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Processo nº 325/2015
(Autos de recurso contencioso)

Data: 26/Maio/2016

Assuntos: Não renovação da autorização temporária de residência
      Extinção/Alteração da situação juridicamente relevante
      Falta de cumprimento do dever de comunicação
      Erro manifesto ou total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários


SUMÁRIO
- Uma vez concedida autorização de residência temporária aos interessados que reúnam os requisitos legais de que depende aquela concessão, estes indivíduos devem manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
- Caso se verifique extinção ou alteração da situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização, deve o interessado comunicar ao IPIM a extinção ou alteração dos referidos fundamentos no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração, cabendo neste caso à Administração apreciar essa “nova questão”, podendo aceitar ou não aceitar essa alteração, ou podendo ainda fixar um prazo para que o interessado se constitua em nova situação jurídica atendível (artigo 18º, nº 2 e 3 do RA nº 3/2005).

- Por outro lado, não logrando o interessado comunicar ao IPIM no prazo de 30 dias a contar da data da extinção ou alteração da situação juridicamente relevante, pode surgir uma das duas consequências: se a falta de cumprimento da comunicação for devida a justa causa, não terá o interessado consequências desfavoráveis, ou seja, não poderá a Administração revogar a autorização de residência por causa desse incumprimento; pelo contrário, se não houver justa causa fundada no incumprimento da obrigação de comunicação, a Administração decide discricionariamente se irá manter ou declinar a autorização (ou sua renovação) de residência (artigo 18º, nº 4 do RA nº 3/2005).
- No caso sub judice, provado está que o recorrente constituiu sucessivamente duas hipotecas sobre o bem imóvel com base no qual lhe havia sido conferida autorização de residência temporária na RAEM, cujo montante total garantido por essas duas hipotecas passou a ser superior à diferença entre o valor de mercado do imóvel no momento da aquisição e o montante mínimo estabelecido na lei (artigo 4º, nº 1 do RA nº 3/2005).
- O facto de o recorrente ter efectuado posteriormente novos investimentos não é uma justificação legalmente aceitável, melhor dizendo, embora não esteja impedido de aumentar o seu investimento em Macau, mas não pode fazer investimentos com recurso a financiamentos garantidos por hipoteca com inobservância dos limites impostos pelo citado artigo 4º do mesmo Regulamento.
- A desrazoabilidade a que alude o artigo 21º, nº 1, alínea d) do CPAC deve ser entendida de forma a deixar um espaço livre à Administração, salvaguardados os limites próprios do poder discricionário, nomeadamente os decorrentes dos princípios da imparcialidade, igualdade, justiça e proporcionalidade.
- No caso concreto, afigura-se-nos não ter havido erro manifesto ou grosseiro no uso de poderes discricionários ou violação dos princípios da justiça e proporcionalidade, na medida em que não era inaceitável ou intolerável a forma como a Administração usou os seus poderes discricionários, pois, tendo em consideração o interesse público que se prende com o cumprimento da lei em geral, e neste caso específico, das regras que exigem a manutenção da situação juridicamente relevante e que, no fundo, visam assegurar a estabilidade do mercado imobiliário e evitar consequências negativas derivadas de variações inesperadas de preços praticados no imobiliário, justifica-se a decisão tomada pela Administração no sentido de indeferimento da renovação da autorização de residência temporária do recorrente na RAEM.

O Relator,

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Tong Hio Fong

Processo nº 325/2015
(Autos de recurso contencioso)

