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Processo nº 318/2015
(Recurso Contencioso)

Relator: João Gil de Oliveira
Data: 24/Setembro/2015

Assuntos:
- Recorribilidade do acto
- Recurso contencioso e recurso hierárquico necessário


SUMÁRIO :
    Não se sufraga o juízo de rejeição do recurso, em momento posterior à possível "rejeição liminar" contemplada na al. c) do n.º 2 do art. 46°, CPAC, adoptando-se assim o entendimento de que os actos administrativos praticados por órgãos subalternos, mesmo que não se trate de acto de competência exclusiva, não estão sujeitos a impugnação administrativa necessária, sendo que o n.º 2 do art. 27° do Dec.-Lei 77/99/M não estabelece uma competência exclusiva ao comandante do CPSP, em matéria de concessão de licença de uso e porte de arma de defesa, agindo o mesmo, a tal nível, com competência própria, comum ao seu superior, não se impondo a interposição do recurso hierárquico necessário, da decisão do Comandante do CPSP, organicamente subalterno do Secretário para a Segurança.
    
O Relator,


Processo n.º 318/2015
(Recurso Contencioso)

Data : 24 de Setembro de 2015

Recorrente: A (A)

Entidade Recorrida: Comandante do Corpo da PSP

    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO

A (A), mais bem identificado nos autos, inconformado com a decisão proferida no Tribunal Administrativo que se pronunciou pela irrecorribilidade do acto em sede de recurso contencioso interposto do acto do Exmo Comandante da PSP que lhe denegou a licença de uso e porte de arma, vem recorrer, alegando em síntese conclusiva:
    1.ª O objecto do presente recurso é a douta decisão da Meritíssima Juíza a quo que, a requerimento da entidade recorrida apresentado após a produção da prova, considerou existir a excepção da (ir)recorribilidade contenciosa de um acto praticado pelo Senhor Comandante da PSP no uso de competência própria (art. 27.°, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 77/99/M) e, assim, considerou improcedente o recurso interposto pelo recorrente.
    2.ª A Meritíssima Juíza a quo fundamentou a sua decisão no entendimento perfilhado no douto Acórdão do TUI de 9 de Julho de 2014, explicitado no processo n.º 10/2014.
    3.ª Foi extemporânea a decisão da Meritíssima Juiz a quo pois, a partir do momento em que ordenou a citação da entidade recorrida para contestar ao invés de ter rejeitado liminarmente o recurso com fundamento na irrecorribilidade do acto, a instância estabilizou-se a partir daquele momento processual.
    4.ª Não competia à entidade recorrida suscitar, naquele momento processual, esta questão, pois, pese o facto de ter o direito de defender qualquer dos entendimentos subscritos pelas duas Instâncias Superiores, teria sido aconselhável que o fizesse em sede própria, isto é, em fase do processo em que lhe é legalmente permitida uma intervenção, enquanto Parte processual, sem se perder de vista, que, depois de ter notificado o recorrente para recorrer hierarquicamente do seu despacho, veio, expressamente, rectificar a sua notificação, afirmando que o recorrente devia recorrer contenciosamente do acto por si praticado.
    5.ª O douto Acórdão do TUI de 9 de Julho de 2014 não pode constituir fundamento bastante para a rejeição do presente recurso contencioso, pois, não constituindo uma decisão de uniformização de jurisprudência, antes reflectindo um mero entendimento jurisprudencial que se não impõe aos tribunais de instância, sendo conhecidas decisões jurisprudenciais de sentido oposto, de que constituem exemplos os doutos Acórdãos desse Venerando Tribunal de Segunda Instância de 9 de Maio de 2013, explicitado no processo n.º 32/2012 e de 31 de Outubro de 2013, explicitado no processo n.º 853/2012, não estava o Tribunal Administrativo recorrido vinculado a tal entendimento.
    6.ª É firme o entendimento nessa Instância Superior, ora Tribunal ad quem, no sentido de que, "quando a lei atribui uma competência a um órgão subalterno da Administração Pública para a prática de um determinado acto administrativo, desse acto não cabe recurso hierárquico necessário salvo quando especialmente previsto na lei".
    7.ª Também, constitui Jurisprudência do Tribunal ad quem que a questão da recorribilidade contenciosa do acto se prende com a sua definitividade em termos de estabelecimento da definição de uma situação jurídica, pelo que o acto administrativo definitivo há-de ser um acto pela qual a Administração define a sua esfera jurídica ou a esfera de outros sujeitos de direito que com ela estão ou pretendiam estar em relação jurídica, em termos de uma resolução final, no sentido de que com ela se põe termo a um processo gracioso ou a um seu incidente autónomo e de que é a resolução dum órgão de cujos actos não cabe recurso hierárquico necessário.
    8.ª O acto administrativo não pode ser mera e simplesmente considerado como definitivo quando se verifica a situação em que esgota a via administrativa, de modo a considerar que não são definitivos actos administrativos, por natureza, os actos preparatórios, os de execução, os confirmativos de actos definitivos anteriores, os internos.
    9.ª Conforme é defendido pelo Venerando Tribunal ad quem "o recurso hierárquico necessário é o meio de que o destinatário de um acto administrativo definitivo por sua natureza se deve servir para provocar a decisão do órgão a quem cabe proferir, em sede administrativa, a última decisão sobre aquele caso".
    10.ª Nos termos do artigo 154.° do CPA, o recurso hierárquico é necessário ou facultativo, consoante o acto a impugnar seja ou não insusceptível de recurso contencioso. E para saber se o acto administrativo é ou não susceptível de recurso hierárquico necessário, deve-se atentar no estatuto da entidade recorrida.
    11.ª No caso, a decisão negatória da concessão da licença do Senhor Comandante da PSP foi tomada no uso da competência exclusiva que o art. 27.°, n.º 2, do D. L. n.º 77/99/M, de 8 de Novembro, lhe confere directamente e apresenta-se com definitividade (material, horizontal e vertical) e, como tal, desde logo, recorrível contenciosamente junto do Tribunal Administrativo.
    12.ª O D. L. n.º 77/99/M, de 8 de Novembro atribui uma competência a um órgão subalterno da Administração Pública (Senhor Comandante da PSP) para a concessão da licença de uso e porte de arma de defesa, não estando previsto neste diploma legal que desse acto cabe recurso hierárquico necessário.

