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Processo nº 344/2015
Data do Acórdão: 14JUL2016


Assuntos:

Autorização de residência
Antecedentes criminais
Conflitos de interesses


SUMÁRIO

Mesmo que tenham decorrido largos anos sobre a prática dos crimes registados no cadastro do recorrente, nem por isso as tais infracções deixam de poder ser atendidas como antecedentes criminais para efeitos da concessão ou não da autorização de residência.

Em nenhuma norma da nossa lei, os interesses consubstanciados na comunhão de vida conjugal em Macau e na possibilidade de cumprir os deveres e exercer os direitos inerentes ao casamento em Macau, por parte de um residente e de um não residente conjuntamente, são considerados valores de superioridade absoluta, ou pelo menos superiores aos interesses públicos da segurança interna da RAEM. Antes pelo contrário, os tais interesses dos particulares devem ceder perante esses interesses públicos.


O relator


Lai Kin Hong

Processo nº 344/2015

I

Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM

A, devidamente identificado nos autos, vem recorrer do despacho do Senhor Secretário para a Segurança que lhe indeferiu o pedido que formulara para que fosse autorizada a residência em Macau, concluindo e pedindo:

1. 適用法律前提錯誤,錯誤適用3月17日第4/2003號法律第9條第2款1項之規定
2. 第一,關於法律適用方面,上述批示內指申請人“根據香港警務處所簽發的 文件,申請人有多項刑事犯罪紀錄,表明其不是個遵守法律的人,除不配擁有澳門居民身份外,亦有可能對公共治安構成威脅,因此,經考慮第4/2003號法律第9條第2款1項之規定後,決定不批准有關居留許可。”上訴人認為,尊敬的司長 閣下錯誤理解第9條第2款1項的規定。
3. 上訴人認為第9條第2款1項中的犯罪前科,應與經證實不遵守澳門特別行政 區法律一同考慮。
4. 即如考慮申請人之犯罪前科時,所考慮之前科應屬於經證實不遵守澳門法律而被判罪之前科。
5. 而根據相關通知批示中所述,尊敬的司長 閣下是考慮上訴人在香港的犯罪前科而作出不批准居留許可之決定。
6. 上訴人認為上述的規定應理解為經證實不遵守澳門法律而被判罪之前科,而不 應一概地考慮申請人在香港之犯罪前科。