Data: 26/Maio/2016

Recorrente:
- A

Entidade recorrida:
- Secretário para a Economia e Finanças

Acordam os Juízes do Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I) RELATÓRIO
A, casado, titular do BIR Não Permanente da RAEM, melhor identificado nos autos, notificado do despacho do Exmº Secretário para a Economia e Finanças de 2 de Fevereiro de 2015, que indeferiu o pedido de renovação de autorização de residência temporária do recorrente e do seu agregado familiar, interpôs o presente recurso contencioso de anulação do referido despacho, formulando as seguintes conclusões:
A. O acto recorrido indefere o pedido renovação de residência temporária do Recorrente e seu agregado familiar, por alegada alteração da situação juridicamente relevante, devido ao facto de o Recorrente ter constituído segunda hipoteca sobre o imóvel que fundamentou inicialmente a concessão do direito de residência temporária, sem tomar em consideração que o Recorrente aumentou significativamente o seu investimento imobiliário em Macau.
B. Sendo o investimento imobiliário a causa de atribuição da residência, o Recorrente ficou naturalmente convencido de que, sendo o seu objectivo aumentar o investimento em Macau, a prossecução de tal objectivo nunca o prejudicaria na renovação da referida residência.
C. Sendo certo que o Recorrente constituiu a segunda hipoteca sobre o imóvel que serviu de fundamento para a concessão da residência, nunca, em momento algum, o valor de mercado desse mesmo imóvel ficou abaixo do valor inicial de investimento, não tendo havido qualquer violação do Regulamento Administrativo no. 3/2005, de 4 de Abril (“RA 3/2005”) ou de quaisquer outas disposições legais aplicáveis.
D. O indeferimento da renovação da autorização de residência temporária, ora impugnada, vai contra todas as legítimas expectativas do Recorrente, e da sua família, que de boa fé e, dir-se-á, com pensamento lógico, nunca imaginou que o aumento da sua actividade de investimento criasse as condições para que lhe fosse recusada a renovação de residência.
E. Esta contradição lógica é evidente, e não deve enformar a actuação da Administração, que assim emite decisões não expectáveis e atentatórias das legítimas expectativas que ela própria criou.
F. Os factos revelam que, em momento algum o Recorrente e sua mulher deixaram de ser proprietários do imóvel que serviu de investimento inicial, e que o valor total do seu investimento imobiliário em Macau não diminuiu mas, pelo contrário, foi aumentado significativamente, e bem assim, que não ocorreu qualquer alteração da situação juridicamente relevante.
G. Como claramente resulta das transacções realizadas pelo Recorrente e sua mulher, a segunda hipoteca sobre o imóvel que foi a base para a concessão da residência temporária, foi constituída pelo Recorrente e sua mulher precisamente com o propósito de alargar o seu investimento em Macau.
H. Se o valor real do investimento inicial do Recorrente e sua mulher preenchia os requisitos legais à data da aquisição, o valor real do investimento actual de ambos não apenas os preenche, como os excede.
I. O valor matricial do conjunto de fracções adquiridas pelo Recorrente e sua mulher é de valor muito superior ao requisito legal do artigo 3º do RA 3/2005.
J. O investimento foi mantido durante todo o período de residência temporária autorizada e, como tal, justificativo da renovação da autorização de residência ao Recorrente, sua mulher e filhos menores.
K. Na fundamentação do despacho recorrido, o IPIM apenas considera o valor inicial de aquisição do imóvel, confrontando o mesmo com o valor das duas hipotecas constituídas, sem atribuir qualquer relevância aos valores reais de mercado praticados à data das mesmas.
L. Em termos de valor real, no total, o investimento feito pelo Recorrente em Macau tem hoje o valor de HKD$27.450.000,00, equivalente a MOP$28.273.500,00, um aumento muito significativo quando comparado com o preço de aquisição inicial de MOP$5.257.069,00.
M. Concluindo-se que, à data em que o Recorrente constituiu a segunda hipoteca sobre o imóvel que fundamentou a concessão da residência, em comparação à data de aquisição, o seu valor real não se alterou, pelo que também não se verificou qualquer alteração da situação jurídica do mesmo.
N. É por estes motivos que se compreende a convicção do Recorrente de que não havia qualquer alteração dos fundamentos que deram suporte à concessão da sua autorização de residência, e, mantendo-se titular de investimento real que cumpre com os requisitos legais, considerou que não tinha obrigação de notificar o IPIM de qualquer alteração.
O. O Recorrente acreditava que, mantendo o seu investimento real acima do necessário para a submissão do pedido de autorização de residência, não teria que notificar o IPIM, visto não haver alteração do seu investimento para valores abaixo do legalmente exigido.
P. Note-se ainda que o Recorrente prontamente esclareceu o IPIM quando foi notificado para o efeito, tendo juntado os documentos comprovativos necessários.
Q. O acto recorrido parte de pressupostos factuais que não correspondem à verdade, afirmando no respectivo despacho, por duas vezes, que o Recorrente e sua mulher não apresentaram provas de que possuíam imóveis durante o período decorrido 25 de Novembro de 2011 e 15 de Junho de 2012, factos estes que são obviamente falsos.
R. A documentação submetida no Processo Administrativo, nomeadamente o original da informação escrita do Registo Predial relativa ao imóvel inicialmente adquirido, constitui prova irrefutável de que não houve lugar a qualquer alienação e que o Recorrente manteve sempre a titularidade do imóvel verificando-se que o acto recorrido enferma do vício de erro sobre os pressupostos de facto.
S. Em face dos factos supra expostos, conclui-se que a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência temporária não se alterou.
T. Na verdade, a ratio do art. 18º do RA 3/2005 é precisamente a de a Administração exigir que o titular da autorização de residência temporária mantenha estável a situação de investimento, que é de interesse público.
U. Ora, como ficou sobejamente demonstrado, a situação de investimento do Recorrente manteve-se estável, dado que o valor de mercado do imóvel no momento da aquisição não ficou afectado pelas hipotecas constituídas, tomando em consideração o aumento do mercado imobiliário verificado entre o ano de 2008 e o presente.
V. A “situação juridicamente relevante” concretiza-se nos requisitos exigidos no art. 3º no. 1 do RA 3/2005 para a autorização de residência temporária com fundamento na aquisição de imóveis em Macau, ou seja, (i) o interessado ter adquirido na RAEM bens imóveis por preço não inferior a um milhão de patacas e cujo valor de mercado, no momento da aquisição, não seja igualmente inferior a um milhão de patacas; (ii) ter fundos de valor não inferior a quinhentas mil patacas depositados a prazo em instituição de crédito autorizada a operar na RAEM; e (iii) ser titular do grau académico de bacharelato ou equivalente.
W. Tais requisitos não se alteraram, pelo que não ocorreu alteração da situação juridicamente relevante, nem havia obrigação de comunicação ao IPIM.
X. O acto recorrido não toma em consideração o disposto no art. 19º no. 2 al. 1) do RA 3/2005, de acordo como o qual a renovação pressupõe a manutenção, na pessoa do interessado, dos pressupostos que fundamentaram o deferimento do pedido inicial, devendo o interessado “provar que os direitos respectivos continuam na sua titularidade e que os imóveis e depósitos bancários continuam livres dos encargos vedados pelo artigo 4º”.
Y. Do artigo 4º do RA 3/2005 resulta que não é proibido qualquer tipo de oneração dos imóveis que servem de base à concessão da autorização de residência, mas apenas aqueles encargos que garantam obrigações com um valor pecuniário superior à diferença entre o valor de mercado do imóvel no momento da aquisição e o montante mínimo estabelecido no artigo 3º, ou seja, o montante de um milhão de patacas.
Z. Esta norma, que se aplica ao pedido inicial de residência temporária, aplica-se mutatis mutandi aos pedidos de renovação da mesma (por remissão do art. 19º no. 2 al. 1)) e, naturalmente, deve ser interpretada em concordância à situação que se verifica à data do pedido de renovação.
AA. Tendo em atenção que o valor de mercado do imóvel era, na altura do pedido de renovação, era de aproximadamente MOP$20.000.000,00 e, sendo as hipotecas no valor total de MOP$6.045.070,00, o valor pecuniário das obrigações garantidas mantém-se muito abaixo da diferença entre aquele valor e o montante mínimo exigido nos termos do art. 3º no. 1 do RA 3/2005.
BB. Ainda que se considere que durante o período de autorização de residência temporária se verificou uma alteração da situação juridicamente relevante nos termos do art. 18º do RA 3/2005, deveria a entidade recorrida ter aplicado a excepção de justa causa consagrada no no. 4 da mesma norma.
CC. Não se trata de desconhecimento da lei – o que, de resto, não foi alegado pelo Recorrente -, mas sim de uma genuína convicção por parte do mesmo de que a obrigação de comunicação não se aplicava ao seu caso.
DD. Em face do exposto, conclui-se pois, que a decisão recorrida aplicou erradamente a lei, nomeadamente no que se refere aos arts. 18º no. 1 e 4, e 19º no. 1 do RA 3/2005, tornando-se anulável o respectivo acto administrativo nos termos do art. 124º do CPA.
EE. Como ficou demonstrado, a decisão de indeferimento do pedido de renovação da residência temporária partiu de pressupostos factuais que são totalmente falsos.
FF. O Recorrente manteve sempre a titularidade da Fracção A24, imóvel que constituiu o seu investimento inicial e que fundamentou a concessão da autorização de residência temporária, durante todo o período de residência temporária autorizada, tendo apresentado prova nesse sentido aquando do pedido de renovação, ora indeferido.
GG. Padecendo do vício de erro nos pressupostos de facto, o acto recorrido torna-se igualmente anulável nos termos do art. 124º do CPA.
HH. Acresce que a decisão de indeferimento da Administração acarreta consequências extremamente gravosas para o Recorrente, que procurou fundar a sua vida em Macau, investindo em imóveis, contribuindo assim para o desenvolvimento económico da RAEM.
II. E que, por força da não comunicação da segunda hipoteca constituída sobre o seu primeiro imóvel se encontra na iminência de ter de abandonar todo um projecto de vida desenvolvido ao longo de vários anos em Macau.
JJ. Impondo-se, no respeito do princípio da proporcionalidade, estabelecer um equilibro entre o interesse público face ao sacrifício dos interesses dos particulares, sendo certo que o legislador procurou expressamente consagrar o interesse na manutenção de investidores de reconhecida capacidade económica para o desenvolvimento de Macau.
KK. O interesse público eventualmente em causa não reveste, no caso em apreço, importância superior, como seriam, nomeadamente, a salvaguarda da segurança e estabilidade social da RAEM, ou ainda qualquer princípio fundamental consagrado na Lei Básica ou em legislação de Macau, pelo que devia de ceder considerando, por um lado, o interesse do Recorrente a em manter a residência em Macau, e por outro, o próprio interesse da RAEM.
LL. Assim, considera-se violado o princípio da proporcionalidade, porquanto uma alegada infracção formal por parte do Recorrente implica consequências manifestamente gravosas e desproporcionadas para o Recorrente que, recorde-se, tinha aumentado substancialmente o seu investimento imobiliário em Macau aquando do pedido de renovação da autorização de residência.
MM. Ao penalizar desta forma o Recorrente, que alargou o seu investimento imobiliário global em Macau, apenas por não comunicar ao IPIM a oneração do imóvel para atingir esse objectivo (de aumentar o investimento inicial), o acto recorrido viola ainda o princípio da justiça.
NN. Pelo exposto, deverá o acto recorrido ser revogado, porquanto violou de modo patente o princípio da proporcionalidade e da justiça consagrados, respectivamente, nos arts. 5º no. 2 e 7º do CPA, cominando-se em consequência a sua anulação.
Conclui, pedindo que se julgue procedente o recurso e, em consequência, se anule o acto recorrido.
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Regularmente citada, contestou a entidade recorrida, formulando as seguintes conclusões, pugnando pela improcedência do recurso:
1. O acto impugnado aderiu ao despacho do presidente do IPIM de 28.01.2015.
2. O facto de o recorrente não ter conseguido provar a titularidade do direito de propriedade sobre qualquer imóvel entre 25.11.2011 e 15.06.2012 não constituiu fundamento do acto impugnado.
3. Em todo o caso, sempre é verdade que ele não logrou fazer essa prova.
4. A constituição de hipotecas sobre o imóvel cuja aquisição fundou a concessão da autorização de residência estava limitada pelo disposto no art. 4º, n.º 1 do RA 3/2005, independentemente das vicissitudes da economia da RAEM.
5. O recorrente constituiu duas hipotecas que ultrapassaram os limites fixados no art. 4º, n.º 1 do RA 3/2005.
6. O valor relevante para determinar se o particular ultrapassa os limites fixados no art. 4º, n.º 1 do RA 3/2005 é sempre, e somente, “o valor de mercado do imóvel no momento da aquisição, determinado nos termos deste diploma” – ou seja, em princípio, e no caso vertente, o preço de aquisição.
7. Tendo ocorrido uma alteração da situação jurídica relevante, o recorrente estava obrigado a fazer a comunicação prevista no art. 18º, n.º 3 do RA 3/2005.
8. O particular que está, erradamente, convencido que determinada obrigação legal não lhe é aplicável, ignora obviamente a lei.
9. A ignorância da lei nunca constitui justa causa do incumprimento de uma obrigação legal.
10. A violação dos princípios da proporcionalidade e da justiça só assume autonomia enquanto fonte de invalidade do acto administrativo quando a Administração actua no exercício de poderes discricionários.
11. E o acto recorrido foi, efectivamente, praticado no exercício de poderes discricionários.
12. Contudo, os poderes discricionários só são sindicáveis judicialmente, em sede de recurso contencioso, em caso de erro grosseiro ou manifesta desrazoabilidade.
13. Mas o recorrente não demonstrou erro grosseiro ou manifesta desrazoabilidade.
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Tanto o recorrente como a entidade recorrida apresentaram alegações facultativas, reproduzindo, cada um deles, basicamente, a sua posição inicial.
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Findo o prazo para alegações, o Ministério Público deu o seguinte douto parecer:
“經濟財政司司長於2015年2月2日作出批示,同意不批准A惠及其家團之臨時居留許可續期申請 (見行政卷宗第159頁)。
A不服有關決定,向中級法院提起司法上訴。
在其上訴理由及非強制性陳述中,司法上訴人A指出被上訴之司長批示存在事實前提的錯誤,並違反了第3/2005號行政法規第18條第1款、第4款、第19條第2款(一)項及第4條之規定,亦違反適度原則及公正原則。
對於司法上訴人A所提出的上訴理由,我們認為應部份成立。
*
1. 關於事實前提的錯誤
在其上訴理由及非強制性陳述中,司法上訴人A強調其一直是作批准居留依據的不動產—位於氹仔哥英布拉街XXXXXXX之不動產的業主,其將該不動產進行抵押的目的是要擴大其在本澳之投資,並非如被上訴的行政批示所指,其未能提供在2011年11月25日至2012年6月15日期間出能證明其在本澳具有任何不動產的證明,認為被上訴的行政批示存在事實前提的錯誤。
根據卷宗資料,尤其是行政卷宗第70頁至第72頁、第73頁至第74頁,司法上訴人A用作向澳門貿易投資促進局申請居留所依據的不動產,係其於2006年12月14日透過預約買賣合同而取得的位於氹仔哥英布拉街XXXXXXX,以及位於氹仔南京街XXXXXXX停車場029S/L車位之不動產 (見卷宗第140頁至第149頁)。
上述不動產自2007年7月6日起以港幣約350萬元(約澳門幣360萬元)首次抵押予F銀行股份有限公司,並於2011年4月25日同時進行取得及意定抵押的物業登記;之後,於2011年11月14日起第二次以港幣230萬元(約澳門幣236萬元)抵押予同一銀行,並於2011年11月25日進行意定抵押的物業登記 (見行政卷宗第139頁及第71頁)。
眾所周知,即使有關不動產被抵押予銀行,並不妨礙其所有權仍屬於物業登記人。
再者,經第7/2007號行政法規修改之第3/2005號行政法規(《投資者、管理人員及具特別資格技術人員臨時居留制度》)第1條(四)項及第3條第1款規定了在澳門購買特定條件的不動產、存有特定金額款項及擁有特定學歷的人士可以在澳門特別行政區申請臨時居留的許可:
“第一條
對人的適用範圍
下列者中非屬本地居民的自然人得按照本行政法規的規定申請在澳門特別行政區臨時居留的許可:
……
(四)符合第三條所定要件的不動產購買人。”

