打印全文
Processo nº 675/2015
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 12 de Maio de 2016
Descritores:
-Revisão de sentença
-Divórcio

SUMÁRIO

I. Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.

II. Quanto aos requisitos relativos ao trânsito em julgado, competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do artigo 1200º, do CPC negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.


Proc. nº 675/2015

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I – Relatório
A, divorciada, de nacionalidade chinesa, titular do Bilhete de Identidade de Residente Não Permanente de Macau nº 150XXXX(X) emitido em 29/10/2012 pela Direcção dos Serviços de Identificação (titular do Bilhete de Identidade de Residente da República Popular da China nº 44030719XXXXXXXXXX, emitido em 15 de Março de 2010, pela autoridade competente da República Popular da China), residente habitualmente em Macau, na XXXXXXXXXXXXXXX, instaurou---
Acção Especial de Revisão de Sentença Estrangeira
contra B, divorciado, de nacionalidade chinesa, titular do Bilhete de Identidade de Residente da República Popular da China nº 44030719XXXXXXXXXX, emitido em 23 de Outubro de 2014, pela autoridade competente da República Popular da China, residente na China 深圳市XXXXXXXXXXXXXXX.
*
O requerido foi citado mas não contestou.
*
O digno Magistrado do MP não se opôs ao deferimento do pedido.
*
Cumpre decidir.
***
II – Pressupostos processuais
O Tribunal dispõe de competência internacional, material e também em razão da hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária, dispondo de legitimidade ad causam.
Inexistem quaisquer outras excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer.
***
III – Os Factos
1 - A requerente casou na República Popular da China com o requerido em 12 de Dezembro de 2003
2 – Requerente e requerido acordaram na dissolução do casamento nos seguintes termos:
«Acordo de Divórcio
Primeira parte: B portador do BIR n.º: 44030719XXXXXXXXXX
Segunda parte: A portadora do BIR n.º: 44030719XXXXXXXXXX
As duas partes trataram do registo de casamento no Conservatório de Casamento do Governo Popular do Condado Henggang, Bairro Longgang, Município Shenzhen, aos 12 de Dezembro de 2003. Ora devido ao rompimento das relações, as duas partes desejam divorciar-se voluntariamente, depois de se concordarem entre si. Já chegaram aos seguintes acordos quanto aos assuntos pertinentes:
1. Alimentos à filha
As duas partes têm uma filha, C, nascida aos 25 de Dezembro de 2004. O direito de alimentos pertence à primeira parte; e dão-se alimentos mensalmente à segunda parte no valor de três mil Renminbi. A segunda parte pode visitar a filha duas vezes por semana.
2. Tratamento das propriedades
Um bem imóvel privado sob o nome da primeira parte pertencer-se-á à segunda parte, morada: XXXXXXXXXXXXXXXXXXX, Município Shenzhen, certificado de bem imóvel n.º: 深房地字第6000XXXXXX號.
Os dois carros pertencentes à primeira parte passam a pertencer à segunda parte, cujas matrículas são, respectivamente: 粵XXXXXX, 粵XXXXXX.
3. Tratamento dos créditos e dívidas
Não há créditos ou dívidas a tratar pelas duas partes.
4. Outros acordos
As duas partes não têm outros acordos.
Os signatários divorciam-se voluntariamente, e concordam totalmente com as disposições constantes do presente acordo, não havendo outras divergências.
O presente acordo será emitido em três vias, uma para cada uma das duas partes, a outra para a repartição de registo de casamento para efeitos de arquivo.»
3 – Este acordo foi homologado pela Direcção dos Serviços de Assuntos Civis do Bairro Longgang do Município de Shenzhen, tendo sido emitido o respectivo certificado nº L440307-2011-XXXXXX em 8/12/2011.
***
IV – O Direito
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública. 2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Neste tipo de processos - de revisão formal - não se conhece do fundo ou do mérito da causa, uma vez que o Tribunal se limita a verificar se a decisão ou sentença estrangeira satisfazem certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento, nem da questão de facto, nem de direito.
Vejamos, então, os requisitos previstos no artigo 1200º do CPC.
Os documentos constantes dos autos reportam e certificam o divórcio por mútuo consentimento e a respectiva homologação e certificação pelo departamento governamental competente da República Popular da China.
Revelam, além da autenticidade, a inteligibilidade da cessação da união conjugal por divórcio com observância dos preceitos legais em vigor aplicáveis à situação.
Por outro lado, a decisão em apreço não conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública (cfr. art. 20º e 273º do C.C.). Com efeito, o direito substantivo de Macau prevê a dissolução do casamento, igualmente com fundamento na cessação dos laços e convivência conjugal, bem como a regulação do exercício do poder paternal.
Reunidos estão, pois, os requisitos de verificação oficiosa do art. 1200º, n.º 1, als. a) e f), do CPC.
Além destes, não se detecta que os restantes (alíneas b), d) e e)) constituam aqui qualquer obstáculo ao objectivo a que tendem os autos.
Também não se vê que tivesse havido violação das regras de litispendência e caso julgado ou que tivessem sido violadas as regras da citação no âmbito daquele processo ou que não tivessem sido observados os princípios do contraditório ou da igualdade das partes.
Posto isto, tudo se conjuga para a procedência do pedido (cfr. art. 1204º do CPC).
***
V – Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder a revisão e confirmar a o acordo de divórcio, entre A e B, nos precisos termos acima transcritos.
Custas pela requerente.
TSI, 12 de Maio de 2016
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong



675/2015 7