E – PEDIDO
    TERMOS EM QUE e contando com o muito douto suprimento, de Vossas Excelências, Venerandos Juízes, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser reenviado o processo para o Tribunal Administrativo para prosseguir os seus trâmites, porque não existe nenhuma excepção que obste ao conhecimento do recurso interposto pelo recorrente impugnando a decisão do Senhor Comandante da PSP.
    
    Este recurso não foi contra-alegado.
    
    O Exmo Senhor Procurador Adjunto oferece o seguinte douto parecer:
    Se bem apreendemos o alegado, prende-se a argumentação expendida pelo recorrente contra a douta sentença sob escrutínio, em 2 vectores fundamentais : um, atinente à forma e momento em que a questão da irrecorribilidade do acto foi suscitada pela entidade recorrida e apreciada pelo tribunal e outro, atinente à "substância" do decidido relativamente à ocorrência da excepção de irrecorribilidade do acto, suscitando-se errada interpretação da lei, mais concretamente do disposto no art. 27°/2 do Dec Lei 77/99/M de 8/11-
    Pois bem:
    Detectando-se, de facto, alguma anomalia processual relativamente ao preciso momento em que a excepção em questão foi aduzida pela entidade recorrida, ou seja, já fora do prazo a que alude o n° 5 do art. 68°, CPAC, a verdade é que o Mmo Juíz "a quo" (fls. 80 e v) não deixou de suscitar, ele próprio, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 71° daquele diploma, tal questão, concedendo às partes e ao M.P. oportunidade de se pronunciarem, à luz do n.º 2 daquele normativo, pelo que não se descortina, a nível da tramitação processual, qualquer "deriva" a censurar, como também se não vislumbra que, face à posição alcançada na matéria, o julgador "a quo" tenha errado ao concluir pela rejeição do recurso, em momento posterior à possível "rejeição liminar" contemplada na al. c) do n.º 2 do art. 46°, CPAC.
    Não tendo sucedido nessa fase, cremos que nada impediria o julgador da rejeição operada, no momento processual em que o foi, antes e com prejuízo do conhecimento do mérito.
    Posto isto, resulta inequívoco, à luz da doutrina emanada do acórdão de 9/7/14 do TUI, no âmbito do proc. 10/2014 que, nos termos do art. 131°/1 do CPA, os actos administrativos praticados por órgãos subalternos, desde que não se trate de acto de competência exclusiva, estão sujeitos a impugnação administrativa necessária, sendo que o n.º 2 do art. 27° do Dec Lei 77/99/M não estabelece uma competência exclusiva ao comandante do CPSP em matéria de concessão de licença de uso e porte de arma de defesa, agindo o mesmo, a tal nível, com competência própria, comum ao seu superior, razão por que, no caso em questão (para o que aqui conta, similar ao dos presentes autos) se entendeu que o acto praticado pelo comandante do CPSP, orgânicamente subalterno do Secretário para a Segurança, está sujeito a impugnação administrativa necessária, não sendo ainda contenciosamente recorrível.
    Não se desconhecendo ponderosa jurisprudência em sentido inverso deste Tribunal, alguma da qual adiantada pelo recorrente e, não sendo insensível às dúvidas sobre a "actualidade" daquela doutrina dimanada do TUI, face à evolução do sistema jurídico português e respectivas preocupações na tónica da lesividade como condição da impugnabilidade contenciosa dos actos administrativos, em detrimento do carácter definitivo e executório dos mesmos, a verdade é que, pese embora (como bem sustenta o recorrente) nos não encontremos face a jurisprudência obrigatória, não alcançamos no ordenamento jurídico de Macau razões e justificações suficientemente ponderosas que nos permitam, com rigor, divergir do entendimento assumido na matéria pelo Supremo Tribunal da Região.
    Finalmente, a questão das notificações.
    Como é bom de ver, à luz do entendimento assumido, a 1ª notificação empreendida ao recorrente, em 18/4/13 foi correcta, no que tange à forma de reacção, tendo presente o preceituado na al. d) do arte 70°, CPA.
    O mesmo não sucedeu, porém, quanto à "rectificação" empreendida - notificação de 14/5/13 - que terá induzido o interessado em erro.
    Trata-se, contudo, de matéria exterior ao acto, que, podendo contender com a eficácia respectiva, não é susceptível de afectar a sua validade, não se encontrando, de todo o modo, o interessado inibido de, assim o entendendo, poder, pelos meios próprios, responsabilizar quem de direito por eventuais prejuízos advenientes do engano provocado, sendo certo, porém, que o mesmo, "malgré tout", não deixou de deter a possibilidade de fazer valer os seus interesses através da impugnação de acto de indeferimento tácito do Secretário para a Segurança.
    Seja como for, para o que agora nos ocupa, entende-se, pelas razões apontadas, ser de manter o decidido, negando-se provimento ao recurso.
    
