Processo nº 918/2015
(Autos de recurso laboral)
Data: 10/Dezembro/2015
Assunto: Companhia de Segurança B Limitada
Matéria de facto insuficiente para a procedência do pedido
SUMÁRIO
1. Independentemente de o autor ter ou não razão quanto à questão de saber se, numa relação jurídica laboral, a ré devia ser condenada a pagar-lhe a diferença entre o que a ré pagou ao autor a título do trabalho prestado em dia de descanso semanal determinado pelo “salário de base” e o que a mesma deveria ter pago tendo por base de cálculo a “remuneração de base”, o autor teria que invocar factos relevantes para a boa decisão da causa, nomeadamente deveria alegar e provar, de forma elucidativa, quanto efectivamente recebeu e quanto deveria receber da ré, a título do trabalho prestado em dia de descanso semanal.
2. Isto é o que resulta da teoria da substanciação, consagrada no nosso ordenamento jurídico, segundo a qual se exige a indicação específica do facto constitutivo do direito invocado.
3. Por que a matéria de facto provada constante dos autos não é suficiente para suportar o pedido do autor, a qual deveria ser oportunamente alegada, e provada, pelo próprio interessado mas não o foi, já que a mera remissão para os documentos feita pelo tribunal a quo apenas comprova a existência dos respectivos documentos e nada mais, o seu pedido não pode, assim, deixar de improceder.
O Relator,
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Tong Hio Fong
Processo nº 918/2015
(Autos de recurso laboral)
Data: 10/Dezembro/2015
Recorrente:
- A (Autor)
Recorrida:
- Companhia de Segurança B Limitada (Ré)
Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:
I) RELATÓRIO
A intentou junto do Tribunal Judicial de Base da RAEM acção de processo comum do trabalho, pedindo a condenação da Companhia de Segurança B Limitada no pagamento do montante de MOP$243.709,00, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento, entretanto foi reduzido o pedido por iniciativa do Autor até ao montante de MOP$74.800,00.
Realizado o julgamento, foi a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia relativa ao descanso compensatório não gozado, em montante a liquidar em execução de sentença, ao abrigo do disposto no artigo 564º, nº 2 do CPC.
Inconformado com a sentença, dela interpôs o Autor recurso ordinário para este TSI, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
1. Versa o presente recurso sobre a parte da douta Sentença na qual foi julgada parcialmente improcedente ao Autor, ora Recorrente, a atribuição de uma determinada quantia a título de trabalho extraordinário, subsídio de alojamento e compensação por trabalho prestado em dia de descanso semanal.
2. Porém, está o Recorrente em crer que a douta Sentença enferma de erro de apreciação da matéria de facto (quanto à “declaração” constante de fls. 99) em termos que comprometem seriamente a sua “bondade” e o respectivo conteúdo; porquanto, contrariamente ao que terá sido pressuposto, a referida “declaração” não está datada pelo que em caso algum o Tribunal a quo poderia ter retirado consequências (negativas) da mesma em sentido desfavorável ao ora Recorrente, razão pela qual deve o quesito 15º da Base Instrutória ter-se por não provado.
3. Por outro lado, a douta Sentença enferma de erro de aplicação de Direito quanto à correcta forma de cálculo para a determinação das quantias devidas pela Recorrida ao ora Recorrente a título de trabalho extraordinário e de trabalho prestado em dia de descanso semanal, porquanto em cada um dos casos o Tribunal a quo terá aceite como correcto o entendimento segundo o qual o referido trabalho deveria ser remunerado tendo por base de cálculo o valor do “salário de base” e não o da “remuneração de base” e, neste sentido, mostra-se em violação ao disposto nos artigos 37º, 43º, 59º e 61º da Lei n.º 7/2008.
Em concreto,
Quanto ao subsídio de alojamento:
4. Em caso algum o Tribunal a quo poderia ter concluído resultar da “declaração” de fls. 99 que o Autor declara prescindir do alojamento fornecido pela Ré, desde logo porque a referida “declaração” não se encontra datada e, como tal, não se conhece em que momento a mesma terá sido proferida razão pela qual o quesito 15º da Base Instrutória se deverá ter por não provado.