“第三條
購買不動產的要件
一、擬依據第一條(四)項的規定請求給予臨時居留許可的利害關係人,應在提出請求時同時符合下列要件:
(一) 無需貸款而在澳門特別行政區購買不帶任何負擔的不動產,而價金不低於澳門幣一百萬元,且在購買時其市場價值亦不低於澳門幣一百萬元;
(二) 在獲許於澳門特別行政區經營的信用機構擁有金額不低於澳門幣五十萬元的不帶任何負擔的定期存款;
(三) 具有高等專科或等同高等專科學位。
......”
而根據同一行政法規第4條規定,立法者並無禁止已獲得臨時居留許可的人士在臨時居留期間,為作為批准局留依據的不動產設定擔保,只是作出了限制性的規定:
“第四條
設定擔保的限制
一、按照上條規定請求給予或已獲給予臨時居留許可的利害關係人得就所購的不動產設定擔保,但所擔保的債的金錢價值,不得高於所購不動產按照本行政法規的規定所定的在購買時的市場價值與第三條第一款(一)項所定最低額之間的差額。
二、不得就上條第一款(二)項所指銀行存款設定任何負擔。”
因此,毫無疑問,司法上訴人A用作向澳門貿易投資促進局申請居留所依據的上述不動產一直以來,包括在2011年11月25日至2012年6月15日期間,都屬司法上訴人A所有,並不存在其未能證實其在本澳持有任何物業的證明問題。
我們認為,被上訴的行政批示確實存在事實前提錯誤之瑕疵。

2. 關於第3/2005號行政法規第18條第1款之違反
在其上訴理由及非強制性陳述中,司法上訴人A強調其將用作申請居留依據的上述不動產多次抵押的目的,是為了擴大其在本澳之投資,達到公共利益中所考慮的維持本澳穩定的投資環境,故不存在“具重要性的法律狀況之變更”,從而指責被上訴的行政批示違反了第3/2005號行政法規(《投資者、管理人員及具特別資格技術人員臨時居留制度》)第18條第1款之規定。
經第7/2007號行政法規修改之第3/2005號行政法規(《投資者、管理人員及具特別資格技術人員臨時居留制度》)第18條第1款及第2款前半部份規定:
“第十八條
狀況的變更
一、利害關係人須在臨時居留期間保持居留許可申請獲批准時被考慮的具重要性的法律狀況。
二、如上款所指法律狀況消滅或出現變更,臨時居留許可應予取消……”
明顯地,上述第18條第1款所指的“具重要性的法律狀況之變更”中的“法律狀況”是指,有權限當局在考慮是否批准居留申請時所依據的事實的法律狀況。
在本具體個案中,就是指司法上訴人A用作向澳門貿易投資促進局申請居留所依據的不動產—位於氹仔哥英布拉街XXXXXXX之不動產,以及位於氹仔南京街XXXXXXX停車場029S/L車位的法律狀況。
根據卷宗資料,司法上訴人A於2008年11月3日獲得居留許可的批准,當時,上述不動產的法律狀況是已自2007年7月6日起以港幣約350萬元(約澳門幣360萬元)抵押予F銀行股份有限公司,只是未進行物業登記罷了 (見行政卷宗第139頁及第71頁)。
之後,司法上訴人A於2011年11月14日起再以港幣230萬元(約澳門幣236萬元)將上述不動產抵押予F銀行股份有限公司 (見行政卷宗第139頁及第71頁)。
毫無疑問,上述不動產的法律狀況已經改變,已經由一次抵押變成二次抵押(俗稱“加按”)了,這跟司法上訴人A的財產有否增長,有否達到公共利益中所考慮的維持本澳穩定的投資環境並無任何關係。
我們認為,司法上訴人A在臨時居留期間,其居留許可申請獲批准時被考慮的具重要性的法律狀況已經被改變,被上訴的批示賴以為據的澳門貿易投資促進局這種認定是沒有錯誤的。
因此,被上訴的批示並無違反第3/2005號行政法規第18條第1款之規定,司法上訴人A此部份上訴理由不成立。

