Processo nº 101/2016
(Autos de recurso penal)
ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
Relatório
1. A, arguido com os sinais dos autos respondeu no T.J.B. vindo a ser condenado pela prática como autor de 1 crime de “furto”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 1, al. a) do C.P.M., (agravado pelo art. 22° da Lei n.° 6/2004), fixando-lhe o Colectivo a quo a pena de 1 ano e 9 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico como a pena aplicada no âmbito do Proc. n.° CR4-14-0524-PCS, por 1 outro crime de “furto (simples)”, (dois meses de prisão, com suspensão da execução da pena por 1 ano), fixou-lhe o Tribunal a pena única de 1 ano e 10 meses de prisão, condenando ainda o arguido a pagar ao ofendido uma indemnização total de MOP$83.570,00; (cfr., fls. 130 a 136 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).
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Inconformado, o arguido recorreu.
Em síntese, diz que por erro ou omissão da sua notificação foi julgado a revelia, o que lhe ofendeu o direito de estar presente na audiência, que o Acórdão recorrido padece de “erro notório na apreciação da prova” e violação do “princípio in dubio pro reo”, que houve renúncia ou desistência da queixa do ofendido, e, por fim, que excessiva é a pena decretada que sempre devia ser suspensa na sua execução; (cfr., fls. 161 a 187).
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Respondendo, diz o Ministério Público que o recurso não merece provimento; (cfr., fls. 192 a 198).
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Neste T.S.I., juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:
“Na Motivação de fls.162 a 187 dos autos, o recorrente assacou, ao douto Acórdão sob sindicância, a violação das regras da notificação que afectou o exercício do direito de defesa, o erro notório na apreciação de prova, a renúncia pela ofendida de da responsabilidade penal e civil do recorrente, a excessiva severidade da pena condenada e, afinal, a violação do art.48° do CP por não lhe conceder a suspensão da execução.
Antes de mais, sufragamos as criteriosas explanações do ilustre Colega na Resposta (cfr. fls192 a 198 dos autos), no sentido do não provimento do recurso em apreço.
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Repare-se que a prisão preventiva imposta ao recorrente não foi ordenada nestes autos, mas sim no Processo n.°CR1-15-0267-PCC (art.10° da Motivação), e o recorrente não alegou nem provou que ele tivesse efectivado a comunicação daquela prisão preventiva.
Nos termos do disposto na parte final do n.°3 do art.315° do CPP, a declaração de fls.53 dos autos prestada espontaneamente pelo recorrente faz com que não seja obrigatória nem legalmente exigida a comparência dele na audiência de julgamento.
Não descortinando disposição legal que prescreva expressamente a nulidade à inobservância do art.101° do CPP, parece-nos que a apontada falta de notificação pessoal ao recorrente do despacho de designação da data de julgamento constitui apenas a mera irregularidade.
De outra banda, óbvio é que o recorrente não demonstrou, na sua Motivação, em quê aspecto é que a falta de notificação pessoal do despacho de designação da data de julgamento afectaria ou prejudicaria efectivamente o exercício do direito de defesa.
Nesta linha de consideração, entendemos modestamente que a invocada «violação das regras da notificação» não dá lugar à nulidade, nem ao erro de julgamento. Como mera irregularidade, a mencionada falta de notificação pessoal do despacho de designação da data de julgamento é irrelevante para efeitos de recurso.
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No que respeite ao «erro notório na apreciação de prova» previsto na c) do n.°2 do art.400° do CPP, é pacífica e consolidada, no nosso actual ordenamento jurídico de Macau, a seguinte jurisprudência (cfr. a título exemplificativo, Acórdãos do Venerando TUI nos Processo n.°17/2000, n.°16/2003, n.46 /2008, n.°22/2009, n.°52/2010, n.°29/2013 e n.°4/2014): “O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem de formação média facilmente dele se dá conta.