5. Acresce que, salvo melhor opinião, resulta da prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento que nenhum trabalhador de origem filipina residia nos dormitórios da Recorrida ao tempo da relação de trabalho entre o ora Recorrente e a Recorrida.
6. Em consequência, deve o referido quesito 15º da matéria de facto ser revisto e, em consequência, ser a Recorrida condenada a pagar ao ora Recorrente a quantia de MOP$24.500,00, tendo por base o conteúdo “imperativo” e a natureza “protectora” do Despacho do Chefe do Executivo n.º 88/2010, nos termos do qual resulta ser devido aos trabalhadores não residentes um alojamento ou uma determinada quantia em dinheiro não inferior a MOP$500,00 caso o mesmo (alojamento) não seja fornecido pelo respectivo empregador.
Quanto ao trabalho extraordinário:
7. A questão – de Direito – que se coloca ao douto Tribunal de Recurso reside em saber se o acréscimo de 20% sobre a “remuneração normal do trabalho prestado” a título de trabalho extraordinário deverá ser compensado tendo por base de cálculo (apenas) o montante do “salário de base”, ou, antes, tal acréscimo de 20% deverá ser determinado tendo por base de cálculo a “remuneração de base” efectivamente auferida pelo Autor, sabido que o artigo 37º da Lei n.º 7/2008 faz referência a “remuneração normal do trabalho prestado” mas em lado nenhum oferece uma qualquer definição a respeito do seu concreto conteúdo.
8. Em sequência, a concluir-se que a melhor interpretação para o preceito será a de que o acréscimo de 20% deverá ser determinado tendo por base a “remuneração de base” efectivamente auferida pelo Recorrente em cada um dos meses da relação de trabalho e não apenas o valor do “salário de base” – deve a Recorrida ser condenada a pagar ao Recorrente a diferença entre o montante das quantias efectivamente pagas a título de trabalho extraordinário prestado e determinadas com base no “salário de base” e as quantias que deveriam ter sido pagas tendo por base de cálculo a “remuneração de base” efectivamente auferida pelo Recorrente ao longo da relação de trabalho com a Recorrida e que se estima em MOP$9.768,00.
9. Ao não entender deste modo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto nos artigos 37º, 59º e 61º da Lei n.º 7/2008, pelo que a douta decisão deve ser julgada nula e substituída por outra que condene a Recorrida em conformidade com o disposto na referida Lei das Relações de Trabalho.
Quanto ao descanso semanal:
10. Não obstante o Tribunal a quo ter relegado para liquidação em execução de sentença os dias de descanso compensatório devidos pela Recorrida ao ora Recorrente em contrapartida do trabalho prestado em dia de descanso semanal, a questão – de Direito – que se coloca reside em saber se o trabalho prestado pelo Recorrente nos dias de descanso semanal deveria ter sido remunerado tendo por base (apenas) o valor do “salário de base” tal qual foi defendido pela Recorrida e aceite pelo Tribunal a quo; ou, o mesmo trabalho prestado em dia de descanso semanal deveria ter sido remunerado ao ora Recorrente tendo por base de cálculo o valor da “remuneração de base” efectivamente auferida durante o período da relação de trabalho com a Recorrida e determinada nos termos do disposto nos artigos 59º e 61º da Lei n.º 7/2008.
11. Salvo melhor opinião, referindo-se a Lei a “um acréscimo de um dia de remuneração de base”, em caso algum se poderá interpretar restritivamente a referida expressão de forma a obter tão-só e apenas um acréscimo de um “salário de base”, conforme foi defendido pela Recorrida e, ao que parece, veio a ser sufragado pelo Tribunal a quo.
12. De onde, sem prejuízo da condenação da Recorrida pela falta de concessão de um dia de descanso compensatório ao ora Recorrente e relegado para liquidação de execução de sentença, desde já se requer que a Recorrida seja condenada a pagar ao Recorrente a quantia de MOP$39.300,00 a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal relativo aos anos civis de 2009 a 2012, tendo por base a diferença entre o que a Recorrida pagou ao ora Recorrente a título de trabalho prestado em dia de descanso semanal determinado pelo “salário de base” e o que a mesma deveria ter pago tendo por base de cálculo a “remuneração de base” efectivamente auferida pelo Recorrente.
