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   ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por Acórdão de 14 de Junho de 2007, rejeitou recurso interposto pelo arguido A, da decisão do tribunal de primeira instância que o condenou na pena de 11 (onze) anos de prisão e na multa de MOP$20.000,00 (vinte mil patacas), ou, em alternativa a esta em 132 (cento e trinta e dois) dias de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefaciente, previsto e punível pelo art. 8.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 5/91/M, de 28 de Janeiro.
   Inconformado, interpôs recurso para este Tribunal de Última Instância, formulando as seguintes conclusões:
   1. O recorrente A veio interpor o recurso contra o acórdão do Tribunal de Segunda Instância que, mantendo o acórdão a quo, condenou o recorrente, em autoria e em forma consumada, pela prática de 1 crime de tráfico de drogas previsto e punido pelo disposto do artigo 8.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 5/91/M na pena de 11 anos de prisão efectiva e multa de MOP$20.000;
   2. O recorrente entende que se verifica a questão de direito previsto no artigo 400º n.º 1 do Código de Processo Penal de Macau no douto acórdão do Colectivo do Tribunal de Segunda Instância;
   3. Devido ao erro constante no douto acórdão do Tribunal a quo, o que não só conduziu a pena excessiva, ainda violou o princípio de igualdade no direito;
   4. In casu, a personalidade e a situação económica do recorrente são: não residente de Macau, solteiro, nascido na família com receita baixa, tem o pai a seu encargo.
   5. O recorrente entende que o Colectivo não considerou suficientemente a situação actual do recorrente e determinou uma pena mais grave, razão pela qual, o acórdão violou o previsto do artigo 65.º do Código Penal de Macau.
   6. O recorrente pede que o Tribunal de Última Instância considere prudentemente a situação do recorrente, tanto do âmbito de direito e justiça.(princípio da humanidade) como da posição da humanidade, para que lhe conceda uma oportunidade para a redução da pena.
   Na resposta à motivação do recurso a Ex.ma Procuradora-Adjunta defendeu a rejeição do recurso.
   No seu parecer, a Ex.ma Procuradora-Adjunta manteve a posição assumida na resposta à motivação do recurso.
   
