o modo, não se retira destes elementos a inevitabilidade de uma resposta em sentido contrário ao que vem fixado.
    
    2.10. Quanto ao quesito 21.º da base instrutória – “A 1ª Ré não recebeu da 2ª Ré qualquer preço para pagamento da transmissão e a 2ª Ré não entregou à 1ª Ré qualquer quantia com esse fim" - entende o Recorrente que se trata de uma conclusão a retirar, nomeadamente, resposta do Tribunal a quo à matéria de facto constante dos quesitos 14.°, 34.° e 51.° da base instrutória.
    Com efeito, a 2.ª Ré fez seu o imóvel (dação em cumprimento - artigos 828.° a 831.° do Código Civil) pelo valor de MOP$52.118.000,00 (cfr. as respostas aos quesitos 14.° e 51.° da base instrutória).
    O que significa que, tendo o Tribunal a quo dado como provado a confissão de dívida da 1ª à 2ª Ré, no valor de HKD$243.000.000,00, tal significa que, não só a 1ª Ré não recebeu qualquer valor como ainda ficou em dívida para com a 2ª Ré, no valor aproximado de HKD$190.882.000,00 (sobre o qual, eventualmente, a 2ª Ré ainda exigiria juros à taxa convencionada - cfr. a resposta ao quesito 35.° da base instrutória).
    Pelo exposto, tendo em conta os documentos juntos aos autos, bem como a resposta do Tribunal a quo aos quesitos 14.°, 34.°, 35.° e 51.° da base instrutória, entende o Recorrente que o quesito 21º da base instrutória deverá ser dado como PROVADO, porquanto, não só a 1ª Ré não recebeu qualquer preço pela transmissão do imóvel, como - em bom rigor - ainda terá permanecido em dívida para com a 2.° Ré.
    
    Com todo o respeito pelo raciocínio desenvolvido, pensamos, contudo que ele peca por erro silogístico. As premissas donde se pretende retirar aquela conclusão referem-se a realidades diferentes. O reconhecimento de uma dívida, o preço de aquisição declarado em negócio consigo mesmo, não reflectem necessariamente que não houve qualquer preço na venda da 1.º Ré.
    
    2.11. Quanto aos quesitos 23.°, 26.° e 32.° da base instrutória - "As 1ª, 2.ª e 3ª Rés praticaram os actos aludidos nos artigos 14.º e 15.º com o intuito de enganar o Autor", "As 1ª, 2ª e 3ª Rés há muito que mantêm negócios conjuntos" e "As Rés tinham consciência do prejuízo que os seus actos causaram ao Autor" dados como “Não Provados”, entende a Recorrente que tais factos resultaram claramente demonstrados em sede de audiência de julgamento, quer com base nas declarações das testemunhas, quer com base na prova documental junta aos autos e que se passa a identificar.
    O depoimento da testemunha H, ouvido na sessão de julgamento de 08.06.2012, (OE3V@CC105011270), às 11.45, minuto 00.00 a 41.40, foi muito elucidativo, tendo a propósito do conhecimento das Rés e dos prejuízos do Autor, referido nomeadamente o seguinte:
    ( ... )
    Testemunha (T): A, o Autor, era uma das maiores personalidades no sector de imóveis.
    Advogada do Autor (A): O Autor era conhecido e a celebração deste contrato era conhecido em Macau?
    T: Sim, conhecemos na nossa área. Porque em 1993 a 1993, de repente, ficou desenvolvido o ramo de imóveis. E raramente havia estes enormes valores (...). Todo o pessoal deste ramo conhecia este negócio. Se não soubesse, então não era deste ramo.
    (…)
    A B só conseguiu o empréstimo com a D por causa do contrato com A A é um comerciante famoso de imóveis. Todo o pessoal de Macau o conhecia. Até advogados,
    (…)
    Este negócio afectou muita gente, mais de 200. A foi o primeiro a adquirir. E a B não tinha outro património. Em Macau, não tinha outros bens.
    (…)
    A: Acha que as Rés tinham conhecimento sabiam que estavam a prejudicar o Autor e os outros credores?
    T: De certeza que sim. É que esta conduta não foi vulgar ...
    Também a testemunha a G ouvido na sessão de julgamento de 08.06.2012 (OE3SSB6!105011270), às 10.14.29, minuto 41.50 a 1h12.56, disse o seguinte:
    Min. 50.00 e ss.
    (...)
    Testemunha (T): da forma como se vendeu o imóvel (...), o prejuízo é muito elevado.
    A corroborar as declarações das testemunhas - e demonstrativo do conhecimento quer da 2ª, quer da 3ª Ré, quanto à existência de contratos previamente celebrados e dos prejuízos que adviriam das suas condutas confira-se o documento de Os. 797 e ss. dos autos - Contrato-Promessa de compra e venda de Terreno e respectivo prédio celebrado entre a sociedade D (a 2ª Ré) e a J Limitada (sociedade que tem os mesmos sócios familiares que a 3.ª Ré ver resposta aos quesitos 52.º e 55.º da base instrutória).
    Desse contrato, resulta, nomeadamente, da cláusula 3ª, o seguinte:
    "(...) Entregam-se o direito de administração e o direito de uso à Parte B, que também conhece bem todo o direito de propriedade do terreno e do respectivo prédio e o estado actual do terreno (...) Com a concordância da Parte A, a Parte B, em nome da Parte A, apresenta acção no Tribunal para tratar de todas as formalidades legais e formalidades relevantes a fim de que a Parte A possa vender o terreno e respectivo prédio de forma estável e favorável e com sucesso à parte B e a parte A possa assinar com a parte B a escritura de compra e venda."
    Mais, este contrato de fls. 797 e ss. dos autos menciona expressamente na parte final ("Anexos") que foi junto o duplicado do Contrato de Desenvolvimento e Cooperação celebrado entre F (a 1ª Ré) e a 2ª Ré em 18 de Março de 1992 (cfr., novamente, o teor de fls. 794 a 796 dos autos).
     Desse contrato, resulta expressamente o seguinte:
    “1. Fda Parte A que é o representante da Hong Kong B Ltd. declara ser o proprietário do lote.
    2. A Parte A confirma que é o titular do direito de propriedade não impugnável do lote da Avenida do xxxxxx em Macau n.º xxx, com a área de 31,172 pés quadrados, o titular do documento da concessão do governo com o n.º de registo 1XXXX, a fls. 184v do livro B-36 na Conservatória do Registo Predial e o contrato assinado com o governo, a respectiva planta de construção do lote, tendo sido tudo autorizado pelo governo. Todas as unidades de construção com o uso para comércio e residência e lugares de estacionamento construídos no lote foram vendidos. Por isso, a Parte A concorda basear-se nisto para cooperar com a Parte B.”
    Pelo exposto, entende o Recorrente que, da análise dos referidos documentos, dúvidas não podem existir que quer a 2.a Ré, quer a 3.a Ré tinham perfeito conhecimento da situação do imóvel em apreço nos presentes autos, pelo que necessária e inelutavelmente a sua conduta iria causar prejuízos a todos aqueles que previamente celebraram contratos para aquisição das fracções, onde se inclui o Recorrente.
    Impondo-se, consequentemente, também uma correcção na resposta ao quesito 27.° da base instrutória, de forma a incluir a 3.a Ré ("Provado que a 2ª Ré e a 3ª Ré sabiam da existência de promessas de venda ... "), o que, desde já e para os devidos efeitos legais, o Recorrente igualmente requer a V. Ex.ªs.
    Assim, tendo em conta os depoimentos das testemunhas acima destacados, bem como o teor dos documentos de fls. 797 e ss. e de fls. 794 a 796 dos autos, entende o Recorrente que os quesitos 23.º, 26.º e 32.º da base instrutória só poderiam ter sido dados todos como PROVADOS.
    
