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Processo nº 618/2015
(Recurso de Contencioso)


Relator: João Gil de Oliveira

Data: 7/Julho/2016


Assuntos:
- Notificação; sua regularidade:
- Aviso de recepção assinado por terceiro


SUMÁRIO :
    Se o interessado, na manutenção da seu estatuto de residente por investimento, opta por indicar no seu relacionamento com o IPIM uma morada de terceira pessoa, - no caso uma determinada agência -, tem o ónus de assegurar que as notificações que para aí sejam enviadas cheguem ao seu conhecimento, salvaguardando uma razão excepcional e inesperada, fora do normal, não podendo alegar que o terceiro que recebeu a carta não lha entregou.

               O Relator,
              João A. G. Gil de Oliveira


Processo n.º 618/2015
(Recurso Contencioso)

Data : 7 de Julho de 2016

Recorrentes: - A
- B
- C
- D

Entidade Recorrida: Secretário para a Economia e Finanças

    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I – RELATÓRIO

   1. Inconformados com a decisão proferida pelo Exmo senhor Secretário para a Economia e Finanças, vêm A, B, C e D, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância, alegando, em síntese conclusiva:
a. O presente recurso contencioso tem como objecto o despacho do Secretário para a Economia e Finanças de 28 de Fevereiro de 2015 que confirmou a proposta n.º 01700/GJFR/2014/02R emitida pelo IPIM em 9 de Fevereiro de 2015, na qual declarou cancelada a respectiva autorização de residência temporária do recorrentes e dos seus agregados familiares.
b. Os recorrentes receberam em 28 de Maio de 2015, através do seu mandatário judicial, o despacho do Secretário para a Economia e Finanças de 28 de Fevereiro de 2015 que fundamentou o presente recurso;
c. Não obstante o IPIM já emitiu o aludido despacho em 24 de Março de 2015 para o domicílio de correspondência do 1º recorrente - Macau, Rua de Xangai, Edf. da Associação Comercial de Macau, XX-andar-XX;
d. E em 8 de Abril de 2015, o despacho foi recebido e assinado por um representante da XXX Tourism and Travel Agency Ltd.;
e. Contudo, esta empresa nunca entregou a carta aos recorrentes;
f. Ademais, além do 4º recorrente que morava em Macau, os 1º a 3ª recorrentes residiam no Interior da China por causa laboral e escolar.
g. De facto, é de salientar que os recorrentes nunca incumbiram XX Tourism and Travel Agency Ltd. e/ou qualquer pessoal desta para tratar de qualquer assunto relativo à residência por investimento dos recorrentes.
h. Acresce que os BIRNPM dos 1º e 4º recorrentes tinham sido tirados quando este passaram o posto de fronteiriço em 19 de Abril.
i. Contudo, a notificação do Serviço de Migração do CPSP não contém o teor previsto no art.º 70.º do Código de Procedimento Administrativo, nem foi aquela entidade que praticou o respectivo acto administrativo emitiu a tal notificação;
j. Portanto, tal como a jurisprudência, o vício da notificação, apesar de não constituir a condição de nulidade do acto administrativo, não produz efeitos deste.
k. De facto, o 1º recorrente, depois do facto do ponto 7, contactou imediatamente com o seu mandatário judicial para saber se recebeu a notificação do IPIM e foi ao local indicado no ponto 2 para verificar a situação;
l. Aliás, o seu mandatário judicial respondeu-lhe imediatamente que não recebeu nenhuma notificação do IPIM para os recorrentes;
m. O 1º recorrente apenas recebeu a tal notificação do IPIM até ao início de Junho de 2015 através do seu mandatário judicial das mãos do pessoal da XX Tourism and Travel Agency Ltd.;
n. Nos termos dos art.ºs 68.º e 70.º do Código do Procedimento Administrativo, conjugado com o art.º 26.º do Código do Procedimento Administrativo (sic.), devem ser notificados aos interessados os actos administrativos, a contagem do prazo para interposição do recurso contencioso/ou qualquer outro processo de tutela inicia-se a partir da notificação.
o. Nestes termos, conforme o direito e a jurisprudência vigentes acima referidos, a notificação do Serviço de Migração não deve ser considerada válida.
p. Portanto, a notificação de cancelamento da autorização de residência temporária não foi validamente feita aos recorrentes.
q. Portanto, os recorrentes não podem saber o motivo, a razão do cancelamento da sua autorização de residência temporária, o prazo para a interposição de impugnação e a entidade responsável; Apenas até que os recorrentes receberam, através do seu mandatário judicial, a certidão do despacho que serve de objecto do presente recurso contencioso, ficaram a saber plenamente o respectivo teor do acto administrativo.
r. A tal certidão foi passada em 28 de Maio de 2015;
s. Portanto, o prazo para a interposição do recurso conta-se a partir doe 28 de Maio de 2015.
t. A aludida certidão do despacho já indicou expressamente que o prazo para a interposição do recurso ao TSI é de 30 dias (vide fls. 2, doc. n.º 1).
u. Portanto, o presente recurso contencioso foi interposto dentro do prazo legal previsto no art.º 25.º n.º 2 al. a) do Código do Processo Administrativo Contencioso.