   II – Os factos
   As instâncias consideraram provados e não provados os seguintes factos:
  -- Em 16 de Setembro de 2005, cerca das 5 horas e 32 minutos, o arguido A e o arguido B chegaram ao Aeroporto Internacional de Macau no mesmo voo n.º NX855 procedentes de Manila, Filipinas.
  -- Em 16 de Setembro de 2005, cerca das 6 horas e 20 minutos, agentes da P. J. interceptaram o arguido B à saída da Alfândega de Entrada do aeroporto internacional de Macau e o levaram para o gabinete da P. J. no aeroporto para mais averiguação.
  -- Agentes da P.J. encontraram, numa mala de marca “POLO CAB” na posse do arguido B, uma caixa de papel imprimida com “Pillsbury-Hotcake-Mix”, contendo lá dentro substância branca em pó, uma caixa de papel imprimida com “Maya” contendo lá dentro substância branca em pó, duas caixas de papel com “Quaker” imprimida contendo lá dentro substância branca em pó, duas caixas de papel com “Tang” respectivamente imprimida contendo lá dentro substância branca em pó, uma caixa plástica de Bolo da Lua contendo lá dentro substância branca em pó, uma caixa em metal de Bolo da Lua com caractéres chineses “大榮華雙黃白蓮”imprimidos contendo lá dentro substância branca em pó, uma caixa em metal de Bolo da Lua lá dentro contendo substância branca em pó e uma caixa de papel de Bolo da Lua lá dentro contendo lá dentro substância branca em pó (ver detalhes na fls.9, objectos apreendidos série 1, e fls. 10, auto de apreensão, nos autos).
  -- Além disso, foram encontrados na posse do arguido B, um telefone móvel, uma etiqueta de mala, 3.100,00 pesos filipinos (três mil e cem) e US$100,00 (cem) em dinheiro vivo (ver detalhes na fls.9, objectos apreendidos série 2, nos autos).
  -- Feito o exame laboratorial, foi confirmado que a substância, contida nas caixas de papel imprimidas respectivamente com “Pillsbury-Hotcake-Mix” e “Maya”, com pesos respectivamente de 201,120 e 205,110 gramas, não contém substâncias restringidas legalmente. As duas caixas imprimidas com “Quaker” estão com substâncias brancas em pó com peso total de 1994,690 gramas, contendo Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C, anexa ao Decreto-Lei n.° 5/91/M, de 28 de Janeiro (com a alteração da Lei n.º 4/2001, de 2 de Maio); feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina na substância supra citada é de 81,70%, sendo o peso líquido total de 1629,662 gramas de Ketamina. As substâncias brancas em pó contidas em outras duas caixas imprimidas com “Tang” pesam 2996,960 gramas, contendo a mesma substância de Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C do mesmo Decreto-Lei; feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina na substância supra citada é de 74,90%, sendo o peso líquido total de 2244,723 gramas de Ketamina. A substância branca em pó contida na caixa plástica de Bolo da Lua pesa 104,740 gramas, contendo a substância de Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C do mesmo Decreto-Lei; feito o exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 78,72%, sendo o peso líquido total de 82,451 gramas de Ketamina. A substância branca em pó contida na caixa em metal com caractéres chineses “大榮華雙黃白蓮” imprimidos pesa 120,290 gramas, contendo a substância de Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C do mesmo Decreto-Lei; feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 79,48%, sendo o peso líquido total de 95,606 gramas de Ketamina. A substância branca em pó contida numa outra caixa em metal de Bolo da Lua pesa 109,110 gramas, contendo a substância de Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C do mesmo Decreto-Lei; feito o exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 77,60%, sendo o peso líquido total de 84,669 gramas de Ketamina. A substância branca em pó contida numa caixa de papel de Bolo da Lua pesa 103,530 gramas, contendo a substância de Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C do mesmo Decreto-Lei; feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 74,760%, sendo o peso líquido total de 77,399 gramas de Ketamina.
  -- As drogas supra citadas foram adquiridas em 15 de Setembro de 2005 pelo arguido B a um indivíduo com o sobrenome C, cujos dados pessoais não identificados, em Manila, Filipinas, com o objectivo de levá-las a Taiwan, via Macau, e por fim oferecer a terceiros.
   -- Em 16 de Setembro de 2005, por volta das 7 horas e 50 minutos da tarde, agentes da P.J. interceptaram o arguido A na Alfândega de Saída das Portas do Cerco.
  -- Foram encontrados por agentes da P. J. na mala de marca “ARADISE” do arguido A uma garrafa plástica imprimida com “Doggies Choice” contendo lá dentro substância branca em pó, duas caixas de papel imprimidas com “Arrowhead Mills-Bran Flakes” contendo lá dentro substância branca em pó, duas caixas de papel imprimidas com “Sweetened Mills- Sweetened Shredded Wheat” contendo lá dentro substância branca em pó, um saco plástico imprimido com “Quaker” contendo substância branca em pó, uma caixa de papel de Bolo da Lua contendo lá dentro substância branca em pó e uma caixa em metal de cor vermelha contendo lá dentro substância branca em pó (ver detalhes na fls.22, objectos apreendidos série 3 e na fls.23, auto de apreensão, nos autos).
  -- Além disso, agentes da P.J. encontraram junto ao arguido A 3 telefones móveis, um bilhete de embarque, HKD$600,00(seiscentos), NTW$700,00 (setecentos) e RMB$1.000,00 (mil), todos em dinheiro vivo (ver detalhes na fls.22, objectos apreendidos série 4) .
  -- Feito exame laboratorial, foi confirmada que a substância branca em pó contida na garrafa plástica imprimida com “Doggies Choice”, com peso de 328,110 gramas, contém Ketamina, substância abrangida na Tabele II-C anexa ao Decreto-Lei n.º 5/91/M, de 28 de Janeiro (com a alteração da Lei n.º 4/2001, de 2 de Maio); feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 78,64%, sendo o peso líquido total de 258,026 gramas de Ketamina. A substância branca em pó contida nas duas caixas de papel imprimidas com “Arrowhead Mills-Bran Flakes”, com peso de 1989,680 gramas, contem Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C anexa ao mesmo Decreto-Lei; feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 77,81%, sendo o peso líquido total de 1548,170 gramas de Ketamina. A substância branca em pó nas duas caixas de papel imprimidas com “Arrowhead Mills(sic) --Sweetened Mills- Sweetened Shredded Wheat” , com peso de 1989,990 gramas, contem Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C anexa ao mesmo Decreto-Lei; feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 77,22%, sendo o peso líquido total de 1536,670 gramas de Ketamina. A substância branca em pó contida num saco plástico imprimido com “Quaker”, com peso de 1040,910 gramas, contem Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C anexa ao mesmo Decreto-Lei; feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 74,79%, sendo o peso líquido total de 778,497 gramas de Ketamina. A substância branca em pó contida numa caixa de Bolo da Lua, com o peso de 104,750 gramas, contem Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C anexa ao mesmo Decreto-Lei; feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 77,23%, sendo o peso líquido total de 80,898 gramas de Ketamina. A substância branca em pó contida numa caixa de Bolo da Lua de cor vermelha, com peso de 105,460 gramas, contem Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C anexa ao mesmo Decreto-Lei; feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 76,00%, sendo o peso líquido total de 80,150 gramas de Ketamina. A substância branca em pó contida numa caixa em metal de cor dourada (sic), com peso de 103,240 gramas, contem Ketamina, substância abrangida na Tabela II-C anexa ao mesmo Decreto-Lei; feito exame laboratorial por quantidade determinada, a taxa de Ketamina é de 76,80%, sendo o peso líquido total de 79,288 gramas de Ketamina.
  -- As drogas supra citadas foram adquiridas pelo arguido A em Manila, Filipinas a um indivíduo não identificado, com o objectivo de levá-las e entregar, via Macau, a um terceiro em fronteira Gongbei, da cidade de Zhuhai, com a compensação de saldar uma dívida contraída pelo arguido A no valor de HKD$20.000,00.
  -- Os arguidos B e A sabiam muito bem a natureza e as características das drogas supra citadas.
  -- Os arguidos B e A adquiriram, transportaram e detiveram as drogas supra citadas, não com o objectivo para o consumo pessoal, mas sim, para oferecer a terceiros, a fim de obter ou procurar obter interesses pecuniários ilegítimos.
  -- Os arguidos B e A agiram livre, voluntaria e conscientemente.
  -- Os arguidos B e A tinham perfeito conhecimento que as suas condutas não eram permitidas e punidas por Lei.
  -- O arguido B era operário do estaleiro naval, auferia de NTW$50.000,00 a NTW$60.000 de Taiwan por mês.
  -- Divorciado, tendo três filhos a seu encargo.
  -- Não confessou os factos, é primário.
  -- O arguido A era carpinteiro, auferia de um salário de NTW$50.000,00 a NTW$60.000,00.
  -- Solteiro, tendo os pais a seu encargo.
  -- Não confessou os factos, é primário.
  Os factos não provados: Os factos constantes na acusação, como:
  -- O arguido B cobrou daquele indivíduo com o sobrenome C $5000,00 pesos filipinos como remuneração.
   