Fundamentando o invocado erro notório na apreciação de prova e a consequente ofensa do princípio de in dúbio pro reo, o recorrente arguiu que o depoimento da ofendida, sendo prova isolada, era insuficiente para apoiar o facto dado por provado de serem, ao menos, de MOP$83,570.00 o valor total dos objectos por si furtados,
Na nossa óptica, nada impede que os MM°s. Juízes do Tribunal colectivo a quo procedessem, segundo critério prudente e razoável, o valor de cada objecto e o correspondente valor total, ou aceitassem criticamente o valor declarado pela ofendida como verdadeiro e exacto.
De qualquer modo, o valor total adoptado pelo Tribunal colectivo a quo não está em desconformidade com o que realmente se provou ou não provou, nem configurou conclusão logicamente inaceitável, ainda nem infringem as regras de experiência ou as sobre o valor da prova vinculada ou as legis artis. Daí não existe in casu este erro.
Bem, os argumentos aduzidos em sede do «erro notório na apreciação de prova» mostram nitidamente que ele pretendeu pôr em crise, no fundo, a apreciação e livre convicção do Tribunal a quo sobre os vários meios de prova, tentando sobrepor a sua valorização sobre a do Tribunal.
O que justifica que recordamos o ensinamento do Venerando TUI no seu Processo n.°13/2001: O recorrente não pode utilizar o recurso para manifestar a sua discordância sobre a forma como o tribunal a quo ponderou a prova produzida, pondo em causa, deste modo, a livre convicção do julgador.
Por sua vez, o Venerando TSI inculca (aresto no Proc. n.°470/2010): Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.
Em conformidade com tais sensatas jurisprudências, afigura-se-nos inquestionável que não se verifica o invocado «erro notório na apreciação de prova», sendo os argumentos do recorrente supra transcritos vedado pelo preceito no art.114° do CPP.
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Sendo público o crime de furto qualificado p.p. pelo art.114° do CP, o respectivo procedimento penal não depende de queixa. Daí a renúncia manifestada pela ofendida durante a inquirição (fls.4v. dos autos) não faz extinguir a responsabilidade penal do recorrente.
Em consequência disso, não colide com o preceito no art.108° do CP o douto Acórdão recorrido na parte respeitante a responsabilidade penal. E a aludida renúncia aparece-nos que não invalida a condenação do recorrente na obrigação de indemnização.
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À luz da moldura penal prevista no n.°1 do art.198° do CP e ainda do disposto no art.22° da Lei n.°6/2004, ponderando equilibradamente a ilicitude, a culpa, a consequência e a personalidade do recorrente, temos por justas a pena parcelar de um ano e nove meses de prisão efectiva, bem como a única um ano e dez meses de prisão efectiva, não verificando-se a excessiva severidade desta pena.
Avaliando a personalidade do recorrente em harmonia com regras de experiência, afigura-se-nos que a simples censura de facto e a ameaça da prisão é, no caso sub iudice, inadequada e insuficiente para realizar as finalidades da punição, sendo inviável a suspensão da execução.
Tudo isto torna infundada a arguição de que o Acórdão em causa ofende as disposições legais nos arts.65°, 40° e 48° do CP.
Por todo o expendido acima, pugnamos pela total improcedência do presente recurso”; (cfr., fls. 208 a 210).
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
Fundamentação
Dos factos
2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 131-v a 132-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.
Do direito
3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou pela prática como autor de 1 crime de “furto”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 1, al. a) do C.P.M., (agravado pelo art. 22° da Lei n.° 6/2004), fixando-lhe o Colectivo a quo a pena de 1 ano e 9 meses de prisão, e que, em cúmulo jurídico como a pena aplicada no âmbito do Proc. n.° CR4-14-0524-PCS por 1 outro crime de “furto” do art. 197° do C.P.M., fixou-lhe o Tribunal a pena única de 1 ano e 10 meses de prisão, condenando ainda o arguido a pagar ao ofendido uma indemnização total de MOP$83.570,00.