7. 故此,上訴人認為保安司司長 閣下錯誤適用第4/2003號法律第9條第2款之 規定,為可撤銷之行政行為。
8. 第二,即使尊敬的法官 閣下不認同上訴人之上述見解,上訴人認為尊敬的保 安司司長 閣下並沒有全面地考慮第9條第2款之規定。
9. 上述批示內指上訴人“根據香港警務處所簽發的文件,申請人有多項刑事犯 罪記錄,表明其不是個遵守法律的人,除不配擁有澳門居民身份外,亦有可能對公共治安構成威脅,因此,經考慮第4/2003號法律第9條第2款1項之規定後,決定不批准有關居留許可。”(反黑及底線是我們加上的)
10. 上訴人認為,不應只考慮上訴人之刑事紀錄就認為上訴人可能對澳門之公共安全是否構成危險,還需考慮的是上訴人現在之個人狀況。
11. 上訴人雖然於1960年7月16日至1980年2月12日在香港存有犯罪紀錄。
12. 但是,有關犯罪事實發生至今已逾三十四年,上訴人現在已改過自新,此後亦再沒有任何的犯罪紀錄。
13. 可見,上訴人的人格已向好的方面作轉變。
14. 批准上訴人之居留許可並不會對澳門的公共安全構成影響。
15. 第三,上訴人認為在決定是否批准上訴人之居留除需考慮申請人之犯罪紀錄外,還需考慮上訴人之其他狀況,即第4/2003號第9條第2款第2項至第6項之規定──利害關係人所擁有的維生資源、在澳門特別行政區居留之目的及其可能性、利害關係人在澳門特別行政區從事或擬從事的活動、利害關係人與澳門特別行政區居民的親屬關係、人道理由,尤其在其他國家或地區缺乏生存條件或家庭輔助。
16. 上訴人之配偶B現患有乳癌,現正接受治療,需長期服藥,亦不能工作,需要人長期照顧,不能獨自地生活,需要家人的扶持及鼓勵對抗疾病。(見現提交之文件二:書面聽證陳述書內文件二至文件五醫療報告影印本)
17. 另一方面,上訴人自身亦患有肛周膿腫等疾病,在香港亦沒有其他人照顧其生活。(見現提交之文件二:書面聽證陳述書內文件六)
18. 上訴人與配偶沒有子女照顧,需要互相扶持及照顧。
19. 因此,上訴人在香港是缺乏家庭輔助。
20. 澳門民法典1533條的規定:“夫妻雙方互負尊重、忠誠、同居、合作及扶持的義務”。
21. 而上訴人申請來澳定居的目的是為了與妻子B團聚及照顧其身體。
22. 尊敬的保安司司長 閣下不批准上訴人來澳定居的申請,上訴人及其妻子在沒有對方的照顧下難以獨自生活及對抗疾病。
23. 上訴人認為尊敬的司長 閣下在考慮上訴人之申請時,不應只考慮上訴人之犯 罪前科,同時亦需考慮第4/2003號法律第9條第2款規定之其他因素。
24. 如上訴人與澳門特別行政區的親屬關係(妻子為本澳居民)及人道理由(上訴 人與其妻子均患有疾病,上訴人的妻子患病不能工作及獨立生活,必須依靠上訴人之照顧。
25. 上訴人認為,批准上訴人之居留許可更符合第4/2003號法律第9條第2款第2 項至第6項之規定。
26. 亦符合澳門民法典第1533條夫妻雙方互負同居及扶持之義務。
27. 綜上所述,考慮上訴人與澳門特別行政區居民的親屬關係(妻子為本澳居民)、尤其是人道理由(上訴人及妻子患病,上訴人及其妻子不能工作及獨立生活,極需雙方互相照顧),上訴人在香港缺乏家庭輔助等原因批准申請人來澳定居是合法及合理的。
28. 被上訴批示違反了第4/2003號法律第9條第2款規定,應予以撤銷。
29. 不批准上訴人之居留申請,將違反第6/94/M號法律《家庭政策綱要法》之規定
30. 如前所述,上訴人申請來澳居留的目的是為了與妻子團聚及照顧患病的妻子。
31. 家庭政策綱要法目的是保護家庭的建立,人人均有權在完全平等的條件下成立家庭和結婚。
32. 尊敬的司長 閣下以上訴人於香港曾有刑事紀錄之原因而不批准申請人之居留,會對上訴人成立家庭做成危害。
33. 同時亦會違反《家庭政策綱要法》第1條、第5條及其他相關之規定。
34. 基於此,被上訴批示應予以撤銷。

