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Proc. nº 1046/2015
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 21 de Julho de 2016
Descritores:
-Habitação social
-Listas provisórias
-Reclamação
-Listas definitivas
-Recorribilidade
-Confirmatividade

SUMÁRIO:

I. As listas provisórias dos candidatos à habitação social a que se refere o art. 7º do Despacho do Chefe do Executivo nº 296/2009, de 10/08, convertem-se em listas definitivas, se não houver reclamações ou, caso as haja, com a respectiva decisão administrativa tomada nessa sede impugnativa.

II. É da decisão tomada na referida reclamação, e não da lista definitiva, que deve ser interposto recurso contencioso.

III. A lista, por não ser acto administrativo, não pode ser meramente confirmativa da decisão que a precede.

Proc. nº 1046/2015

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I – Relatório
A, melhor identificada nos autos, interpôs no Tribunal Administrativo recurso contencioso da decisão proferida pelo Presidente Substituto do IH, que rejeitou a reclamação por si apresentada e a excluiu da lista de candidatos à atribuição de habitação social, pedindo que fosse declarado nulo ou anulado o acto recorrido, com fundamento em que o acto recorrido violou o direito fundamental previsto no artigo 39.º da Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau, bem como a lei ordinária e o princípio da justiça e da imparcialidade.
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Notificada para o efeito, a recorrente corrigiu a petição inicial, alegando interpor o recurso contencioso da lista definitiva de espera e dos excluídos do concurso de habitação social, confirmada pelo Presidente Substituto do IH por despacho de 15 de Dezembro de 2014 e publicado em 26 de Dezembro do mesmo ano.
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Na oportunidade, foi proferida sentença que, considerando irrecorrível o acto sindicado, com fundamento na sua natureza “meramente confirmativa”, rejeitou o recurso.
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É contra essa decisão que ora vem interposto o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações a recorrente formulou as seguintes conclusões:
«A) A sentença recorrida entendeu que o objecto do recurso contencioso (publicação das listas definitivas de espera e dos excluídos para o concurso de atribuição da habitação social 2013 confirmada pela Proposta n.º 1319/DHP/DHS/2014) é um acto meramente confirmativo, pelo que, é irrecorrível.
B) Cujos fundamentos são: o objecto do presente recurso contencioso é um acto meramente confirmativo, as listas provisórias de espera do presente processo não são definitivas, a reclamação do presente processo é um meio de impugnação administrativa necessário e a decisão da reclamação é definitiva.
C) A recorrente concorda que as listas provisórias de espera não são definitivas.
D) Contudo, a recorrente não concorda que a reclamação em causa é uma impugnação administrativa necessária, pois nos termos do artigo 148.º n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo e do princípio geral da reclamação, a reclamação é facultativa em vez de obrigatória.
E) E, quer no Curso de Procedimento Administrativo, quer no Código do Procedimento Administrativo de Macau. Anotado e Comentado, entendem que a reclamação tem apenas natureza facultativa, salvo disposição legal em contrário.
F) Nos termos do artigo 7.º n.º 3 do Regulamento de Candidatura para Atribuição de Habitação Social aprovado pelo Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2009, podem ser interpostas reclamações das respectivas listas, dirigidas ao presidente do IH.
G) Além disso, no ponto 4 do anúncio publicado no Boletim Oficial n.º 41 (II Série), de 8 de Outubro de 2014, o IH só referiu que “podem ser interpostas reclamações das listas acima mencionadas, dirigidas ao presidente do IH, no prazo de 15 dias a contar da data seguinte ao da publicação do presente aviso no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau, ou seja, a partir do dia 8 de Outubro de 2014 até ao dia 23 de Outubro de 2014.”
H) Pelo que, a reclamação do presente processo não é uma forma de impugnação administrativa necessária.
I) Além disso, o tribunal recorrido também entendeu que a decisão tomada em sede de reclamação é imediatamente definitiva.
J) Porém, a referida reclamação não é uma impugnação administrativa necessária, e nos termos dos artigos 150.º e 151.º do Código do Procedimento Administrativo, a reclamação tem apenas efeitos suspensivos ou não suspensivos do referido acto administrativo ou do recurso hierárquico necessário.
K) Isto quer dizer que a reclamação não tem efeitos de alterar o acto administrativo não definitivo para acto administrativo definitivo,
L) Pelo que, a decisão tomada em sede de reclamação não é definitiva.