E, como já se deixou relatado, é de opinião que por erro ou omissão da sua notificação para a audiência de julgamento foi julgado à revelia, o que lhe anulou o direito de estar presente na audiência, que o Acórdão recorrido padece de “erro notório na apreciação da prova” e violação do “princípio in dubio pro reo”, que houve renúncia ou desistência da queixa do ofendido, e que excessiva é a pena que sempre devia ser suspensa na sua execução.
–– Ponderando nas questões pelo arguido ora recorrente colocadas, e não tendo este T.S.I. de as aprecias em conformidade com a ordem pelo recorrente apresentada, afigura-se-nos de começar pela alegada “renúncia ou desistência de queixa”, já que, a proceder, prejudicadas ficam todas as outras.
Pois bem, diz o ora recorrente que houve “renúncia e/ou desistência” de queixa pelo ofendido.
Porém, como é evidente, labora em equívoco.
O crime pelo qual foi punido – o de “furto (qualificado)”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 1, al. a) do C.P.M. – é um crime “público”, não estando a legitimidade do Ministério Público dependente de queixa do ofendido, (como bem se constata do que se preceitua no art. 38° do C.P.P.M.).
Dest’arte, mesmo que tivesse havido a invocada “renúncia e/ou desistência de queixa” – e não houve – nenhum obstáculo havia – existe – ao prosseguimento dos autos.
–– Continuemos, passando agora para a questão do seu alegado indevido “julgamento à revelia”.
Pois bem, sobre a questão incide o estatuído no art. 313°, n.° 1 do C.P.P.M., onde se prescreve que “É obrigatória a presença do arguido na audiência, sem prejuízo do disposto nos artigos 314.º a 316.º”, e, o estatuído no art. 315°, n.° 2 do mesmo Código, onde se prescreve que “Sempre que o arguido se encontrar impossibilitado de comparecer à audiência, nomeadamente por idade, doença grave ou residência fora da Região Administrativa Especial de Macau, pode requerer ou consentir que a audiência tenha lugar na sua ausência”.
No caso dos autos, o Tribunal a quo efectuou o julgamento à revelia – “consentida” – do arguido, uma vez que pelo mesmo foi autorizado que se procedesse à audiência sem a sua presença, (como aliás consta da declaração de fls. 53).
Porém, o certo é que aquando do julgamento, o arguido encontrava-se preventivamente preso no E.P.C., à ordem de um outro processo.
E, então, quid iuris?
Ora, sem prejuízo do muito respeito por opinião em sentido diverso, cremos que, à primeira vista, a circunstância de se encontrar preso preventivamente e de mesmo assim responder à revelia é algo impressionante.
Todavia, importa atentar que nos presentes autos nenhuma informação havia quanto a tal prisão preventiva.
E que, para além disso, o que nestes autos existia era (antes) uma informação (oficial) a dar conta que o ora recorrente tinha sido pela P.S.P. expulso para o Continente em 09.12.2014, (e proibido de reentrar em Macau por 7 anos, cfr., fls. 62), tendo-se, nesta conformidade, efectuado as competentes notificações para a morada que consta do Termo de Identidade e Residência que oportunamente prestou, (cfr., fls. 52), prosseguindo-se, posteriormente, para a audiência de julgamento à sua revelia atenta o expresso consentimento pelo mesmo prestado; (cfr., fls. 53).
Dest’arte, autorizado que foi o julgamento à sua revelia, constando (apenas) dos autos que o ora recorrente tinha sido expulso e proibido de reentrar em Macau, observadas que foram as formalidades para que o julgamento prosseguisse (com notificações para a morada pelo mesmo declarada) e nenhuma questão tendo sido suscitada (pelo seu Exmo. Defensor) aquando da audiência, motivos não nos parecem existir para não se considerar válida e legal a audiência de julgamento que teve lugar no T.J.B. e da qual resultou o veredicto condenatório objecto do presente recurso.