    Mais uma vez esta prova não se mostra definitiva. O que se verifica é que a parte A, a 1.ª Ré era a a titular do direito de concessão e daí todas as cautelas em que não abrir mão total do imóvel, sob pena de eventualmente perder o direito que lhe estava concedido ou, mesmo que autorizada a celebrar aqueles negócios, continuava com o poder de facultar o exercício e gozo em função do contrato celebrado, compreendendo-se que muitas das démarches, nomeadamente administrativas devesse ser por ela desenvolvidas.
    Ainda aqui, com muito respeito, por outra opinião, o Tribunal entende não ser esta prova concludente no sentido pretendido.
    
    2.12. Quanto ao quesito 24.º da base instrutória - "Com esses actos impossibilitou o cumprimento da promessa pela 1ª Ré celebrada" – “Não Provado”, sustenta o recorrente que a resposta do Tribunal a quo ao dar o referido quesito como não provado é, uma vez mais, verdadeiramente incompreensível.
    As testemunhas confirmaram tal facto, nomeadamente as testemunhas G e H, mas trata-se, mais uma vez, de um quesito que encerra uma conclusão de direito.
    Com efeito, se a 1ª Ré perdeu a titularidade do imóvel em virtude das transmissões referidas nos quesitos 14.º e 15.º da base instrutória, naturalmente, deixou de ser possível o cumprimento o contrato promessa celebrado com o Autor e ora Recorrente, o qual, por sua vez, deixou igualmente de poder requerer a execução específica do contrato.
    Tratando-se de um conclusão necessária e que resulta por inerência da prova das transmissões do imóvel para a esfera jurídica da 2ª e da 3ª Rés, o quesito 24.º da base instrutória teria necessariamente que ser dado como PROVADO.
    
    Remetemo-nos aqui para o que já acima se disse, no sentido que, não comprovado que o contrato promessa foi celebrado com a 1.ª Ré, não faz mais sentido saber se outra actuação por parte desta faz ou não perder o interesse no cumprimento de um contrato que não se prova. Bem poderia, realmente, face às respostas dadas anteriormente ter o tribunal respondido que se tratava de matéria prejudicada.
    O que não deixa de ser válida, em grande parte, para a materia referente aos quesitos que se vêm analisando.
    O único interesse que poderia ter, prende-se ainda com eventual impossibilidade de cumprimento do contrato promessa, tal como foi celebrado.
    
    2.13. Quanto ao quesito 25.º da base instrutória - "Diminuindo os bens da 1ª Ré" - entende o aqui Recorrente que só pode ter ficado a dever-se a lapso do Tribunal a quo ter considerado tal facto como não provado, tal como resulta das respostas positivas aos quesitos 30.º e 31.º da base instrutória.
    Com efeito, se o Tribunal a quo deu como provado - como se impunha - que o imóvel em apreço nos presentes autos era o único bem de que dispunha a l.ª Ré, a qual não era titular de quaisquer outro bens susceptíveis de penhora, é claro que as transmissões do imóvel para a 2ª e 3ª Rés diminuíram (esvaziaram mesmo!) o património da 1ª Ré.
    Tratando-se de um conclusão necessária e que resulta dos factos que o próprio Tribunal a quo considerou provados em resposta aos quesitos 30.º e 31.º da base instrutória, entende o ora Recorrente que o quesito 25.º da base instrutória teria necessariamente que ser dado como PROV ADO.
    
    Tem razão o recorrente, mas, mais uma vez, face à não comprovação de que foi a 1ª Ré que prometeu vender ao Autor, trata-se de matéria irrelevante.
    