v. Os recorrentes também são interessados dos autos, assim, têm legitimidade para interpor o presente recurso contencioso nos termos do art.º 33.º do Código do Processo Administrativo Contencioso.
w. Por fim, nos termos do art.º 36.º n.º 8 al. 1) da Lei n.º 9/1999, o TSI é competente para conhecer do presente recurso contencioso.
x. O 1º recorrente foi autorizado a fixar residência temporária em Macau pela primeira vez em 4 de Maio de 2007;
y. Para os efeitos de aquisição de residência em Macau, o 1º recorrente comprou a fracção sita na Rua de Nam Keng, XXX, Taipa, (adiante designada por “propriedade”);
z. O 1º recorrente comprou a aludida propriedade pelo preço de MOP$2.468,028,00 e tinha um depósito a prazo num valor não inferior a MOP$500.000,00 na Sucursal de Macau do Banco da China.
aa. O pedido do 1º recorrente foi extensivo aos seus agregados familiares, incluindo a cônjuge (2ª recorrente) e os dois filhos, C (3ª recorrente) e D (4º recorrente).
bb. Os recorrentes obtiveram o BIRNPM em 4 de Maio de 2008 respectivamente.
cc. Os recorrentes pediram a renovação da autorização de residência temporária ao IPIM em 15 de Junho de 2010 e 22 de Julho de 2013 respectivamente e foram autorizados a renovar, e no último pedido de renovação, a autorização de residência temporária do 1º recorrente, A, será renovada até 18 de Junho de 2016 e a da 2ª recorrente e da 3ª recorrente até 14 de Junho de 2016, enquanto a do 4º recorrente foi renovada até 8 de Janeiro de 2015.
dd. Portanto, o 1º recorrente, para que o 4º recorrente possa continuar a ser autorizado a residir temporariamente em Macau, pediu a renovação ao IPIM em 28 de Outubro de 2014 a favor do seu agregado familiar, D.
ee. No entanto, o IPIM, perante a solicitação da renovação apresentada pelo 1º recorrente a favor do 4º recorrente, indicou que o 1º recorrente tinha constituído a favor do Banco Tai Fung uma hipoteca sobre a propriedade supracitada em 30 de Agosto de 2011 e em 20 de Fevereiro de 2014.
ff. E julgou que o facto de constituição da hipoteca do 1º recorrente sobre a propriedade supracitada é juridicamente relevante, logo, o 1º recorrente violou o disposto no art.º 18 do Regulamento Administrativo 3/2005, cancelando assim a autorização de residência temporária dos recorrentes e realizando a audiência.
gg. Segundo a proposta do IPIM n.º 01700/GJFR/2014/02R, “por registo de 30 de Agosto de 2011, o requerente constituiu uma hipoteca a favor do Banco Tai Fung sobre a propriedade que fundamentou a concessão da autorização, no valor de HKD$1.203.000,00, equivalente a MOP$1.239.090,00, em seguida, constituiu outra hipoteca a favor do mesmo Banco sobre a propriedade supracitada em 20 de Fevereiro de 2014, no valor de HKD$2.000.000,00, equivalente a MOP$2.060.000,00, fazendo com que o valor de investimento do requerente não satisfaça as disposições legais e daí extinguiu-se a situação jurídica que fundamentou a autorização original.”;
hh. E indicou no ponto 3 da proposta supracitada que o recorrente violou a obrigação de comunicação previsto no art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, pelo que se sugeriu o cancelamento da autorização de residência temporária do recorrente e dos seus agregados familiares.
ii. Na proposta supracitada, o IPIM entende que o acto de constituição da hipoteca sobre a propriedade em causa pode levar à extinção da situação jurídica que fundamentou a autorização de residência temporária, assim, o recorrente tem a obrigação de comunicação.
jj. É de salientar que por um lado, a propriedade supracitada ainda estava registada a favor do 1º recorrente, sendo o mesmo único proprietário legítimo desta até hoje, e a situação de extinção do direito de propriedade sobre o imóvel, tal como a venda da propriedade supracitada, nunca aconteceu.
kk. E por outro lado, indicou o IPIM na proposta que, através dos ofícios n.º 09259/GFJR/2008 de 26 de Maio de 2008, 10420/GFJR/2010 29 de Junho de 2010 e 07858/GFJR/2013 de 29 de Julho de 2013, já notificou o requerente que “deve manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.”
ll. De facto, todos os três ofícios supracitados especificaram as situações juridicamente relevantes tais como divórcio, sucessão e venda da propriedade, etc..
mm. Mas nunca indicaram que a constituição da hipoteca sobre a propriedade em causa é uma das situações juridicamente relevantes.
nn. Assim, o 1º recorrente estava convencido de que desde que não faça qualquer situação prevista nos três ofícios supracitados, a sua autorização de residência temporária não vai ser afectada.
oo. Ademais, tal como referiu a proposta, o 1º recorrente constituiu a hipoteca sobre a propriedade em 30 de Agosto de 2011, mas quando este requereu a renovação no ano 2013;
pp. Também lhe foi concedida a renovação de autorização de residência temporária em 22 de Julho do mesmo ano,