13. Ao não decidir desde modo, o Tribunal a quo terá procedido a uma interpretação menos correcta do disposto nos artigos 49º, 59º e 61º da Lei n.º 7/2008, razão pela qual, nesta parte, a douta decisão deverá ser e substituída por outra que condene a Recorrida em conformidade com o disposto na referida Lei das Relações de Trabalho.
Conclui, pedindo que se conceda provimento ao recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida e substituída por outra que atenda ao formulado pelo recorrente.
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Devidamente notificada, contra-alegou a recorrida, formulando as seguintes conclusões alegatórias:
1. Entende o ora Recorrente que o Tribunal a quo errou na apreciação da matéria de facto e fez uma aplicação incorrecta da lei.
2. O Tribunal a quo decidiu, e bem, que uma vez que o Recorrente declarou prescindir do alojamento fornecido pela Recorrida, nada mais lhe seria devido.
3. Baseia o Tribunal a quo a sua decisão na declaração, assinada pelo ora Recorrente, junta aos autos a fls. 99 dos autos, onde se pode ler que o mesmo não necessita, não quer, prescinde (“Not Demand”) do alojamento fornecido pela Recorrida.
4. Até à interposição do presente recurso, nunca o Recorrente invocou – nem provou – qualquer falsidade do documento, pelo que o mesmo se deve gozar de força probatória plena, ao abrigo do n.º 1 do artigo 370º do Código Civil.
5. A disposição contida no n.º 3 do Despacho do Chefe do Executivo n.º 88/2010 concede claramente duas possibilidades ao empregador: ou pagar um montante não inferior a 500 patacas mensais a cada trabalhador não residente, ou assegurar o direito do trabalhador não residente ao alojamento.
6. Porquanto o Recorrente prescindiu do alojamento providenciado pelo empregador, tendo inclusivamente assinado uma declaração onde o faz expressamente, nada mais lhe é devido pela Recorrida. Assim, não merece qualquer censura a decisão do Tribunal a quo ao considerar que uma vez que o “Autor prescindiu do alojamento que lhe foi fornecido pela Ré (…)” e não havendo nenhuma matéria que “permitia concluir (…) ter tal documento sido assinado contra a vontade do Autor”, nada lhe é devido.
7. No que concerne ao trabalho extraordinário, o Recorrente referiu nas suas alegações que “A este concreto respeito, a questão – de Direito – que se coloca ao douto Tribunal de Recurso reside (…)”. Contudo, o motivo pelo qual o Tribunal a quo julgou improcedente o pedido do Recorrente consistia na circunstância de não resultar provada qualquer matéria de facto que permitisse sustentar a tese que o ora Recorrente defendeu.
8. Trata-se de uma questão de facto e não de direito, como sustenta o ora Recorrente. Logo, ao não ter impugnado devidamente a matéria de facto, as pretensões do Recorrente sobre esta concreta questão não podem proceder.
9. O Recorrente foi remunerado com um acréscimo de 20% por cada hora de trabalho que prestou. Em sede de Contestação, a Recorrida juntou aos autos 42 declarações assinadas pelo Recorrente (Docs. 93-134 juntos com a Contestação), e onde se pode ler:
“(…) prestei serviço, com o meu consentimento, para além do horário de trabalho, com consentimento do empregador.
Assim, de acordo com o n.º 2 do artigo 37º, da Lei n.º 7/2008, o empregador tem conhecimento de que quando o empregado presta serviço para além do horário normal de trabalho tem direito a receber o vencimento normal, acrescido de 20% a título extraordinário.”
10. Pelo que, não restam dúvidas que o acréscimo será sempre de 20%, o qual, aliás, foi já foi pago pela Recorrida ao Recorrente.
11. Relativamente ao descanso semanal, não merece qualquer censura a decisão do Tribunal a quo ao entender que não poderia proceder a tese do Recorrente segundo a qual “nunca lhe foram concedidos dias de descanso”. Toda a prova produzida, quer testemunhal, quer documental, foram no sentido de que o Recorrente trabalhou em alguns dias de descanso semanal, tendo descansado noutros dias, não se conseguindo, no entanto, apurar o quantum.