  五、請求
  綜上全部所述及有賴尊敬的法官 閣下對法律理解的高見,懇請尊敬的法官 閣下判處如下:
1. 裁定本上訴理由成立,因為被上訴行為沾有上述無效或可撤銷之瑕疵,撤銷有關行政行為;或
2. 為著上訴人的行益,撤銷被上訴行為;及
3. 批准上訴人的居留許可。
4. 請求傳喚被上訴實體如有需要可在法定期間內作出答辯,並命令將有關行政卷宗附入本司法上訴之卷宗內(《行政訴訟法典》第55條第1款)
  懇請批准!


Citado, veio o Senhor Secretário para a Segurança contestar pugnando pela improcedência do recurso.

Não havendo lugar à produção de provas, foram o recorrente e a entidade recorrida notificados para apresentar alegações facultativas.

Não foram apresentadas alegações facultativas.

Em sede de vista final, o Dignº Magistrado do Ministério Público opinou no seu douto parecer pugnando pelo não provimento do presente recurso.

Colhidos os vistos, cumpre conhecer.

O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.

O processo é o próprio e inexistem nulidades e questões prévias que obstam ao conhecimento do mérito do presente recurso.

Os sujeitos processuais gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade.

De acordo com os elementos existentes nos autos, é tida por assente a seguinte matéria de facto com relevância à decisão do presente recurso:

* O recorrente A, é residente em Hong Kong e titular do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Hong Kong;

* Casou-se em Macau em 18MAIO2005 com B, que é residente em Macau e titular do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau;

* Em 16JUL1969, o recorrente foi condenado em Hong Kong pela prática de um crime tentado de roubo, com ofensa corporal, (Assaut with intente to rob), na medida de internamento no Training Centre;

* Em 09JUL1971, o recorrente foi condenado em Hong Kong pela prática de um crime de vandalismo (Suspected person found loitering), na prestação da caução no valor de HKD$300, para o cumprimento das boas condutas por 9 meses;

* Em 29JUL1974, o recorrente foi condenado em Hong Kong pela prática, em concurso, de vários crimes de roubo, na pena de prisão de 4 anos, por cada um dos crimes a executar em simultâneo;

* Em 19SET1977, o recorrente foi condenado em Hong Kong pela prática de um crime de furto, na pena de multa de HKD$600,00;

* Em 19MAIO1978, o recorrente foi condenado em Hong Kong pela prática, em concurso, de um crime tentado de subtracção de meios de transporte sem autorização (Attempted taking conveyance without authority), de um crime de evasão à detenção legalmente imposta (Escaping from legal custody) e de um crime de resistência às autoridades policiais (Resisting a police officer), nas penas parcelares de 9 meses, 3meses e 3 meses de prisão, respectivamente;

* Em 31MAIO1979, o recorrente foi condenado em Hong Kong pela prática de um crime de jogo em estabelecimento de jogos (Gambling in a gambling establisment), na pena de HKD$300 de multa;

* Em 09JUL1979, o recorrente foi condenado em Hong Kong pela prática de um crime de jogo em estabelecimento de jogos (Gambling in a gambling establisment), na pena de HKD$200 de multa;

* Em 12FEV1980, o recorrente foi condenado em Hong Kong pela prática de um crime de jogo em estabelecimento de jogos (Gambling in a gambling establisment), na pena de HKD$200 de multa;

* Em 20MAIO2005, ao abrigo do disposto no artº 14º do Regulamento Administrativo nº 5/2003, o recorrente requereu ao Chefe do Executivo da RAEM a autorização de residência em Macau, tendo invocado como fundamento a existência dos laços familiares com o seu cônjuge residente da RAEM e a necessidade de tomar conta do seu cônjuge que se encontrava em mal estado de saúde;

* Por despacho do Senhor Secretário para a Segurança lançado em 26JUL2005, foi indeferido o pedido de autorização de residência com fundamento nos antecedentes criminais do recorrente;

* Em 22SET2014, ao abrigo do disposto no artº 14º do Regulamento Administrativo nº 5/2003 e com fundamento nos laços familiares (reagrupamento familiar) com residente da RAEM, o recorrente requereu ao Chefe do Executivo da RAEM a autorização de residência em Macau;

* Na audiência escrita do procedimento administrativo, o requerente juntou os documentos comprovativos de que ele próprio padece das hemorróidas e o seu cônjuge padece da carcinoma da mama, para justificar a sua expectativa de vir a conviver com o seu cônjuge em Macau a fim de puderem tomar conta reciprocamente;

* O recorrente e o seu cônjuge não têm filhos;

* Por despacho do Senhor Secretário para a Segurança lançado em 18FEV2015, foi indeferido o pedido de autorização de residência com fundamento nos antecedentes criminais do recorrente; e

* Inconformado com o despacho que lhe foi notificado por carta expedida em 26MAR2015, veio o recorrente interpor recurso contencioso mediante o requerimento que deu entrada na Secretaria do TSI em 15ABR2015.

Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).

Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi do artº 1º do CPAC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.

Em face das conclusões na petição do recurso, o recorrente está a assacar ao acto recorrido os vícios da violação da lei.

Portanto são as seguintes questões que constituem o objecto da nossa apreciação.

1. Da violação da Lei nº 4/2003; e

2. Da violação da Lei nº 6/94/M.

Então vejamos.

1. Da violação da Lei nº 4/2003

Como se vê na fundamentação do despacho recorrido, foi com base nos comprovados antecedentes criminais do recorrente que o Senhor Secretário para a Segurança indeferiu o seu pedido de autorização da residência.

Todavia, na óptica do recorrente, face ao disposto no artº 9º/2-1) da Lei nº 4/2003, só as infracções criminais cometidas em violação da lei da RAEM podem ser integradas no conceito “antecedentes criminais” a que se alude o artº 9/1-1) do mesmo diploma legal.

Para sustentar a sua interpretação, o recorrente defende que o conceito “antecedentes criminais” deve ser interpretado juntamente com a expressão que se segue, isto é, “comprovado incumprimento das leis da RAEM”.