    2.14. Quanto aos quesitos 28.º e 29.º da base instrutória - "Os preços declarados em ambas as transmissões mencionadas nos artigos 14.º e 15.º são substancialmente inferiores ao valor de mercado do imóvel em Outubro de 2003 e Janeiro de 2004" e “o valor de mercado dos imóveis atingia, então, a quantia de, pelo menos, MOP$300.000.000,00" – “Não Provados”.
    Sustenta a recorrente, a este propósito, que todas as testemunhas reconheceram ou, no caso das testemunhas das 2ª e 3ª Rés, ficaram muito comprometidas quando confrontadas com a transmissão do imóvel em apreço nos autos pelo valor de HKD$50.430.000,00 (cfr. a resposta ao quesito 56.º da base instrutória).
    A testemunha G ouvido na sessão de julgamento de 08.06.2012 (OE3SSB6!105011270), às 10.14.29, minuto 41.50 a 1h12.56, disse o seguinte:
    (...)
    Advogada do Autor (A): "(...) Tem noção do valor do imóvel?
    Testemunha (T): Em que altura?
    A: - Em 2003.
    T: Talvez uns 400/500 milhões.
    A: - Sabe por quanto foi vendido o imóvel?
    T: Foi vendido pela D vendeu à C por 55.000.000,00 ...
    A: Esse valor não tem correspondência com o valor de mercado do imóvel?
    T: Exacto.
    A: Sabe por que foi vendido por esse valor?
    T: Também não sei explicar.
    A testemunha H (sessão de julgamento de 08.06.2012, (OE3V@CC105011270), às 11.45, minuto 00.00 a 41.40) referiu o seguinte:
    Min.32.10:
    Advogada do Autor (A): "Na sua opinião quanto valeria aquele imóvel em 2003 ou início de 2004?
    Testemunha (T): Valia pelo menos 300 milhões.
    Um amigo meu comprou um terreno menor, em lugar próximo, por mais de 200 milhões. Aquele preço que mencionou há pouco de 50 milhões ... eu fiquei estupefacto ao ver esse valor tão reduzido.
    O valor de 50 milhões era impossível. Não devia haver no mercado coisas tão baratas naquela altura.
    (...)"
    A testemunha I - sessão de julgamento de 08.06.2012, (OE3{CW9W05011270), às 15.15, minuto 00.00 a 28.30 - , referiu o seguinte:
    Testemunha (T): " (…)
    Em 2003, ouvi comentar que esse terreno estava à venda.
    Advogado da 1ª Ré (A): Sabe qual o preço por que estava à venda?
    T: Era de 300 milhões e tal. 320 milhões.
    A: Quem lhe disse?
    T: Era um corrector da área, de apelido Lei
    (...)
    A: Sabe qual o preço por que foi vendido?
    T: Não sei.
    
    Ora, os relatórios de avaliação do imóvel, elaborados pela “K Lda.", relativos aos anos de 2001 e 2002, juntos pela 1ª Ré no início da sessão de julgamento de 08.06.2012, por si só, são aptos a comprovar os quesitos 28.0 e 29.0 da base instrutória, ou seja, que os preços declarados nas transmissões efectuadas pela 2ª e 3ª Rés são substancialmente inferiores ao valor de mercado do imóvel em Outubro de 2003 e Janeiro de 2004.
    Dos mesmos resulta claramente que o valor de mercado do imóvel ascendia ao valor de HKD$500,000,000.00, no ano de 2001, e de HKD$550,000,000.00, no que diz respeito ao ano de 2002.
    Sendo ainda que ambos relatórios mencionam o valor do imóvel após construção, donde se previa um valor de venda de HKD$855,002,325.00 (e lucros na ordem de HKD$153,383,729.40 até HKD$251,391,288.81), no que se refere ao ano de 2001, e um valor de venda de HKD$940,502,557.50 (e lucros na ordem de HKD$167,086,341.50 a HKD$274,628,592.60), no que se refere ao ano de 2002.
    Ora, tais relatórios são susceptíveis de pôr seriamente em causa o teor e a veracidade dos relatórios de avaliação do imóvel, elaborados pela "Companhia de Investimento e Fomento Predial N (Macau), S.A.R.L.", em 30.08.2002, e pela mesma "K Lda.", juntos pelas 2ª e 3ª Rés (conferir o Documento 26 do requerimento de prova apresentado pela 2ª Ré em 26.04.2011 e os relatórios de avaliação do imóvel juntos pela 3ª Ré como Documento 1 do requerimento de prova apresentado no mesma dia, 26.04.2011).
    Atendendo ao teor do relatório da "Companhia de Investimento e Fomento Predial N (Macau), S.A.R.L.", junto como Documento 26 do requerimento de prova da 2ª Ré, repare-se na salvaguarda que ao mesmo foi aposta o seguinte:
    "8. Averbamento: o conteúdo do presente relatório é só para referência do comitente, não se responsabilizando perante terceiros. A presente companhia não concordou, por escrito, com todo o conteúdo do relatório ou partes dele, não podendo ser utilizado em qualquer documento. Caso se verifique o contrário, a presente companhia não assumirá todas as responsabilidades causadas."
    Depois, quanto aos relatórios da "K Lda.", juntos pela 1ª Ré em 08.06.2012 e ao confronto com o relatório, datado de 30.07.2002, elaborado pela mesma Companhia e que atribuiu ao imóvel o valor de MOP$60.000.000,00 junto aos autos pela 3ª Ré, atenta a discrepância de valores, foi ordenada a inquirição dos respectivos autores dos relatórios.
    Assim, na sessão de julgamento de 21.06.2012, foi ouvido L, da "K Lda.", o qual explicou que o Autor do relatório de avaliação do imóvel de 30.07.2002 foi elaborado pelo seu pai, o qual já se encontra falecido, tendo o mesmo confirmado o relatório de avaliação de 12.10.2001 que atribuiu ao terreno naquele imóvel o valor de HKD$500.000.000,00.
    A este propósito, quanto à fundamentação do Acórdão com resposta à matéria de facto sobre o valor do imóvel objecto dos presentes autos, atentas as evidentes discrepâncias entre os valores dos 4 relatórios de avaliação do imóvel juntos aos autos (sabendo que o relatório da Sociedade N junto como Doc. 26 do requerimento de prova da 2ª Ré contém ele próprio reservas quanto ao seu conteúdo), perante o que foi referido por todas as testemunhas, é incompreensível que o Tribunal tenha considerado que as transmissões do referido imóvel pelos valores de MOP$52.118.000,00 (venda à 2ª Ré por escritura pública de 30 de Outubro de 2003 fazendo negócio consigo mesma) e de MOP$63.000.000,00 (conferir alínea D) dos factos assentes) se coadunem com o valor de mercado do referido imóvel.
    Como não pode o Recorrente aceitar que o Tribunal utilize para fundamentar a sua convicção os anúncios de jornais de fls. 1009 a 1024, uma vez que a venda se fracções autónomas nos anos de 2001 e 2002 publicitadas não terem nada a ver com a dimensão e a amplitude do lote objecto dos presentes autos, com área aproximada de 3000 m2 (cerca de 31.000 pés quadrados, onde se destinavam a ser construídas não uma, nem 2 fracções autónomas, mas sim dois prédios, com 18/20 andares, com dois andares para estacionamento e centenas de fracções autónomas (quer para comércio, quer para habitação).
    Nenhum dos anúncios publicitados nos jornais de fls. 1009 a 1024 tem qualquer relação com o lote de terreno em apreço nos autos, respectiva área e potencial de construção.
    Pelo exposto, atentas as declarações prestadas pelas testemunhas, às discrepâncias que resultam dos relatórios periciais e à confirmação por L do teor do relatório de 12.10.2001 que atribuiu ao imóvel o valor de HKD$500.000.000,00, entende o Recorrente que os quesitos 28.º a e 29.º da base instrutória só poderiam ter sido dados como PROVADOS.
    