    Foram colhidos os vistos legais.
    
III - FACTOS
Vêm consignados os factos seguintes:
     Nos dias 17 e 18 de Janeiro de 2013, o recorrente pediu à entidade recorrida que lhe concedesse licença de uso e porte de arma de defesa, e que o autorizasse a adquirir à Companhia B (B有限公司) uma pistola de defesa e balas, destinadas à autodefesa, estando o seu pedido acompanhado de documentos relacionados (cfr. fls. 90 a 112 e fls. 112v do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
Por despacho de 7 de Março de 2013, proferido no relatório n.º 134/2013-224.03.04, a entidade recorrida decidiu indeferir o requerimento do recorrente ao abrigo do n.º 2 do art.º 27.º do Regulamento de Armas e Munições aprovado pelo Decreto-Lei n.º 77/99/M, inculcando, por um lado, que Macau tem um bom ambiente de segurança, e por outro, que atentos os documentos e dados apresentados pelo recorrente, não se detectou, quer no passado quer no presente, perigo potencial para a sua segurança pessoal ou da sua família (cfr. fls. 79 a 80 do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
No dia 13 de Março de 2013, o recorrente recebeu a notificação da audiência escrita emitida pelo CPSP, em que se referiu que o CPSP tinha a intenção de indeferir o requerimento do recorrente nos termos do art.º 27.º, n.º 2 do Regulamento de Armas e Munições aprovado pelo Decreto-Lei n.º 77/99/M, em relação à qual se notificou o recorrente para, querendo, expor por escrito quaisquer motivos que considerasse justificativos do deferimento do seu pedido de uso de arma de defesa, no prazo de 10 dias a contar da recepção da notificação, de modo a que o CPSP tratasse do assunto adequadamente (cfr. fls. 78 do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
No dia 25 de Março de 2013, o recorrente, através do seu mandatário judicial, apresentou alegações escritas à entidade recorrida, acompanhadas de documentos relacionados (cfr. fls. 54 a 69 do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
Em 5 de Abril de 2013, o recorrente, através do mandatário judicial, entregou à entidade recorrida uma declaração complementar, acompanhada de documentos complementares (cfr. fls. 70 a 77 do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
No mesmo dia, a entidade recorrida proferiu despacho no relatório n.º 177/2013-224.03.04, afirmando que, pela insuficiência dos fundamentos formulados pelo recorrente, decidiu não os aceitar (cfr. fls. 51 a 53 do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
Por despacho datado de 15 de Abril de 2013, a entidade recorrida apontou que, por não se ter detectado perigo potencial para a segurança pessoal do recorrente ou da sua família, não estava preenchido o disposto no art.º 27.º, n.º 1, al. c) do Regulamento de Armas e Munições, daí o indeferimento do requerimento do recorrente (cfr. fls. 5 a 6 do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
No dia 18 de Abril de 2013, o CPSP, mediante o ofício n.º 101/SAMDI/2013P, notificou o recorrente da decisão supracitada, referindo na mesma notificação que podia o recorrente interpor recurso hierárquico necessário no prazo legalmente fixado (cfr. fls. 48 a 50 e fls. 4 do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
No dia 29 de Abril de 2013, o recorrente, através do seu mandatário judicial, interpôs recuso hierárquico necessário da decisão acima referida para o Senhor Secretário para a Segurança (cfr. 40 a 43 do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
Em 14 de Maio de 2013, o CPSP, mediante o ofício n.º 122/SAMDI/2013P, procedeu à rectificação perante o recorrente e voltou a comunicar-lhe a decisão da entidade recorrida, indicando, ao mesmo tempo, que podia o mesmo interpor recurso contencioso para o Tribunal Administrativo no prazo legalmente fixado (cfr. fls. 38 e 2 do processo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
Em 13 de Junho de 2013, o recorrente interpôs o recurso contencioso sub judice para este Tribunal da decisão tomada pela entidade recorrida no dia 15 de Abril de 2013.
    