3. 關於第3/2005號行政法規第18條第4款之違反
在其上訴理由及非強制性陳述中,司法上訴人A解釋其無將有關抵押通知澳門貿易投資促進局,是基於當局無向其清楚指明有關通知義務所涉及的標的,故指責被上訴的行政批示違反了第3/2005號行政法規(《投資者、管理人員及具特別資格技術人員臨時居留制度》)第18條第4款之規定。
經第7/2007號行政法規修改之第3/2005號行政法規(《投資者、管理人員及具特別資格技術人員臨時居留制度》)第18條第2款、第3款及第4款規定,倘已獲得臨時居留許可的人士在臨時居留期間,將作為批准局留依據的重要性法律狀況變更時,有義務在法定期間內向澳門貿易投資促進局作出通知,倘不依時作出有關通知而又無合理解釋的話,可導致其臨時居留許可被取消:
“第十八條
狀況的變更
……
二、如上款所指法律狀況消滅或出現變更,臨時居留許可應予取消,但利害關係人在澳門貿易投資促進局指定的期限內設立可獲考慮的新法律狀況,又或法律狀況的變更獲具權限的機關接受者,不在此限。
三、為適用上款的規定,利害關係人須在法律狀況消滅或出現變更之日起計三十日內,就法律狀況的消滅或變更向澳門貿易投資促進局作出通知。
四、不依時履行上款規定的通知義務又無合理解釋者,可導致臨時居留許可被取消。”
可見,上述第18條第2款及第3款所規定的可以不取消居留許可的例外情況(在澳門貿促局指定的期限內設立可獲考慮的新法律狀況,又或法律狀況的變更獲具權限的機關接受)的邏輯前提,是利害關係人在30日期間內就相關狀況的消滅和變更情況履行通知義務。
在本具體個案中,正如前述,既然司法上訴人A在臨時居留期間,其居留許可申請獲批准時被考慮的具重要性的法律狀況已經被改變,其有就義務於法定期間內向澳門貿易投資促進局作出通知,以便當局查明事實,因法律規定得十分清楚,只有在獲得有關通知的情況下,行政當局才可以預先審查是否批准司法上訴人A予臨時居留續期申請的事實前提、重要的法律狀況;否則,可導致其臨時居留許可被取消。
然而,我們亦不能忽視,立法者在上述第18條第4款中,仍允許無盡通知義務的申請人擁有以合理理由(justa causa)解釋的機會。
“合理理由(justa causa)”是一個不確定概念,是可免除對一個作為行為或不作為行為進行歸責的所有事實或情節;這並不屬於行政當局的自由裁量權,而只是給予行政當局在面對具體情況並行使其職能時,具有詮釋及解釋的權力。
誠然,司法上訴人A無在法定期間內履行通知義務,其解釋是基於其對法律的不清楚,而當局亦無詳細解釋之故。
讓我們看看,司法上訴人A所提出的解釋是否屬於“合理理由”?
卷宗資料顯示,司法上訴人A於2008年11月3日首次獲得臨時居留許可的批准,依法每3年須續期一次,故於2011年8月12日獲得臨時居留許可的續期,並須於2014年11月3日前獲得另一次臨時居留許可的續期。
因此,無論是首次批准司法上訴人A取得臨時居留許可時,抑或首次對該許可續期時,澳門貿易投資促進局都已經得悉,作為給予司法上訴人A臨時居留許可依據的不動產,早已於2007年7月6日起就抵押予F銀行股份有限公司,並於2011年4月25日作出的物業登記。
然而,我們卻未能在卷宗中找到任何文件,可以支持澳門貿易投資促進局分別於2008年11月3日(首次批准臨時居留許可)及2011年8月12日(首次批准臨時居留許可續期)時曾對司法上訴人A作出第3/2005號行政法規(《投資者、管理人員及具特別資格技術人員臨時居留制度》)第18條所規定之提醒。
相反,我們卻看到司法上訴人A於2014年7月2日主動去函通知澳門貿易投資促進局有關第二次抵押的事宜;然後,澳門貿易投資促進局才在跟物業登記局的聯網平台上查核有關狀況的 (見行政卷宗第174頁至第178頁、第172頁)。
我們認為,對於並非以商業投資為目的而申請臨時居留的人士而言,正常情況下,對本澳法律的認識或能獲得具本澳法律知識的人士的協助的機率,遠遠不及以商業投資為目的申請者的理所當然。
既然司法上訴人A主動坦白交待其擁有的不動產最新的法律狀況,我們實在看不見其有違反有關通知義務的故意。
此外,司法上訴人A確實於2012年6月15日及7月13日先後登記取得了位於澳門馬忌士街XXXXXXX及位於氹仔卓家村XXXXXXX兩個不帶任何負擔的價值均超過澳門幣100萬元的不動產,且均已繳納相關稅項 (參見卷宗第84頁至第100頁)。
我們認為,司法上訴人A並未減少在本澳購置不動產,不能認定其有意減少其為著獲得本澳居留許可而必須的投資,也就是說,司法上訴人A無履行有關通知義務並非為了隱瞞有關不動產被抵押的事實,而更大的可能性是純粹出於其所辯解的理由,因為我們未看見立法者欲透過第3/2005號行政法規第18條所規定之通知義務來保障有關人士財產狀況的目的備受挑戰。
因此,我們同意,被上訴的行政批示確實有違反第3/2005號行政法規第18條第4款之嫌,司法上訴人A此部份上訴理由應為成立。

4. 關於第3/2005號行政法規第19條第2款(一)項及第4條第1款之違反
在其上訴理由中,司法上訴人Aa認為隨著樓市的增長,當初用作申請臨時居留許可依據的不動產—氹仔哥英布拉街XXXXXXX,以及位於氹仔南京街XXXXXXX停車場029S/L車位之不動產的市場價值已大大提高,因此,其將之加按的金額並未超出第3/2005號行政法規第4條所規定之範圍,從而指責被上訴的不批准臨時居留續期的批示違反了第3/2005號行政法規第19條第2款(一)項及第4條第1款之規定。
第3/2005號行政法規第19條第2款(一)項及第4條第1款規定:
“第十九條
臨時居留許可的續期
……
二、續期所給予的有效期與最初許可居留的有效期相同;利害關係人本人須維持其最初申請獲批准時被考慮的前提,方獲給予續期,但下列情況例外:
(一) 臨時居留許可係以購買不動產為理由而獲給予者,其續期並不要求提交關於第三條第一款(三)項及第二款(一)項及(二)項所指要件及所繳付的重要財產的價金或其市場價值的新證明,但利害關係人應證明該等財產的權利仍為其擁有,以及 有關不動產及銀行存款無設定第四條所禁止的負擔;
……
第四條
設定擔保的限制
一、按照上條規定請求給予或已獲給予臨時居留許可的利害關係人得就所購的不動產設定擔保,但所擔保的債的金錢價值,不得高於所購不動產按照本行政法規的規定所定的在購買時的市場價值與第三條第一款(一)項所定最低額之間的差額。
……”
法律明文規定,利害關係人在提出臨時居留許可續期申請時,必須證明起初作為批准居留依據的不動產及銀行存款無設定高於購買時的市場價值與澳門幣100萬元的差額的負擔,也就是說,居留許可續期的程序及必要條件,它同樣也要求利害關係人保持其最初申請獲批准時被考慮的前提,以購買不動產為由獲得居留許可的利害關係人有義務證明相關權利仍為其擁有。
在本個案中,司法上訴人A在2006年購入有關不動產時的價值約為澳門幣500萬元,但經其兩次抵押予F銀行股份有限公司之後,其負擔已超出了上述法律所規定的差額 (見行政卷宗第139頁)。
因此,我們認為,司法上訴人A指責被上訴的批示違反第3/2005號行政法規第19條第2款(一)項及第4條第1款之規定是毫無道理的。