M)Por outro lado, as listas provisórias e a decisão de rejeição da reclamação não são definitivas, assim, é natural que as listas definitivas publicadas pelo IH no Boletim Oficial n.º 52 (II Série), de 26 de Dezembro de 2014, não são um acto meramente confirmativo.
N) Uma vez que conforme o entendimento dos Dr.ºs Lino Ribeiro e José Cândido de Pinto escrevem no seu “Código do Procedimento Administrativo de Macau. Anotado e Comentado”, quando um acto confirma um acto administrativo não definitivo, é um acto confirmativo que é definitivo e recorrível.
O) Ao contrário, quando um acto confirma um acto administrativo definitivo, é apenas um acto meramente confirmativo.
P) Nas palavras de Freitas do Amaral, para que um acto administrativo possa ser qualificado como meramente confirmativo, é necessários que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos: - Que o acto confirmado seja definitivo; que o acto confirmado fosse do conhecimento do interessado, de modo a poder recorrer-se dele; e que entre o acto confirmado e o acto confirmativo haja identidade de sujeitos, de objecto e de decisão.
Q) Mesmo que as listas definitivas publicadas pelo IH no Boletim Oficial n.º 52 (II Série), de 26 de Dezembro de 2014, definam apenas a decisão tomada em sede de reclamação e/ou as listas provisórias publicadas no Boletim Oficial n.º 41 (II Série), de 8 de Outubro de 2014,
R) Dado que as listas provisórias e a decisão tomada em sede de reclamação não são definitivas, as listas definitivas publicadas no Boletim Oficial n.º 52 (II Série), de 26 de Dezembro de 2014, são apenas um acto confirmativo, em vez de um acto meramente confirmativo.
S) Assim sendo, deve-se interpor recurso contencioso das listas definitivas.
T) E, a recorrente interpôs o recurso contencioso nos termos do ponto 4 do Aviso publicado no Boletim Oficial n.º 52 (II Série), de 26 de Dezembro de 2014 (publicação das listas definitivas de espera e dos excluídos para o concurso de atribuição da habitação social).
U) Pelo acima exposto, a sentença recorrida que rejeitou o recurso contencioso por irrecorribilidade do objecto do recurso contencioso (isto é, as listas definitivas de espera e dos excluídos para o concurso de atribuição da habitação social publicadas no Boletim Oficial n.º 52 (II Série)), enferma do vício de erro nos pressupostos de direito, devendo ser anulada.
Pelo acima exposto, solicita que os MM.ºs Juízes julguem procedente o recurso interposto pela recorrente, anulando a decisão do tribunal a quo, com a consequente produção de efeitos jurídicos necessários. Solicita que se faça a habitual Justiça!»
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A entidade administrativa apresentou resposta ao recurso, sintetizando assim as suas alegações:
«1. Em princípio, nos termos do artigo 148.º n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo, a reclamação de qualquer acto administrativo é facultativa.
2. Em geral, é absolutamente desnecessário que o legislador preceitua especialmente para um determinado acto administrativo tal mecanismo de impugnação, isto é, a reclamação facultativa.
3. Pelo que, no artigo 7.º n.º 3 do Regulamento da Candidatura para Atribuição de Habitação Social, a razão pela qual o legislador prevê expressamente que “ (...) podem ser interpostas reclamações das respectivas listas, dirigidas ao presidente do IH (...) ” é qualificar tal reclamação como reclamação “necessária”.
4. Do conteúdo da referida disposição, pode-se saber que na fase de lista provisória os interessados não podem interpor directamente recurso contencioso da decisão de exclusão, mas sim devem apresentar reclamação dirigida ao presidente do IH.
5. O que conduz a que a decisão de exclusão na fase de lista provisória não seja definitiva por estar vinculada à impugnação administrativa necessária.
6. Pelo que, a decisão proferida pela Administração em sede de reclamação só constitui a decisão final contenciosamente recorrível. Caso não se conforme com tal decisão, dela pode a recorrente interpor directamente o recurso contencioso.
7. A lista dos excluídos publicada na fase de lista definitiva repetiu meramente o conteúdo da decisão da reclamação sem apreciar ou debruçar sobre questões novas nem invocar a factualidade e/ou fundamentação jurídica diversa, pelo que, não afectou a situação jurídica da própria recorrente, constituindo apenas o acto meramente confirmativo.