   III - O Direito
   1. A questão a resolver
   A questão a resolver é apenas a de saber se a pena aplicada ao recorrente é a legal e justa.
   2. A medida da pena
O recorrente foi condenado na pena de na pena de 11 (onze) anos de prisão e na multa de MOP$20.000,00 (vinte mil patacas), ou, em alternativa a esta em 132 (cento e trinta e dois) dias de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefaciente, previsto e punível pelo art. 8.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 5/91/M.
A substância objecto de tráfico, na modalidade de transporte, pelo arguido, foi Ketamina, com o peso líquido de 4361,70 gramas.
   Não se provaram circunstâncias agravativas nem atenuativas da responsabilidade do arguido.
   O crime pelo qual o arguido foi condenado é cominado com uma pena de prisão de oito a doze anos e com multa de cinco mil a setecentas mil patacas.
   De acordo com o n.º 1 do artigo 65.º do Código Penal a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.
   O Acórdão recorrido reflectiu que o Tribunal goza de alguma liberdade na escolha da pena, dentro dos limites definidos na lei. E é assim, efectivamente.
   Por outro lado, o recorrente não apontou concretamente nenhuma violação judicial concreta, mas apelou apenas para questões de justiça.
   Ora, afigura-se-nos que ao Tribunal de Última de Instância, como Tribunal especialmente vocacionado para controlar a boa aplicação do Direito, não cabe imiscuir-se na fixação da medida concreta da pena, desde que não tenham sido violadas vinculações legais – como por exemplo, a dos limites da penalidade – ou regras da experiência, nem a medida da pena encontrada se revele completamente desproporcionada. É o que defende J. FIGUEIREDO DIAS1.
   Não se mostra que o Acórdão do Tribunal Colectivo de 1.ª Instância ou o Acórdão recorrido tenham violado qualquer norma legal na determinação da medida da pena.
   Por outro lado, atendendo à quantidade traficada, que é substancial para o mercado de droga de Macau, não se pode considerar desproporcionada a fixação da pena de onze anos de prisão e vinte mil patacas de multa, face à moldura da penalidade (entre oito e doze anos de prisão e multa de cinco mil a setecentas mil patacas), na ausência de quaisquer circunstancialismo que atenue a culpa do arguido, para além do facto de ter uma dívida para saldar, que se pode, aliás, considerar relativamente diminuta, face aos seus rendimentos laborais.
   Impõe-se, assim, a rejeição do recurso.
   
   IV – Decisão
   Face ao expendido, rejeitam o recurso por manifesta improcedência.
   Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 5 UC, suportando, ainda, 5 UC pela rejeição.
   Fixam em MOP$1.000,00 (mil patacas) os honorários ao ilustre defensor oficioso do 1.º arguido.
   
   Macau, 10 de Outubro de 2007.
   
   Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) - Sam Hou Fai - Chu Kin
1 J. FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português. Parte Geral II. As Consequências Jurídicas do Crime, Lisboa, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, p. 197.
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12
Processo n.º 33/2007