qq. O ofício n.º 07858/GFJR/2013, para além de notificar o recorrente da respectiva autorização da renovação, apenas advertiu repetidamente o recorrente da obrigação de comunicação ao IPIM sobre a alteração da situação juridicamente relevante (tais como divórcio, sucessão e venda de propriedade), mas não especificou a hipoteca em causa como uma circunstância da violação do disposto do Regulamento Administrativo n.º 3/2005.
rr. Conjugando com as situações objectivas referidas nos pontos 29 a 35 supracitados, o 1º recorrente estava convencido de que a constituição da hipoteca sobre a propriedade não iria afectar a renovação da sua residência temporária.
ss. Aqui, é de realçar que segundo as “Instruções de Pedido de Fixação de Residência Temporária” do IPIM, também não se considera a constituição da hipoteca sobre a propriedade como uma alteração jurídica (vide doc. n.º 2, fls. 46).
tt. Ao abrigo do art.º 8.º do Código do Procedimento Administrativo, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa fé e devem ponderar os valores fundamentais do direito, relevantes em face das situações consideradas, em especial da confiança suscita na contraparte pela actuação em causa.
uu. Daí, podemos ver que quer as informações deixadas ao público (incluindo os recorrentes) quer os actos feitos pelo IPIM não revelam que a constituição da hipoteca sobre a propriedade é uma alteração da situação jurídica.
vv. In casu, quando o 1º recorrente constituiu, pela primeira vez, a hipoteca sobre a propriedade, o IPIM sempre mantinha a posição relevada nas “Instruções de Pedido de Fixação de Residência Temporária”, não fazendo advertência ao recorrente nem instaurando nenhum processo de revogação do pedido da autorização de residência temporária do recorrente. Assim, o recorrente estava convencido de que a constituição da hipoteca não iria afectar a residência temporária deste em Macau.
ww. Portanto, o objecto do presente recurso contencioso violou plenamente o disposto no art.º 8.º do Código do Procedimento Administrativo, devendo ser anulado nos termos do art.º 124.º do mesmo Código.
xx. Caso assim não se entenda, o recorrente ainda mantinha o valor de investimento inicial na sua posse.
yy. Nos termos do art.º 19.º n.º 2 do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, a renovação, que é concedida por período igual ao da autorização inicial, pressupõe a manutenção, na pessoa do interessado, dos pressupostos que fundamentaram o deferimento do pedido inicial.
zz. Conforme a proposta n.º 01700/GJFR/2014/02R, indicou-se que “por registo de 30 de Agosto de 2011, o requerente constituiu uma hipoteca a favor do Banco Tai Fung sobre a propriedade que fundamentou a concessão da autorização, no valor de HKD$1.203.000,00, equivalente a MOP$1.239.090,00, em seguida, constituiu outra hipoteca a favor do mesmo Banco sobre a propriedade supracitada em 20 de Fevereiro de 2014, no valor de HKD$2.000.000,00, equivalente a MOP$2.060.000,00, fazendo com que o valor de investimento do requerente não satisfaça as disposições legais e daí extinguiu-se a situação jurídica que fundamentou a autorização original.”;
aaa. De facto, o recorrente, no momento da compra da propriedade supracitada no ano 2007, já pagou totalmente o preço desta propriedade, no valor de MOP$2.468.028,00.
bbb. É de notar que com o desenvolvimento de mercado imobiliário de Macau ao longo dos últimos anos, o valor da mairoira de imóveis já se multiplicou;
ccc. E o valor de mercado actual da propriedade em causa já, pelo menos, se triplicou em relação ao valor inicial, sendo aproximadamente MOP$6.000.000,00 (vide doc. n.º 3 a juntar posteriormente).
ddd. Supomos que o valor actual da propriedade subtraiu o valor do preço no momento da compra, sendo de MOP$3.531.972,00;
eee. Portanto, o Banco concedeu empréstimo ao recorrente também por causa da valorização da propriedade em causa.
fff. Aqui, é necessário distinguir o valor inicial da compra da propriedade já pago (MOP$2.468.028,00) e o valor de empréstimo (MOP$2.060.000,00), o último traduz-se num resultado de investimento do recorrente sobre a propriedade supracitada;
ggg. Concluímos assim o suposto valor de venda desta propriedade, isto é, a diferença entre o valor de marcado actual desta propriedade e o valor de dois empréstimos, sendo de MOP$2.700.910,00 (MOP$6.000.000,00 – MOP$1.239.090,00 – MOP$2.060.000,00).
hhh. O valor supracitado não é incompatível completamente com o inicial valor de investimento que fundamentou o requerimento da residência temporária;
iii. Também satisfaz os pressupostos da renovação previstos no art.º 19.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005.
jjj. Portanto, não existe a extinção da situação jurídica invocada na proposta supracitada.
kkk. 63. Nem sucedeu a alteração da situação jurídica, uma vez que o recorrente era sempre proprietário do imóvel em causa,
lll. E o recorrente, depois de ter conhecimento da notificação da realização do processo de audiência, já liquidou os respectivos empréstimos para evitar problemas eventuais (vide doc. n.º 4).
mmm. Face ao exposto, o teor do despacho que serve do objecto do presente recurso não preenche os dispostos nos art.ºs 18.º e 19.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, devendo ser anulado.

