Processo nº 1021/2015-A
Data do Acórdão: 14ABR2016
Assuntos:
Suspensão da eficácia de acto administrativo
Prejuízos de difícil reparação
SUMÁRIO
De acordo com o despacho que versa sobre a concessão do terreno em causa, o terreno é aproveitado com a construção de um edifício industrial, de 3 pisos, para instalação de uma unidade fabril destinada à transformação de elementos de aço e outros metais e produção de artigos de esmalte para utilização doméstica, a explorar directamente pela ora requerente.
Ao dar de arrendamento ou ceder gratuitamente a favor de terceiros o terreno para os fins diversos daqueles a que se destina a sua concessão, a ora requerente está a dispor ou administrar os direitos que ela própria não tem, pois de acordo com o despacho da concessão do terreno, a concessionária, ora requerente, só pode aproveitar o mesmo terreno para a construção de um edifício industrial, de 3 pisos, para instalação de uma unidade fabril destinada à transformação de elementos de aço e outros metais e produção de artigos de esmalte para utilização doméstica.
Não obstante pendente o procedimento administrativo para a alteração das finalidades da concessão, tal como alega a requerente, o certo é que as finalidades do terreno não foram alteradas até à prolação do despacho que declarou a caducidade da concessão.
Assim sendo, a requerente não tem direito a pedir à Administração, mesmo na procedência do recurso de anulação do acto administrativo que declarou a caducidade da concessão, a indemnização pela impossibilidade, decorrente da execução imediata desse mesmo acto, de cumprir as suas obrigações contratualmente assumidas perante as sociedades terceiras que consistem na cedência do uso do terreno para fins diversos daqueles a que se destina o terreno por força do contrato da concessão.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 1021/2015-A
Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância
I – Relatório
A, Limitada, devidamente identificada nos autos, veio, ao abrigo do disposto nos artºs 120º e s.s., requerer a suspensão da eficácia do despacho, datado de 30SET2015, do Senhor Chefe do Executivo que declarou a caducidade de concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 2637m², situado na ilha de Taipa, na Zona de Aterro Pac On, designado por lote ..., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ..., a fls. .., do livro ….
Inconformada com o despacho veio interpor recurso contencioso de anulação e na pendência dele, formulou o presente pedido de suspensão da eficácia mediante o requerimento a fls. 2 a 22 dos presentes auto, cujo teor se dá aqui por integralmente transcrito.
Citada a entidade requerida, veio contestar pugnando pelo indeferimento do pedido.
O Dignº Magistrado do Ministério Público emitiu o seu douto parecer, no qual opinou no sentido de indeferimento da requerida suspensão.
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo é o próprio e inexistem nulidades.
Os sujeitos processuais gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade.
Inexistem excepções ou questões prévias que obstam ao conhecimento do mérito do presente recurso.
Sem vistos – artº 129º/2 do CPAC, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
De acordo com os elementos constantes dos autos e do processo instrutor, podem ser seleccionados os seguintes factos com relevância à decisão do presente pedido da suspensão de eficácia:
* Por despacho do Chefe do Executivo datado de 30SET2015 que declarou a caducidade de concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 2637m², situado na ilha de Taipa, na Zona de Aterro Pac On, designado por lote ..., descrito na Conservatório do Registo Predial sob o nº ..., a fls. …, do livro …;
* Inconformada com esse despacho do Chefe do Executivo, veio interpor recurso contencioso de anulação para este TSI, onde o recurso foi registado, autuado e distribuído sob o nº 1021/2015;
* Na pendência desse recurso contencioso de anulação, a requerente requereu a suspensão de eficácia desse despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas.
Então apreciemos.
A propósito da suspensão de eficácia de actos administrativos, o CPAC diz no seu artº 120º que:
A eficácia de actos administrativos pode ser suspensa quando os actos:
a) Tenham conteúdo positivo;
b) Tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
Assim, é de averiguar se o acto em causa tem conteúdo meramente negativo, pois a ser assim, o acto em causa não se mostra logo susceptível de ser objecto do pedido de suspensão de eficácia.
