Processo nº 288/2015
Data do Acórdão: 14JUL2016
Assuntos:
Interdição de entrada na RAEM
Falta de fundamentação
Desistência de queixa
Extinção do procedimento criminal
Fortes indícios
SUMÁRIO
1. O acto administrativo considera-se fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal – o bonus pater familiae de que fala o artº 480º/2 do Código Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de reacção, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual.
2. A extinção do procedimento penal por desistência de queixa nunca formou caso julgado sobre a inocência do arguido, portanto nada impede a Administração de retirar dos elementos constantes do respectivo processo penal as consequências jurídicas para efeitos de avaliação da perigosidade do arguido a fim de tomar medidas necessárias à defesa da segurança pública da RAEM.
O relator
Lai Kin Hong
Processo nº 288/2015
I
Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM
A, devidamente identificado nos autos, vem recorrer do despacho do Senhor Secretário para a Segurança que lhe manteve a interdição de entrada por 3 anos, já anteriormente decretada.
Inconformado, A veio interpor presente recurso contencioso desse despacho, tendo para o efeito apresentado as seguintes conclusões e formulado os seguintes pedidos:
1. 本司法上訴上訴標的為保安司司長於2015年01月30日作出駁回司法上訴人之訴願之批示),表示決定繼續維持對司法上訴人實施禁止進入澳門特區之行政措施。
2. 被上訴之批示對司法上訴人採取了禁止入境3年的防範性措施,無疑是限制或損害了司法上訴人的自由入境的權利。
3. 禁止司法上訴人入境3年的行政措施,行政當局無疑是負有說明理由的義務。
4. 說明理由要件應以明示方式,且應扼要闡述有關決定之事實依據及法律依據。
5. 被上訴之批示,我們無法看到行政當局的行政行為符合《行政程序法典》第70條, 114條及115條的要件規定。
6. 亦即是,行政當局沒有說明以那一條具體的法律規定作為對司法上訴人採取禁止入境的依據。
7. 說明理由義務,它是利害關係人了解行政行為事實與法律依據的唯一途徑。行政行為的主要特徵之一在於它是單方行為,行政機關作出行政行為時並不需要取得相對人的同意,因此也決定了行政管理相對人並不了解行政機關作出決定時的依據,尤其不了解其法律依據。
8. 依據被上訴之批示之內容,該批示僅有闡述有關決定之事實依據(即司法上訴人被刑事警察當局及司法當局認定觸犯恐嚇罪),以及對該行政行為可提起司法上訴的提醒,但根本沒有任何決定之法律依據。
9. 根據同一法典第124條及125條的規定,上述行政行為之瑕疵為可撤銷。
10. 因此,司法上訴人認為被上訴之批示沾有違反形式規定的瑕疵,被上訴之批示應予撤銷。