Portanto, os cadastros criminais por factos praticados em Hong Kong não se devem integrar no conceito “antecedentes criminais” a que se alude o artº 9/1-1) da mesma lei, uma vez que estes factos não violaram as leis da RAEM.

Salvo o devido respeito, custa-nos aceitar essa interpretação, pois os sentidos resultantes dessa interpretação carecem de qualquer apoio nas palavras da lei.

Ao rezar que “…… deve atender-se, nomeadamente, aos antecedentes criminais, comprovado incumprimento das leis da RAEM ou qualquer das circunstâncias referidas no artigo 4.º da presente lei”, a lei está a enunciar vários elementos a ser atendidos alternativamente pela Administração, quando houver de decidir um pedido de autorização de residência.

Sendo enunciados em alternativa, os tais elementos são levados em conta individualmente pela Administração para tomar decisão.

Compreende-se a intenção do legislador, uma vez que ao estar confrontada com um pedido de concessão da autorização de residência, formulado por um não residente, a Administração deve, por razões que se prendem com a segurança interna da RAEM, levar em conta nomeadamente os antecedentes e a conduta anterior do requerente, quer no ordenamento na RAEM quer em ordenamentos fora da RAEM, nomeadamente no da sua origem.

Portanto, não faz sentido mandar atender apenas os antecedentes criminais registados na RAEM por factos praticados ou relacionados com a RAEM e não também os antecedentes criminais pelos factos praticados fora da RAEM, pois tanto uns como outros são igualmente importantes para formar um prognóstico relativamente à existência ou não, ou o grau de perigosidade à segurança interna da RAEM, resultante da permanência do requerente que pretende fixar residência em Macau.

Improcede assim este argumento.

Subsidiariamente, o recorrente entende que como decorreram mais de 30 anos sobre a prática dos factos que tiveram origem nas suas condenações criminais em Hong Kong e o recorrente tem mantido sempre bom comportamento, a evolução positiva da sua personalidade é demonstrativa de que a presença do recorrente em Macau já não tem a virtualidade de constituir perigo à segurança pública da RAEM.

Ora, tal como decidimos já no Acórdão de 13DEZ2012 no processo nº 244/2012, mesmo que tenham decorrido largos anos sobre a prática dos crimes registados no cadastro do recorrente, nem por isso as tais infracções deixam de poder ser atendidas como antecedentes criminais para efeitos da concessão ou não da autorização de residência.

A propósito da eventual relevância do simples decurso de tempo sobre os antecedentes criminais a que se refere o artº 9º/2-1) da Lei nº 4/2003, o Venerando TUI já se pronunciou, no seu Acórdão tirado em 13DEZ2007 no processo nº 36/2006, nos termos seguintes:

“Para a lei não é particularmente relevante o tempo decorrido desde a prática de crimes e as condenações. Na óptica do legislador, as condenações criminais anteriores, bem como os fortes indícios de terem praticado ou de se prepararem para a prática de quaisquer crimes susceptíveis de ser motivo de recusa da entrada dos não residentes na RAEM (art.º 4.º, n.º 2, al. d) da Lei n.º 4/2003), constituem sempre motivo de alarme para a ordem e segurança públicas da Região.”

Assim, na esteira dessa sensata e convincente doutrina, o simples decurso de tempo não tem, a fortiori, a virtualidade de diluir, muito menos de neutralizar a preocupação por parte da Administração sobre o perigo para a ordem e a segurança pública, ao confrontar-se com um pedido de concessão da autorização de residência na RAEM.

Ora, perante a grande abundância das condenações criminais de que sofreu o ora recorrente, de entre as quais várias são dos crimes de roubo e de ofensa corporal, não vimos em que termos podemos dizer que a decisão da Administração pode constituir violação do artº 9º da Lei nº 4/2003.

Não há portanto violação do artº 9º da Lei nº 4/2003.

O recorrente avançou com mais um argumento subsidiário para assacar ao acto recorrido a violação da Lei nº 4/2003, dado que, na óptica do recorrente, a Administração ignorou a sua necessidade de residir em Macau juntamente com a sua esposa aqui residente, justificada pelo estado de saúde quer dele próprio quer da sua esposa.

Para efeito, apresentou documentos para demonstrar que a sua esposa padece do carcinoma da mama e ele próprio sofre das hemorróidas.