    IV – FUNDAMENTOS
    1. O objecto do presente recurso é a douta decisão da Meritíssima Juíza do Tribunal Administrativo e a única questão, que se traz à apreciação deste Tribunal, usando as próprias palavras do recorrente, é a da (ir)recorribilidade contenciosa do acto praticado pelo Senhor Comandante da PSP.
    
    2. Atentemos na douta fundamentação da decisão proferida na linha da jurisprudência que com mais unanimidade se instalou ao longo de muito tempo:
    “No tocante a requerente da licença de uso e porte de arma de defesa (sic), dispõe o n.º 2 do art.º 27.º do Regulamento de Armas e Munições aprovado pelo Decreto-Lei n.º 77/99/M de 8 de Novembro: “A concessão da licença de uso e porte de arma de defesa é da competência do comandante do CPSP, mediante requerimento do interessado, que a pode denegar por razões gerais de segurança e ordem públicas.”
     O Venerando TUI, no seu acórdão de 9 de Julho de 2014, proferido no processo n.º 10/2014, fez uma análise perspicaz acerca da questão de direito supra referida, entendendo que as decisões feitas pelo Comandante do CPSP no exercício desta competência não reúnem o pressuposto processual de recorribilidade. Vem transcrito abaixo o dito acórdão na parte pertinente:
     “ ...
     No entendimento do Acórdão recorrido, face à ausência no Decreto-Lei n.º 77/99/M de uma norma que impõe a necessidade de impugnação graciosa ou que estabelece a impugnabilidade contenciosa do acto do subalterno, é de concluir pela natureza facultativa do recurso hierárquico do despacho do Senhor Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública que negou o pedido da concessão da licença de uso e porte de arma de defesa, proferido ao abrigo da competência atribuída pelo n.º 2 do art.º 27.º, e que por força atributiva dessa norma, o acto do Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública é imediatamente recorrível contenciosamente.
     Acresce-se ainda que o despacho do Senhor Secretário para a Segurança se limitou a confirmar o despacho do Comandante da PSP, remetendo para os fundamentos aí adoptados.
     Pelo contrário, defendem os recorrentes que, estando a decisão do Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública sujeita ao recurso hierárquico necessário, é o acto praticado pelo Senhor Secretário para a Segurança impugnável contenciosamente.
     Coloca-se a questão de saber se é exclusiva a competência conferida ao Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública na matéria em causa.
     Vejamos.
     No que respeita à competência dos órgãos das pessoas colectivas, ensina Marcello Caetano que cada pessoa colectiva tem, na maioria dos casos, mais de um órgão e os órgãos, por sua vez, são coadjuvados por agentes que desempenham os cargos públicos.
     E a competência de um órgão é o complexo de poderes funcionais conferido por lei a cada órgão para o desempenho das atribuições da pessoa colectiva em que esteja integrado.
     Quando numa pessoa colectiva vários órgãos ou agentes se incumbem da mesma matéria, formando hierarquia, os respectivos poderes distribuem-se entre eles tendo em consideração a sua posição relativa na escala hierárquica, sendo a regra de que a competência do superior compreende a dos seus subalternos.1
     Sobre o tema de como saber se efectivamente a competência do superior envolve a do inferior, e ao indicar vários critérios para o efeito, defende Robin de Andrade que “Quando nenhum dos elementos anteriores nos trouxer qualquer indicação decisiva para a resolução do problema, deve entender-se que a competência do superior envolver a do inferior, que, portanto, ao superior é reconhecido o poder de avocar e de revogar os actos do inferior, de tal forma que os actos do inferior não se possam considerar resoluções finais nem actos definitivos, por deles caber recurso hierárquico necessário para o superior. É a própria organização hierárquica dos serviços que permite presumir esta solução, na medida em que o poder de direcção do superior tem como seu apoio natural, embora não necessário, a competência dispositiva do superior sobre os assuntos objecto da direcção”. E mesmo nos casos em que o poder de avocação não seja reconhecido ao superior, isso não significa necessariamente que a sua competência não envolva a do inferior.2
     Mas há casos em que a lei confere aos subalternos competência exclusiva, subtraída aos seus superiores, reservando aos subalternos “o seu exercício em termos expressos ou de maneira que claramente se deduza que quis estabelecer uma distribuição de poderes e ordenar um processo de modo a acautelar ou garantir os direitos dos administrados.
     Estão nestes casos os preceitos que permitem a aplicação de sanções pelo subalterno com recurso para o superior, pois a preterição da ordem hierárquica equivaleria à supressão de um grau de jurisdição”.3
     É esta também a opinião de Freitas do Amaral, que sustenta a competência separada do subalterno como regra geral, dizendo que “o subalterno é por lei competente para praticar actos administrativos, que podem ser executórios, mas não são definitivos, pois dele cabe recurso hierárquico necessário (é a regra geral no nosso direito, quanto aos actos praticados por subalternos”.4
     Para além das considerações doutrinais acima expostas, resulta claramente da relação hierárquica existente nos órgãos administrativos, em que se reconhece ao superior o poder de direcção do inferior, bem como da disposição legal sobre a competência para a revogação dos actos administrativos, que a regra no nosso Direito é também a apontada, a de que a competência do superior compreende a dos subalternos, sendo a competência exclusiva destes, subtraída aos seus superiores, a excepção.