11. 另一方面,被上訴之批示認為司法上訴人是基於有強烈跡象顯示訴願人作出了《刑法典》第147條1款的規定及處罰的恐嚇罪,對公共治安構成威脅,而且司法上訴人有關行為已被檢察院提起控訴,表明跡象是足夠強烈的,刑事程序的消滅只因司法上訴人撤銷告訴所致。
12. 換言之,行政當局是次對司法上訴人作出禁止入境的決定是因為司法上訴人有強烈的犯罪跡象,而非取決於刑事程序的結果。
13. 於本案中,行政當局所作出的行政決定是建基於司法上訴人的行為被檢察院提起控訴,換言之,行政行為的決定的事實依據源自檢察院控訴的事實依據。
14. 對於刑事警察機關或司法當局來說,對犯罪行為是否展開偵查或提起控訴,主要因素為是否有足夠的強烈跡象顯示有犯罪發生,相對於法院來說,是否構成犯罪,則必須綜合行為人主觀及客觀的因素而決定的,為此必須透過審判聽證,去判斷犯罪行為要件是否成立。
15. 《刑法典》中所保護的除了包含私人的利益之外,其更著重於社會的公共利益,因為刑法典中的犯罪是或多或少會影響社會秩序,影響到社會的安寧。
16. 根據《刑法典》第108條第2款的規定:如嫌犯不反對告訴之撤回,告訴人得在第一審之判決公布前將之撤回,而撤回後不得再行告訴。
17. 第一點,法律對於被害人告訴權的撤回的產生了一個確定的效果:被害人的告訴權不得再行使。
18. 第二點,被害人告訴權的撤回須征得有關嫌犯的同意,因為可能出現的情況是,有關的嫌犯是希望從法院中得到公正的裁決,因而反對被害人撤回告訴權。
19. 第三點,即使嫌犯不反對,對於被害人告訴權的撤回亦必須得到檢察院或法院的認可,因為這種認可所產生的效果為刑事訴訟程序消滅,亦即檢察院或法院的認可是合法地導致刑事訴訟程序清滅的方式之一,並隨後,裁判轉為確定後,任何有關的訴訟主體不得針對該裁判提起平常上訴。
20. 參照民事訴訟法典訴之撤回及請求之捨棄的規定,訴之撤回是使當事人已提起之訴訟程序終結,而請求之捨棄是使當事人欲行使之權利消滅。
21. 在刑法中,告訴權是一種被害人以刑法保護自己利益的權利,一旦告訴權已撤回,針對同一案件,被害人便會永久失去請求刑法保護的權利,因為告訴權已不得再行使。
22. 告訴權這種權利,與民事訴訟法中請求之捨棄的效果是相同的,它們都是使權利人的請求保護的權利消滅。
23. 此外,引用民事訴訟法典中由法官認可的制度,認可的裁判亦可產生判決的效力。
24. 被害人告訴權的撤回並非單純的導致檢察院在刑事程序中缺乏正當性,相反是被害人尋求刑法保護的權利消滅,而且法院的認可等同作出了一個判決;
25. 既然我們不可能得出一個有罪判決,但我們也不能否認這個判決卻產生了與無罪判決相同的效果(因為該判決確定後,已不能從提起平常上訴或再次就相同事實提起訴訟程序,而且行為人不會被制裁)。
26. 司法上訴人認為行政當局仍以司法上訴人被檢察院控訴的事實行為作為依據,禁止司法上訴人入境是無道理的,因為被害人尋求刑法救濟的權利亦已經消滅,且有關的裁判是已確定的,故此,司法上訴人對有關的行為是不會受到任何的制裁。
27. 概括來說,一般存在下列情況:
第一種情況:行政當局可基於利害關係人的行為,即使處於偵查階段又或待審判階段,行政當局亦可對利害關係人採取禁止入境的措施,目的是預防利害關係人對公共秩序構成危險;
第二種情況:行政當局可基於利害關係人的行為已被判處有罪判決的情況下,對利害關係人採取禁止入境的措施,目的不是預防,而是利害關係人確實構成危險而採取守護。
28. 第三種情況:行政當局以檢察院控訴的事實行為作為依據時,行政當局不可就利害關係人的行為已被開釋的情況下,決定或維持對利害關係人採取禁止入境的措施。
29. 司法上訴人既不是第一種情況,也不是第二種情況,但我們認為司法上訴人與第三種情況是相似的。
30. 利害關係人可依據無罪的確定判決使行政當局的禁止入境行為不再其正當性/合法性,相同地,既然在法律上,司法上訴人不會就同一的事實行為受任何法律制裁或控訴。
31. 行政當局繼續以司法上訴人不可制裁及不可控訴的事實行為作為禁止入境決定的事實依據顯然是不存在任何公共利益的追求。
32. 即使司法見解認為作為預防措施,並非必然取決於作出不法事實,只要存在犯罪的強烈跡象便可,我們也不能忽略,當有關的事實行為不可再被制裁時,以存在實施犯罪的強烈跡象作為禁止入境決定的依據顯然是不再適用,因為司法上訴人的事實行為變得不可制裁及不可追訴,就不具有犯罪行為的特性,又如何繼續說司法上訴人存有犯罪的強烈跡象?
