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Processo n.º 1070/2015 Data do acórdão: 2016-1-28 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– crime de passagem de moeda falsa
– uso de cartões de crédito falsos
– medida da pena
S U M Á R I O
Como os dois arguidos recorrentes têm sensivelmente as mesmas circunstâncias favoráveis (confissão integral e sem reservas dos factos imputados e inexistência de antecedentes criminais em Macau) e desfavoráveis (pertença a um mesmo grupo transnacional de falsificação de cartões de crédito, e vinda para Macau para praticar condutas de passagem de cartões de crédito falsos) à medida da pena dos seus crimes de passagem de moeda falsa, a justa medida das penas de ambos deve ser feita em função sobretudo dos valores pecuniários das transacções dos cartões de crédito falsos em questão.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 1070/2015
(Autos de recurso penal)
Recorrentes: 1.º arguido BBB
2.º arguido CCC






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Por acordão proferido a fls. 534 a 543v dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR2-15-0185-PCC do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, o 1.º arguido BBB e o 2.º arguido CCC, aí já melhor identificados, foram condenados de seguinte maneira:
– o 1.º arguido, pela autoria material, de quatro crimes consumados de passagem de moeda falsa (cartão de crédito), p. e p., conjugadamente, pelos art.os 255.º, n.º 1, alínea a), e 257.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal (CP), em um ano, um ano e nove meses, um ano e um ano de prisão por cada, e de dois crimes tentados desse mesmo tipo legal, em sete meses e um ano e três meses de prisão por cada, e finalmente, em cúmulo jurídico dessas seis penas parcelares, na pena única de três anos e nove meses de prisão;
– o 2.º arguido, pela autoria material, de sete crimes consumados do mesmo tipo legal de passagem de moeda falsa (cartão de crédito), em um ano, um ano, um ano, um ano, um ano, um ano e um ano e seis meses de prisão por cada, e de um crime tentado desse mesmo tipo legal, em sete meses de prisão, e finalmente, em cúmulo jurídico dessas oito penas parcelares, na pena única de três anos e nove meses de prisão.
Inconformados, vieram os dois arguidos recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI).
O 1.º arguido alega que a medida da pena dos seus diversos crimes tem que ser feita em função sobretudo da consideração dos valores pecuniários concretos em questão nas respectivas condutas delituosas, pelo que pede que passe a ser punido com prisão inferior a seis meses em cada um dos dois desses crimes dele em que estavam em causa apenas MOP212,00 e MOP141,00, e com prisão inferior a nove meses num outro dos crimes seus em que estava em causa somente MOP7.000,00, de maneira que passe a ser punido, finalmente, em cúmulo jurídico, com pena de prisão única inferior a três anos, com também pretendida suspensão da execução da pena, tendo em conta que ele é delinquente primário, confessou integralmente e sem reservas os factos imputados, já sentiu remorso da prática dos factos, promete que não irá voltar a cometer crime, precisa de sustentar os pais e a avó, e quer regressar de imediato à Malásia para poder cuidar dos seus pais (cfr. com mais detalhes, a motivação do recurso apresentada a fls. 575 a 578 dos presentes autos correspondentes).
O 2.º arguido pede que passe a ser punido com pena única inferior a três anos de prisão, com também almejada suspensão da execução da prisão, alegando que a justa medida da pena tem que levar em consideração que ele já confessou integralmente e sem reservas os factos imputados e demonstrou arrependimento na audiência de julgamento, é delinquente primário, tem a mãe e uma irmã mais nova a seu cargo, tinha dificuldades económicas no momento da prática dos crimes, porque a sua mãe se encontrava muito doente devido à doença cardíaca (cfr. com mais detalhes, a motivação do recurso apresentada a fls. 557 a 561 dos autos).