5. 關於適度原則之違反
在其上訴理由及非強制性陳述中,司法上訴人A指出其生活已深植澳門,且其將有關不動產加按的目的是為了在澳門購買更多的物業,其投資有利於澳門的經濟發展,不批准其臨時居留許可續期將導致其承受極嚴重且不成比例的損失,故指責被上訴的批示違反了適度原則。
適度原則由《行政程序法典》第5條第2款所確立,係指當行政當局之決定跟私人權利或受法律保護之利益有衝突時,僅得在有關決定對所擬達致之目的屬適當及適度時,方可損害私人的權利或有關利益。
根據適度原則,對個人權利和利益的限制必須是對確保以公權力作出的行為所欲達致的目的來講屬合適且必需的。除例外情況以外,在行政當局行使自由裁量權的範圍內,如不涉及由被限定的決定解決的事宜,則行政當局所作出的決定不受法院審查。
適度原則包括了適當性、必要性及狹義的適度性(即成比例性)。
對於行政當局的自由裁量權,法院的介入僅僅是判斷行政當局在行使此自由裁量權時,有否以不能容忍的方式違反了適度或其他原則,從而出現明顯的錯誤或絕對不合理的情況;除例外情況以外,在行政當局行使自由裁量權的範圍內,如不涉及由被限定的決定解決的事宜,則行政當局所作出的決定不受法院審查。終審法院亦一直認為在審議行政機關是否遵守上述法律原則時,只有在行政決定以不能容忍的方式違反該原則的情況下,法官才可介入。
中級法院於2014年5月8日在第356/2013號司法上訴案件中作出進一步闡釋,行政裁量權所須遵行的原則尤其包括憲法性原則、無私原則、平等原則、公正原則、善意原則等。
此外,從Freitas do Amaral的教導,我們亦知道,裁量權是法律賦予行政當局有權在兩個或數個選擇中選擇其中一個方法作為決定;至於這個選擇是否自由的,答案是否定的,因為其仍然必須按照法律規定的解決方法來作出選擇及決定,因此仍然受到約束行政當局的一般原則及規定所限制。因此,嚴格來說,並不存在純粹的受拘束的行政行為或自由裁量的行政行為,而只有“傾向性拘束行( actos predominantemente vinculados )”或“傾向性裁量行為(actos predominantemente discricionários)”,行政當局作出的行為仍然必須以更好地實現公共利益為前提,自由裁量權並非一個真正自由的行政行為,而是在法律規定的範圍內所賦了的一個法律權力罷了。(見《Curso de Dto Administrativo》, 2002版,第78頁及續後)。
我們再看,立法者透過第3/2005號行政法規,尤其是第4條、第18條及第19條之規定所擬確保的是投資者的財產狀況的確定性與穩定性。
在本具體個案中,司法上訴人A自2008年起在澳門臨時居留至今,在澳門已擁有3個獨立的不動產,其家團一家五口全部在澳門居住了接近7年的時間,可以認同,司法上訴人A的生活已深植澳門。
在衡量是否對居留許可予以續期時所要考慮的公共利益,應該是利害關係人有否維持最初許可居留的事實前提,以確保澳門的經濟發展得以維持。
而從司法上訴人A在臨時居留期間,在本澳所擁有的物業已由1個增加至3個,儘管其中一個負有負擔,我們仍然認為,上述應維護的公共利益並未見受到損害。
我們亦注意到,司法上訴人A將位於氹仔哥英布拉街XXXXXXX之不動產作出的抵押,並非為了債務而作出,而其配偶及3名未成年子女亦已跟隨遷住澳門展開生活,其行為反映出有在本澳穩定投資與長期居留的意欲。
不得否認的是,立法者並無禁止獲得臨時居留許可的人士就所購得的作為首次申請臨時局留依據的不動產設定擔保,正正是對諸如司法上訴人A作出的這種投資賦予可能性。
雖然,我們不能確定司法上訴人A在將首個不動產抵押之後,再於2012年購置的兩個不動產,是否已令其財產獲得增長,但可以確定的是,司法上訴人A已經在澳門擁有3個獨立的不動產,且每個的市場價值均超過法律要求臨時居留許可的申請人所需購置的不動產的價值(澳門幣100萬元);因此,我們實在看不見司法上訴人A在澳門居住的個人利益跟公共利益之間存在著哪些衝突?!
必須重申的是,行政當局所擁有的裁量權並非自由選擇的權力,而係必須在法律規定及法律原則下作出選擇及決定。
明顯地,不批准司法上訴人A獲得臨時居留許可續期的後果,不僅僅影響其住處、生活方式的改變,更會導理其整個家庭面臨逆境,更會導致其在本澳所擁有的3個不動產的所有權被逼出現變更,從而進一步引致澳門社會資源及經濟財產的物權狀況出現不穩定的情況。
面對本案的情節,我們無法認同僅僅因為司法上訴人A無在法定期間內履行有關通知義務,就要求私人利益讓步,屬不適當、不必要,且不成比例的犧牲。事實上,我們並未看見司法上訴人A的增置物業的行為跟澳門社會整體的利益之間存在哪些衝突而必須讓其私人利益讓步!
因此,我們認為被上訴的批示確實違反了適度原則,司法上訴人A此部份理由應成立。