  Face ao exposto, solicita-se aos MM.ºs Juízes que admitem o presente recurso contencioso, e:
(1) O acto administrativo que serve o objecto do presente recurso violou o princípio da boa fé previsto no art.º 8.º do Código do Procedimento Administrativo, devendo ser anulado nos termos do art.º 124.º do mesmo Código,
Subsidiariamente,
(2) O acto administrativo que serve o objecto do presente recurso não preenche os dispostos nos art.ºs 18.º e 19.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, devendo ser anulado nos termos do art.º 124.º do Código do Procedimento Administrativo.


2. O Exmo Senhor Secretário para a Economia e Finanças contesta, dizendo:

   I. Excepção
   3. O presente recurso contencioso é extemporâneo, uma vez que:
   4. Conforme o aviso de recepção da carta registada da Direcção dos Serviços de Correios, constante do Processo Administrativo, os recorrentes receberam a notificação do despacho recorrido em 8 de Abril de 2015.
   5. Os recorrentes são considerados notificados do despacho, desde que a notificação tenha sido remetida ao âmbito em que os recorrentes possam conhecer e receber a notificação, mesmo que não seja recebida pessoalmente pelos mesmos. Isto é jurisprudencialmente indiscutível (art.º 201º do Código de Processo Civil).
   6. Face ao facto de que a notificação do despacho recorrido foi dirigida, através da carta registada com aviso de recepção, para o endereço fornecido pelos recorrentes ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau, e foi devidamente recebida, averigua-se que a notificação foi remetida ao âmbito em que os recorrentes podiam conhecer e receber a notificação, sendo a mesma considerada válida.
   7. Independentemente de o receptor ser ou não os próprios recorrentes, foi considerada remetida a notificação do despacho recorrido aos recorrentes em 8 de Abril de 2015 (vide acórdão do Recurso contencioso n.º 792/2012 do TSI).
   8. Os recorrentes só interpuseram o presente recurso contencioso em 20 de Julho de 2015 para o TSI contra o despacho recorrido, ultrapassando manifestamente o prazo para interposição de recurso contencioso permitido pelo art.º 25º do Código de Processo Administrativo Contencioso, devendo o ora recurso ser indeferido liminarmente, por ser extemporâneo.
   
   II. Violação do princípio da boa fé
   9. Os recorrentes apontaram que o despacho recorrido violou o princípio da boa fé, por entender que o IPIM não lhes tinha explicado que a constituição de hipoteca sobre o bem imóvel investido seria alteração da situação jurídica.
   10. Obviamente, os recorrentes não têm razão nenhuma.
   11. O IPIM advertiu, por meio de exemplos, os recorrentes da necessidade de cumprimento dos deveres previstos na lei, não constituindo, em qualquer situação, nenhuma promessa feita aos recorrentes, nem fazendo com que os recorrentes tenham confiança na Administração, no sentido de acreditar que a autoridade administrativa não considere como alteração da situação jurídica a hipoteca que está fora do âmbito permitido por lei.
   12. Não se verifica, de forma nenhuma, a violação do princípio da boa fé.
   
   III. Violação dos artigos 18º e 19º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005
   13. Os recorrentes necessitam de manter a posse do bem imóvel, livre de qualquer encargo, de valor não inferior a um milhão de patacas, durante o período de residência temporária autorizada.
   14. Todavia, após a constituição de duas hipotecas sobre o bem imóvel dos recorrentes, o valor deste torna-se desadequado ao disposto na alínea 1) do n.º 1 do art.º 3º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, suscitando alteração da situação jurídica relevante.
   15. O despacho recorrido cancelou a autorização de residência concedida aos próprios recorrentes e ao seu agregado familiar, por ausência da notificação da alteração da situação jurídica feita pelos recorrentes. Portanto, não se vê como é que se violaram os artigos 18º e 19º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005.
   16. Assinalaram os recorrentes que o valor do bem imóvel subiu, pelo que o valor deste ainda é compatível com o valor de investimento exigido por lei, mesmo que tenha sido constituída hipoteca sobre o bem imóvel.
   17. Não se conforma com a opinião dos recorrentes, já que é de saber que a fixação de residência por investimento tem como objectivo atrair capitais estrangeiros para desenvolverem a economia de Macau, portanto, o valor de investimento deve ser calculado com base no preço de aquisição do bem imóvel e não no valor posterior à aquisição.
   