33. 因此,司法上訴人認為被上訴之批示的事實依據與有關刑事裁判 (CR3-14-0276-PCS)的結果相抵觸,違反了《行政程序法典》第122條第2款h)項的規定,應宣告無效。
34. 綜上所述,上訴人認為被上訴之批示欠缺說明行政行為之法律依據,違反《行政程序法典》第115條說明理由的規定及第70條的規定,違反行政行為通知的法定形式規定,應予撤銷;以及被上訴之批示與刑事裁判(CR3-14-0276-PCS)的結果相抵觸,違反了《行政程序法典》第122條第2款h)項的規定,應宣告無效。
請求
基於上述的事實及法律規定,在此請求法官 閣下:
(1) 接納本司法上訴及全部附件;及
(2) 傳喚被司法上訴人以便答覆;及
(3) 宣告被上訴之批示沾有違反說明理由義務及通知法定形式的規定,故應撤銷被上訴之批示;
或
(4) 宣告被上訴之批示違反《行政程序法典》第122條第2款h)項的規定,故應宣告被上訴之批示無效,並撤銷被上訴之批示。
Citado, veio o Senhor Secretário para a Segurança contestar pugnando pela improcedência do recurso.
Não havendo lugar à produção de provas, foram o recorrente e a entidade recorrida notificados para apresentar alegações facultativas.
Só o recorrente apresentou as alegações facultativas, reiterando o já alegado na petição do recurso.
Em sede de vista final, o Dignº Magistrado do Ministério Público opinou no seu douto parecer pugnando pelo não provimento do presente recurso.
Colhidos os vistos, cumpre conhecer.
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo é o próprio e inexistem nulidades e questões prévias que obstam ao conhecimento do mérito do presente recurso.
Os sujeitos processuais gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade.
De acordo com os elementos existentes nos autos, é tida por assente a seguinte matéria de facto com relevância à decisão do presente recurso:
* O recorrente A, é residente nos E.U.A. e titular do passaporte dos E.U.A. e do salvo-conduto da RPC;
* Em 23MAIO2014, o Ministério Público deduziu acusação contra o recorrente, a quem imputou a prática, em 07N0V2013, no Casino Venetian, dos factos integrantes de um crime de ameaça;
* Notificada a acusação e remetidos os autos do respectivo inquérito ao TJB, os mesmos autos foram distribuídos ao 3º Juízo Criminal do mesmo tribunal e a acusação foi recebida pela Exmª Juiz do 3º Juízo Criminal, onde os autos foram registados e autuados como processo comum singular nº CR3-14-0276-PCS;
* Em 30OUT2014, por despacho ditado pela Exmª Juiz do 3º Juízo Criminal do TJB, para a acta da audiência de julgamento, realizada, no âmbito do processo comum singular nº CR3-14-0276-PCS, foi declarado extinto o procedimento criminal contra o ora recorrente por desistência da queixa por parte da ofendida, e ordenado o arquivamento dos autos;
* Em 05NOV2014, com base nos factos de que recorrente foi acusado pelo Ministério Público e na existência de perigo efectivo para a segurança ou ordem públicas da RAEM, o Senhor Secretário para a Segurança decretou contra o recorrente a interdição de entrada na RAEM por três anos, contados a partir de 16JUL2014;
* Notificado desse despacho por ofício datado de 01DEZ2014 (cf. fls. 16, 17 dos autos de procedimento administrativo), o recorrente não reagiu;
* Mediante requerimento datado de 03DEZ2014, o recorrente pediu ao Senhor Comandante da PSP a revogação do despacho que lhe decretou a interdição de entrada com fundamento no arquivamento dos autos do processo penal;
* Em resposta ao pedido, o Senhor Secretário proferiu o seguinte despacho:
事項:必要訴願
利害關係人:A
利害關係人針對治安警察局局長禁止其入境為期三年的決定提出訴願。
被訴願的行為是基於有強烈跡象顯示訴願人作出了《刑法典》第147條1款規定及處罰的恐嚇罪,對公共治安構成威脅。利害關係人被檢察院提起控訴的事實,表明訴願人作出該犯罪行為的跡象是足夠強烈的,而有關刑事訴訟程序只是因被害人撤銷告訴導致檢察院缺乏正當性而被宣告消滅。
因此,同意治安警察局局長於2015年1月21日報告書所作之分析,並根據《行政程序法典》第161條1款規定,決定維持治安警察局局長所作之禁止入境批示。
保安司司長
XXX
二零一五年一月三十日
* Inconformado com o despacho, o recorrente interpôs o presente recurso contencioso mediante o requerimento que deu entrada na Secretaria do TSI em 25MAR2015.