Diferente seria a situação se o recorrente estivesse preso à “ordem dos presentes autos”.
Aí, tal situação não era – nem podia ser – desconhecida, e, como é evidente, motivos não havia para se efectuar a audiência à sua revelia.
Todavia, in casu, não foi assim, e, daí, a solução que se deixou adiantada.
Continuemos.
–– Quanto ao “erro”, repetidamente temos considerado que o mesmo apenas existe “quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores”.
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I. de 14.01.2016, Proc. n.° 1053/2015, de 25.02.2016, Proc. n.° 94/2016 e de 03.03.2016, Proc. n.° 82/2016).
Como também já tivemos oportunidade de afirmar:
“Erro” é toda a ignorância ou falsa representação de uma realidade. Daí que já não seja “erro” aquele que possa traduzir-se numa “leitura possível, aceitável ou razoável, da prova produzida”.
Sempre que a convicção do Tribunal recorrido se mostre ser uma convicção razoavelmente possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve a mesma ser acolhida e respeitada pelo Tribunal de recurso.
O princípio da livre apreciação da prova, significa, basicamente, uma ausência de critérios legais que pré-determinam ou hierarquizam o valor dos diversos meios de apreciação da prova, pressupondo o apelo às “regras de experiência” que funcionam como argumentos que ajudam a explicar o caso particular com base no que é “normal” acontecer.
Não basta uma “dúvida pessoal” ou uma mera “possibilidade ou probabilidade” para se poder dizer que incorreu o Tribunal no vício de erro notório na apreciação da prova; (cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I. de 14.01.2016, Proc. n.° 863/2015 e de 25.02.2016, Proc. n.° 87/2016).
Ora, no caso, a “questão” coloca-se quanto ao “valor do prejuízo” do ofendido do crime pelo recorrente cometido, e, sinceramente, (há que referir), não será (certamente) em virtude da uma mera afirmação do recorrente no sentido de que outro devia ser (o valor) para se considerar justificada a existência do imputado “erro”, (muito menos “notório”).
Como bem se vê, limita-se o recorrente a tentar controverter a factualidade provada, afrontando o princípio da livre apreciação da prova consagrado no art. 114° do C.P.P.M., o que, como é óbvio, não colhe.
–– No que ao princípio in dubio pro reo diz respeito, vejamos.
“O princípio “in dubio pro reo” identifica-se com o da “presunção da inocência do arguido” e impõe que o julgador valore sempre, em favor dele, um “non liquet”.
Perante uma situação de dúvida sobre a realidade dos factos constitutivos do crime imputado ao arguido, deve o Tribunal, em harmonia com o princípio “in dubio pro reo”, decidir pela sua absolvição”; (cfr., v.g. o recente Ac. deste T.S.I. 14.01.2016, Proc. n.° 1053/2015 e de 25.02.2016, Proc. n.° 94/2016).
Por sua vez, e como entende a doutrina, segundo o princípio “in dubio pro reo” «a persistência de dúvida razoável após a produção da prova tem de actuar em sentido favorável ao arguido e, por conseguinte, conduzir à consequência imposta no caso de se ter logrado a prova completa da circunstância favorável ao arguido»; (cfr., Figueiredo Dias, in “Direito Processual Penal”, pág. 215).
Conexionando-se com a matéria de facto, este princípio actua em todas as vertentes fácticas relevantes, quer elas se refiram aos elementos típicos do facto criminalmente ilícito - tipo incriminador, nas duas facetas em que se desdobra: tipo objectivo e tipo subjectivo - quer elas digam respeito aos elementos negativos do tipo, ou causas de justificação, ou ainda, segundo uma terminologia mais actualizada, tipos justificadores, quer ainda a circunstâncias relevantes para a determinação da pena.