Portanto, temos de nos debruçar sobre esta questão primeiro.
Tradicionalmente falando, a suspensão de eficácia tem uma função conservatória ou cautelar, admitida no âmbito dos processos do contencioso administrativo, que visa obter provisoriamente a paralização dos efeitos ou da execução de um acto administrativo.
Assim, o acto administrativo cuja suspensão se requer tem de ter, por natureza, conteúdo positivo, pois de outro modo, a ser decretada a suspensão, em nada alteraria a realidade preexistente, deixando o requerente precisamente na mesma situação em que se encontra.
In casu, trata-se de um despacho que declarou a caducidade da concessão de um terreno.
A propósito da natureza do acto num caso congénere, este TSI chegou a pronunciar-se recentemente, no Acórdão tirado em 07ABR2016, no processo nº 1074/2015-A, nos termos seguintes:
……
2 – Da natureza do acto
É sabido que só é suspensível a eficácia de actos de conteúdo positivo ou, quando de conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva.
Verdade que, normalmente, um acto de não renovação ou que declara a caducidade se limita a uma mera constatação de facto, a uma mera enunciação de uma realidade previamente prevista, a uma simples expressão do reconhecimento de uma situação já verificada: o decurso do tempo (ou verificação duma condição resolutiva). Nesse sentido, habitualmente, o acto que declara a caducidade é acto negativo, porque não inovador1, porque não introduz alteração no “status” do interessado.
Contudo, algumas declarações de caducidade acabam por representar alguma interferência na esfera dos seus destinatários, na medida em que alteram o seu “status quo ante” ou que “obrigam” a uma alteração material e jurídica da situação daqueles. Isso é aqui particularmente visível, em virtude de a execução do acto implicar a desocupação do terreno concedido de todos e quaisquer haveres, máquinas, utensílios e veículos que ali estivessem e que pertencessem à requerente. A desocupação corta cerce qualquer expectativa jurídica, mais ou menos fundada, de levar a cabo a actividade para a qual o terreno foi concessionado.
É por esta razão que o acto administrativo em causa apresenta, quanto a nós, uma imediata repercussão negativa na esfera da requerente, circunstância que, por caber no âmbito de previsão da alínea b), do art. 120º do CPAC, permite a formulação do pedido e obriga à apreciação dos requisitos de procedibilidade.
Subscrevemos a tese vertida nesse Acórdão.
Portanto o acto da cuja eficácia que a requerente pretende ver suspensa é integrável no elenco dos actos susceptíveis de suspensão.
Então avancemos.
Passemos a debruçar-nos sobre a verificação ou não dos requisitos exigidos no artº 121º/1 do CPAC para o deferimento da requerida suspensão
Para o deferimento da tal providência, a lei exige a verificação cumulativa dos seguintes requisitos – artº121º/1-a), b) e c) do CPAC:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
Sendo de verificação cumulativa que é, a inverificação de qualquer deles implica logo o indeferimento da suspensão.
Comecemos então pelos requisitos exigidos nas alíneas b) e c), que nos se afiguram ser de fácil apreciação, tendo em conta a especificidade do caso, a matéria de facto assente, assim como os elementos constantes nos autos.
No que respeita ao requisito exigido na alínea b), não cremos que a não execução imediata, apenas num curto período de tempo correspondente ao tempo da pendência do recurso de anulação, do despacho cuja eficácia ora se requer, possa causar imediatamente lesão do interesse público de tal maneira grave que frustrará de todo em todo o fim concretamente prosseguido por este despacho, pois, pelo menos, de acordo com os elementos existentes quer nos presentes autos quer no Processo nº 1021/2015, não temos presente a existência de um projecto concreto de reaproveitamento do terreno a ser implementado imediatamente com vista à prossecução de interesses públicos eminentes.