Antes de mais, é de salientar a doutrina do saudoso PROFESSOR JOSÉ ALBERTO DOS REIS de que “quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (in CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO, Volume V – Artigos 658.º a 720.º (Reimpressão), Coimbra Editora, 1984, pág. 143).
Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, ex vi do artº 1º do CPAC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.
No caso sub judice, para nós algo esquisito, antes de elencar as questões que constituem o objecto da nossa apreciação, temos de identificar o acto recorrido.
Ora, de acordo com o texto do próprio acto recorrido, a decisão recorrida trata-se de um despacho do Secretário para a Segurança que, em sede do recurso hierárquico necessário, manteve a interdição decretada pelo Comandante da PSP.
Certamente por lapso manifesto, não foi isso aconteceu.
Pois, conforme se vê nos autos do procedimento administrativo e na matéria de facto tida por assente, a decisão recorrida é o despacho proferido em 30JAN2015 pelo Secretário para a Segurança em resposta a um requerimento formulado pelo recorrente pedindo a revogação da interdição de entrada na RAEM já decretada 05NOV2014 pela mesma entidade, com fundamento num elemento de conhecimento superveniente que é a comprovada extinção do procedimento criminal dos factos que se serviram de fundamento para o decretamento da interdição de entrada.
Portanto, com alguns esforços, correctivos, podemos identificar o acto recorrido como o despacho do Secretário para a Segurança de 30JAN2015 que manteve a interdição de entrada na RAEM já decretada em 05NOV2014.
Então avancemos.
Em face das conclusões na petição do recurso, o recorrente está a assacar ao acto recorrido os seguintes vícios que constituem o objecto da nossa apreciação:
1. Da falta de fundamentação;
2. Da violação do caso julgado.
Então vejamos.
1. Da falta de fundamentação
Para o recorrente, ao decretar a interdição de entrada na RAEM, que é indubitavelmente uma medida limitativa de liberdade, a Administração tem de fundamentar de facto e de direito.
Todavia, in casu, a Administração se limitou a fundamentar de facto, sem que tivesse fundamentado de direito, pois nenhuma referência foi a qualquer norma à luz da qual foi decretada a interdição.
Portanto, o recorrente entende que o acto recorrido padece do vício de falta de fundamentação.
Como se sabe, o acto administrativo considera-se fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal – o bonus pater familiae de que fala o artº 480º/2 do Código Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de reacção, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual.
Tal como enfatizámos supra, o acto recorrido é um despacho em resposta a um requerimento pedindo a revogação da interdição de entrada na RAEM, já decretada e notificada ao recorrente que não reagiu.
Seria farisaico se o recorrente, notificado de ambos os actos, isto é, o acto que decretou a interdição e o acto ora recorrido que se limitou a manter a interdição, dissesse que não sabia à luz de quê norma foi decretada a interdição.
Pois conforme se vê a fls. 21 dos autos do procedimento administrativo, o despacho do Secretário para a Segurança, datado de 05NOV2014 que decreta a interdição de entrada, consiste na declaração da concordância com os fundamentos dos pareceres e informações dos seus subalternos, que citaram expressamente o artº 4º/2-3) da Lei nº 4/2003 e o artº 12º/2-1), 2 e 4 da Lei nº 6/2004, como fundamento de direito para propor a interdição de entrada.
O que veio atacar por via do presente recurso foi um outro despacho em resposta a um requerimento formulado pelo ora recorrente, rogando a revogação da tal interdição de entrada já decretada e devidamente notificada.