     Na realidade, dispõe o art.º 131.º n.º 1 do Código de Procedimento Administrativo que “Salvo disposição especial, são competentes para a revogação dos actos administrativos, além dos seus autores, os respectivos superiores hierárquicos, desde que não se trate de acto da competência exclusiva do subalterno”.
     Do preceito resulta que os superiores hierárquicos são competentes para a revogação dos actos administrativos praticados por subalternos (regra), só assim não acontecendo quando se trate de acto da competência exclusiva do subalterno (excepção).5
     Como afirma Paulo Otero, para o direito português perante o preceito semelhante, a competência revogatória do órgão titular de um poder de supremacia intra-administrativa compreende sempre a competência revogatória do autor do acto submetido a essa mesma relação e “a identidade de competência revogatória entre os referidos órgãos, expressando uma situação de concorrência de competências administrativas, vem demonstrar que também ao nível da titularidade do poder revogatório só excepcionalmente existe um único órgão exclusivamente competente”.
     Acresce que “o campo de operatividade do poder de direcção confere ao superior hierárquico a possibilidade de emanar ordens e instruções sobre toda a actividade confiada por lei aos órgãos subalternos, definindo o momento e o conteúdo decisórios – senão mesmo ditando-lhes palavra por palavra a própria decisão – encontrando-se estes sujeitos a um dever geral de obediência.
     A circunstância de o poder de direcção permitir ao superior hierárquico interferir sobre todas as matérias da competência dos subalternos, podendo mesmo ir ao ponto de esvaziar ou expropriar a discricionariedade decisória que lhes foi conferida por lei (…), tem de significar, forçosamente, a existência de um nexo de competência comum entre superior e subalternos.6
     Como pode um órgão determinar validamente o conteúdo de uma decisão integrante da competência externa de outros órgãos se também não participa de qualquer forma na competência destes últimos? Como se pode justificar a faculdade de o superior hierárquico interferir sobre todas as matérias da competência dos respectivos subalternos, emitindo ordens e instruções vinculativas sobre o sentido concreto de exercício dos respectivos poderes decisórios, se ele também não partilhar o exercício de tais poderes?”7
     Por outro lado, a Lei n.º 2/1999 (Lei de Bases da Orgânica do Governo) prevê, no seu o art. 17º, as competências dos titulares dos principais cargos: “Os titulares dos principais cargos exercem as competências previstas nos diplomas orgânicos das entidades ou serviços que dirigem ou tutelam e nos demais diplomas legais”.
     E de acordo com o diploma que estabelece a organização, competências e funcionamento dos serviços e entidades públicas, o Regulamento Administrativo n.º 6/1999, a competência dos Secretários abrange áreas de governação.
     No que tange às competências do Secretário para a Segurança, estipula o artigo 4.º do mencionado Regulamento que o Secretário para a Segurança “exerce competências nas seguintes áreas de governação:
     1) Segurança pública interna da Região Administrativa Especial de Macau;
     2) Investigação criminal;
     3) Controlos de imigração;
     4) Fiscalização do tráfego marítimo e das respectivas regras disciplinadoras;
     5) Protecção Civil;
     6) Coordenação e gestão do sistema prisional.
     7) Actividades alfandegárias no âmbito definido pela Lei n.º 11/2001”.
     E fica na dependência do Secretário para a Segurança o Corpo de Polícia de Segurança Pública, conforme a disposição no n.º 2 do art.º 4.º e no Anexo IV do Regulamento Administrativo n.º 6/1999.
     Ao mesmo tempo, dispõe expressamente o n.º l do art. 1º do Regulamento Administrativo n.º 22/2001, o Corpo de Polícia de Segurança Pública fica na dependência do Secretário para a Segurança.
     Tem, assim, de se entender que o Secretário para a Segurança exerce todas as competências na área da segurança pública, sem prejuízo de casos especiais em que a lei disponha em sentido contrário, concedendo competências exclusivas aos subalternos.
     E o Secretário para a Segurança tem poder hierárquico sobre o Corpo de Polícia de Segurança Pública, donde decorre o seu poder de direcção sobre os órgãos deste Corpo e daqui a sua competência cumulativa sobre as áreas em que esses órgãos disponham de competências.
     Voltando ao caso ora em apreciação, estabelece o n.º 2 do art.º 27.º do Decreto-Lei n.º 77/99/M que a concessão da licença de uso e porte de arma de defesa é da competência do comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública, mediante requerimento do interessado, que a pode denegar por razões gerais de segurança e ordem públicas.
     Não se estabelece nenhuma competência exclusiva deste órgão.
     Logo, funcionando a regra geral de a competência do superior compreender a dos subalternos, o Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública exerce uma competência própria, que não sendo exclusiva, é comum ao seu superior.
     Daí que o acto praticado pelo Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública, organicamente subalterno do Secretário para a Segurança, está sujeito a impugnação administrativa necessária, não sendo ainda contenciosamente recorrível, nos termos do art.º 28.º n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso.
     O acto recorrível é, pois, do Secretário para a Segurança.
     Pelo que é de revogar o Acórdão recorrido.
     ...”
    