Em relação à inexistência dos fortes indícios da ilegalidade do recurso, podemos dizer que existem sim fortes indícios da legalidade do recurso, tendo em conta os vícios imputados ao acto ora suspendendo no recurso contencioso de anulação e a manifesta legitimidade da requerente para reagir contenciosamente contra o acto administrativo que representa a última palavra da Administração.
Então resta analisar a verificação ou não do requisito exigido na alínea a), ou seja, se a execução do acto causa previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso contencioso.
A lei exige que sejam de difícil reparação os prejuízos resultantes da execução imediata do acto suspendendo.
A dificuldade de reparação do prejuízo deve avaliar-se através de um juízo prognose relativo a danos prováveis, tendo em conta o dever de reconstrução da situação (hipotética) pela autoridade administrativa na sequência de uma eventual sentença de anulação – Vieira de Andrade, in A Justiça Administrativa, 2ª ed. pág. 168.
Com a exigência desse requisito consistente nos previsíveis prejuízos de difícil reparação, a mens legislatoris é para acautelar as situações em que, uma vez consumada a execução do acto administrativo, ocorre a dificuldade de reconstituição hipotética da situação anteriormente existente e ainda aquelas em que, para ressarcimento dos prejuízos causados pela execução imediata, se revele difícil fixar a indemnização, por serem de difícil avaliação económica exacta, mesmo no âmbito ou por via dos meios judiciais a que se referem os artºs 24º/1-b) e 116º do CPAC.
E para convencer o Tribunal de que, segundo o decurso normal das coisas e pela experiência comum, os alegados prejuízos sejam a consequência adequada, típica, provável da execução imediata, é preciso que o Requerente da suspensão de eficácia alegue e demonstre factos concretos e bem determinados em que assentam tais prejuízos.
Para sustentar a sua tese da verificação in casu desse requisito, o requerente alega que:
12.º
Nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC, o primeiro requisito a verificar, para conceder a suspensão de eficácia do acto administrativo é a existência de prejuízos de difícil reparação para o requerente causado pela execução desse mesmo acto - há assim que aferir da existência de prejuízos e da previsibilidade da sua difícil reparação.
(i) DOS COMPROMISSOS ASSUMIDOS NO ÂMBITO DO PROCESSO DE ALTERAÇÃO DE FINALIDADE DO APROVEITAMENTO DO TERRENO
13.º
O acto que declarou a caducidade da concessão por arrendamento, do terreno, não se tratou de um acto vinculado, porquanto não teve por base o mero decurso do tempo da concessão.
14.º
Fundou-se numa apreciação de critérios unilateralmente definidos e que levaram a uma imputação que se julga errada de responsabilidade sobre incumprimento nos termos do contrato de concessão; porquanto a haver algum incumprimento deverá ser imputado à própria Administração que falhou na execução atempada das respectivas obrigações.
15.º
Tal apreciação foi feita em violação do princípio do tratamento igual, tendo sido concedido um prazo adicional a outros terrenos em condições semelhantes, como demonstrado no recurso de anulação, supra identificado.
16.º
A análise levada a cabo pela administração também peca por ter feito tábua rasa da responsabilidade exclusiva dos órgãos administrativos competentes, cuja actuaçao faltosa, em desrespeito pelos princípios básicos do direito administrativo esteve na génese da suspensão do processo de alteração de finalidade que havia reconhecido como do superior interesse para a RAEM em 2007.
17.º
Interesse, esse que se mantém actual e cada vez mais premente na realidade socioeconómica da região.