Porém, importa atentar que o referido o princípio (“in dubio pro reo”), só actua em caso de dúvida (insanável, razoável e motivável), definida esta como “um estado psicológico de incerteza dependente do inexacto conhecimento da realidade objectiva ou subjectiva”; (cfr., Perris, “Dubbio, Nuovo Digesto Italiano”, apud, Giuseppe Sabatini “In Dubio Pro Reo”, Novissimo Digesto Italiano, vol. VIII, págs. 611-615) .
Por isso, para a sua violação exige-se a comprovação de que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes, e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido; (neste sentido, cfr. v.g., o Ac. do S.T.J. de 29.04.2003, Proc. n.º 3566/03, in “www.dgsi.pt”).
Daí também que, para fundamentar essa dúvida e impor a absolvição, não baste que tenha havido versões dispares ou mesmo contraditórias, sendo antes necessário que, perante a prova produzida, reste no espírito do julgador – e não no do arguido ou recorrente – alguma dúvida sobre os factos que constituem o pressuposto da decisão, dúvida que, como se referiu, há-de ser “razoável” e “insanável”; (cfr., o Ac. deste T.S.I. de 25.02.2016, Proc. n.° 94/2016).
Na situação sub judice, não se vislumbra – nem o recorrente identifica – nenhuma dúvida (ou sequer hesitação) por parte do Tribunal a quo, evidente sendo que não foi tal princípio beliscado.
–– Quanto à pena.
Também aqui muito não se mostra de consignar.
Como resulta do que se deixou relatado, foi o arguido condenado pela prática como autor de 1 crime de “furto”, p. e p. pelo art. 198°, n.° 1, al. a) do C.P.M., (agravado pelo art. 22° da Lei n.° 6/2004), fixando-lhe o Colectivo a quo a pena de 1 ano e 9 meses de prisão.
Seguidamente, em cúmulo jurídico como a pena aplicada no âmbito do Proc. n.° CR4-14-0524-PCS, por 1 outro crime de “furto (simples)” (dois meses de prisão, com suspensão da execução da pena por 1 ano), fixou-lhe o Tribunal a pena única de 1 ano e 10 meses de prisão.
Como sabido é, ao dito crime de “furto (qualificado)”, pelo recorrente cometido cabe a pena de prisão até 5 anos ou pena de multa até 600 dias.
Nenhuma circunstância se apresentando como relevante para efeito de atenuação (geral) da pena, e aplicável sendo (antes) a circunstância agravante do art. 22° da Lei n.° 6/2004, cremos que, atentos os critérios do art. 40°, 64° e 65° do C.P.M., nenhum reparo merece a pena de 1 ano e 9 meses de prisão fixada.
Com efeito, totalmente inviável era a opção por uma pena não privativa da liberdade (cfr., art. 64° do C.P.M.), notando-se que a pena, (com a agravante), nem sequer chega ao meio da sua moldura.
Em relação ao cúmulo jurídico, observado mostram-se também os critérios do art. 71° do C.P.M., reparo não merecendo a pena única de 1 ano e 10 meses de prisão.
Por fim, quanto à “suspensão da execução da pena”, é também aqui de improceder o recurso.
Com efeito, e independentemente do demais, mostram os autos que o ora recorrente foi expulso de Macau e proibido de cá entrar por 7 anos.
Porém, como se deixou relatado o certo é que entretanto, (cerca de 3 meses depois – cfr., o recente Ac. deste T.S.I. de 25.02.2015, Proc n.° 106/2016) – regressou, violando a dita ordem de expulsão, demonstrando uma personalidade pouco compatível com um “juízo de prognose favorável” à sua futura conduta que, como se sabe, constitui pressuposto necessário à pretendida suspensão da execução.
Dest’arte, e não se nos apresentando verificados os pressupostos do art. 48° do C.P.M., também aqui não se pode reconhecer razão ao recorrente, com o que, improcede, in totum, o seu recurso.
Decisão
4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 6 UCs.
Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.800,00.
Macau, aos 17 de Março de 2016
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 101/2016 Pág. 22
Proc. 101/2016 Pág. 21