     Salvo o devido respeito por opinião contrária sobre esta questão de direito, concordamos com o TUI que entendeu no acórdão supracitado que não cabe recurso contencioso imediato da decisão feita pelo Comandante do CPSP no exercício da competência conferida pelo art.º 27.º, n.º 2 do Regulamento de Armas e Munições, a qual está ainda sujeita ao recurso hierárquico necessário para o superior hierárquico do Comandante -- o Secretário para a Segurança, tendo em conta que o legislador não dispõe expressamente que a referida competência é competência exclusiva do Comandante do CPSP, e nos termos do art.º 17.º da Lei de Bases da Orgânica do Governo, aprovada pela Lei n.º 2/1999 de 20 de Dezembro, conjugado com o art.º 4.º e o Anexo IV do Regulamento Administrativo n.º 6/1999 de 20 de Dezembro (Determina a organização, competências e funcionamento dos serviços e entidades públicos), e com o art.º 131.º, n.º 1 e o art.º 154.º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo, bem como o art.º 1.º, n.º 1 do Regulamento Administrativo n.º 22/2001 de 22 de Outubro (Aprova a organização e funcionamento do Corpo de Polícia de Segurança Pública).
     Por outro lado, da análise global do Regulamento de Armas e Munições decorre que, além do Governador (Chefe do Executivo) (Cfr. os art.ºs 8.º, n.º 1, 18.º, n.º 2, 22.º. al. e), 23.º, 24.º, 40.º a 42.º e 48.º a 49.º), cabe ao CPSP a fiscalização de armas e munições e o exercício das competências (Cfr. os art.ºs 5.º, n.º 2, 13.º, n.º 1, 14.º, 15.º, n.º 3, 20.º, 21.º, n.º 2, 27.º, n.º 2, 28.º, n.º 2, 34.º, 35.º e 36.º, n.º 1). No entanto, o Regulamento não tem disposições expressas relativas aos meios de impugnação administrativa ou à recorribilidade contenciosa das decisões proferidas pelo Comandante do CPSP no exercício dessas competências, (Cfr. os art.ºs 5.º, n.º 2, 15.º, n.º 3, 20.º, 21.º, n.º 2, 27.º, n.º 2 e 28.º, n.º 2). Mas nos art.ºs 38.º e 39.º do mesmo diploma está previsto o seguinte:
    “Artigo 38.º
    (Competência sancionatória)
      A aplicação das multas previstas no presente regulamento compete ao director dos Serviços de Economia, relativamente às infracções ao regime das operações de comércio externo, e ao comandante do CPSP, relativamente às restantes.
    Artigo 39.º
    (Pagamento da multa)
      1. A multa é paga no prazo de 30 dias a contar da data de notificação da decisão sancionatória.
      2. Na falta de pagamento voluntário da multa, no prazo fixado no número anterior, procede-se à sua cobrança coerciva, nos termos do processo de execução fiscal, através da entidade competente, servindo de título executivo a certidão da decisão sancionatória.
      3. Da aplicação da multa cabe recurso para o Tribunal Administrativo.”
     Daí se vê que o legislador estabelece a recorribilidade contenciosa imediata das decisões sancionatórias do Comandante do CPSP relativas às infracções administrativas derivadas das actividades regulamentadas por esse diploma, o que implica que, das decisões feitas pelo Comandante do CPSP ao abrigo dos demais preceitos do mesmo diploma, como seja o art.º 27.º, n.º 2 aplicável ao acto recorrido nos autos, não cabe recurso contencioso imediato quando não se prevê expressamente a competência exclusiva do Comandante do CPSP, visto que tais decisões não são actos administrativos finais, estando sujeitas à impugnação administrativa necessária perante o superior hierárquico do seu autor.
     Com base nisso, em consonância com o art.º 28.º, n.º 1 do CPAC, é de rejeitar o presente recurso contencioso por ser contenciosamente irrecorrível o acto recorrido.”
    