18.º
A violação do princípio da boa-fé, pela Administração, demonstrada no recurso de anulação pendente nesse Venerando Tribunal sob o n.º 1021/2015, culminou numa situação que contraria o processo de alteração de finalidade, iniciado em 2007;
19.°
Segundo o qual a Requerente assumiu compromissos perante terceiros, sociedades com as quais a personalidade da Requerente se confunde, por serem detidas por sócios comuns. Na génese de uma estratégia comercial definida antes de 2007; e, comunicada à Administração, através do pedido de alteração de finalidade, do aproveitamento do terreno;
20.°
Essas sociedades são a B - Transportes Urbanos de Macau SARL ("B") e a C Turismo Limitada, ambas constituídas e com sede em Macau, registadas na Conservatória de Registo Comercial e de Bens móveis sob os n.ºs … e …, respectivamente (conforme certidões que se juntam como Docs. 1 e 2);
21.º
Estas duas sociedades dependem da sociedade Requerente, numa colaboração que decorre da titularidade do capital social pelo sócio, D, que detém interesses quer na sociedade Requerente, bem como nas duas sociedades com quem a Requerente colabora.
22.º
Como consequência directa do processo de alteração do aproveitamento do terreno, suspenso em 2008, por responsabilidade exclusiva da Administração, foi tacitamente consentido que aquelas duas sociedades procedessem ao estacionamento e reparação de um elevado número de autocarros, de grandes dimensões, destinados quer ao transporte público quer ao sector de transporte para fins de turismo.
23.º
A B estaciona no terreno, cerca de 20 autocarros, de grande dimensão; e
24.º
Aumentará a sua frota de autocarros que passaram a ser mais 50 autocarros, nos termos do contrato assinado com o Governo de Macau e publicado no Boletim Oficial n.º 5, II Série, de 3 de Fevereiro de 2016, num total de 70 autocarros de grande dimensão.
25.º
Contrato de concessão de serviços esse, que se completou numa data em que a Administração não pode alegar o desconhecimento da utilização dada ao terreno e dos prejuízos, implicações e inviabilidade real do despacho de desocupação subsequente à caducidade, pretendendo a sua execução num escasso período de 60 dias.
26.º
Também a sociedade C Turismo Limitada, estaciona diariamente cerca de 40 autocarros de grande dimensão, no terreno, e em média cerca de 6 são sujeitos a manutenção diária.
27.º
A Requerente comunicou às duas sociedades com quem colabora o teor da declaração de caducidade e subsequente despacho de desocupação e obteve como resposta as cartas de que junta públicas formas como Docs. 3 e 4.
28.º
A Requerente está sujeita a todas as acções e imputação de despesas e danos sofridos pelas sociedades acima identificadas.
29.º
E, causará grave prejuízo para a região a impossibilidade de colocação dos cerca de 110 autocarros de grandes dimensões.
30.º
É imperativo decretar a suspensão de eficácia do acto recorrido, tornando inválidos todos os actos subsequentes por ele desencadeados.
d) DA PREVISIBILIDADE DA DIFÍCIL REPARAÇÃO DOS PREJUÍZOS PELA REQUERENTE
31.º
O primeiro requisito para que seja concedida a suspensão de eficácia, previsto na alínea a) do n.º1 do artigo 121.º do CPAC, exige que a execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para a Requerente da providência.
32.º
Os prejuízos causados já foram acima descritos, restando agora a verificação da previsibilidade da sua difícil reparação.
33.º
O conceito tradicional de "prejuízo de difícil reparação" esteve, durante muito tempo, directamente associado à possibilidade de esse dano ser ressarcível ou não em termos económicos e, eventualmente, à dificuldade ou não de calcular o montante indemnizatório desse ressarcimento.
34.º
Neste sentido, todo e qualquer dano susceptível de ser ressarcido em dinheiro não seria um dano de difícil reparação, tendo grande parte da Jurisprudência negado provimento ao longo dos anos a procedimentos cautelares de suspensão de eficácia com base na não verificação, desde logo, desse primeiro requisito.
35.º
No entanto, com o passar do tempo, quer a doutrina, quer a Jurisprudência, deram-se conta da insuficiência do critério da avaliação económica do dano e do princípio da reparação ou indemnização pecuniária a posteriori para uma tutela efectiva dos direitos dos particulares.