   
   Conclusão
   1. O presente recurso contencioso deve ser indeferido liminarmente, por ser extemporâneo.
   2. São improcedentes os vícios de violação do princípio da boa fé e de violação dos artigos 18º e 19º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 pelo despacho recorrido, invocados pelos recorrentes.


    3. A, B, C e D, ora recorrentes nos autos supra referenciados, melhor identificados nos autos, dado que foram notificados do teor de fls. 274 dos autos, veio alegar o seguinte:
    
1. Segundo consta da contestação apresentada pela entidade recorrida, em 8/4/2015, através da carta registada dos Serviços de Correios, os recorrentes foram notificados do acto administrativo recorrido;
2. O endereço do destinatário pertence ao local onde podem os recorrentes saber e receber notificações;
3. Tendo a entidade recorrida entendido que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Segunda Instância, a respectiva notificação é válida e pelo que o recurso contencioso em causa é um recurso interposto intempestivamente, devendo ser rejeitado.
4. Salvo o devido respeito, os recorrentes não estão de acordo com o supracitado entendimento.
5. Embora o Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento, em 24/3/2015, tenha enviado o acto administrativo dos autos, ao endereço de contacto do 1º recorrente, sito em Macau, na Rua de Xangai, XXX;
6. A respectiva carta foi recebida, em 8/4/2015, pelo representante de uma agência de turismo e viagem denominada “XX Travel Limited”;
7. Mas essa companhia nunca entrega aos recorrentes a carta por si recebida:
8. Na contestação, a entidade recorrida invocou os fundamentos expostos no acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância no processo n.º792/2012 que considerou:
9. Basta mandar a decisão dum acto administrativo ao endereço de contacto do recorrente, considerando-se legal a respectiva notificação, embora tenha sido recebida por terceira pessoa;
10. Contudo, é de salientar que o supracitado endereço de contacto não é um local onde podem os recorrente saber e receber notificações;
11. Para além do 4º recorrente que reside em Macau, os 1º a 3º recorrentes residem no Interior da China por causa de trabalho e estudos.
12. O endereço de residência do 4º recorrente também não é o endereço indicado no ponto 5, mas sim o endereço da universidade onde ele frequentou na altura;
13. O endereço não é local onde podem os recorrentes saber e receber notificações.
14. Além do mais, todos os recorrentes nunca incumbiram tal agência de turismo e viagem denominada “XX Travel Ltd.” e/ou quaisquer empregados desta de tratar assunto relativo à fixação de residência dos recorrentes através de investimento.
15. Também não existe nos autos procuração assinada por qualquer um dos recorrentes que conferisse poderes à supracitada agência de viagem para, em representação deles, receber qualquer carta.
16. Além disso, o supracitado entendimento do acórdão também não é aplicável ao presente caso, dado que, segundo os requisitos do respectivo processo, foi suposta a recepção de notificação do acto administrativo por um representante com poderes.
17. Contudo, para além do referido endereço não pertencer ao local onde podem os recorrentes saber e receber notificações, a respectiva agência de viagem também não dispõe de qualquer poder conferido pelos recorrentes para, em nome deles, receber qualquer carta;
18. Pelo que tal situação indicada no acórdão invocada pela entidade recorrida totalmente não é aplicável aos presentes autos.
19. Nos termos das jurisprudências em vigor, embora o vício na notificação não constitua a nulidade de acto administrativo, não produz o devido efeito do acto administrativo.
20. Os recorrentes só tomaram conhecimento do teor do acto administrativo, após o mandatário por si constituído ter recebido a certidão do despacho indicado no objecto do recurso.
21. Mas a certidão só foi emitida até 28/5/2015;
22. Pelo que o prazo para interposição do recurso contencioso deve ser calculado desde 28/5/2015.
23. Segundo o despacho, nele foi indicado expressamente que é de 30 dias, o prazo para interposição de recurso contencioso para o Tribunal de Segundas Instância.
24. Assim, o presente recurso contencioso reúne o disposto no art.º 25.º, n.º2, al. a) do Código do Processo Administrativo Contencioso, por ter sido interposto dentro do prazo legal.
25. Pelo acima exposto, dado que o recurso em causa foi interposto tempestivamente e todos os recorrentes têm legitimidade, pede-se a V. Exas que admitam o presente recurso contencioso, ordenando prosseguimento da acção até seus ulteriores termos.