    Os elementos e argumentos aduzidos não são de molde a formatar uma convicção que divirja da formulada pelo Colectivo do TJB.
    Os argumentos que ora se invocam baseiam-se em testemunhas e em documentos que pretendem convencer de um valor que é contraditado por outros relatórios e não surgem elementos que façam acreditar que os valores pretendidos pelo recorrente é que estão certos em detrimento dos valores a que o Tribunal atendeu, que confrontou e conjugou com vários elementos.
    Remetemo-nos, ainda aqui, para a explicação circunstanciada do Colectivo de juízes que procedeu o julgamento da matéria de facto.
    
    2.15. Quanto aos quesitos 41.º a e 43.º da base instrutória - "Provado que no dia 2 de Abril de 1992, o F adquiriu a quota da sócia "O Ltd." e que "no dia 08 de Abril de 1992, o F aceitou a nomeação para o cargo de director da 1ª Ré", entende o Recorrente que, em coerência com o acima exposto sob o ponto 2.2., para onde, nesta sede, expressamente se remete, o Tribunal a quo não podia dar como provadas as datas em que F adquiriu a quota de 99% na B, nem a data em que aceitou a nomeação para o cargo de administrador.
    Com efeito, tal como acima referido, em relação aos actos em referência aquisição da qualidade de sócio e nomeação para o cargo de administrador da sociedade -, o registo não é constitutivo de direitos, visando apenas conferir publicidade a tais actos.
    Nada impede - como não impediu - F de se apresentar e de actuar já aos olhos de todos como "dono" e legítimo representante da B Investment Company Limited, a 1ª Ré, mesmo antes de tais factos se encontrarem inscritos no registo.
    Pelo exposto, entende o Recorrente que tais factos devem continuar a ser dados como provados, eliminando-se, no entanto, as datas de aquisição da qualidade de sócio e de nomeação para o cargo de administrador, respectivamente.
    Assim, analisada e impugnada a matéria de facto, dada como não provada e provada, nos termos definidos pelo art. 599.°, requer o Recorrente a V. Ex.ªs que seja ordenada a sua modificação em conformidade.
    As alterações à matéria de facto nos termos acima expostos são fundamentais e impõem necessariamente uma alteração no sentido da decisão recorrida, devendo impor a sua revogação.
    
    Também não assiste neste segmento da matéria de facto razão ao recorrente. O Tribunal baseou-se no Registo comercial e é a partir dessa data que se deve ter F como director daquela C.ª
    Esse facto é indesmentível e não é verdade que, no ordenamento da RAEM, o registo comercial, contrariamente ao que acontece no Registo Predial, em relação a muitos actos assume natureza constitutiva5.
    O certo é que mesmo esse facto perde relevância, pois, sendo ou não sendo constitutivo (estaremos perante uma Sociedade comercial constituída e submetida ao regime do Exterior), ainda que o registo daquela sociedade não seja constitutivo de direitos, o que importa, mesmo na tese do A., não é a situação jurídica em que terá actuado, pelo que o facto formalmente comprovado, não belisca uma actuação representativa que aquele F poderia ter desenvolvido, mas que, todavia, não se tem por comprovada.
    
    3. Considerando que o recorrente não logrou obter êxito quanto à impugnação da matéria de facto não há fundamento para dar outra solução à matéria de direito.
    Donde, sem necessidade de outros desenvolvimentos, sermos a sufragar o que doutamente decidido foi e que passamos a transcrever:
    