36.º
Isto porque, o propósito da providência cautelar de suspensão de eficácia é garantir os efeitos práticos de uma sentença final favorável à Requerente.
37.º
E os efeitos práticos de tal sentença prendem-se com a restauração in natura, ou como melhor diz o n.º3 do artigo 174.º do CPAC, "a reintegração efectiva da ordem jurídica violada e a reposição da situação actual hipotética".
38.º
Ora, a reposição da situação actual hipotética não se alcança, em muitos casos, apenas com o ressarcimento económico dos danos sofridos pela prática de um acto ilegal.
39.º
No caso da Requerente, a suspensão imediata é essencial pois os efeitos do acto recorrido (produzido sem audiência prévia da Requerente quando ao prazo adequado para a sua execução) implica uma situação de comoção social, iametralmente oposta ao interesse público que se deve salvaguardar.
40.º
Neste sentido, cita-se RUI MACHETE, in "O Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais", A Feitura das Leis, INA, pág. 105, onde se pode ler: "muitas vezes, torna-se fundamental que se suspenda a execução do acto, sob pena de, depois, a reparação se tornar inviável. Uma reparação, que é um sucedâneo! não tendo, portanto, a importância para a defesa dos interesses do particular que teria se o acto fosse suspenso e houvesse uma reconstituição in natura".
41.º
Como acima ficou dito! com a execução do acto recorrido, que se considera manifestamente inválido, criar-se á uma situação instabilidade na normal circulação de cerca de 110 autocarros de grande porte;
42.º
Reflexamente o acto recorrido implicará a impossibilidade de manutenção da normal circulação de um número relevante de autocarros de transporte público, condicionando o normal funcionamento da rede pública de transporte na RAEM!
43.º
Ora, é totalmente impossível saber e determinar a quantidade de prejuízos que a Requerente poderá vir a sofrer por reflexamente lhe ser imputada responsabilidade extracontratual pela deterioração de inúmeros autocarros de grande dimensão, bem como pelo distúrbio ou paragem da rede pública de transportes de passageiros.
44.º
O Objecto social da Requerente foi alterado em cumprimento de uma condição imposta pela Administração no âmbito do processo de alteração de finalidade do aproveitamento do terreno, em curso em 2007 e posteriormente suspensa por iniciativa da Administração e por motivos a que a Requerente é alheia.
45.º
Será impossível evitar o tumulto social e económico causado pela impossibilidade de manter e reparar cerca de 110 autocarros de transporte público.
46.º
Que não poderão ser relocalizados no período de 60 dias, como pretende a Administração.
47.º
Assim, verifica-se, quer na vertente clássica (quanto à impossibilidade de cálculo do dano sofrido), quer na vertente moderna (quanto à impossibilidade de repor a situação actual hipotética), a existência de danos de difícil reparação para a Requerente quanto ao incumprimento de compromissos assumidos com entidades terceiras.
48.º
Apenas suspendendo a eficácia do acto recorrido, poderá a Requerente tentar minimizar a responsabilidade na impossibilidade de parqueamento e reparação de cerca de 110 autocarros de grandes dimensões.
49.º
Julga-se cumprida a alínea a) do n.º 1 do artigo 121.º do CPAC onde se lê:"prejuízo de difícil reparação para o Requerente", não concretizando que tipo de prejuízos podem ser tidos em conta.
Ora, o prejuízo de difícil reparação alegado pela requerente consiste, em síntese, na responsabilidade que lhe eventualmente decorre do incumprimento das obrigações por ela assumidas nos contratos celebrados com as outras duas sociedades, nos termos dos quais cedeu o uso do terreno em causa, concedido pela Administração à requerente para a instalação de um estabelecimento industrial, a estas sociedades para fins de estacionamento de autocarros e reparação de autocarros, na impossilidade de manutenção da normal circulação de um número relevante de autocarros de transporte público por falta do espaço para o estacionamento e reparação dos tais autocarros, condicionando o normal funcionamento da rede pública de transporte na RAEM, e no tumulto social e económico causado à RAEM pela impossibilidade de manter e reparar cerca de 110 autocarros de transporte público.