8. Nos termos do artigo 31.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, o acto meramente confirmativo é irrecorrível.
9. No aviso sobre a publicação da lista dos excluídos na fase de listas definitivas, a Administração referiu que dela podiam ser interpostos recursos contenciosos, porém, efectivamente, a Administração prestou informações erradas aos interessados.
10. Contudo, isto ainda não pode alterar a irrecorribilidade da lista dos excluídos.
11. Pelo que, é absolutamente legal a decisão da MM.ª Juíza do Tribunal Administrativo que rejeitou o recurso contencioso da recorrente por irrecorribilidade do acto recorrido, não incorrendo em qualquer erro nos pressupostos de direito, devendo, por isso, ser mantida.
12. Nestes termos, deve ser rejeitado o recurso interposto pela recorrente.».
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O digno Magistrado do MP junto deste TSI emitiu o seguinte parecer:
«Vem o presente recurso interposto da decisão de 30 de Julho de 2015 que, com fundamento em irrecorribilidade do acto, rejeitou o recurso contencioso que A dirigiu contra a exclusão da sua candidatura num concurso promovido pelo Instituto da Habitação para atribuição de habitação social.
A recorrente, A, diz que a decisão recorrida padece de erro nos pressupostos de direito, já que considerou meramente confirmativo um acto que o não é.
Não creio que assista razão à recorrente. Vejamos.
Num concurso, para atribuição de habitação social, aberto por aviso publicado no Boletim Oficial n.º 21, II Série, de 22.05.2013, a recorrente viu a sua candidatura excluída conforme lista afixada nos locais anunciados no Boletim Oficial n.º 41, II Série, de 08.10.2014. Desta exclusão reclamou para o presidente do Instituto da Habitação, de harmonia com o previsto no artigo 7.º, n.º 3, do Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2009, tendo a reclamação sido objecto de indeferimento mediante despacho do Presidente Substituto do Instituto da Habitação, de 11.11.2014, que manteve a decisão de exclusão. Este despacho foi notificado à interessada, ora recorrente, sendo-lhe no acto prestada a informação de que da decisão podia deduzir impugnação pela forma a mencionar no aviso da lista definitiva de espera dos candidatos, a publicar posteriormente. Por aviso publicado no Boletim Oficial n.º 52, II Série, de 26.12.2014, foram indicados os locais de afixação da lista definitiva de espera e da lista dos excluídos e foi anunciada a possibilidade de interpor recursos das listas mencionadas, para o Tribunal Administrativo, no prazo de 30 dias.
Posto isto, constata-se que a recorrente interpôs recurso da lista de exclusão avalizada e mandada publicitar pelo Presidente Substituto do Instituto da Habitação em 15 de Dezembro de 2014 e anunciada no Boletim Oficial n.º 52, II Série, de 26 de Dezembro de 2014.
É óbvio que a lista não é recorrível. A lista em si nada define. Recorrível é o acto de exclusão, pois é esse o que apresenta apetência para causar lesão na esfera jurídica da recorrente. E o acto definidor da situação de exclusão é aquele que, em sede de reclamação, manteve a anterior exclusão.
Dada a estrutura procedimental do concurso, parece-nos claro que, contrariamente ao que intenta sustentar a recorrente na sua alegação de recurso jurisdicional, a reclamação é necessária à abertura da via contenciosa. De contrário, a exclusão anteriormente determinada e anunciada na lista publicitada em 08.10.2014 ter-se-ia firmado como caso decidido...
O acto definidor da situação da recorrente é, pois, a decisão proferida em sede de reclamação, tal como assevera o despacho recorrido. Era contra essa decisão que deveria ter sido dirigido o recurso contencioso.
No que toca à recorrente, a lista de exclusão publicitada em 26.12.2014, bem como o despacho de 15 de Dezembro, que a aprovou e mandou publicitar, apenas confirmam o acto de 11.11.2014, que decidiu a reclamação e impôs autoritária e definitivamente a exclusão. Como este fora oportunamente notificado à interessada e ora recorrente, o acto que ela trouxe a escrutínio é meramente confirmativo, pelo que o recurso contencioso estava votado à rejeição - artigo 31.º, n.º 1, do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Nenhuma censura merece, pois, o douto despacho recorrido.