6. 關於公正原則之違反
在其上訴理由及非強制性陳述中,司法上訴人A認為被上訴的行政當局以不批准其臨時居留許可續期,作為其無履行有關通知義務的懲罰,是違反公正原則的。
關於公正原則,中級法院於2002年11月4日在第1284號司法上訴案件中作出了具說服力表述:
“一、所謂基本權利與保障市民在社會中正常生活的根本核心有關,一般載於以 “權利、自由及保障” 為標題之憲法性法規中。
二、僅當侵犯基本權利之行政行為損及其內核或根本內容,而非僅僅侵犯其涵蓋之空間時,方構成無效。……
四、公正原則與尊重反映社會意識及法律觀念的基本規則有關。…..”
終審法院亦曾於2013年7月31日在第32/2013號行政司法裁判中強調:
“根據狹義的公正原則,所有在明顯不公正的基礎上所作出的行政行為都是違法的,可以通過司法上訴予以撤銷。
這裏所說的“明顯不公正”不僅包括行政當局毫無根據或毫無必要地迫使私人犧牲權利的情況,而且還包括行政當局對私人存有故意或惡意的情況。”
在本案中,我們認為,被上訴的行政當局在考慮是否批准司法上訴人A的臨時居留許可續期申請時,亦必須同時考慮及尊重其經濟、家庭利益及情感。
尤其在無影響保障本澳經濟增長及穩定的公共利益的前提下,我們認同僅僅因為司法上訴人A無在法定期間內履行有關通知義務,作為其不批准其臨時居留許可續期的理據,是毫無必要的。
值得一再強調的是,澳門貿易投資促進局對於司法上訴人A不屬於其用作獲得批准居留所依據的不動產 — 位於氹仔哥英布拉街XXXXXXX之不動產的業主,是毫無根據的、完全錯誤的認定。
綜上所述,我們認為,被上訴的經濟財政司司長在行使有關自由裁量權方面乃為維護公共安全利益,被上訴的行政行為出現了明顯、嚴重的錯誤,違反了第3/2005號行政法規第18條第4款,亦違反適度原則及公正原則。
因此,根據《行政訴訟法典》第21條第1款d項之規定,被上訴的批示應受到司法審查的干預,應裁定司法上訴人A針對經濟財政司司長所作之同意不批准臨時居留許可續期之批示而提起的司法上訴理由部份成立,從而撤銷被上訴的行政行為。”
*
O Tribunal é o competente em razão da matéria e hierarquia, e o processo o próprio.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas, e têm interesse processual.
Não existe outras nulidades, excepções nem questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
***
II) FUNDAMENTAÇÃO
Resulta provada dos elementos constantes dos autos, designadamente do processo administrativo, a seguinte matéria de facto com pertinência para a decisão da causa:
Ao recorrente foi concedida autorização de residência temporária em virtude de investimento, nos termos do Regulamento Administrativo nº 3/2005, com base na compra do imóvel sito na RAEM. (fls. 20 e 21 do P.A.)
A primeira autorização de residência temporária foi concedida ao recorrente em 3.11.2008, tendo sido renovada em 12.8.2011. (fls. 20 do P.A.)
A autorização de residência do recorrente foi estendida ao seu agregado familiar composto pela sua mulher B e seus filhos C, E e D.
O recorrente e sua mulher adquiriram por escritura pública de 25.4.2011 a fracção autónoma A24, para habitação, e um lugar de estacionamento para automóvel 029S/L, pelo valor total de MOP$5.257.070,00. (fls. 95 e 125 do P.A.)
O recorrente e sua esposa constituíram sucessivamente duas hipotecas sobre a referida fracção autónoma A24 que serviu de fundamento à concessão de residência, nos seguintes termos:
- em 25.4.2011, o recorrente e sua esposa constituíram uma hipoteca com o F sobre o referido imóvel, para a garantia de facilidades bancárias no valor de HKD$3.569.000,00, equivalente a MOP$3.676.070,00; (fls. 96 do P.A.)
- em 25.11.2011, constituíram uma segunda hipoteca com o F sobre o mesmo imóvel, para a garantia de empréstimo no valor de HKD$2.300.000,00, equivalente a MOP$2.369.000,00; (fls. 97 do P.A.)
Por escritura pública de 15.6.2012, o recorrente e sua mulher adquiriram a fracção autónoma designada por B4, para habitação, descrita na CRP sob o nº 20613, pelo preço de HKD$1.700.000,00, equivalente a MOP$1.753.550,00. (fls. 130 do P.A.)
Por escritura pública de 13.7.2012, o recorrente e sua mulher adquiriram a fracção autónoma designada por E3, para habitação, descrita na CRP sob o nº 10258-I, pelo preço de HKD$1.600.000,00, equivalente a MOP$1.650.400,00. (fls. 138 do P.A.)
O recorrente não logrou comunicar ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau o sucedido.
O valor matricial da fracção A24 é de MOP$4.754.640,00. (fls. 99 dos autos)
E foi avaliada, a 30.3.2015, em HKD$19.850.000,00. (fls. 102 e 103 dos autos)
Em 21.1.2015, foi elaborada a seguinte Proposta registada sob o n.º 0155/2008/03R: (fls. 16 a 18 do P.A.)
“事由:審查投資居留申請
執行委員會:
1. 利害關係人身份資料及建議批給臨時居留許可期限如下:
序號
姓名
關係
證件/編號
證件有效期
臨時居留許可有效期至
1
A
申請人
西班牙護照
XDBXXXXXX
2016/07/17
2014/11/03
2
B
配偶
烏拉圭護照
CXXXXXX
2019/09/01
2014/11/03
3
C
卑親屬
西班牙護照
XDAXXXXXX
2016/05/10
2014/11/03
4
D
卑親屬
烏拉圭護照
CXXXXXX
2015/11/24
2014/11/03
5
E
卑親屬
烏拉圭護照
CXXXXXX
2019/09/01
2014/11/03
2. 申請人於2008年11月03日首次獲批臨時居留許可有關申請。
3. 為續期目的,申請人提交下列不動產文件,證實仍持續擁有符合法律規定之不動產投資:
(1) 物業編示編號:XXXX
氹仔南京街XXXXXXX第029S/L號車位
價值:1.00澳門元(申請人與配偶各佔50.00%業權,即相當於0.50澳門元)
登記日期:2011/04/25 (90)
(2) 物業編示編號:XXXX
氹仔南京街XXXXXXX
價值:5,257,069.00澳門元(申請人與配偶各佔50.00%業權,即相當於2,628,534.50澳門元)
登記日期:2011/04/25 (90)
4. 申請人提交本澳信用機構發出定期存款證明文件,以證實其持續擁有不低於五十萬澳門元的定期存款:
信用機構:F銀行
賬戶編號:9006865598
存款本金:527,800.19澳門元
存款期間:2008/01/02至2015/01/06
性質:不設任何負擔
簽發日期:2014/09/26
5. 然而,按申請人提交的物業文件及透過物業登記局網上服務平台獲悉顯示,申請人及配偶於2011年4月25日將上述作為申請依據之一的物業(氹仔南京街XXXXXXX,價值5,257,069.00澳門元)向F銀行股份有限公司作抵押,貸款額為3,569,000.00港元(相當於3,676,070.00澳門元),後於2011年11月25日再將該物業向同一銀行作抵押,貸款額為2,300,000.00港元(相當於2,369,000.00澳門元),致使申請人之法律狀況消滅,且申請人亦沒有依據第3/2005號行政法規第18條規定,於法律狀況變更之日起計30日內以書面方式通知本局。
6. 基於上述事宜,本局透過第09779/GJFR/2014號通知申請人,其須於10日內就上述相關事宜提出書面答辯及相關佐證文件,以便本局繼續處理申請人之臨時居留許可續期申請(見第153至156頁)
7. 申請人授權律師於2014年9月29日及隨後向本局提交書面解釋及物業登記證明文件,顯示申請人與其配偶分別於2012年6月15日及2012年7月13日在澳登記購置兩物業,但於2011年11月25日至於2012年6月15日(約6個多月)期間則沒有任何佐證文件以證實其在澳持有物業,另對於沒有依法及時通知本局一事上,則辯稱不知悉有關規定(見第119至151頁)。
9. 須指出的是,本局於發給申請人之批准通知書時,於注意事項中已明確:“依據第3/2005號行政法規第18條規定,閣下須於申請期間或申請獲批准後保持居留許可申請獲批准時被考慮的具重要性的法律狀況。如法律狀況消滅或出現變更,將於法律狀況消滅或變更之日起計30日內以書面方式通知本局。否則臨時居留許可會被取消。…申請依據的變更,例如不動產類別的業權狀況變更或50萬澳門元定期存款變更、…等情況。”故此,申請人應當知悉其有義務依法將法律狀況之變更及時通知本局,對申請人辯稱不知悉有關規定無法接納。
10. 經分析,由於申請人將申請依據之兩物業先後兩次向銀行抵押貸款,致使法律狀況消滅,亦沒有依法於法定期間內書面通知本局有關法律狀況消滅之事宜,故依據第3/2005號行政法規第18條和第19條第2款規定,建議不批准下列利關係人是次提出的臨時居留許可續期申請。
序號
姓名
關係
1
A
申請人
2
B
配偶
3
C
卑親屬
4
D
卑親屬
5
E
卑親屬
請批閱
                        高級技術員
                        (簽名)
                        XXX
                        2015年1月21日”
Tendo o Presidente do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau lavrado o seguinte despacho: (fls. 15 do P.A.)
“經濟財政司司長:
經本建議書研究分析,因申請人將申請依據之物業先後兩次向銀行抵押貸款,致使法律狀況消滅,亦沒有依法於法定期間內書面通知本局有關法律狀況消滅之事宜,故建議不批准下列利害關係人的臨時居留許可續期的意見,現本人建議不批准有關申請。
序號
姓名
關係
1
A
申請人
2
B
配偶
3
C
卑親屬
4
D
卑親屬
5
E
卑親屬
然而還是請 閣下決定。
                        (簽名)
                        XXX/主席
                        28.JAN.2015”
Em 2.2.2015, pelo Exmº Secretário para a Economia e Finanças foi proferido o seguinte despacho:
“批准建議。”
*
O caso
Ao recorrente foi concedida autorização de residência temporária na RAEM, estendida ao seu agregado familiar, com fundamento em investimento de bem imóvel.
Em 25.11.2012, o recorrente e sua esposa constituíram uma segunda hipoteca sobre o imóvel que serviu de fundamento à concessão de residência temporária, e não logrou aquele cumprir o dever legal de comunicação que lhe era exigido pelo artigo 18º do Regulamento Administrativo nº 3/2005.
Em 15.6.2012 e 13.7.2012, respectivamente, o recorrente e sua mulher adquiriram por escritura pública duas outras fracções autónomas.
Por parte da entidade recorrida, entendeu que, uma vez verificada a extinção da situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência temporária, bem como a falta de cumprimento do dever legal de comunicação, indeferiu o pedido de renovação de autorização de residência temporária do recorrente e do seu agregado familiar.
É este o acto recorrido.
*
Da alteração/extinção da situação juridicamente relevante
O recorrente assaca ao despacho recorrido vício de violação de lei, por entender que não se vislumbra qualquer alteração da situação juridicamente relevante a que se alude no artigo 18º do Regulamento Administrativo nº 3/2005.
Dispõe esse artigo 18º o seguinte:
“1. O interessado deve manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
     2. A autorização de residência temporária deve ser cancelada caso se verifique extinção ou alteração dos fundamentos referidos no número anterior, excepto quando o interessado se constituir em nova situação jurídica atendível no prazo que lhe for fixado pelo Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau ou a alteração for aceite pelo órgão competente.
     3. Para efeitos do disposto no número anterior, o interessado deve comunicar ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau a extinção ou alteração dos referidos fundamentos no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração.
     4. O não cumprimento sem justa causa da obrigação da comunicação prevista no número anterior, dentro do respectivo prazo, poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária.”
Em boa verdade, as questões agora levantadas pelo recorrente não são novas, tendo já sido objecto de algumas apreciações por este TSI, e também pelo TUI em recursos jurisdicionais.
A título exemplificativo, veja-se o que se disse no Acórdão do Venerando TUI, no Processo nº 30/2013:
“Daí resulta que, uma vez que a autorização de residência temporária é concedida a indivíduos não residentes que satisfaçam os requisitos previstos por lei, estes indivíduos devem manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
No caso de extinção ou alteração da situação, o interessado deve cumprir o dever de comunicação, no prazo de 30 dias a contar da data da extinção ou alteração; e o não cumprimento, sem justa causa, dessa obrigação poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária.
É muito clara a intenção do legislador, de manter estável, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que esteve na base da concessão dessa autorização.
No caso de concessão da autorização de residência temporária por aquisição de imóveis, como é o nosso caso, o investidor deve cumprir os requisitos previstos no art.º 3.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, incluindo a aquisição em Macau de bens imóveis por preço não inferior a um milhão de patacas e cujo valor de mercado, no momento da aquisição, não seja igualmente inferior a um milhão de patacas.