Ora bem, para além do primeiro dos alegados prejuízos, obviamente nenhum dos prejuízos alegados integra o conceito de “prejuízo” a que se refere o artº 121º/1-a) do CPAC, que exige que para a suspensão da eficácia do acto administrativo seja precisa que a execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso.
Pois se tratam dos prejuízos a causar ou aos interesses da RAEM, ou aos interesses daquelas sociedades com personalidade diversa da da ora requerente.
No que diz respeito a prejuízos que lhe alegadamente cause a previsível impossibilidade, decorrente da execução imediata do acto ora suspendendo, de cumprir as obrigações contratualmente assumidas perante terceiros, consistentes na cedência do uso do terreno em causa, não nos parece que os tais negócios mereçam tutela jurídica, ou pelo menos é muito questionável o merecimento da tutela jurídica.
Senão vejamos.
De acordo com despacho que versa sobre a concessão do terreno em causa, o terreno é aproveitado com a construção de um edifício industrial, de 3 pisos, para instalação de uma unidade fabril destinada à transformação de elementos de aço e outros metais e produção de artigos de esmalte para utilização doméstica, a explorar directamente pela ora requerente.
Ao dar de arrendamento ou ceder gratuitamente a favor de terceiros o terreno para os fins diversos daqueles a que se destina a sua concessão, a ora requerente está a dispor ou administrar os direitos que ela própria não tem, pois de acordo com o despacho da concessão do terreno, a concessionária, ora requerente, só pode aproveitar o mesmo terreno para a construção de um edifício industrial, de 3 pisos, para instalação de uma unidade fabril destinada à transformação de elementos de aço e outros metais e produção de artigos de esmalte para utilização doméstica.
Não obstante pendente o procedimento administrativo para a alteração das finalidades da concessão, tal como alega a requerente, o certo é que as finalidades do terreno não foram alteradas até à prolação do despacho que declarou a caducidade da concessão.
Assim sendo, a requerente não tem direito a pedir à Administração, mesmo na procedência do recurso de anulação, a indemnização pela impossibilidade, decorrente da execução imediata da declaração da caducidade da concessão, de cumprir as suas obrigações contratualmente assumidas perante as sociedades terceiras que consistem na cedência do uso do terreno para fins diversos daqueles a que se destina o terreno por força do contrato da concessão.
Ex abundantia, tal como salienta e bem o Ministério Público no seu douto parecer, “por natureza das coisas, não tem a natureza de difícil reparação a eventual indemnização à qual está sujeita a requerente para com as duas sociedades, visto que tal indemnização é passível de qualificação e quantificação pecuniárias……”.
Portanto, os prejuízos que a requerente alegou, são, pela sua natureza estritamente económica, sempre susceptíveis da quantificação e ressarcimento pecuniário.
Pelo que não podemos senão julgar não verificado o requisito a que se refere o artº 121º/1-a) do CPAC e consequentemente indeferir a requerida suspensão da eficácia do acto em causa.
Tudo visto, resta decidir.
III – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam indeferir o pedido de suspensão da eficácia do despacho, datado de 30SET2015, do Senhor Chefe do Executivo que que declarou a caducidade de concessão, por arrendamento, do terreno com a área de 2637m², situado na ilha de Taipa, na Zona de Aterro Pac On, designado por lote ..., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ..., a fls. …, do livro ….
Custas a cargo da requerente, com taxa de justiça fixada em 8UC.
Registe e notifique.
RAEM, 14ABR2016
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
Fui presente
Mai Man Ieng
1 Lino Ribeiro e C. Pinho, Código de Procedimento Administrativo Anotado, Fundação Macau e SAFP, pág. 741).
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Susp.ef. 1021/2015-A-19