    “Pela presente acção pretende o Autor que seja declarado resolvido o contrato promessa alegadamente celebrado entre este e a 1ª Ré e que esta Ré seja condenada a pagar ao Autor a quontia de HKD186.670.000,00, acrescida dos respectivos juros de mora.
    Mais pede que sejam declaradas nulas as transmissões sucessivas feitas pela 1ª Ré à 2ª Ré e esta à 3ª Ré de um prédio de que a 1ª Ré era proprietária e cancelados os registos feitos com base nestes negócios.
    Para o efeito deste segundo pedido, alega que os negócios em questão eram simulados porque nem a 1ª Ré quisera vender à 2ª Ré que também não quisera comprar o imóvel nem esta quisera depois vender o imóvel à 3ª Ré que também não quisera comprá-lo e as declarações de compra e venda emitidas destinavam-se a enganar o Autor.
    Subsidiariamente a este segundo pedido, impugna as referidas transmissões por ser credor da 1ª Ré, crédito este resultante do alegado contrato-promessa celebrado entre o Autor e a 1ª Ré e anterior às transmissões as quais tornaram impossível a satisfação integral do seu crédito.
*
Resolução do contrato
Como foi referido, o Autor pede, em primeiro lugar, a declaração de resolução do contrato-promessa que alega ter celebrado com a 1ª Ré por entender que esta deixou de o cumprir.
No que a esse pedido diz respeito, alega que celebrou o referido contrato com a 1ª Ré apesar de constar do contrato que era promitente vendedor F, administrador e sócio maioritário, detentor de 99% do capital social, da 1ª Ré. Defende que F interveio na celebração do referido contrato bem como no recebimento da primeira prestação paga pelo Autor na quolidade de representante da 1ª Ré sendo esta vontade real daquele. Da mesma forma, a vontade real do Autor era celebrar o contrato com a 1ª Ré e não com F.
Feito o julgamento da matéria de facto, provou-se apenas que, em 8 de Janeiro de 1992, data de celebração do contrato junto a fls. 14 a 16, o Autor entregou a primeira prestação do preço, no montante de HKD$97.335.000,00 a F que é sócio maioritário, detentor de 99% do capital social, da 1ª Ré, desde 2 de Abril de 1992.
Não conseguiu o Autor provar os restantes factos por si alegados para sustentar que a 1ª Ré era promitente vendedora do alegado contrato-promessa e não F como literalmente consta do contrato junto a fls. 14 a 16. Com efeito, não ficou provado que F interveio assinando o contrato e recebendo a primeira prestação paga pelo Autor na quolidade de representante da 1ª Ré.
Uma vez que o primeiro pedido formulado pelo Autor pressupõe a efectiva celebração do alegado contrato-promessa entre este e a 1ª Ré, afastado este facto, nada resta senão julgar improcedente este mesmo pedido.
*
    Simulação
    Defende o Autor que as duas transmissões sub judice eram negócios simulados porque as 1ª e 2ª Rés nunca quiseram vender o imóvel nem as 2ª e 3ª Rés alguma vez quiseram comprá-lo, nem aquelas pagaram nem estas receberam qualquer preço pelas compras e vendas impugnadas, tendo apenas emitidos as respectivas declarações de vontade para enganar terceiros designadamente o Autor.
    Nos termos do artigo 232º do CC “1. Se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado. 2. O negócio simulado nulo.”
    Porém, da matéria assente não consta os factos alegados pelo Autor para sustentar esse entendimento.
    Assim, sem necessidade de mais considerações improcede o pedido formulado com base na simulação dos negócios jurídicos impugnados.
*
    Impugnação pauliana
    Como foi já referido no início, o Autor impugna as duas transmissões feitas entre as Rés invocando a sua quolidade de credor da 1ª Ré bem como outros factos relacionados com os requisitos legais previstos para o instituto da impugnação pauliana.
    Dispõe o artigo 605º do CC que “Os actos que envolvam diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de natureza pessoal podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as circunstâncias seguintes: a) Ser o crédito anterior ao acto ou, sendo posterior, ter sido o acto realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor; b) Resultar do acto a impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação integral do seu crédito, ou agravamento dessa impossibilidade.”
    Além disso, estipula o artigo 607º do CC que “1. O Acto oneroso só está sujeito à impugnação pauliana se o devedor e o terceiro tiverem agido de má fé; se o acto for gratuito, a impugnação procede, ainda que um e outro agissem de boa fé. 2. Entende-se por má fé a consciência do prejuízo que o acto causa ao credor.”
    Relativamente às transmissões onerosas efectuadas posteriormente, é ainda exigido que nessas transmissões haja má fé do primeiro adquirente, transmitente na segunda transmissão, e dos subsequentes adquirentes (cfr. artigo 609º, nº 1, nº b), do CC).
    Portanto, são requisitos da impugnação deduzida: 1) crédito do Autor; 2) anterioridade do crédito ou a fraude preordenada; 3) acto lesivo da garantia patrimonial praticado pela 1ª Ré; e 4) má fé das Rés nos actos se os mesmos forem onerosos.
    Urge, portanto, analisar se estão verificados esses pressupostos para a almejada impugnação.
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Crédito do Autor
Funda o Autor o seu crédito no facto de ter celebrado com a 1ª Ré um contrato-promessa em que esta prometera vender-lhe determinadas fracções autónomas e em virtude do qual o Autor pagou determinada quontia sem que a 1ª Ré tivesse cumprido a promessa.
    Como foi referido, não logrou o Autor provar que celebrara algum contrato-promessa com a 1ª Ré nos termos invocados.
    Pelo que, por não estar provado o alegado contrato-promessa, fica precludida a necessidade de mais detalhada análise sobre a existência ou não de qualquer direito de crédito na sua esfera jurídica e sobre os demais requisitos da impugnação pauliana. É, portanto, de julgar improcedente o pedido subsidiário.
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Pacto comissório
    Na sequência do exposto, é de julgar improcedente a presente acção.
    Convém, porém, anotar que consta dos factos assentes matéria que indicia a existência um outro vício capaz de tornar nulas as transmissões impugnadas. Uma vez que “A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal” (cfr. artigo 279º do CC), urge analisar essa matéria.