12. Por outro lado, os recibos de vencimento (Docs. 1 a 49 juntos com a Contestação) demonstram que todo o montante devido a este título ao Recorrente foi pago, e por isso, nada mais lhe é devido.
13. Por fim, relativamente às fórmulas de cálculo, entende o Recorrente que o montante que deveria servir de base para os cálculos deveria ser o de “remuneração de base” e não, como adoptado o Tribunal a quo, e bem, o “salário de base”.
14. Deve-se fazer uma interpretação restritiva ao conceito de “remuneração de base”. Se não se fizer uma interpretação restritiva, como podemos, por exemplo, calcular a remuneração de base no primeiro mês de trabalho de um trabalhador?
15. A única conclusão que podemos retirar da Lei é que o conceito de “remuneração de base” deverá ser lido restritivamente, como “salário de base”.
16. Por fim, além de todas as considerações anteriormente expostas, cabe salientar a circunstância de o Autor ter assinado o último recibo de vencimento (Documento 135 junto com a Contestação), declarando “本人已收妥在B保安有限公司任職期內的所有薪金,加班費或有薪年假補償等的一切報酬,之後雙方再沒有薪酬的拖欠”.
Conclui, pugnando pela negação de provimento ao recurso.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
A Ré é uma sociedade que se dedica à prestação de serviços de segurança. (A)
Desde 15/12/2008 o Autor está ao serviço da Ré, exercendo funções de “guarda de segurança”, enquanto trabalhador não residente. (B)
Entre 01/01/2009 a 31/12/2012, o Autor auferiu da Ré a título de salário anual e de salário normal diário, as quantias que abaixo se discrimina (Cfr. doc. 3 Certidão de Rendimentos – Imposto Profissional):(C)
ano
Salário anual
2009
82057
2010
66091
2011
101454
2012
121159
O Autor foi recrutado pela Sociedade C CONSULTORES LIMITADA, e posteriormente exerceu a sua prestação de trabalho para a Ré ao abrigo dos seguintes despachos:
- Despacho n.º 16949/IMO/GRH/2008, de 22/07/2008, com efeitos a partir de 15/08/2008 e válido até 20/09/2010 (Cfr. Doc. 1 e 2);
- Despacho n.º 16334/IMO/GRH/2010, de 28/06/2010 (Cfr. Doc. 3);
- Despacho n.º 02614/IMO/GRH/2011, de 07/02/2011 (Cfr. Doc. 4);
- Despacho n.º 09765/IMO/GRH/2012, de 11/04/2012 (Cfr. Doc. 5). (1º)
O Autor exerceu a sua prestação de trabalho para a Ré, ininterruptamente, ao abrigo do contrato aludido em 4). (3.º)
Ao longo da relação laboral, a Ré nunca entregou ao Autor o duplicado dos contratos de trabalho entre ambos assinados, nem cópia dos Despachos de Autorização e/ou Contratos de Prestação de Serviço ao abrigo dos quais o Autor prestou trabalho para a Ré. (4º)
Desde o início da relação de trabalho, a Ré nunca entregou ao Autor os recibos de pagamento de salário. (5º)
Entre 01/01/2009 a 31/10/2011, o Autor trabalhou em turnos de 12 horas de trabalho por dia. (6º)
Desde o início da relação laboral, a Ré nunca atribuiu ao Autor alojamento ou qualquer quantia em dinheiro a título de subsídio de alojamento, sem prejuízo do que resulta do documento de fls. 99. (9º)
A Ré nunca fixou ou conferiu ao Autor o gozo de um outro dia de descanso compensatório em virtude do trabalho prestado em dia de descanso semanal. (13º)
O Autor, relativamente ao trabalho extraordinário assinou as declarações juntas como Docs. 93 a 134, com o seguinte teor: “(…) prestei serviço, com o meu consentimento, para além do horário de trabalho, com consentimento do empregador. (18º)
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São três as questões suscitadas pelo recorrente:
1 - Da impugnação da matéria de facto constante da resposta ao quesito 15º da base instrutória;
2 – Do trabalho extraordinário: da sua remuneração e forma de cálculo; e
3 – Do descanso semanal.