No caso em apreciação, o recorrente não possuiu, de forma contínua e estável, os investimentos que tinha feito em bens imóveis de Macau e não comunicou, no prazo legal, a alteração desta situação juridicamente relevante que tinha fundamentado a concessão da autorização de residência, o que conduziu ao cancelamento da autorização.”
No mesmo sentido, decidiu-se num outro Acórdão mais recente do TUI, no Processo nº 79/2015, o seguinte:
“E quanto aos poderes a que se refere o artigo 18.º, n.º 2?
Aí não temos dúvidas de que se trata de poderes vinculados da Administração: quando ocorra extinção ou alteração da situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão de autorização de residência, a Administração tem de cancelar a autorização de residência temporária. Não pode deixar de o fazer.
É nesse sentido que aponta a letra da norma “A autorização de residência temporária deve ser cancelada caso se verifique extinção ou alteração …”. Enquanto, no caso de falta de cumprimento da comunicação, a norma refere “O não cumprimento sem justa causa da obrigação de comunicação prevista no número anterior, dentro do respectivo prazo, poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária”.
Neste caso, o conceito indeterminado situação juridicamente relevante não contém nenhum juízo de prognose, não havendo intenção de conferir margem de livre apreciação à Administração.
Por outro lado, os interesses envolvidos apontam inequivocamente no sentido de estarem em causa poderes vinculados. É que o pressuposto da concessão da autorização de residência temporária é, além do mais, a aquisição em Macau, sem recurso ao crédito e livres de quaisquer encargos, bens imóveis por preço não inferior a um milhão de patacas e cujo valor de mercado, no momento da aquisição, não seja igualmente inferior a um milhão de patacas.
Ora, de acordo com o n.º 1 do artigo 18.º, o interessado tem a obrigação de manter durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
Face à violação de tal obrigação, faz todo o sentido que a falta de manutenção da situação juridicamente relevante, seja cominada com o cancelamento da autorização de residência, não ficando na disponibilidade da Administração o poder de cancelar ou deixar de cancelar. Trata-se de uma violação maior, por fazer cessar os pressupostos em que assentou a concessão da autorização de residência, não uma simples falta de comunicação.
Em conclusão:
A competência prevista no artigo 18.º, n.º 2, do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 integra o exercício de um poder vinculado da Administração.
A competência prevista no artigo 18.º, n.º 4, do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 integra o exercício de um poder discricionário da Administração.”
De facto, estatui-se nos termos do artigo 3º do Regulamento Administrativo nº 3/2005 que os interessados que pretendam obter autorização de residência temporária com fundamento na aquisição de bens imóveis devem, no momento do pedido, cumprir cumulativamente os seguintes requisitos:
“1) Ter adquirido na Região Administrativa Especial de Macau, sem recurso ao crédito e livres de quaisquer encargos, bens imóveis por preço não inferior a um milhão de patacas e cujo valor de mercado, no momento da aquisição, não seja igualmente inferior a um milhão de patacas;
2) Ter fundos de valor não inferior a quinhentas mil patacas depositados a prazo em instituição de crédito autorizada a operar na Região Administrativa Especial de Macau e livres de quaisquer encargos;
3) Ser titulares do grau académico de bacharelato ou equivalente.”
E uma vez concedida a autorização de residência temporária aos interessados que reúnam aqueles requisitos legais, estes indivíduos devem manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
Caso se verifique extinção ou alteração da situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização, em princípio deve ser cancelada a respectiva autorização (artigo 18º, nº 1 do RA nº 3/2005), mas pode acontecer o seguinte:
1) Ter o interessado comunicado ao IPIM a extinção ou alteração dos referidos fundamentos no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração;
2) Não ter logrado o interessado comunicar ao IPIM no prazo acima referido.
Ora bem, quanto ao primeiro caso, tendo o interessado comunicado ao IPIM a extinção ou alteração dos fundamentos que serviram de base à concessão da autorização de residência temporária, no prazo de 30 dias contados desde a data da extinção ou alteração, cabe à Administração apreciar essa “nova situação”, podendo aceitar ou não essa alteração, ou podendo ainda fixar um prazo para que o interessado se constitua em nova situação jurídica atendível (artigo 18º, nº 2 e 3 do RA nº 3/2005).
Já no segundo caso, em que o interessado não logrou comunicar ao IPIM no prazo de 30 dias a contar da data da extinção ou alteração da situação juridicamente relevante, pode surgir uma das duas consequências: se a falta de cumprimento da comunicação for devida a justa causa, não terá o interessado consequências desfavoráveis, ou seja, não poderá a Administração revogar a autorização de residência por causa desse incumprimento; pelo contrário, se não houver justa causa fundada no incumprimento da obrigação de comunicação, a Administração decide discricionariamente se irá manter ou declinar a autorização de residência (artigo 18º, nº 4 do RA nº 3/2005).
No caso sub judice, verifica-se que durante o período de residência temporária, a situação juridicamente relevante que esteve na base da concessão da autorização de residência foi extinta, na medida em que o recorrente constituiu uma segunda hipoteca sobre o bem imóvel com base no qual lhe havia sido conferida aquela autorização de residência temporária na RAEM, cujo montante total garantido por essas duas hipotecas passou a ser superior à diferença entre o valor de mercado do imóvel no momento da aquisição e o montante mínimo estabelecido na lei.
Por outro lado, verifica-se também que o recorrente não logrou comunicar ao IPIM o sucedido, daí que, tendo sido ponderados esses aspectos, decidiu a Administração cancelar a autorização de residência do recorrente e do seu agregado familiar.
Entretanto, entende o recorrente que não houve alteração da situação juridicamente relevante, isto porque, na sua perspectiva, nunca deixou de ser titular do imóvel que foi objecto do investimento inicial, antes pelo contrário, veio adquirir mais imóveis.
Em nossa modesta opinião, embora seja verdade que o recorrente chegou a adquirir mais imóveis, mas a questão fulcral é saber se houve alteração ou extinção da situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão da autorização de residência temporária.
De facto, o recorrente formulou o pedido de fixação de residência em Macau, mediante o investimento na aquisição de fracção autónoma, pelo preço de MOP$5.257.069,00.
Na mesma ocasião, o recorrente constituiu hipoteca sobre a referida fracção autónoma, destinada para a garantia de facilidades bancárias no montante de MOP$3.676.070,00.
Pouco tempo depois, foi constituída uma segunda hipoteca sobre a mesma fracção, para a garantia de empréstimo no valor de MOP$2.369.000,00.
Melhor dizendo, podemos verificar que o recorrente e sua mulher investiram MOP$5.257.069,00, mas constituíram sucessivamente sobre a mesma fracção autónoma duas hipotecas, no montante total de MOP$6.045.070,00.
Daí que não restam dúvidas de que, com a constituição da segunda hipoteca sobre o bem imóvel cuja aquisição fundamentou o pedido de autorização de residência temporária, deixou de se verificar as condições previstas nos artigos 3º e 4º do Regulamento Administrativo nº 3/2005, mais precisamente, deixou de existir um efectivo investimento de um milhão de patacas por parte do recorrente.
E não se diga que o preço do imóvel subiu muito nos últimos anos, e atendendo ao seu preço actual, descontando o valor total das garantias constituídas, o valor de investimento ainda é superior ao valor exigido pela lei.
Salvo o devido respeito por melhor opinião, julgamos que essa interpretação do recorrente não corresponde minimamente à intenção do legislador.
Em boa verdade, a lei estabelece a possibilidade de os investidores estrageiros requererem a autorização de residência com base em investimento, nomeadamente mediante a aquisição de bem imóvel em Macau.
A ideia que está por detrás dessa política é incentivar a captação de investimentos de reconhecida relevância económica do exterior tendo em vista a promoção do crescimento económico da RAEM.
E a intenção do legislador é bastante clara, aqueles interessados que pretendam obter autorização de residência temporária com fundamento na aquisição de bem imóvel terão que efectuar um investimento efectivo no valor mínimo de um milhão de patacas, sendo permitida apenas a constituição de hipoteca sobre o mesmo imóvel se o valor pecuniário da obrigação a garantir não for superior à diferença entre o valor de mercado do imóvel no momento da aquisição e o montante mínimo estabelecido na lei (artigo 4º, nº 1 do RA nº 3/2005).