Improcedem, assim, os argumentos da recorrente, pelo que deve negar-se provimento ao recurso jurisdicional».
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Cumpre decidir.
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II – Os Factos
A sentença deu por provada a seguinte factualidade (que, por nossa iniciativa, enumeraremos):
1 - Em 28 de Maio de 2013, a recorrente apresentou ao IH o boletim de candidatura à habitação social, cujo n.º é 31201300302, e os respectivos documentos (fls. 1 a 2, 6 a 13 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
2 - Em 4 de Setembro de 2013, por ofício n.º 1309040159/DRS, o IH notificou a recorrente para entregar os documentos em falta (cfr. fls. 16 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
3 - Em 18 de Setembro e 3 de Outubro de 2013, a recorrente apresentou os documentos em falta ao IH (cfr. fls. 17 a 23 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
4 - Em 7 de Março de 2014, por ofício n.º 1403070030/DRS, o IH notificou a recorrente para entregar os documentos em falta (cfr. fls. 27 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
5 - Em 26 de Setembro de 2014, o Presidente Substituto do IH proferiu despacho, concordando com o conteúdo da Proposta n.º 0772/DHP/DHS/2014 e confirmando a publicação da lista provisória de espera e da lista dos excluídos do concurso para atribuição de habitação social de 2013, em que a recorrente se encontrava na lista dos excluídos, por motivo de que a recorrente é elemento do agregado familiar que figura no boletim de candidatura de outro agregado familiar, ao qual o IH já autorizou a aquisição de habitação construída em regime de contratos de desenvolvimento para a habitação e a recorrente não supriu a deficiência documental dentro do prazo que lhe foi fixado (cfr. fls. 1 a 11 do Apenso 2, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
6 - Em 8 de Outubro de 2014, o IH publicou no Boletim Oficial da RAEM, n.º 41, II Série, o anúncio sobre a “Publicação da Lista Provisória de Espera e da Lista dos Excluídos do Concurso para Atribuição de Habitação Social”, no qual indicou que podiam os requerentes consultar as listas provisórias de espera e dos excluídos no prazo e no local fixados e das referidas listas podiam ser interpostas reclamações para o presidente do IH no prazo fixado (cfr. fls. 89 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
7 - Em 22 de Outubro de 2014, a recorrente apresentou ao presidente do IH reclamação da não admissão da sua candidatura à habitação social na lista provisória de espera, entregando, para tal efeito, os respectivos documentos (cfr. fls. 32 a 33 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
8 - Em 23 de Outubro de 2014, a recorrente apresentou ao IH o pedido de autorização excepcional (cfr. fls. 30 a 31 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
9 - Em 29 de Outubro de 2014, pessoal do IH realizou reunião para apreciar o pedido de autorização excepcional da recorrente, entendendo que a recorrente é cônjuge do promitente-comprador da habitação económica e o prazo do ónus de inalienabilidade da referida habitação económica ainda não terminou, situações essas não preencheram todos os factores referidos nos critérios da concessão de autorização excepcional, propondo, por isso, que não fosse admitido o pedido de autorização excepcional da recorrente (cfr. fls. 45 a 46 e seu verso, e 48 e 49 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
10 - Em 11 de Novembro de 2014, o Presidente Substituto do IH proferiu despacho, concordando com o conteúdo da Proposta n.º 1180/DRP/DRS/2014 onde referiu que a recorrente não supriu a deficiência documental dentro do prazo que lhe foi fixado, e apesar de ter apresentado o esclarecimento, a recorrente e os elementos do seu agregado familiar são elementos de agregado familiar que figuram noutro boletim de candidatura ao qual já foi autorizada a aquisição da habitação económica e o prazo do ónus de inalienabilidade da referida habitação económica ainda não terminou, situações essas não preencheram todos os factores referidos nos critérios da concessão de autorização excepcional, razões pelas quais decidiu não admitir o pedido de autorização excepcional da recorrente para candidatar-se à habitação social (cfr. fls. 72 a 75 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