Aos recursos respondeu a Digna Delegada do Procurador no sentido de improcedência da argumentação dos dois arguidos (cfr. a resposta una de fls. 582 a 584v).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 598 a 599v), pugnando também pela manutenção do julgado.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como não vem impugnada a matéria de facto já descrita como provada nas páginas 9 a 15 do texto do recorrido acórdão de 23 de Outubro de 2015 (ora a fls. 538 a 541 dos autos, cujo teor se dá por aqui integralmente reproduzido) e sendo o objecto dos dois recursos em questão circunscrito tão-só à problemática da medida da pena, é de tomar tal factualidade provada como fundamentação fáctica da presente decisão de recurso, nos termos permitidos pelo art.º 631.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, ex vi do art.º 4.º do Código de Processo Penal (CPP).
Dessa factualidade provada, sabe-se, em especial, o seguinte:
– os dois arguidos ora recorrentes foram recrutados por um grupo transnacional de falsificação de cartões de crédito, para eles fazer compras com uso de cartões de crédito falsificados, e depois entregar ao grupo os objectos assim comprados, obtendo eles 8 a 10% do valor pecuniário das compras como recompensa;
– assim, em 12 de Dezembro de 2014, os dois arguidos partiram, primeiro por avião, da Malásia para Hong Kong, e depois, apanharam barco de Hong Kong para Macau, tendo chegado a Macau cerca das três horas e tal da tarde do mesmo dia, e a partir de então, começaram a proceder ao uso de cartões de crédito falsificados que trouxeram, para fazer compras ou adquirir serviços em diversos estabelecimentos comerciais de Macau;
– nas já provadas condutas de uso de cartões de crédito falsificados praticadas pelo 1.º arguido BBB, estão em causa os seguintes valores pecuniários de transacção:
– (crime consumado) MOP212,00;
– (crime consumado) MOP30.500,00;
– (crime consumado) MOP7.000,00
– (crime consumado) MOP141,00;
– (crime tentado) MOP38.800,00;
– (crime tentado, na compra de dois cintos) valor não apurado;
– nas já provadas condutas de uso de cartões de crédito falsificados praticadas pelo 2.º arguido CCC, estão em causa os seguintes valores pecuniários de transacção:
– (crime consumado) MOP198,00;
– (crime consumado) MOP93,00;
– (crime consumado) MOP500,00;
– (crime consumado) MOP8.920,00;
– (crime consumado) MOP162,00;
– (crime consumado) MOP548,00;
– (crime consumado) MOP17.038,00;
– (crime tentado, na compra de dois cintos) valor não apurado;
– os dois arguidos não têm antecedentes criminais em Macau;
– o 1.º arguido declarou trabalhar como empregado de venda, com cerca de MOP4.000,00 de rendimento mensal, ter por nível de instrução o 5.º ano do curso secundário, e precisar de sustentar os pais e a avó;
– o 2.º arguido declarou trabalhar como empregado de venda, com cerca de MOP4.000,00 de rendimento mensal, ter por nível de instrução o 5.º ano do curso secundário, e precisar de sustentar a mãe e a irmã mais nova.
Conforme a acta da audiência de julgamento então realizada perante o Tribunal Colectivo recorrido (lavrada a fls. 529 a 531v dos autos), os dois arguidos confessaram integralmente e sem reservas os factos imputados.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cumpre notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Os dois arguidos assacam principalmente à decisão recorrida o excesso na medida da pena.
Pois bem, como os dois arguidos têm sensivelmente as mesmas circunstâncias favoráveis (i.e., confissão integral e sem reservas dos factos imputados e inexistência de antecedentes criminais em Macau) e desfavoráveis (i.e., e em especial, pertença a um mesmo grupo transnacional de falsificação de cartões de crédito, e vinda para Macau para praticar condutas de passagem de cartões de crédito falsos) à medida da pena deles, a justa medida das penas deles deveria ser feita, realmente, em função sobretudo dos valores pecuniários das transacções em questão.