1 - Da impugnação da matéria de facto constante da resposta ao quesito 15º da base instrutória
Alega o recorrente que, no respeitante à resposta dada ao quesito 15º da base instrutória, o tribunal limitou-se a remeter à declaração constante de fls. 99, entendendo que em caso algum o tribunal a quo poderia ter extraído dessa mesma declaração que “o Autor declara prescindir do alojamento fornecido pela Ré”, porquanto tal não se encontra datada e não se conhece em que momento tal declaração terá sido proferida, pelo que entende que o quesito 15º deverá ter-se por não provado.
Vejamos.
Questiona-se no artigo 15º da base instrutória se “o A. prescindiu do alojamento providenciado pelo empregador (cf. doc. 50)”, e feito o julgamento, ficou “provado o que resulta do documento de fls. 99”.
Em primeiro lugar, e salvo o devido respeito, entendemos que, de um modo geral, a validade de um documento particular não depende necessariamente da aposição da data, nem que tenha que ser assinado ou conter algum carimbo de quem quer que seja.
Por outro lado, verifica-se que, tendo o documento de fls. 99 sido apresentado pela recorrida junto com a contestação, o recorrente não logrou impugnar a autoria daquele documento, mas apenas se limitou a alegar que nunca prescindiu do suposto alojamento providenciado pela mesma recorrida, nem do direito a auferir a quantia mínima de MOP$500,00 a título de subsídio de alojamento.
Em boa verdade, considerando que não tendo sido impugnada a autoria do referido documento particular pela parte contra quem o documento é apresentado, ao abrigo do artigo 368º, nº 1 do Código Civil, tanto a letra como a assinatura constantes daquele documento consideram-se verdadeiras.
Por que a autoria do referido documento é considerada reconhecida pelo recorrente, os factos compreendidos nessa mesma declaração consideram-se, em consequência, provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante, isto é, em relação aos factos que lhe são desfavoráveis, nomeadamente quanto à matéria respeitante à declaração de prescindir do alojamento fornecido pela recorrida, deveria ser considerada plenamente provada, ao abrigo do disposto no artigo 370º, nº 1 e 2 do Código Civil.
Com efeito, salvo o devido respeito, entendemos que não há razão para se dar como não provado o quesito 15º da base instrutória, pelo contrário, deveria o tribunal a quo ter dado como provado o mesmo quesito tal como vem formulado.
Nestes termos, não merece qualquer reparo a decisão do tribunal a quo no sentido de ter extraído da referida declaração de fls. 99 o facto de o Autor ter prescindido do alojamento fornecido pela Ré ora recorrida.
Improcede o recurso nesta parte.
*
2 – Do trabalho extraordinário: da sua remuneração e forma de cálculo
Alega o recorrente que, tendo o mesmo prestado trabalho extraordinário durante a vigência da relação contratual, tem direito a um acréscimo de 20%, entretanto, esse acréscimo deveria ser compensado tendo por base de cálculo a “remuneração de base”, e não apenas o “salário de base”.
Vejamos.
Antes de mais, convém salientar que, tal como refere a recorrida, e bem, o motivo pelo qual o tribunal a quo julgou improcedente o pedido do recorrente consistia na circunstância de não resultar provada qualquer matéria de facto relativa à falta de pagamento da compensação do trabalho extraordinário.
De facto, sobre tal matéria, apenas foram quesitados dois factos:
Quesito 6º - “Entre 01/01/2009 a 31/10/2011, o Autor trabalhou em turnos de 12 horas de trabalho por dia?”
Quesito 7º - “A Ré nunca atribuiu ao Autor uma qualquer quantia pelo trabalho extraordinário prestado?”
Feito o julgamento, em relação àqueles dois quesitos, foi dado como provado o primeiro e não provado o segundo.
A nosso ver, face à factualidade acima descrita, é mais do que óbvio que não há aqui matéria de facto provada que permita sustentar suficientemente a tese agora defendida pelo recorrente.