11 - Em 25 de Novembro de 2014, por ofício n.º 1411050003/DHS, o IH notificou a recorrente da aludida decisão, indicando ainda que a recorrente podia apresentar impugnação segundo a forma mencionada no aviso sobre a lista definitiva de espera dos candidatos futuramente publicado pelo IH (cfr. fls. 10 dos autos e fls. 76 a 77 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
12 - Em 15 de Dezembro de 2014, a entidade recorrida proferiu despacho, concordando com o conteúdo da Proposta n.º 1319/DHP/DHS/2014, confirmando a publicação da lista definitiva de espera e da lista dos excluídos do concurso para atribuição de habitação social de 2013, em que a recorrente se encontra na lista dos excluídos por motivo de que a recorrente é elemento do agregado familiar que figura no boletim de candidatura à habitação económica de outro agregado familiar, ao qual o IH já autorizou a aquisição de habitação construída em regime de contratos de desenvolvimento para a habitação e a recorrente não supriu a deficiência documental dentro do prazo que lhe foi fixado (cfr. fls. 12 a 26 do Apenso 2, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido
13 - Em 26 de Dezembro de 2014, o IH publicou, no “Boletim Oficial da RAEM”, n.º 52, II Série, o aviso sobre as “Listas Definitivas de Espera e Lista dos Excluídos do Concurso para Atribuição de Habitação Social”, em que indicou que os requerentes podiam consultar as referidas listas definitivas de espera e dos excluídos no prazo e no local fixados e podiam interpor recursos contenciosos das listas para o Tribunal Administrativo no prazo fixado (cfr. fls. 85 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
14 - Em 30 de Dezembro de 2014, a recorrente apresentou o pedido de apoio judiciário à Comissão de Apoio Judiciário (cfr. fls. 38 dos autos e fls. 83 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido), o pedido de apoio judiciário da recorrente foi autorizado e tal decisão passou a ser impugnável em 13 de Fevereiro de 2015 (cfr. fls. 39 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).
15 - Em 16 de Março de 2015, a mandatária judicial nomeada da recorrente interpôs, por via de fax, o presente recurso contencioso da aludida decisão.
Dos autos resultam ainda provados os seguintes factos, que ora se acrescentam:
a) No requerimento de candidatura para habitação social, a recorrente apresentou o seu agregado como seu constituído por si e seus dois filhos menores, declarando ainda como estado civil o de divorciada (fls. 12, p.a.);
b) Declarou ainda ser incapaz de trabalhar em virtude de doença crónica (fls. 10 do p.a.);
c) O Chefe Substituto da Divisão de Habitação Social notificou a recorrente para entregar documentos comprovativos de sentença de regulação poder paternal sobre os dois filhos e certidão da decisão sobre a dissolução do casamento além de documento de registo da avaliação de deficiência emitido pelo Instituto de Acção Social (fls. 16 do p.a.);
d) Nesse ofício foi advertida de que a falta desses elementos implicaria a exclusão de candidatura;
e) A recorrente entregou no IH em 18/09/2013 cópia de uma declaração médica emitida pelo Centro de Prevenção de Tratamento de Tuberculose da Direcção dos Serviços de Saúde, que declarava que ela sofria de tuberculose pulmonar (fls. 17-19 do p.a.);
f) Em 3/10/2013 a recorrente apresentou cópia do cartão de estudante dos dois filhos, mas não apresentou quaisquer documentos comprovativos do seu estado civil e da regulação do exercício do poder paternal;
g) A recorrente e os dois filhos faziam parte de um agregado declarado na candidatura nº 2120131985 para habitação económica (fls. 15 e 26 do p.a.);
h) O Chefe Substituto da Divisão de Habitação Social enviou outro ofício à recorrente em 7/03/2014 para que em 18/03/2014 fosse ao IH entregar sentença de regulação do exercício de poder paternal e documento de actualização do seu estado civil, tendo sido advertida então que caso não suprisse a insuficiência documental seria excluída da candidatura (fls. 27 do p.a.);
i) Em 26/09/2014 a entidade recorrida excluiu a recorrente (fls. 1 a 11 do p.a);
j) Em 22 de Outubro a recorrente apresentou reclamação (ver facto 7 supra);
l) Em 23 de Outubro de 2014, a recorrente apresentou no IH o pedido de autorização excepcional, que foi indeferido por despacho de 11/11/2014 (facto 10 supra).
m) Nesse mesmo despacho de 11/11/2014, foi decidido rejeitar a reclamação (fls. 72-76 do p.a.).