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    Ora, o que está agora em causa é o facto de o bem alienado ter sido objecto de hipoteca para garantir o pagamento da dívida que a 1ª Ré tinha perante a 2ª Ré, dívida esta posteriormente considerada satisfeita com a transmissão do mesmo bem à 2ª Ré.
    Nos termos do artigo 694º do CC, “É nula, mesmo que seja anterior ou posterior à constituição da hipoteca, a convenção pela quol o credor faz sua a coisa onerada no caso de o devedor não cumprir.”
    Conforme Pires de Lima e Antunes Varela,6 essa “… proibição aparece na generalidade das legislações e funda-se no prejuízo que do pacto comissório pode resultar para o devedor, que seria facilmente convencido, dado o seu estado de necessidade, a aceitar cláusulas lesivas dos seus interesses. O fundamento é paralelo ao da proibição da usura.”
    Em semelhantes termos foi também sustentado o mesmo no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça português, de 30 de Janeiro de 2003,7 segundo o qual “A lei procura valer à parte aparentemente em estado de debilidade, que pode ser levada a aceitar cláusulas lesivas dos seus interesses.”
    A propósito dos negócios usurários, dispõe o artigo 275º, nº 1, do CC que “É anulável, por usura, o negócio jurídico, quando alguém, aproveitando conscientemente a situação de necessidade, inépcia, inexperiência, ligeireza, relação de dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de benefícios que, atendendo às circunstâncias do caso, sejam manifestamente excessivos ou injustificados.” (sublinhado nosso).
    Sendo esse o fundamento da norma do artigo 694º do CC, julga-se que a nulidade só se afirma se realmente houve aproveitamento do estado de fraqueza da 1ª Ré, aproveitamento este traduzido na sujeição da 1ª Ré a sacrifícios excessivos ou injustificados eventualmente em vista de uma qualquer vantagem concedida pela 2ª Ré.
    Assim, a correcta interpretação e aplicação da norma passa pela seguinte análise: existência ou não de qualquer benefício e/ou sacrifício quando a 1ª Ré aceitou e decidiu abrir mão do bem hipotecado em vez de pagar em dinheiro a dívida e os respectivos juros e comparação entre o benefício obtido e o sacrifício tido.
    No que ao benefício se refere, constata-se que a mesma só pode consistir na dilação do prazo de pagamento inicial de 30 meses, contado a partir de 2 de Abril de 1992, para 29 de Outubro de 1994 e 2 de Dezembro de 1994 respectivamente. O sacrifício é inequivocamente o prejuízo que a 1ª Ré eventualmente teve ao substituir o pagamento da dívida em dinheiro com a transmissão do bem hipotecado. Questão é saber como apurar se houve prejuízo para a 1ª Ré.
    Em declaração de voto vencido emitido no Acórdão acima referido, sustenta o Conselheiro Quirino Soares que “Isto é tudo menos pacto comissório, cuja proibição tem como razão de ser a protecção do devedor contra a sua própria fraqueza, deixando ir pelo valor da dívida um bem que poderá valer muito mais.” (sublinhado nosso).
    Segundo o Acórdão do mesmo Tribunal Superior de Justiça, de 7 de Maio de 2009,8 “A razão de ser da proibição legal do pacto comissório, consagrada pelas disposições legais acabadas de citar, reside na tutela do devedor, colocado em estado de debilidade ou de necessidade, perante as pressões do credor e, igualmente, na protecção de terceiros credores, não se permitindo que o credor fique com a coisa empenhada, sem avaliação ou mediante uma avaliação por ele efectuada, mesmo que exista convenção nesse sentido.” (sublinhado nosso).
    Conforme Vaz Serra, fazendo referência ao Código de Seabra,9 “O nosso Código, como outros, não consente que o credor, mesmo que tal se convencione, fique com a coisa empenhada em pagamento do seu crédito, sem avaliação ou por avaliação por ele feita.”
    Retomando os dados assentes, verifica-se que em 2 de Abril de 1992, a 1ª Ré confessou que devia à 2ª Ré HK$243.000.000,00, e obrigou-se a pagá-la escalonadamente durante 30 meses a contar a partir da data da escritura pública de reconhecimento desta dívida, isto é, até 2 de Outubro de 1994. Uma vez que as 1ª e 2ª Rés acordaram que os juros de mora pelo não pagamento nos termos fixados nessa escritura pública eram calculados à taxa anual de 14.4% (cfr. cópia da escritura junta a fls 65 a 68v), à data em que o bem foi transmitido à 2ª Ré (30 de Outubro de 2003), a dívida atingiu, pelo menos, HK$560.612317,81 [HK$243.000.000,00 + (HK$243.000.000,00 x 14.4% x 9 anos e 28 dias)].
    Por outro lado, consta dos autos a fls 432 a 439 e 962 a 965 três avaliações do bem alienado feitas respectivamente em 30 de Agosto de 2002 pela Companhia de Investimento e Fomento Predial N (Macau) SARL a pedido da 2ª Ré, em 30 de Julho de 2002, pela K Lda. a pedido do S SARL e em 12 de Outubro de 2001, também pela K Lda. a pedido da 1ª Ré tendo a primeira avaliação atribuído o valor de HK$49.238.000,00 ao bem alienado, a segunda avaliação o valor de MOP$60.000.000,00 e a terceira avaliação o valor de HK$500.000.000,00. A isso acresce que conforme a avaliação feita pela Direcção dos Serviços de Finanças, entre Outubro e Dezembro de 2003, para efeitos da determinação do imposto de selo devido pela primeira transmissão, o valor do imóvel era de MOP$63.000.000,00 (cfr. documentos juntos a fls 134, 135 e 829 a 852). Além disso tudo, na fase de julgamento da matéria de facto, o tribunal não deu como provado que, à data das duas transmissões impugnadas, o valor de mercado do imóvel atingia, a quontia de, pelo menos, MOP$300.000.000,00.
    Desses dados conclui-se que, à data da primeira transmissão, o valor do bem alienado era muito inferior ao valor da dívida. Não se pode, por conseguinte, dizer que a 1ª Ré teve prejuízo ao optar por pagar a dívida através da transmissão do bem hipotecado em troca da dilação acima referida e, muito menos, que a 1ª Ré teve um prejuízo excessivo ou injustificado face ao benefício obtido.
    Ora, cessada a razão da lei, cessa a própria lei. Pelo que, a primeira transmissão não é nula nos termos do artigo 690º do CC.
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    Por todo o expendido, improcedem os pedidos do Autor.”
    