    4. O Digno Magistrado do MP emite o seguinte douto parecer:
    Na sua contestação, a fls. 254 e seguintes, suscitou a autoridade recorrida a questão da extemporaneidade do recurso. Nesse sentido alega que a notificação do acto impugnado se tem por efectuada em 8 de Abril de 2015, pelo que, quando o recurso foi interposto, havia já decorrido o prazo de caducidade do direito de recurso. Contrapõem os recorrentes que a notificação recepcionada em 8 de Abril de 2015 foi enviada para local onde não residem e que esse endereço não é adequado para receber notificações, acrescentando ainda que a agência aí instalada, XX Travel Limited, nunca entrega aos recorrentes a carta por si recebida.
    Vejamos.
    Em 13 de Março de 2013, o recorrente e interessado A, na qualidade de adquirente de bens imóveis e inerente titular da possibilidade de requerer, para si e familiares, a fixação de residência em Macau, forneceu ao IPIM, para além da sua residência em Shenzhen, uma morada, em Macau, destinada a servir de endereço para recepcionar a correspondência que houvesse de ser-lhe enviada pelo IPIM - fls. 153 do processo instrutor.
    A notificação do acto administrativo de que ora vem interposto recurso foi efectuada, mediante carta registada com aviso de recepção, para esta morada de Macau (Rua de Xangai, XXX).
    Dizem os recorrentes que este endereço não se destinava a receber notificações, Mas se assim fosse, não se alcançaria a razão por que haveria de ter sido fornecido ao IPIM precisamente como endereço para correspondência: Ora, não estipulando o Código do Procedimento Administrativo o local onde devem ser efectuadas as notificações, parece que nada impede, antes tudo aconselha, que, sendo feitas por correio (carta/ofício - artigo 72.° do Código do Procedimento Administrativo), sejam enviadas para a morada que a própria parte interessada indicou e elegeu como aquela para onde queria que lhe fosse remetida a correspondência. Foi o que sucedeu, estando demonstrado que a carta foi recebida em 8 de Abril de 2015 - cf. fls. 11 e seguintes do instrutor - o que os recorrentes não põem em causa.
    Aliás, esta é a forma que melhor se harmoniza com a regra das notificações às partes em processo civil. Como não havia (ainda) mandatário constituído no procedimento administrativo em causa, a notificação foi enviada para o domicílio indicado pela parte para o efeito, como prescrito no artigo 202,° do Código de Processo Civil.
    Não se afigura, pois, que aquela notificação padeça de anomalia que importe a sua invalidade.
    Tendo a notificação ocorrido em 8 de Abril de 2015, vejamos se o recurso é tempestivo.
    Os recorrentes residem em Shenzen, pelo que, nos termos do artigo 25.° do Código de Processo Administrativo Contencioso, e dado que está em causa acto anulável, é de 60 dias o prazo para interposição de recurso, cuja contagem é feita de acordo com o Código do Procedimento Administrativo - cf. artigo 25.º, n.º 3, do Código de Processo Administrativo Contencioso. Esses 60 dias, contados nos termos do artigo 74.° do Código do Procedimento Administrativo, terminaram em 8 de Junho de 2015. Como se apura através do carimbo aposto na primitiva petição, o recurso deu entrada em juízo em 26 de Junho de 2015, portanto já fora do prazo de caducidade.
    A caducidade do direito de recurso obsta ao prosseguimento deste e conduz à sua rejeição - artigo 46.°, n.º 2, alínea h), do Código de Processo Administrativo Contencioso.
    Procede, assim, a nosso ver, a invocada caducidade, pelo que o recurso deve ser rejeitado.
    
    4. Foram colhidos os vistos legais.
    
III - FACTOS
Com pertinência, têm-se por assentes os factos seguintes:

O 1º recorrente foi autorizado a fixar residência temporária em Macau pela primeira vez em 4 de Maio de 2007;
Para os efeitos de aquisição de residência em Macau, o 1º recorrente comprou a fracção sita na Rua de Nam Keng, XXX, Taipa, (adiante designada por “propriedade”);
O 1º recorrente comprou a aludida propriedade pelo preço de MOP$2.468,028,00 e tinha um depósito a prazo num valor não inferior a MOP$500.000,00 na Sucursal de Macau do Banco da China.
O pedido do 1º recorrente foi extensivo aos seus agregados familiares, incluindo a cônjuge (2ª recorrente) e os dois filhos, C (3ª recorrente) e D (4º recorrente).
Os recorrentes obtiveram o BIRNPM em 4 de Maio de 2008.
Os recorrentes pediram a renovação da autorização de residência temporária ao IPIM em 15 de Junho de 2010 e 22 de Julho de 2013 respectivamente e foram autorizados a renovar, e no último pedido de renovação, a autorização de residência temporária do 1º recorrente, A, será renovada até 18 de Junho de 2016 e a da 2ª recorrente e da 3ª recorrente até 14 de Junho de 2016, enquanto a do 4º recorrente foi renovada até 8 de Janeiro de 2015.
nnn. Portanto, o 1º recorrente, para que o 4º recorrente possa continuar a ser autorizado a residir temporariamente em Macau, pediu a renovação ao IPIM em 28 de Outubro de 2014 a favor do seu agregado familiar, D.
No entanto, o IPIM, perante a solicitação da renovação apresentada pelo 1º recorrente a favor do 4º recorrente, indicou que o 1º recorrente tinha constituído a favor do Banco Tai Fung uma hipoteca sobre a propriedade supracitada em 30 de Agosto de 2011 e em 20 de Fevereiro de 2014.
E considerou que o facto de constituição da hipoteca do 1º recorrente sobre a propriedade supracitada era juridicamente relevante, pelo que o 1º recorrente violou o disposto no art.º 18 do Regulamento Administrativo 3/2005, cancelando assim a autorização de residência temporária dos recorrentes e realizando a audiência.
Segundo a proposta do IPIM n.º 01700/GJFR/2014/02R, “por registo de 30 de Agosto de 2011, o requerente constituiu uma hipoteca a favor do Banco Tai Fung sobre a propriedade que fundamentou a concessão da autorização, no valor de HKD$1.203.000,00, equivalente a MOP$1.239.090,00, em seguida, constituiu outra hipoteca a favor do mesmo Banco sobre a propriedade supracitada em 20 de Fevereiro de 2014, no valor de HKD$2.000.000,00, equivalente a MOP$2.060.000,00, fazendo com que o valor de investimento do requerente não satisfaça as disposições legais e daí extinguiu-se a situação jurídica que fundamentou a autorização original.”;
E indicou no ponto 3 da proposta supracitada que o recorrente violou a obrigação de comunicação previsto no art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, pelo que se sugeriu o cancelamento da autorização de residência temporária do recorrente e dos seus agregados familiares.
Na proposta supracitada, o IPIM entende que o acto de constituição da hipoteca sobre a propriedade em causa pode levar à extinção da situação jurídica que fundamentou a autorização de residência temporária, assim, o recorrente tem a obrigação de comunicação.
O IPIM indicou, através dos ofícios n.º 09259/GFJR/2008 de 26 de Maio de 2008, 10420/GFJR/2010 29 de Junho de 2010 e 07858/GFJR/2013 de 29 de Julho de 2013, ter notificado o requerente que “deve manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.”
De facto, todos os três ofícios supracitados especificaram as situações juridicamente relevantes tais como divórcio, sucessão e venda da propriedade, etc..
O 1º recorrente constituiu a hipoteca sobre a propriedade em 30 de Agosto de 2011, mas quando este requereu a renovação no ano 2013.
O presente recurso contencioso tem como objecto o despacho do Secretário para a Economia e Finanças de 28 de Fevereiro de 2015 que confirmou a proposta n.º 01700/GJFR/2014/02R emitida pelo IPIM em 9 de Fevereiro de 2015, na qual declarou cancelada a respectiva autorização de residência temporária do recorrentes e dos seus agregados familiares.
Os recorrentes receberam em 28 de Maio de 2015, através do seu mandatário judicial, o despacho do Secretário para a Economia e Finanças de 28 de Fevereiro de 2015 que fundamentou o presente recurso;
Em 24 de Março de 2015 o despacho recorrido foi enviado para o domicílio de correspondência do 1º recorrente - Macau, Rua de Xangai, XXX, endereço esse fornecido pelos prórios interessados para aqui serem notificados
Eem 8 de Abril de 2015, o despacho foi recebido e assinado por um representante da XX Tourism and Travel Agency Ltd.

O recurso deu entrada em juízo em 26 de Junho de 2015.

    IV - FUNDAMENTOS

1. Vem suscitada a questão da caducidade de interposição de recurso por expirado o prazo para esse exercício impugnatório.
2. Na verdade, o presente recurso contencioso é extemporâneo

Nos termos do aviso de recepção da carta registada pelos Correios, constante do Processo Administrativo, os recorrentes receberam a notificação do despacho recorrido em 8 de Abril de 2015.
O recurso deu entrada em 26 de Junho de 2015.
A notificação foi remetida para a morada que foi fornecida pelos próprios interessados e não se comprova que tenha sido extraviada ou deixado de ser recebida.
Não há razões para descrer que os recorrentes podiam conhecer e receber a notificação, sendo a mesma considerada válida.
Os recorrentes só interpuseram o presente recurso contencioso em 26 de Junho de 2015 para o TSI contra o despacho recorrido, ultrapassando manifestamente o prazo para interposição de recurso contencioso permitido pelo art.º 25º do Código de Processo Administrativo Contencioso, devendo o ora recurso ser indeferido liminarmente, por ser extemporâneo, mesmo considerando o prazo de 60 dias para os casos de notificação no Exterior (cfr. art. 25.º do CPA).
3. A notificação respeitou as formalidades do art. 201º, 202º do CPC e 72º do CPA.
Dizem os recorrentes que a notificação do acto não continha todos os elementos que lhes permitissem saber das razões do cancelamento da autorização e residência temporária. Mas não têm razão, pois facilmente se alcança do PA – fls. 23 e segs - que com a carta que foi enviada se juntava o expediente documental donde constavam os pareceres e informações em que se louvou a decisão proferida.

4. Quanto ao envio da carta para a morada fornecida e eventual desconhecimento do seu envio e conteúdo, importa reter que já se decidiu pela regularidade e validade dessa notificação como se decidiu e sumariou no Proc. 792/2012, deste Tribunal:
“I - A notificação de um acto desfavorável tem natureza receptícia, individual e pessoal.

II - A notificação por via postal sob registo respeita os cânones da comunicação pessoal e o direito que o destinatário tem de receber o acto na sua esfera de perceptibilidade.