n) A recorrente foi notificada dessa decisão pelo ofício n.º 1411050003/DHS, sendo advertida ainda que podia apresentar impugnação “segundo a forma mencionada no aviso sobre a lista definitiva de espera dos candidatos futuramente publicado pelo IH” (cfr. fls. 10 dos autos e fls. 76 a 77 do Apenso 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);
o) Em 26/12/2014 foram publicadas no BO da RAEM as listas definitivas, sendo ainda ali referido que “podem ser interpostos recursos judiciais das listas acima mencionadas, dirigidos ao Tribunal Administrativo, no prazo de trinta dias a contar da data seguinte à da publicação do presente aviso no Boletim Oficial da Região Administrativa Especial de Macau” (cfr. facto 13 supra);
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III – O Direito
1 – Introdução ao caso
A recorrente tinha primeiramente deduzido recurso contencioso da decisão do Presidente Substituto do IH, que rejeitou a reclamação que rejeitou a reclamação por si apresentada e a excluiu da lista de candidatos à atribuição de habitação social.
Na sequência do despacho do juiz titular do processo de fls. 113 (fls. 141-143 do apenso “traduções”), veio a recorrente então apresentar nova petição, desta vez dizendo recorrer «contra a lista dos excluídos…».
E a sentença, aqui sindicada, considerou o seguinte:
- Que o objecto do recurso contencioso não era a decisão proferida pela entidade administrativa sobre a reclamação por si apresentada;
- Que a reclamação da lista provisória a que respeita o art. 7º, nºs 3 e 4 do Despacho do CE nº 296/2009 é um meio de impugnação necessário;
- Que só o resultado da reclamação, constitui a decisão final e definitiva para o interessado, dela podendo então interpor recurso contencioso;
- Que nem a lista provisória, nem a definitiva dos excluídos podem ser objecto do recurso contencioso;
- Que da decisão de 11/11/2014, recaída sobre a reclamação de 22/20/2014, cabia recurso contencioso;
- Que a lista subsequente a tal decisão de 11 de Novembro é mera repetição do conteúdo da decisão da reclamação, sem conteúdo inovador e lesivo, o que constitui assim um “acto meramente confirmativo” (art. 31º do CPAC).
E assim, tendo por base estes pressupostos, tomou o acto objecto do recurso como contenciosamente irrecorrível por ser acto meramente confirmativo.
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2 – Da recorribilidade do objecto do recurso
Urge responder à questão sobre se o recurso contencioso apresenta um objecto recorrível, nomeadamente se tem natureza “meramente confirmativa”.
Como se viu pela resenha fáctica acima exposta, a sentença recorrida considerou que a lista definitiva - de que fora interposto o recurso (na 2ª petição inicial, após convite à correcção feito pelo tribunal) – nada inovou relativamente à decisão tomada sobre a reclamação apresentada pela recorrente da lista provisória de exclusão.
E disse mais: disse que a reclamação era meio de impugnação administrativa necessária.
A dificuldade do caso não está tanto na sua solução (como se verá, bem simples), mas no cruzamento de afirmações que, com o devido respeito, não parece que sejam juridicamente exactas.
*
2.1 – Será a dita reclamação necessária?
Quando se diz que uma determinada impugnação administrativa é “necessária”, tal não significa que seja “obrigatória” no sentido de que substantiva ou materialmente nada acontecerá sem a sua interposição, isto é, no sentido de que a esfera jurídica de alguém não sofrerá alterações sem a decisão definitiva da reclamação. Pode ser “necessária” e, no entanto, o particular pode querer não deduzi-la, por não estar interessado nisso (em boa verdade, a tal não está obrigado). É “necessária” somente para se obter a prática de um acto verticalmente definitivo, mas ninguém está forçado a deduzi-la.
Na verdade, quando o interessado não deduz a impugnação “necessária”, há efeitos que logo decorrem da inacção: o acto impugnável, por falta de sindicância administrativa, torna-se “caso decidido” ou “caso resolvido”, com os inerentes efeitos em termos da definição da situação jurídica substantiva.
Ora, a reclamação administrativa, por via de regra, tem natureza facultativa: significa que só nos casos em da lei resulte precisamente o contrário, deve o interessado apresentar reclamação a fim de obter uma decisão definitiva de que possa interpor recurso contencioso (art. 150º, do CPA).