Foi com base num elemento novo ou de conhecimento superveniente, que é a declaração da extinção do procedimento criminal dos factos que se serviram de fundamento da interdição, que o ora recorrente pediu a reapreciação da situação e a revogação da interdição.
Nesse novo despacho, ora recorrido, naturalmente a Administração só teria de fundamentar tão só o indeferimento da pretendida revogação da interdição, e não também a interdição que já consolidada na ordem jurídica.
E na verdade, a Administração fundamentou o acto ora recorrido na circunstância de a extinção do procedimento criminal por desistência de queixa não ter a virtualidade de abalar o juízo prognóstico da existência do perigo para a segurança ou ordem públicas da RAEM.
Assim, o ora recorrente que pediu à Administração a reapreciação da sua situação não pode deixar de conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração para a determinação do acto.
Improcede assim esta parte do recurso.
2. Da violação do caso julgado
Finalmente o recorrente assaca ao acto recorrido o vício da violação do caso julgado.
Para o recorrente, como o Tribunal penal já mandou arquivar o processo penal contra ele instaurado, a Administração teria de revogar a interdição de entrada, sob pena de violação do caso julgado, uma vez que a interdição foi decretada com base nos mesmos factos de que foi acusado.
Antes de mais, é de frisar que o arquivamento foi ordenado pura e simplesmente pela desistência de queixa por parte da ofendida e que o arguido, ora recorrente, não se opôs à desistência insistindo na prossecução do procedimento penal para provar a sua inocência.
Por outro lado, o recorrente está a confundir duas coisas bem distintas.
Uma coisa é a aplicação das consequências jurídico-criminais dos factos susceptíveis para o preenchimento de um tipo legal do crime, outra coisa é a tomada em conta dos indícios da prática de um crime para efeitos de aplicação de uma medida administrativa.
Ora, a extinção do procedimento criminal por motivo da desistência da queixa só impede a aplicação de uma sanção penal em sentido restrito, mas nunca formou caso julgado sobre a inocência do arguido.
Foi justamente por essa razão que, no caso de desistência da queixa, a lei penal confere ao arguido à faculdade para insistir na prossecução do procedimento criminal a fim de poder obter uma sentença absolutória que prova e declara a sua inocência.
In casu, não foi isso que aconteceu.
Alias, este TSI já teve oportunidade de se pronunciar num processo que tem por objecto um caso semelhante, no sentido de que “a autoridade administrativa é livre de retirar as consequências de uma condenação, ainda que suspensa na sua execução e decorrido já o período de suspensão, bem como de uma investigação criminal, ainda que arquivada por prescrição, para avaliação de uma personalidade em vista dos fins perspectivados, sendo de relevar os interesses referentes à defesa da segurança e ordem públicas.”
Mutatis mutandis, a Administração é livre de retirar as consequências, na matéria administrativa, de um juízo sobre a existência de fortes indícios de se ter verificado crime, já formulado pela autoridade judiciária, num processo penal que foi posteriormente arquivado pura e simplesmente pela desistência de queixa.
Foi o que sucedeu in casu.
Assim, improcede também a invocação do caso julgado.
Portanto, sem necessidade de mais delongas, é de julgar improcedente in totum o recurso.
Em conclusão:
3. O acto administrativo considera-se fundamentado quando o administrado, colocado na posição de um destinatário normal – o bonus pater familiae de que fala o artº 480º/2 do Código Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de reacção, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo o seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual.
4. A extinção do procedimento penal por desistência de queixa nunca formou caso julgado sobre a inocência do arguido, portanto nada impede a Administração de retirar dos elementos constantes do respectivo processo penal as consequências jurídicas para efeitos de avaliação da perigosidade do arguido a fim de tomar medidas necessárias à defesa da segurança pública da RAEM.
Resta decidir.
III
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conferência julgar improcedente o recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça fixada em 8 UC.
Registe e notifique.
RAEM, 14JUL2016
Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
Fui presente
Mai Man Ieng