    3. Não vamos sufragar esta tese, na medida em que temos presente a inversão na Jurisprudência que foi trilhada até ao momento em que sobrevieram outras decisões desta Instância, como foi o caso das proferidas em 9 de Maio de 2013, no processo n.º 32/2012 e de 31 de Outubro de 2013, no processo n.º 853/2012, aí se afirmando que,
     "quando a lei atribuir uma competência a um órgão subalterno da Administração Pública para a prática de um determinado acto administrativo, desse acto não cabe recurso hierárquico necessário salvo quando especialmente previsto na lei".
    E não se pode perder de vista que esta questão - a da recorribilidade contenciosa do acto - ''prende-se com a sua definitividade em termos de estabelecimento da definição de uma situação jurídica, isto é, quando constitua uma resolução final da Administração definindo a sua situação jurídica ou a de pessoas que com ela estão, ou pretendem estar, em relação jurídica, pelo que o acto administrativo definitivo há-de ser um acto pela qual a Administração define a sua esfera jurídica ou a esfera de outros sujeitos de direito que com ela estão ou pretendiam estar em relação jurídica, em termos de uma resolução final, no sentido de que com ela se põe termo a um processo gracioso ou a um seu incidente autónomo e de que é a resolução dum órgão de cujos actos não cabe recurso hierárquico necessário" conforme resulta do Acórdão deste TSI, de 14 de Julho de 2012, explicitada no processo n.º 758/2011.
    Nesse mesmo Acórdão pode ler-se: "O acto administrativo não pode ser mera e simplesmente considerado como definitivo quando se verifica a situação em que esgota a via administrativa, de modo a considerar que não são definitivos actos administrativos, por natureza, os actos preparatórios, os de execução, os confirmativos de actos definitivos anteriores, os internos".
    Mais se afirmando que "o recurso hierárquico necessário é o meio de que o destinatário de um acto administrativo definitivo por sua natureza se deve servir para provocar a decisão do órgão a quem cabe proferir, em sede administrativa, a última decisão sobre aquele caso". Concluindo-se que "como dispõe o artigo 154º do CPA, o recurso hierárquico é necessário ou facultativo, consoante o acto a impugnar seja ou não insusceptível de recurso contencioso. E para saber se o acto administrativo é ou não susceptível de recurso hierárquico necessário, deve-se atentar no estatuto da entidade recorrida".
    4. As razões da mudança estão explicitadas no acórdão n.º 853/2012, de 31 de Out/2013, já citado, para onde nos remetemos.
    Privilegia-se uma desconcentração administrativa, mas sem quebra da autoridade da chefia que não deixa de poder intervir, seja por via do recurso facultativo, seja por via do poder de avocação, seja por via do poder de dar instruções, tudo conforme as diferentes situações, a oportunidade e a conveniência o exija, nas diferentes situações. O poder da Administração, com esta opção, não deixa até, a meu ver, de sair reforçado, aliviando-se o trabalho dos superiores máximos que me parece estarem talhados para outras tarefas mais gerais e abrangentes, não se devendo ocupar de cada um dos casos particulares que chegam à Administração.
     Muito embora este Tribunal tenha ensaiado uma outra via, ao arrepio da linha anteriormente seguida, em que se entendia que no caso de atribuição de competência a um dado órgão, desde que não estivesse salvaguardada na lei, expressamente, a sua competência exclusiva ou não estivesse prevista a necessidade de prévio recurso hierárquico necessário, antes de o particular interessado recorrer ao recurso contencioso, como forma de impugnação judicial do acto, teria de esgotar previamente a via hierárquica, não obstante, pois, os acórdãos citados desta Instância e outros haverá, o certo é que o TUI - Proc. n.º 10/2014 - veio a decidir em sentido contrário.
    Temos presente essa altíssima Jurisprudência, mas as razões que nos levaram a inverter o caminho trilhado mantêm-se, continuando a entender-se válidos os argumentos avançados.
    Em nome da certeza e da segurança jurídica, num ordenamento de dimensão reduzida, numa matéria que quotidianamente congrega e reclama a intervenção de diversos órgãos, para mais quando o mais Alto Tribunal da RAEM já tomou posição, impõe-se que se fixe Jurisprudência obrigatória, até em nome da credibilização dos tribunais que podia ser afectada se apenas uma decisão do TUI servisse logo de farol, pese toda a consideração pelo papel que ele desempenha e pelo aprofundado e saber ínsito às suas decisões.
    Estamos cientes que continuar a decidir ao arrepio daquela decisão pode dar um sinal contraditório, gerador de uma grande incerteza, baralhando os diferentes operadores do Direito, criando, porventura, incómodo, insegurança, se não, prejuízos até para os particulares e transmitindo uma imagem de divergência gratuita para a Sociedade.
    Por isso mesmo se imporá a fixação da Jurisprudência obrigatória, a suscitar pelo MP ou pelas partes nos termos das leis do Processo.
    Há momentos em que há que repensar, reflectir sobre práticas e procedimentos e, quantas vezes, não se chega à conclusão de que os caminhos trilhados durante anos e anos não eram os mais certos, correctos e justos!
    Daí que a provocação à auto e hétero-reflexão possa ser vantajosa. A inversão ensaiada não foi acolhida superiormente, mas não deixou de ser reflectida e até em sede legislativa as sementes podem estar lançadas num ou noutro sentido.
    