Neste caso, não obstante o art. 7º, nº3 do Despacho do Chefe do Executivo nº 296/2009 referir que “podem ser interpostas reclamações das respectivas listas…”, isso não equivale a dizer que estas formas de impugnação administrativa tenham natureza facultativa. Na verdade, e como resulta do nº 5, “decididas as reclamações é elaborada a lista definitiva…”. Ou seja, a definição da situação jurídica substantiva de cada candidato só é obtida com a lista definitiva.
E o reforço desta asserção resulta ainda, cremos nós, do nº6, do mesmo artigo, pois dele resulta que “caso não haja reclamações, a lista provisória converte-se em lista definitiva…”.
Ou seja, a falta de impugnação torna a situação estabilizada definitivamente (o caso fica “decidido” de uma vez por todas), para cada um dos interessados inactivos.
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2.2 – Pensamos, por isso, que a solução do caso dispensa mais profunda apreciação sobre a natureza necessária, ou facultativa, da referida reclamação.
Na verdade, torna-se despiciendo ir mais além na análise desse diferendo, porquanto a recorrente efectivamente apresentou reclamação da sua exclusão da lista provisória. Repare-se: se essa natureza não a tivesse a reclamação apresentada, então qualquer recurso contencioso teria que ser interposto da primeira decisão que excluiu provisoriamente a recorrente da lista de candidaturas admitidas. E nessa hipótese não estaríamos aqui e neste momento, com toda a certeza, a discutir a validade da exclusão definitiva da interessada deste concurso.
Portanto, o que agora se precisa ver é se estamos perante um objecto contenciosamente recorrível.
*
2.3 - A sentença disse que a lista é meramente confirmativa da decisão da reclamação.
Contudo, e salvo devido respeito, tal afirmação contém uma imprecisão.
Diz-se, com efeito, que um acto é confirmativo quando mantém na ordem jurídica um acto anterior que não é definitivo (acontece assim com os actos que decidem impugnações administrativas necessárias). Recorrível contenciosamente é o acto confirmativo.
E meramente confirmativo se fala daquele que mantém na ordem jurídica sem qualquer alteração um acto anterior que já era definitivo, e que, assim, já era recorrível contenciosamente (acontece assim com os actos que decidem impugnações administrativas facultativas). Recorrível contenciosamente é o acto confirmado.
Está contida nesta muito breve súmula toda a teoria do acto administrativo confirmativo.1
Sendo isto assim, parece-nos que a sentença recorrida peca neste aspecto: a irrecorribilidade pode advir de outra coisa, não, porém, da natureza confirmativa ou meramente confirmativa que se queira apontar à lista. Se a lista não é acto administrativo – mas sim, e apenas, uma consequência material da decisão administrativa que a precede, ou mera indicação ou referenciação num “rol” das pessoas admitidas ou excluídas – então não é sequer possível falar em confirmatividade, porque esta implica a existência de uma decisão administrativa que confirma, e mantém na ordem jurídica, outra anterior.
*
2.3 – Mas também não tem razão a recorrente ao dizer que, por a lista não ser meramente confirmativa, dela haveria recurso contencioso. Há nessa afirmação alguma desarrumação de ideias, se nos é permitido dizer assim.
Quer dizer, apesar de não podermos acompanhar a sentença a propósito da alegada natureza “meramente confirmativa” da decisão da reclamação, daí não se segue que estejamos a admitir que ela é passível de impugnação contenciosa.
Na verdade, e tal como acabámos de concluir, a lista não é acto administrativo. E só o acto administrativo é passível de recurso contencioso (cfr. art. 20º, do CPAC).
E basta isto para se acolher a tese da irrecorribilidade do objecto do recurso contencioso (não pelo fundamento invocado na sentença, mas pelo que aqui suscitamos).
***
IV – Decidindo
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça em 5 UC, sem prejuízo do apoio judiciário.
TSI, 21 de Julho de 2016


_________________________ _________________________
José Cândido de Pinho Joaquim Teixeira de Sousa
_________________________ (Fui presente)
Tong Hio Fong
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Lai Kin Hong

1 Sobre o assunto, v.g., J. Cândido de Pinho, Manual de Formação de Direito Processual Administrativo Contencioso, 2ª ed., pág. 102-104.
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1046/2015 23