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Processo nº 371/2015
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 16 de Junho de 2016
Descritores:
-Revisão de sentença
-Divórcio

SUMÁRIO:

I. Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.

II. Quanto aos requisitos relativos à competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do nº1, do artigo 1200º, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.

III. É de confirmar a decisão do Tribunal competente segundo a lei da Região Administrativa Especial de Hong Kong que decreta o divórcio entre os cônjuges, por não existir qualquer violação ou incompatibilidade com a ordem pública da RAEM ou qualquer obstáculo à sua revisão.















Proc. nº 371/2015

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I – Relatório
A, do sexo masculino, divorciado, residente na…Macau, portador do BIRM permanente n.º…, requereu contra os filhos identificados a fls. 20 e herdeiros incertos da B, ausentes em parte incerta, a presente revisão de decisões proferidas por tribunais do exterior de Macau.
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Procedeu-se a citação pessoal e edital e, posteriormente, foi o MP citado, mas não houve contestação.
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Cumpre decidir.
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II – Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia.
O processo é o próprio e não há nulidades.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito.
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III – Os factos
Julga-se documentalmente assente a seguinte factualidade:
1. O autor casou-se com a B em 10 de Junho de 1956 na Paróquia de Santo António do Território.
2. Aos 10 de Maio de 1990, foi extinta a relação matrimonial acima referida através da decisão proferida no âmbito do processo por ele instaurado no ora Tribunal Distrital de Hong Kong.
3. O teor da decisão em língua inglesa é o seguinte:
IN THE DISTRICT COURT OF HONG KONG
DIVORCE JURISDICTION
SUIT NO….
Between A (Petitioner)
and B (Respondent)
BEFORE HIS HONOUR JUDGE GOULD OF DISTRICT
COURT IN COURT
O R D E R
On the 10th day of May 1990.
The JUDGE upon the making of the Decree Nisi herein ordered that there be no order as to costs in this suit.
And the JUDGE further dec1ared that there are no children of the family to whom Section 18 of the Matrimonial Proceedings and Property Ordinance, Cap.192 applies.
Dated the 10th day of May 1990.
4. A referida decisão já transitou em julgada aos 25 de Junho de 1990 (vd. Anexo I), conforme teor do certificado que se transcreve:
Certificate of making Decree Nisi Absolute (Divorce)
NO.1450 OF 1990
IN THE DISTRICT COURT OF HONG KONG
DIVORCE JURISDICTION
Between A (Petitioner)
and B (Respondent)
Referring to the decree made in this cause on 10th day of May 1990
whereby it was decreed that the marriage solemnized on 10th day of June 1956 at the Church of Santo Antonio, municipality, city and diocese of Macau,
between A (the Petitioner)
and B (the Respondent)
be dissolved unless sufficient cause be shown to the court within six weeks from the making thereof why the said decree should not be made absolute, and no such cause having been shown, it is hereby certified that the said decree was on the 25th day of June 1990 made final and absolute and that the said marriage was thereby dissolved.
Dated this 3rd day of July 1990
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III – O Direito
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública.
2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”
Neste tipo de processos não se conhece do fundo ou do mérito da causa, uma vez que o Tribunal se limita a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento, nem da questão de facto, nem de direito.
Vejamos, então, os requisitos.
Os documentos constantes dos autos reportam e certificam a situação invocada pelo autor. Revelam, além da autenticidade, a inteligibilidade da decisão do Tribunal Distrital da RAEK (Jurisdição de divórcio), que decretou a dissolução do casamento dos cônjuges.
Por outro lado, a decisão em apreço não conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública da RAEM (cfr. art. 20º e 273º do C.C.). Com efeito, também o direito substantivo de Macau prevê a dissolução do casamento.
Reunidos estão, pois, os requisitos de verificação oficiosa do art. 1200º, n.1, als. a) e f), do CPC.
Além destes, não se detecta que os restantes (alíneas b) a e)) constituam aqui qualquer obstáculo ao objectivo a que tendem os autos.
Na verdade, também resulta da documentação dos autos que a sentença de divórcio se tornou eficaz com o respectivo trânsito.
Acrescenta-se ainda que a decisão foi proferida por entidade competente face à lei em vigor na Região Administrativa e Especial de Hong Kong e não versa sobre matéria exclusiva da competência dos tribunais de Macau, face ao que consta do art. 20º do Cod. Proc. Civil.
Também não se vê que tivesse havido violação das regras de litispendência e caso julgado ou que tivessem sido violadas as regras da citação no âmbito daquele processo ou que não tivessem sido observados os princípios do contraditório ou da igualdade das partes.
Posto isto, tudo se conjuga para a procedência do pedido (cfr. art. 1204º do CPC).
Portanto, não existe nenhum obstáculo à revisão.
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IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em conceder a revisão e confirmar a decisão proferida pelo Tribunal Distrital da Região Administrativa Especial de Hong Kong datada de 10/05/1990, transitada em 25/06/1990, que decretou o divórcio entre A, e B, nos exactos e precisos termos acima transcritos.
Custas pelo requerente.
TSI, 16 de Junho de 2016
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong
Lai Kin Hong



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