Admitindo embora que, no caso em apreço, o indeferimento da pretendida residência em Macau poderá implicar alguns inconvenientes no exercício, por parte do recorrente, do seu direito à reunião familiar e no cumprimento dos seus deveres conjugais, temos de aceitar a impossibilidade da integral harmonização entre a protecção dos interesses tutelados por esse direito e a de interesses públicos, nomeadamente o da segurança pública e interna da RAEM.

Aliás, em nenhuma norma da nossa lei, os interesses consubstanciados na comunhão de vida conjugal em Macau e na possibilidade de cumprir os deveres e exercer os direitos inerentes ao casamento em Macau, por parte de um residente e de um não residente conjuntamente, foram considerados valores de superioridade absoluta, ou pelo menos superiores aos interesses públicos da segurança interna da RAEM.

Antes pelo contrário, os tais interesses dos particulares devem ceder perante esses interesses públicos.

Nestas circunstâncias concretas, para que se concretizem os interesses públicos consubstanciados na salvaguarda de segurança pública e interna, necessário se torna limitar, senão sacrificar os direitos assinalados do recorrente.

Por outro lado, a lei não impõe o indeferimento necessário da autorização às pessoas que tenham antecedentes criminais, a decisão administrativa, o indeferimento, como sucedeu in casu, não é tomada no exercício de um poder vinculado, mas sim de um poder discricionário, pois, cabe à Administração analisar em cada caso concreto as condições do requerente para saber se a autorização lhe afigura mais conveniente ao interesse público, tendo em conta nomeadamente a segurança pública e interna da RAEM.

Tradicionalmente falando, tirando os seus aspectos vinculados, nomeadamente os relativos à competência, à forma, aos pressupostos de facto e à adequação ao fim prosseguido, que são sempre sindicáveis, os tribunais administrativos não podem sindicar as decisões tomadas pela Administração no exercício de poderes discricionários, salvo nos casos extremos de erro grosseiro ou manifesto ou “quando sejam infringidos os princípios gerais que limitam ou condicionam, de forma genérica, a discricionariedade administrativa, designadamente os princípios constitucionais; o princípio da imparcialidade, o princípio da igualdade, o princípio da justiça, o princípio da proporcionalidade, o princípio da boa-fé, etc..” – Freitas do Amaral, in Curso do Direito Administrativo, II, Almedina, pág. 392.

Assim, ponderando os interesses em jogo, é de concluir que a não autorização da residência temporária, no exercício do poder discricionário, não constitui erro grosseiro ou manifesto na adequação ao fim prosseguido que é salvaguardar a segurança interna da RAEM, nem conduz à violação de qualquer dos princípios fundamentais da igualdade, justiça e imparcialidade.

2. Da violação da Lei nº 6/94/M

Finalmente o recorrente assaca ao acto recorrido o vício da violação dos artºs 1º e 5º da Lei de Bases de Política Familiar uma vez que, na óptica do recorrente, a não concessão de autorização de residência implica a violação do direito ao casamento, e dos inerentes direitos ao casamento, nomeadamente os direito de coabitação e da cooperação.

Ora uma coisa é certa, a lei nunca garante aos particulares, não residentes da RAEM, que tenham estabelecido laços matrimoniais com um residente da RAEM, o direito “potestativo” de fixar residência em Macau, a fim de aqui ter a convivência conjugal ou familiar.

Portanto, fixar residência em Macau não passa de ser uma mera opção pessoal dos interessados e deve sujeitar-se sempre ao condicionalismo estabelecido na lei para a concessão da autorização de residência.

Assim, não se pode dizer que ao não lhe conceder a pretendida autorização de residência, a Administração está a violar os direitos ao casamento e os direitos inerentes ao casamento, de que é titular o requerente.

Pois, mesmo não seja titular da autorização de residência na RAEM, o recorrente pode optar por conviver com o seu consorte em outro sítio, nomeadamente no seu lugar de origem, ou pode deslocar-se a Macau, onde poderá ficar legalmente por um período suficientemente largo para manter a convivência com o seu cônjuge aqui residente.

Não vimos portanto em que termos a não concessão da autorização pode violar a Lei de Bases de Política Familiar.

Portanto, sem necessidade de mais delongas, é de julgar improcedente in totum o recurso.

Resta decidir.

III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência negar provimento ao recurso.

Custas pelo recorrente, com taxa de justiça fixada em 8 UC.

Registe e notifique.

RAEM, 14JUL2016
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng

Fui presente
*
Mai Man Ieng