Da análise da fundamentação fáctica e jurídica do acórdão recorrido, resulta que esses valores pecuniários e as penas de prisão dos respectivos crimes são os seguintes:
– no respeitante ao 1.º arguido B:
– (consumado) MOP212,00, 1 ano de prisão;
– (consumado) MOP30.500,00, 1 ano e 9 meses de prisão;
– (consumado) MOP7.000,00, 1 ano de prisão;
– (consumado) MOP141,00, 1 ano de prisão;
– (tentado) MOP38.800,00, 1 ano e 3 meses de prisão;
– (tentado) valor não apurado, 7 meses de prisão
– no tocante ao 2.º arguido C:
– (consumado) MOP198,00, 1 ano de prisão;
– (consumado) MOP93,00, 1 ano de prisão
– (consumado) MOP500,00, 1 ano de prisão;
– (consumado) MOP8.920,00, 1 ano de prisão;
– (consumado) MOP162,00, 1 ano de prisão;
– (consumado) MOP548,00, 1 ano de prisão;
– (consumado) MOP17.038,00, 1 ano e 6 meses de prisão;
– (tentado) valor não apurado, 7 meses de prisão.
Pede o 1.º arguido que a duração das penas de prisão relativas aos crimes consumados com MOP212,00 e MOP141,00 de valores de transacção seja igualmente inferior a seis meses, e que a da prisão do crime consumado com MOP7.000,00 de valor seja inferior a nove meses.
Entretanto, tudo ponderado aos padrões da medida da pena vertidos nos art.os 40.º, n.os 1 e 2, e 65.º, n.os 1 e 2, do CP, afigura-se ao presente Tribunal ad quem que não há injustiça notória por parte do Tribunal recorrido na fixação das penas de prisão daqueles dois crimes consumados com MOP212,00 e MOP141,00 de valores de transacção, dentro da aplicável moldura penal de um mês a cinco anos de prisão (art.os 41.º, n.º 1, e 255.º, n.º 1, alínea a), do CP). E quanto ao crime consumado com MOP7.000,00 de valor de transacção, a pena de um ano de prisão achada no acórdão impugnado já se apresenta benévola, pelo que por força do princípio da proibição da reforma para pior plasmado no art.º 399.º, n.º 1, do CPP, é de manter também esta concreta pena parcelar de prisão.
É, pois, agora altura de aquilatar da justeza das penas únicas de prisão impostas no acórdão recorrido aos dois arguidos.
Ambos os arguidos vêm aí condenados igualmente em três anos e nove meses de prisão única. E pretendem que passem a ser punidos apenas com prisão única inferior a três anos.
Considerados, em conjunto, todos os ingredientes fácticos pertinentes já apurados no acórdão recorrido e a personalidade dos dois arguidos reflectida na prática dos delitos em questão, tudo à luz do art.º 71.º, n.os 1 e 2, do CP, julga-se, por ser mais adequado e equilibrado, que é de punir os dois arguidos igualmente, e tão-só, com dois anos e seis meses de prisão única, prisão essa que não pode ser suspensa na execução, devido às consabidas prementes exigências da prevenção geral do tipo legal dos delitos por eles praticados (cfr. o critério material exigido no art.º 48.º, n.º 1, do CP para efeitos de suspensão ou não da execução da pena de prisão).
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar parcialmente providos os recursos, passando a aplicar aos dois arguidos recorrentes BBB e CCC 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão única efectiva, ficando, pois, intacto todo o restante já decidido no acórdão recorrido.
Os arguidos pagarão metade das custas dos seus recursos, com três UC de taxas de justiça para o 1.º arguido, e duas UC de taxa de justiça para o 2.º arguido. Fixam em duas mil patacas os honorários do Ilustre Defensor Oficioso do 1.º arguido, e em três mil patacas os da Ilustre Defensora Oficiosa do 2.º arguido, pagando cada arguido metade dos honorários do respectivo Defensor, ficando a outra metade a cargo do Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Macau, 28 de Janeiro de 2016.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)



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