    4. Assim e em resumo:
    Por que não se comprovou que a Ré B Investement Company, Ltd., B有限公司, tenha prometido vender o que quer que fosse ao A. não tem ela de ser condenada a pagar a quantia pecuniária de HKD$186.670,00, acrescida de juros de mora legais, vencidos e vincendos, conforme peticionado.
    Também não faz sentido, não se modificando a matéria de facto nem alterando o sentido de algum ou alguns dos quesitos -, também não haverá lugar, como é evidente, a uma resolução de um contrato que não foi feito com a 1.ª Ré.
    Não só não há lugar a qualquer resolução do contrato, pela razão simples de que o contrato que se pretende resolvido não foi celebrado entre aquelas partes: A e 1.ª Ré, e, consequentemente, não lhe assiste o direito de peticionar o dobro do sinal junto da 1.ª Ré, prestado em 8 de Janeiro de 1992, em consequência dessa pretensa resolução..
    Resta ao Autor demandar quem deve ser demandado, nomeadamente para efeitos de responsabilidade contratual pelo incumprimento do contrato prometido pelo real promitente.
    Não deixamos, contudo, de completar e integrar a argumentação aduzida na douta sentença, nos termos adiante explicitados

5. Da oponibilidade/vinculação da 1ª Ré ao contrato-promessa celebrado em 8 de Janeiro de 1992. Representação sem poderes e ratificação do negócio
    Vem o recorrente, levantar uma questão que eventualmente não deixaria de ser muito pertinente - a alegarem-se e provarem-se os respectivos requisitos - e mui doutamente vem suscitar:
    Diz ter ficado provado, por outro lado, que o ora representante da 1ª Ré teria sido nomeado administrador e sócio maioritário em 2 de Abril de 1992 (resposta do Tribunal Colectivo ao quesito 5° da base instrutória).
    Acontece que o Autor confiou (boa fé subjectiva e objectiva) que F, era já representante legal e/ou administrador e/ou procurador da 1ª Ré, aquando da celebração do contrato-promessa.
    De facto, conforme consta de fls. 794 a 796 dos autos, F, F assinara já em 18 de Março de 1992 em representação da 1ª Ré B有限公司, em que também interveio a 2ª Ré D有限公司, um contrato de Desenvolvimento e Cooperação relativo ao lote de terreno objecto dos presentes autos, tudo isto antes de F, F, ter registado a sua qualidade de sócio maioritário e de administrador da 1ª Ré/Recorrida, B有限公司.
    Ora o número 2 do artigo 261.° do Código Civil de 1999 de Macau prevê que, quanto à representação sem poderes, os negócios jurídicos celebrados nestas circunstâncias não serão ineficazes.
    Ainda que F (F) tivesse celebrado com o Autor o contrato-promessa do imóvel especificado na Alínea A) dos factos assentes antes de ser administrador e sócio maioritário da 1ª Ré, atenta a prova documental junta aos autos acima mencionada, a 1ª R. "conscientemente contribuiu para fundar a confiança do terceiro", ora o Autor e aqui Recorrente, "na legitimidade do representante", o F, F, enquanto representante da 1ª Ré.
    Como acima mencionado no recurso sobre a matéria de facto, consta de prova documental cuja veracidade nunca foi posta em causa, que F, F, previamente à data em que a sua nomeação como sócio e administrador foi levada a registo, já assinava documentos em representação e vinculação da 1ª Ré (acordo de cooperação com a 2ª Ré, subscrevia livranças, foram passados pela 2ª Ré cheques em seu nome quanto a empréstimos da responsabilidade da 1ª Ré) .
    Pelo que, em relação à representada, a 1ª Ré, O contrato-promessa celebrado na pessoa de F, F, deverá ser declarado eficaz e oponível sem necessidade de ratificação.
    O Autor e ora Recorrente sempre actuou de boa fé (ética e psicológica, ou objectiva e subjectiva), tendo pago o valor do (avultado) sinal convencionado e na expectativa do cumprimento do contrato (cfr resposta ao quesito 16.°).
    Sendo claro que, quer antes, quer depois de Abril de 1992, F, F, sempre actuou e foi considerado por todos como legítimo representante da 1ª Ré, o contrato-promessa e o negócio jurídico celebrado entre este último (representando ala Ré) e o Autor é válido, eficaz e o incumprimento da promessa deve ser imputado na esfera jurídica da sociedade B有限公司, ora 1ª Recorrida.
    Termos em que se requer que o negócio jurídico celebrado em 8 de Janeiro de 1992 entre o Autor e F, F, administrador e representante da 1ª Ré, seja oponível a esta Ré, sendo a mesma condenada no pagamento do sinal em dobro, por incumprimento culposo do contrato promessa.
    Mas ainda que assim não se entenda, hipótese que uma vez mais apenas cautelarmente e por dever de patrocínio se pondera, sem conceder - tendo em conta que a partir de Abril de 1992, F (F) passa a estar registado como sócio de 99% do capital social da 1ª Ré e administrador da mesma, então dúvidas não existem que a partir de então houve uma clara ratificação do negócio por parte da B, a 1ª Ré, na medida em que passa a haver uma total confusão entre a mesma e o seu representante legal e sócio F (F).
    
    Não tem razão o recorrente, pela razão simples de que esta tese, invocada com muita argúcia, pelo recorrente descreve uma realidade nova que vai ao arrepio daquilo que ele defendeu nos autos.
    A tese defendida na petição foi a de que a promitente vendedora foi a Ré, estando representada pelo F. Não diz que este agiu sem poderes representativos ou que agiu de tal forma que, pelas circunstâncias objectivas se poderia depreender que estaria a agir com poderes da 1.ª Ré, assim se preenchendo o número 2 do artigo 261.° do Código Civil de 1999 de Macau prevê que, quanto à representação sem poderes, os negócios jurídicos celebrados nestas circunstâncias não serão ineficazes se:
    "Contudo, o negócio celebrado por representante sem poderes é eficaz em relação ao representado, independente de ratificação, se tiverem existido razões ponderosas, objectivamente apreciadas, tendo em conta as circunstâncias do caso, que justificassem a confiança do terceiro de boa fé na legitimidade do representante, desde que o representado tenha conscientemente contribuído para fundar a confiança do terceiro.".
    Não pode agora o recorrente, nesta fase do processo, em recurso, proceder a uma alteração do pedido - pede agora o reconhecimento de uma ratificação que não pediu anteriormente - e da causa de pedir - vem agora defender que houve um contrato sem representação, quando anteriormente dizia que havia uma representação, tudo isto sem que demande o suposto representante, sem que se comprovem, aliás, os requisitos relativos à confiança do terceiro de boa fé e especialmente sem comprovar que a representada de alguma forma tenha contribuído para fundar essa confiança, em qualquer expectativa que tenha ciado, não tendo havido entre eles qualquer contacto ou indicação nesse sentido, pois toda a negociação foi feita entre o Autor e o co-contratante que sempre se assumiu como dono do negócio.
    Com todo o respeito, mas isto não pode ser; seria subverter as regras do jogo.
    
    Muito menos atingimos o que se pretende com uma suposta ratificação do negócio com a aquisição de 99% do capital, na medida em que pretender por essa via, pela aquisição daquela maioria, quase a totalidade do capital, não só isso não implica que daí se retire qualquer ratificação, como sempre estamos perante pessoas jurídicas diferentes, sendo que a vontade negocial de uma não vincula a vontade negocial de outra.
    Na verdade, bem podia F, enquanto não sócio, pretender comprar o imóvel e já o não pretender enquanto sócio maioritário da empresa.

6. Da verificação dos pressupostos da Impugnação Pauliana
    Acresce que, ao contrário do consta na sentença recorrida, entende o Recorrente que, nos termos e para os efeitos do previsto nos artigos 605.°, 607.°, 609.° e 612.° do CC, se encontram verificados os pressupostos da Impugnação Pauliana, a saber:
    - o crédito do Autor é anterior aos negócios e transmissões realizadas entre as 1ª, 2ª e 3ª Rés;
    - verificação e prática de actos lesivos e impossibilidade para o Autor (credor) de obter a satisfação integral do seu crédito, bem como o agravamento dessa impossibilidade (o imóvel era e é o único bem da 1ª Ré);
    
    Também nesta pretensão falece razão ao recorrente.
    Na verdade, não se comprovando que contratou com a 1.ª Ré não lhe assiste um direito de crédito sobre ela, ruindo por aí a pretensão de impugnação pauliana.
    Não se deixa de observar que o recorrente continua a bater-se por um outro valor diferente do que vem fixado, que, como vimos, não se mostra abalado. Trata-se, contudo, de matéria que deixa de interessar e prejudicada se mostra a partir do momento em que não se comprova que o contrato promessa foi celebrado com a alienante no negócio que se pretende impugnar.