No fundo, a lei exige que o interessado invista pelo menos um milhão de patacas, destinado para aquisição de bem imóvel, e uma vez efectuado o investimento e adquirido o imóvel, a sua futura valorização ou desvalorização já não releva para efeitos de renovação da autorização de residência.
No vertente caso, tendo a recorrente investido MOP$5.257.069,00, mas com a constituição das duas hipotecas no montante total de MOP$6.045.070,00, ainda que se verifique a valorização do imóvel no mercado imobiliário, somos a entender que deixou de existir um efectivo investimento no valor de um milhão de patacas.
Por outro lado, o facto de o recorrente ter efectuado posteriormente novos investimentos não é uma justificação legalmente aceitável.
Em boa verdade, o recorrente não está impedido de aumentar o seu investimento em Macau, mas não pode fazer investimentos com recurso a financiamentos garantidos por hipoteca com inobservância dos limites impostos pelo artigo 4º do mesmo Regulamento Administrativo.
Mas de qualquer modo, é de concluir que, com a constituição da segunda hipoteca sobre o imóvel, verifica-se efectivamente uma alteração, sendo mais preciso uma extinção da situação juridicamente relevante que fundamentou o pedido de concessão de autorização de residência temporária do recorrente.
Aqui chegados, não se descortina que a decisão recorrida está inquinada do vício de violação de lei.
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Da justa causa para a falta de comunicação
Alega ainda o recorrente que não foi por causa do desconhecimento da lei, mas sim por estar convicto de que não ocorreu qualquer alteração da situação juridicamente relevante, por isso não foi efectuada a respectiva comunicação, sendo assim, entende ter havido justa causa para a falta de comunicação dentro do prazo de 30 dias, devendo, na sua perspectiva, a entidade recorrida ter aplicado a excepção prevista no nº 4 do artigo 18º do RA nº 3/2005.
Salvo o devido, entendemos não assistir minimamente razão ao recorrente.
De facto, tem razão a entidade recorrida, quando diz que não havia diferença entre ignorar a lei e estar convencido de que a lei não é aplicável.
Em boa verdade, se estava convencido de que não ocorreu qualquer alteração da situação juridicamente relevante, é porque ignorava o que a lei dispõe sobre essa matéria.
E não deixa de ser verdade que não constitui fundamento válido e suficiente a invocação da ignorância ou desconhecimento da lei para se eximir ao seu cumprimento (artigo 5º do CC).
Aliás, no mesmo sentido já decidiu o Venerando TUI, no Processo nº 30/2013, de que “não é necessário ter conhecimentos jurídicos para saber quais as obrigações a que o interessado que obteve autorização de residência está sujeito, para manter o seu estatuto, pelo que o invocado desconhecimento do regime jurídico de Macau não se pode afigurar como justa causa para incumprimento da obrigação de comunicação imposta por lei”.
Improcede, pois, o vício de violação de lei nos termos suscitados pelo recorrente.
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Do erro dos pressupostos de facto
O erro nos pressupostos de facto subjacentes à decisão releva no exercício de poderes discricionários, exigindo-se que os factos que sirvam de motivo de um acto administrativo devem ser verdadeiros, de modo que o órgão decisor possa actuar de forma livre e esclarecida, sem que a sua vontade seja viciada.
No caso sub judice, embora seja verdade que foi mencionado no parecer elaborado pelo funcionário do IPIM o facto de que o recorrente e sua mulher não apresentaram provas de que possuíam imóveis durante o período compreendido entre 25.11.2011 e 15.6.2012, mas não é menos certo que a entidade recorrida não acolheu aquele fundamento no seu despacho ora recorrido.
Na verdade, as razões que levaram a entidade recorrida a indeferir o pedido de renovação da autorização de residência temporário do recorrente consistem na alegada extinção da situação juridicamente relevante resultante da constituição sucessiva de duas hipotecas e na falta de comunicação dessa extinção, pelo que, salvo melhor opinião, não se descortina que o acto recorrido está ferido do vício de violação de lei, por alegado erro nos pressupostos de facto.
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Da violação dos princípios da proporcionalidade e justiça
Alega ainda o recorrente que a decisão recorrida viola dos princípios da proporcionalidade e da justiça, na medida em que implica consequências manifestamente gravosas e desproporcionadas para o recorrente pelo simples facto de ele ter aumentado substancialmente o seu investimento imobiliário em Macau.
Sobre essa questão, também já não é coisa nova.
Vejamos o que se disse no Acórdão do Venerando TUI, no Processo nº 13/2012:
“13. Não se têm suscitado dúvidas tanto na doutrina como na jurisprudência, que os tribunais podem fiscalizar o respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade. A dúvida está em saber em que medida deverão os tribunais intervir nesta matéria.
DAVID DUARTE, referindo-se à proporcionalidade em sentido estrito, «que engloba a técnica do erro manifesto de apreciação, técnica jurisdicional francesa que compreende, em termos avaliativos, para além do erro na qualificação dos factos, a utilização de um critério decisório proporcional que se revela numa decisão desequilibrada entre o contexto e a finalidade. O erro manifesto de apreciação, na vertente de controlo da adequação da decisão aos factos … é, como meio de controlo do conteúdo da decisão, um dos degraus mais elevados da intervenção do juiz na discricionariedade administrativa. E, por isso, só é utilizável na medida da evidência comum da desproporção» (o sublinhado é nosso).
Nas mesmas águas navega MARIA DA GLÓRIA F. P. DIAS GARCIA, defendendo que «em face da fluidez dos princípios (da proporcionalidade, da igualdade, da justiça), só são justiciáveis as decisões que, de um modo intolerável, os violem» (o sublinhado é nosso).
O novo CPAC, no seu art. 21.º, n.º 1, alínea d), embora não aplicável à situação dos autos, a respeito dos fundamentos do recurso contencioso refere-se ao «erro manifesto ou a total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários»”
O recorrente defende que se trata de uma infracção formal, a qual implica consequências manifestamente gravosas e desproporcionadas para o recorrente que alargou o seu investimento imobiliário global em Macau, entendendo que o interesse público eventualmente em causa deveria ceder perante as suas expectativas, considerando, por um lado, o interesse do recorrente em manter a residência em Macau, e por outro, o próprio interesse da RAEM.
Em nossa opinião, a desrazoabilidade a que alude o artigo 21º, nº 1, alínea d) do CPAC deve ser entendida de forma a deixar um espaço livre à Administração, salvaguardados os limites próprios do poder discricionário, nomeadamente os decorrentes dos princípios da imparcialidade, igualdade, justiça e proporcionalidade.
E no caso concreto, não se nos afigura ter havido erro manifesto ou grosseiro no uso de poderes discricionários ou violação dos princípios da proporcionalidade e da justiça, na medida em que não era inaceitável nem intolerável a forma como a Administração usou os seus poderes discricionários, pois, tendo em consideração o interesse público que se prende com o cumprimento da lei em geral, e neste caso específico, das regras que exigem a manutenção da situação juridicamente relevante e que, no fundo, visam assegurar a estabilidade do mercado imobiliário e evitar consequências negativas derivadas de variações inesperadas de preços praticados no imobiliário, justifica-se a decisão tomada pela Administração no sentido de indeferimento da renovação da autorização de residência temporária do recorrente na RAEM.
Queríamos dar uma observação: podemos dizer que o recorrente tem sorte neste caso por que os preços do imobiliário subiram depois de ele ter adquirido os imóveis, mas se os preços tivessem descido acentuadamente, o que aconteceria?
Se assim fosse, o património líquido do recorrente poderia tornar-se negativo, sendo assim a soma dos valores de todos os imóveis (mas descontando as garantias constituídas) poderia nem sequer atingir ao mínimo legal de MOP$1.000.000,00, daí que, muito provavelmente, teria que ser indeferido o pedido de renovação da autorização de residência.
Em nossa modesta opinião, não se justificaria o tratamento desigual entre as duas situações, no sentido de a verificação dos pressupostos legais depender exclusivamente do dinamismo no mercado imobiliário ou das vicissitudes da própria economia da RAEM.
Desta sorte, improcede o vício de violação de lei quanto a este aspecto.
Em tudo o mais, julga-se improcedente o presente recurso contencioso.
***
III) DECISÃO
Face ao exposto, acordam em julgar improcedente o recurso contencioso.
Custas pelo recorrente, com 8 U.C. de taxa de justiça.
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RAEM, 26 de Maio de 2016
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira

Fui presente
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Mai Meng Ieng




Recurso Contencioso 325/2015 Pág 48