III - A notificação por carta registada com aviso de recepção, comum nos procedimentos administrativos, considera-se perfeita desde que dirigida ao domicílio real do destinatário, ainda que o aviso não tenha sido assinado por este, e dá-se por consumada no dia em que foi assinado o aviso de recepção, mesmo que por pessoa diversa do notificando.

IV - Deve, por maioria de razão, dar-se por realizada a notificação se o AR foi assinado por terceira pessoa com prévia autorização dada pelo notificando para o efeito, salvo nos casos de impossibilidade absoluta referente à pessoa do representante.

V - O prazo de interposição de recurso contencioso tem natureza substantivo, pelo que corre continuamente.

VI - Verifica-se a caducidade do direito de recorrer se, verificada a notificação nos termos referidos, a petição de recurso deu entrada no tribunal fora do prazo do art. 25º do CPAC.”
Também no Ac. do TSI, de 27/3/2013, Proc. 808/2012, se considerou, ainda que citação no Exterior, mas por maioria de razão:
“(…) Pese embora tenha sido efectuada em pessoa diversa do citando, estando aquela encarregue de lhe transmitir o conteúdo do acto, terá de considerar-se regular tal citação e, presumir-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento, nos termos das regras gerais dos artigos 180.°, n.º 4 e 184.° ambos do Código de Processo Civil.
3. A presunção estabelecida pela lei de que a carta para citação entregue a um terceiro chegou, oportunamente, ao conhecimento do destinatário, é ilidível, isto é pode ser afastada por prova em contrário, incumbindo, no entanto, tal prova ao interessado, que para além de ter de demonstrar que não chegou a ter conhecimento do acto, deve comprovar igualmente que tal aconteceu por facto que não lhe seja imputável.
4. O valor a preservar na citação do réu traduz-se no conhecimento da acção, da atitude a tomar em termos de defesa e inteiramento do prazo e demais condições em que o deve fazer. As formalidades da citação visam aquele conhecimento, mas a lei não diz, nem pode dizer com rigor que o réu só está citado quando tome conhecimento do objecto de tal acto. O conhecimento é um facto do foro íntimo, um facto do foro intelectual, da representação racional de um dado objecto.

5. As regras da citação visam o cumprimento de diversas formalidades tendentes a propiciar um dado conhecimento. E este há-de retirar-se de um conjunto de regras da experiência comum, de presunções quase naturais, de uma prática procedimental que incumbe ao Tribunal exercer e comprovar. Mas, como se disse, isso não basta. O destinatário não está eximido de comprovar que algo de anormal contrariou aqueles procedimentos conducentes a um dado resultado: o conhecimento.
Mal andariam as coisas se o citando se limitasse a invocar o mero desconhecimento.
6. A identificação do terceiro que levanta a carta e a obrigação de o distribuidor do correio lhe dizer que a deve entregar prontamente só são formalidades essenciais quando se revele que o são em vista dos fins para que foram estabelecidas. De outro modo degradam-se em meras irregularidades anódinas, como é o caso, de a identificação do terceiro não se mostrar já essencial a partir do momento em que ele está identificado, como não se mostra já essencial a indicação da entrega pronta se o destinatário incumbe esse terceiro de levantar a carta e que lhe deve entregar a correspondência num dado local sob pena de esvaziar de sentido a razão de ser da própria norma.”

Mantém-se válida esta interpretação.
No nosso caso, diz-se apenas que a referida agência não lhe fez entrega da carta, mas o alegado desconhecimento do seu conteúdo tem de ser justificado por uma razão que iniba o regular funcionamento do mecanismo criado pelo próprio interessado para ser notificado. Não se pode admitir, por um lado, que escolha ser notificado por uma via e através de uma determinada morada e depois vir dizer, sem uma razão justificativa, anormal, imprevista, de força maior, desconsiderar o meio de notificação que ele próprio escolheu.
O interessado ao escolher ser notificado numa determinada morada e através de terceiro tem de assumir os riscos inerentes a essa opção, bem podendo não o fazer. Se o faz tem de criar os mecanismos internos para que tome conhecimento das notificações que lhe forem enviadas.
    Na verdade, se o interessado, na manutenção da seu estatuto de residente por investimento, opta por indicar no seu relacionamento com o IPIM uma morada de terceira pessoa, - no caso uma determinada agência -, tem o ónus de assegurar que as notificações que para aí sejam enviadas cheguem ao seu conhecimento, salvaguardando uma razão excepcional e inesperada, fora do normal, não podendo alegar que o terceiro que recebeu a carta não lha entregou.
Nesta conformidade, somos a sufragar o entendimento vertido na douta sentença recorrida e reforçado pelo entendimento vertido pelo Digno Magistrado do MP nos presentes autos.
    
V - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em julgar procedente a excepção de caducidade do direito ao recurso, o que obsta ao seu conhecimento.
    Custas pelos recorrentes, com 8 UC de taxa de justiça
                Macau, 7 de Julho de 2016
                João A. G. Gil de Oliveira
                Ho Wai Neng
                José Cândido de Pinho
                
                Fui presente
                Mai Man Ieng
               
618/2015 26/26