7. Da nulidade da transmissão do imóvel por violação do pacto comissório
    Defende o A, que nestes autos, verifica-se nulidade da transmissão do imóvel da 1ª Ré para a 2ª Ré/Recorrida, pela violação do Pacto Comissório (nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 690.° do CC).
    Nos termos do artigo 690° do CC:
    "É nula, mesmo que seja anterior ou posterior à hipoteca, a convenção pela qual o credor faz a coisa onerada no caso de o devedor não cumprir.";
    Como refere, a 1ª Ré constituiu uma hipoteca a favor da 2ª Ré para o reembolso do empréstimo por aquela a favor desta no valor de HKD$243.000.000,00 - alínea C) dos factos assentes, tendo a 2ª Ré, no uso de uma procuração irrevogável, feito seu o imóvel em 30 de Outubro de 2003, pelo valor de MOP$52.118,000,00 - resposta ao quesito 51.° da base instrutória.
    Sem qualquer prévia consulta da 1ª Ré, a 2ª Ré fez sua a coisa onerada com direito de hipoteca.
    Sobre esta matéria, remetemo-nos para o que doutamente ficou exarado na douta sentença, tal como já acima transcrito.
    
    O recorrente deixa de ter razão na sua argumentação, pela razão simples de que não logrou comprovar o valor do imóvel, tal como pretendia.
    
    Contrariamente ao por si afirmado, não se comprova igualmente que a dilação no pagamento facultado pela 2ª Ré à 1ª Ré para pagamento do empréstimo tenha sido obtido claramente de uma forma usurária, aproveitando uma situação de dependência, ligeireza, enfraquecimento e de fraqueza da 1ª Ré para com a 2ª Ré, tendo esta obtido o registo de uma hipoteca em seu favor sobre o imóvel e feito do imóvel coisa sua, um bem onerado, no montante de MOP$52.118.000,00, resultando num benefício claramente injustificado e excessivo em favor da 2ª Ré, em detrimento do Autor (e mesmo da 1ª Ré).
    A questão do valor dos juros que devia ser pago não deixa também, contrariamente ao pretendido, alguma relevância, não se deixando de dever levar em conta esses valores que, naturalmente, traduziriam um encargo para a 1.Ré, que teria de pagar capital e juros, pelo que esse valor global não deve ser desprezado na ponderação do real prejuízo com a alienação e que não deixa de estar subjacente à ratio da invalidade absoluta prevista na lei.
    Para além de que não temos por seguro que, sem outros elementos que se esteja, sem mais, perante um negócio usurário quando se outorga uma procuração irrevogável para negócio consigo mesmo com plenos poderes para o credor hipotecário vender ou prometer vender a si ou a quem entender, pelo preço e demais condições que entender. É que o que se proíbe, face ao disposto no art. 690.º do CC, é a cláusula que permita essa alienação no caso de o devedor não cumprir. A ratio do artigo é plúrima e complexa. A proibição do pacto comissório funda-se no prejuízo que pode resultar para o devedor, que seria facilmente convencido, dado o seu estado de necessidade, a aceitar cláusulas lesivas dos seus interesses. Sem dúvida que na sua génese não deixa de estar o propósito de proteger o devedor da possível extorsão do credor, mas a por outro lado, a procuração irrevogável não deixa de estar ligada a um contrato que constitui “a relação subjacente” que não deixa de ter vida própria e autonomia em relação àquele propósito.10 (Neste acórdão que se vem de citar, ainda que provado o iter usurário, abrem-se as portas exactamente a que assim possa não acontecer).
    Sem dúvida que um negócio desse teor pode muito bem camuflar um negócio de cariz usurário e traduzir encapotadamente um pacto comissório proibido nos termos do art. 690.º. Mas como pode, também pode tal não acontecer e o negócio ter uma justificação autónoma que não passa necessariamente pela satisfação nua e crua da satisfação do crédito.
    Acresce que o que é ferido de nulidade é a referida cláusula. A alienação da coisa hipotecada, nomeadamente por dação em pagamento ao credor, vencido o crédito hipotecário, não está vedado por lei. Por exemplo, como já se decidiu, acontecendo o não cumprimento da obrigação pelo devedor, o credor pode fazer seu o depósito bancário empenhado, no sentido de se cobrar pelo valor deste, não com base na existência de um pacto comissório, atendendo à sua manifesta nulidade, mas antes pela via da compensação.11
    No caso, observa-se que logo em 1994 a 1.ª ré devia ter pago um montante de cerca de MOP 250.000.000,00; só em 2002 a escritura vem a ser celebrada, donde, ainda por aí, não se poder ter como absoluta relação causa-efeito, a tomada do imóvel em execução do compromisso da entrega da coisa pela dívida.
    No fundo, a razão ínsita na norma traduz-se nesta postura por parte do credor beneficiário: “se não pagas, fico com a coisa hipotecada”. Essa razão deixará de existir se o devedor acorda na alienação, ainda que se assuma aí que, por via desse compromisso, se reforça acrescidamente a garantia do pagamento da sua dívida. Ora, se assim é, como se pode defender que estamos perante uma situação de manifesta inferioridade do devedor se, no caso sub judice, nem o credor nem o devedor corroboram tal tese? Seria atrevimento pretender comprovar uma viciação da liberdade negocial quando nenhuma das partes directamente interessadas configura sequer essa possibilidade.
    Pelas razões e fundamentos expostos o recurso não deixará de improceder.
    
    IV - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
    Custas pela recorrente.
Macau, 3 de Março de 2016,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho


1 Castro Mendes, TGDC, II, AAFDL, 1995, 313.

2 - vd. Tratado de Direito Civil Português, I Parte Geral, Tomo I, Almedina, 1999, 575 -
3 - Joana Vasconcelos, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica Editora, 2014, 498).
4 - Carvalho Fernandes , Teoria Geral do Direito Civil, II, Universidade Católica Editora, 2001, 24).

5 - Vicente Monteiro, Direito Registral, FRC, 47
6 Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., pg 718.
7 http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/eb01e7581a59cb5b80256cef003d57 48?OpenDocument&Highlight=0,pacto,comiss%C3%B3rio,hipoteca
8 http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/85d678be294a8c34802575be00358 ae4?OpenDocument&Highlight=0,pacto,comiss%C3%B3rio,hipoteca
9 Vaz Serra, BMJ, 58, PG 217.
10 - Ac. STJ, de 21/12/2005, Proc. n.º 04B4479
11 - Ac. STJ, de 7/5/2009, Proc. n.º 3116/06TVLSB
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