    5. Aliás, não se deixa de referir – em termos meramente de Direito Comparado – que o novo Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Dec.-lei n.º 4/2015, de 7/Jan., em Portugal, no artigo 185º, passou a acolher o entendimento que faz vencimento no presente acórdão, porventura até numa perspectiva interpretativa do regime vigente, que a partir de um determinado momento o STA inverteu.
    
    6. Quanto à questão da oportunidade de ser suscitada a questão relativa à recorribilidade do acto, o que se nos oferece dizer é que, não obstante haver um momento de eleição para tal questão ser deduzida - alude-se ao disposto no artigo 68º, n.º 5 do CPAC -, enquanto matéria exceptiva, em sede de contestação, o facto é que, sendo matéria de conhecimento oficioso, sempre ela pode ser conhecida - alude-se ao art. 71º, n.º 1 do CPAC - , desde que sobre ela o tribunal não tenha emitido pronúncia.
    
    7. Pelo que não se sufraga o juízo de rejeição do recurso, em momento posterior à possível "rejeição liminar" contemplada na al. c) do n.º 2 do art. 46°, CPAC, adoptando-se assim o entendimento de que os actos administrativos praticados por órgãos subalternos, mesmo que não se trate de acto de competência exclusiva, não estão sujeitos a impugnação administrativa necessária, sendo que o n.º 2 do art. 27° do Dec.-Lei 77/99/M não estabelece uma competência exclusiva ao comandante do CPSP, em matéria de concessão de licença de uso e porte de arma de defesa, agindo o mesmo, a tal nível, com competência própria, comum ao seu superior, não se impondo a interposição do recurso hierárquico necessário, da decisão do Comandante do CPSP, organicamente subalterno do Secretário para a Segurança.
    Tudo na esteira da Jurisprudência já citada e da doutrina alicerçada, entre outros, na pesquisa empreendida pelo Exmo 2º Adjunto que integra o presente Colectivo, “Breve Ensaio Sobre a Competência Hierárquica”, Almedina, 2000.
    
    8. Quanto às notificações
    Aludimos já aos problemas que podem advir de diferentes interpretações quanto às notificações e imaginamos até as dores de cabeça para as chefias, quando inquiridos pelos funcionários como devem notificar os interessados sobre as vias impugnatórias que devem usar!
    Quanto à 1ª notificação empreendida ao recorrente, em 18/4/13 mostra-se não ter havido aí qualquer problema.
    Já quanto à "rectificação" empreendida com a notificação de 14/5/13, que terá induzido o interessado em erro, como diz o Digno Magistrado do MP, trata-se, contudo, de matéria exterior ao acto, que, podendo contender com a eficácia respectiva, não é susceptível de afectar a sua validade, não se encontrando, de todo o modo, o interessado inibido de, assim o entendendo, poder, pelos meios próprios, responsabilizar quem de direito por eventuais prejuízos advenientes do engano provocado, sendo certo, porém, que o mesmo, "malgré tout", não deixou de deter a possibilidade de fazer valer os seus interesses através da impugnação de acto de indeferimento tácito do Secretário para a Segurança.
    Na verdade uma errada notificação resultante de uma errada interpretação da lei não pode vincular a interpretação que cabe a todo e qualquer interessado fazer.
    
    Nesta conformidade e sem necessidade de outros desenvolvimentos somos a conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida.
    
    V - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em conceder provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, revogar a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir para conhecimento do fundo, se outras razão a tal não se opuserem.
    Sem custas, por não serem devidas.
Macau, 24 de Setembro de 2015,
Joao A. G. Gil de Oliveira
Jose Candido de Pinho
Ho Wai Neng (vencido, mantendo a posição já assumida na declaração de voto vencido feito no Proc. nº 853/2012, em 31/10/2013)
Fui presente
Mai Man Ieng

1 Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, 10.ª ed., I vol., p. 223 e 224.
2 Robin de Andrade, A Revogação dos Actos Administrativos, Coimbra Editora, 2.ª edição, 1985, p. 283 a 285.
3 Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, 10.ª ed., I vol., p. 224 e 225.
4 Freitas do Amaral, Conceito e Natureza do Recurso Hierárquico, 1981, Vol. I, p. 62 e Curso de Direito Administrativo, 3a ed., I vol., p. 785.
5 Mas em recurso hierárquico o superior pode revogar o acto recorrido, mesmo que a competência do subalterno seja exclusiva. Mas já não modificar o acto ou substituí-lo (n.º 1 do art.º 161.º do Código de Procedimento Administrativo).
6 Seguimos aqui de perto aquilo que antes se escreveu sobre a matéria, cfr. Paulo Otero, Conceito e Fundamento ... , pp. 120ss.
7 Paulo Otero, Legalidade e Administração Pública, 2003, p. 884 e 885.
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