Improcedem, pois, as razões do recorrente quanto a esta parte.
*
3 – Do descanso semanal
Alega o recorrente que, ainda que o tribunal a quo tenha relegado para liquidação em execução de sentença a determinação do número de dias e respectiva quantia relativa ao descanso compensatório devida pela recorrida ao recorrente em contrapartida do trabalho prestado em dia de descanso semanal, mas em relação às quantias já pagas ao recorrente pelo referido trabalho prestado em dia de descanso semanal, tal deveria ter sido remunerado tendo por base de cálculo a “remuneração de base”, e não apenas o “salário de base”.
Vejamos quais foram os factos quesitados e os que foram dados como provados pelo tribunal a quo relativamente à matéria de descanso semanal.
Quesito 10º - “Entre 01/01/2009 a 31/12/2012, nunca o Autor gozou de qualquer dia a título de descanso semanal?” – Não provado
Quesito 11º - “Nunca a Ré atribuiu ao Autor um qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal?” – Não provado
Quesito 12º - “Os dias de dispensa ao trabalho concedidos ao Autor nunca foram pela Ré remunerados?” – Não provado
Quesito 13º - “A Ré nunca fixou ou conferiu ao Autor o gozo de um outro dia de descanso compensatório em virtude do trabalho prestado em dia de descanso semanal?” – Provado
Quesito 16º - “O A. foi remunerado por todos os dias de descanso semanal em que prestou serviço a R. (“RD pay”) – cf. docs. 1 a 49?” – Provado o que resulta dos documentos aí referidos
Quesito 17º - “Razão por que o A. assinou as declarações constantes dos docs. 51 a 92?” –Provado o que resulta dos documentos aí referidos
Ora bem, de acordo com a matéria acima descrita e dada como provada pelo tribunal a quo, é bom de ver que também há falta de elementos fácticos que permita sustentar a tese agora defendida pelo recorrente, senão vejamos.
No que respeita à alegação de que o recorrente nunca gozou de qualquer dia a título de descanso semanal, nem a Ré lhe atribuiu qualquer acréscimo salarial pelo trabalho prestado em dia de descanso semanal, não ficou provada.
Apenas se deu como provado que nos dias de descanso semanal em que o recorrente prestou trabalho, a recorrida nunca fixou ou conferiu ao recorrente o gozo de um outro dia de descanso compensatório.
Com efeito, foi a recorrida condenada a pagar ao recorrente apenas a quantia relativa ao descanso compensatório não gozado, em montante a liquidar em execução de sentença.
Já quanto à questão de saber se ainda deverá ser a recorrida condenada a pagar ao recorrente mais alguma quantia que tem por base a diferença entre o que a recorrida pagou ao recorrente a título do trabalho prestado em dia de descanso semanal determinado pelo “salário de base” e o que a mesma deveria ter pago tendo por base de cálculo a “remuneração de base”, somos a entender que já não constam da matéria de facto provada elementos suficientes que permitam conduzir à procedência do pedido.
Isto é, independentemente de ter ou não razão, quanto ao mérito, o recorrente teria que invocar factos relevantes para a boa decisão da causa, nomeadamente deveria alegar e provar, de forma elucidativa, quanto efectivamente recebeu e quanto deveria receber da recorrida, a título do trabalho prestado em dia de descanso semanal.
Isto é o que resulta da teoria da substanciação, consagrada no nosso ordenamento jurídico, segundo a qual se exige a indicação específica do facto constitutivo do direito invocado.
Aqui chegados, por que a matéria de facto provada não é suficiente para suportar o pedido do recorrente, a qual deveria ser oportunamente alegada, e provada, pelo próprio interessado mas não o foi, já que a mera remissão para os documentos feita pelo tribunal a quo apenas comprova a existência dos respectivos documentos e nada mais, outra alternativa não resta senão julgar improcedente o recurso nesta parte.
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III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso interposto pelo recorrente A, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente nesta instância, sem prejuízo do apoio judiciário de que o mesmo beneficia.
Registe e notifique.
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RAEM, 10 de Dezembro de 2015
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
Recurso Laboral 918/2015 Página 19